Introdução
Atualmente observa-se o crescimento da população adolescente no mundo,1 fenômeno coincidente com a redução de doenças infecciosas, da desnutrição e da mortalidade na infância.2,3 Na adolescência, são observados comportamentos de risco e de negligência nos cuidados com a própria saúde,1,2,4 mais impactantes ainda em situações nas quais não existe a garantia dos direitos de cidadania.1,5
O período da adolescência, caracteriza-se por determinadas situações de vulnerabilidade como, por exemplo, gravidez precoce, violência e abuso sexual, uso e abuso de álcool e outras drogas, capazes de comprometer ainda mais seu desenvolvimento, quando comparados a outros segmentos populacionais.1,2,4-6 Essas situações tornam-se mais graves quando combinadas com as desigualdades sociais presentes, a exemplo da pobreza, baixa escolaridade, área de moradia, precariedade da oferta de instituições e serviços públicos, entre outras.1,4
No Brasil, desde a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, houve importantes avanços em direção à universalização do acesso ao Ensino Fundamental.1 Entretanto, muitas crianças e adolescentes têm dificuldade no aprendizado ou não concluem os estudos, uma vez que o sistema educacional também sofre o impacto determinante das desigualdades e vulnerabilidades sociais.1 De acordo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), um em cada quatro alunos que inicia o Ensino Fundamental abandona a escola antes de completar a última série. A propósito, o Brasil tem a terceira maior taxa de abandono escolar - 24,3% - entre os 100 países com maior índice de desenvolvimento humano (IDH).7
A educação é um dos mais fortes preditores de saúde.8-10 Além de potencializadora de oportunidades, a educação ainda é capaz de pôr fim ao ciclo de pobreza intergeracional e prover um desenvolvimento sustentável,8,9 facilitar a escolha de comportamentos saudáveis e o acesso a cuidados de saúde de qualidade, além de oferecer ferramentas de apoio e recursos que otimizam a saúde individual.8-10 Acredita-se que promover o bem-estar das populações em situação de risco e manter esses grupos em contato com oportunidades educacionais pode contribuir para a superação de desigualdades nos resultados da saúde.10 Ações de parceria entre os serviços de saúde e as escolas têm-se destacado por sua contribuição para a saúde, ao compensar trajetórias difíceis, ligadas ao processo saúde-doença, que afetam o desempenho do aluno e, muitas vezes, levam ao abandono escolar.10,11
Ao considerar a educação como um importante veículo para abordar a desigualdade de oportunidades e de resultados, manter o adolescente na escola e garantir a conclusão de seus estudos torna-se fundamental para a superação, o enfrentamento e a redução das vulnerabilidades.12 Nessa perspectiva, as intervenções realizadas em programas de atendimento psicossocial e especialmente dedicadas à redução e prevenção das situações de vulnerabilidade deveriam valorizar e priorizar as oportunidades educacionais, entre elas a inserção ou garantia da continuidade dos adolescentes na escola.
O objetivo deste estudo foi avaliar a efetividade do atendimento psicossocial a adolescentes em vulnerabilidade social com foco em sua situação escolar.
Métodos
Estudo de coorte retrospectivo, com adolescentes que sofreram intervenção do Programa de Atendimento Psicossocial (PAS) do município de Caçapava, São Paulo, no período entre setembro de 2007 e dezembro de 2012. Os critérios de inclusão no PAS foram: ter idade entre 11 e 18 anos; renda familiar até dois salários mínimos; e participação voluntária.
O presente estudo tomou como objeto o referido PAS, inserido em uma organização não governamental (ONG) que atendia adolescentes de ambos os sexos e seus familiares em situação de vulnerabilidade social. O PAS estudado tem como proposta:
[...] realizar intervenções de caráter preventivo em regime ambulatorial visando: atender, estimular e desenvolver atividades de promoção da saúde, social e educacional para adolescentes em situação de vulnerabilidade e risco social.
O encaminhamento era realizado somente via órgãos municipais, e a atuação da equipe multidisciplinar (assistente social, psicóloga, psicopedagoga/pedagoga, professor de curso de informática e marcenaria, gestor e pessoal administrativo) era baseada em pressupostos da abordagem conhecida como Redução de Danos.13 A ênfase nessa abordagem privilegia (i) os danos causados (ao invés do comportamento patológico), (ii) o respeito ao indivíduo e (iii) o direito à escolha, garantidos na participação voluntária cujo acolhimento se dá por acordo de mútua confiança, livre de julgamento moral. Tais pressupostos, além de mais atraentes para o adolescente, podem reduzir os obstáculos, o estigma e a vergonha pessoal.13 Após a triagem, um plano de intervenção individualizado era conduzido de maneira a responder às necessidades de cada adolescente e sua família, incluindo os diversos enfoques dos atendimentos (social; psicológico; psicopedagógico e/ou pedagógico; familiar; e oficinas educativas) e das ações (visita domiciliar; acompanhamento escolar; encaminhamentos médicos para hebiatra, neurologista e psiquiatra; atividades esportivas e culturais; e cursos profissionalizantes e de orientação ao mercado de trabalho). O cálculo da média (M) de tempo e desvio-padrão (DP) em meses de cada grupo foi realizado, e a diferença dos resultados entre os grupos foi avaliada pelo teste t de Student. Esse procedimento foi realizado para verificar se a intervenção estava diferentemente distribuída nos dois grupos.
Para fins de análise, foram utilizadas as seguintes variáveis independentes:
Participação da família e/ou responsável (não; sim), considerada como positiva quando houve a frequência em pelo menos um atendimento individual e do grupo de orientação familiar ao longo do acompanhamento psicossocial; nos casos em que o adolescente estava residindo em abrigo provisório, o profissional do abrigo era responsável por comparecer aos atendimentos e participar nas orientações aos adolescentes.
Transtorno mental (não; sim), considerado positivo quando o adolescente já tinha passado por avaliação especializada ou estava em atendimento psiquiátrico.
Queixa inicial, (i) Vulnerabilidade familiar/social (conflito familiar; pai ou mãe usuários de drogas; violência doméstica; perda familiar; negligência familiar; e vulnerabilidade social ou pobreza), (ii) Comportamento disruptivo (problemas de comportamento; agressividade; instabilidade emocional; gravidez precoce; uso de álcool e drogas; e dificuldade de socialização), (iii) Problema escolar (problemas de ordem comportamental; frequência irregular; evasão escolar; e dificuldade de aprendizagem)
Defasagem idade/série (não; sim), calculada segundo os critérios para escolaridade esperada para idade, estabelecidos pelo Ministério da Educação do Brasil.14
Linha da pobreza (acima; abaixo), estimada a partir da renda média familiar per capita/dia, convertida para o dólar do mês de coleta dos dados; os indivíduos foram considerados como tendo renda abaixo da linha da pobreza quando esta foi menor que US$1.00/dia.
O registro das informações dos adolescentes encaminhados para atendimento no PAS serviu como fonte de informações: identificação do atendimento; família; situação de saúde e escolar; renda familiar; motivo do encaminhamento; e fonte do encaminhamento. Um questionário complementar recolheu informações sobre: período de acompanhamento psicossocial; intervenções; encaminhamentos; participação dos pais e responsáveis; desligamento do PAS; e situação escolar após seis meses de seguimento. No caso do grupo que abandonou a intervenção, as informações sobre estar estudando após seis meses foram obtidas via contato com as equipes dos órgãos encaminhadores (ex.: Conselho Tutelar; Secretarias de Cidadania e Educação), responsáveis pela assistência e acompanhamento das famílias dos adolescentes encaminhados ao PAS.
As análises estatísticas foram realizadas em duas etapas: na primeira, observaram-se os fatores associados à adesão (exposição) ao PAS; na segunda etapa, analisou-se a efetividade da adesão ao programa na permanência na escola (desfecho) após seis meses de participação na intervenção. Estas análises foram feitas pelo programa Stata versão 12, tendo como medida de associação o risco relativo (RR) e intervalo de confiança de 95% (IC95%), estimados por modelos de regressão de Poisson, com estimação de variância robusta.15
Os fatores relacionados à adesão ao programa PAS foram investigados por meio de um modelo que incluiu as seguintes variáveis: faixa etária; sexo; área de moradia; renda; estar estudando no inicio do tratamento; escolaridade esperada para a idade; queixa declarada para o tratamento; acompanhamento do tratamento pela família; e ter transtorno mental. A efetividade da intervenção no PAS com adolescentes em vulnerabilidade social foi estudada por meio de um modelo que inclui as variáveis cuja análise bivariada resultou em nível de significância p<0,10.
O projeto do estudo foi apresentado junto ao Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp/EPM e Plataforma Brasil - CAAE nº 24351414.4.0000.5505 - e aprovado: Parecer nº 622986. Os adolescentes e seus responsáveis assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando o uso das informações para fins de pesquisa.
Resultados
De acordo com os 282 prontuários analisados, 82 adolescentes foram encaminhados mas não se iniciaram no programa. O grupo de adesão, composto por 116, frequentou o programa PAS por no mínimo seis meses; 84 adolescentes abandonaram o programa nos seis primeiros meses, formando o grupo de abandono (Figura 1).
O grupo de adesão participou do PAS por 12,1±5,25 meses, em média, e o grupo de abandono, por 2,9±1,35 meses, sendo essa diferença entre os grupos estatisticamente significativa (p<0,001).
A amostra foi composta por 55% de meninos, idade média de 14 anos (variando de 11 a 18 anos), 60% residentes em área urbana e 40% em área rural (Tabela 1). Baixos índices de desempenho escolar foram observados entre os adolescentes: 23% de evasão escolar; 59% de defasagem idade-série; e 69% de reprovação. Dos adolescentes evadidos dos bancos escolares, aproximadamente 73,3% pararam de estudar por não gostarem da escola e 18% por problemas de saúde ou emocionais. Entre os adolescentes com reprovação, 47% já haviam sido reprovados mais de uma vez.
a) RR: risco relativo
b) IC95%: intervalo de confiança de 95%
c) Análise ajustada por Regressão de Poisson
d) No Programa de Atendimento Psicossocial (PAS)
A maioria dos adolescentes (46%) morava com a mãe, 30% com ambos os pais, 10% somente com o pai, 6% com outros parentes e 8% em abrigo. Os domicílios tinham em média três cômodos e quatro habitantes. A média da idade da mãe foi de 38 anos, 66% com Ensino Fundamental incompleto e 20% com Ensino Médio completo, 35% eram 'do lar' e 45% autônomas. A média da idade do pai foi de 43 anos, 66% com Ensino Fundamental incompleto e apenas 10% com o Ensino Médio concluído, 40% eram autônomos, 18% trabalhavam em indústria e 10% estavam desempregados. A maioria das famílias (41%) vivia com um a dois salários mínimos, sendo que 24% tinham renda domiciliar abaixo da linha da pobreza. As mães eram as principais responsáveis pelos adolescentes (70%) e 48% das famílias participaram do PAS com seus filhos.
A maior parte dos encaminhamentos ao PAS foi realizada pelo Conselho Tutelar (70%). A queixa inicial mais frequente foi problema escolar (50,0%), seguida de comportamento disruptivo (25,5%) e, por último, vulnerabilidade familiar/social (24,5%) (Tabela 1). Além da queixa, 10% dos adolescentes tinham história de abuso físico ou sexual, 14% apresentavam algum diagnóstico psiquiátrico, 13% faziam acompanhamento médico e 11% usavam algum medicamento no início da intervenção. Ademais, 35% dos adolescentes e 52% de suas famílias faziam uso de alguma substância lícita ou ilícita, e 27,5% dos adolescentes tinham familiares doentes no domicílio, eram portadores de doenças crônicas e de transtorno mental.
Os grupos de adolescentes que aderiram ao programa e os que abandonaram mostraram-se diferentes. A adesão ao PAS esteve associada a estar estudando no início da intervenção, ter renda domiciliar acima da linha da pobreza, contar com a participação da família e residir em área urbana (Tabela 1).
Entre os adolescentes participantes, 74,5% estavam estudando após seguimento de 6 meses. A análise da efetividade da intervenção mostrou que a adesão ao PAS esteve associada à condição de estar estudando após seguimento de seis meses (RR=1,12; IC95% 1,01;1,27) e após o ajuste para os efeitos das outras variáveis associadas ao desfecho. As outras condições que mostraram associação significante com estar estudando após seis meses foram: estudar no início da intervenção (RR=8,52; IC95% 3,71;19,57) e não apresentar queixa de comportamento disruptivo (RR=0,92; IC95% 0,84;0,99) (Tabela 2).
Discussão
Os resultados deste estudo mostram uma proporção alta de adolescentes em vulnerabilidade social que aderiram à intervenção psicossocial. Esta adesão contribuiu para que o adolescente estivesse estudando após seis meses, parâmetro de efetividade utilizado neste estudo. Entretanto, características do indivíduo, como já estar estudando no início da intervenção, desempenharam papel predominante nesse resultado.
A taxa de adesão à intervenção encontrada foi de 58%, dentro da margem apresentada em estudos internacionais que mostram variação de 30% (transtornos por uso de substâncias) a 80% (outros transtornos mentais).16-18 A adesão ao tratamento é considerada um desafio, especialmente quando se trata de adolescentes: o estigma da intervenção psicossocial afeta negativamente sua autoestima, a ponto de reduzir as possibilidades de inserção e busca de tratamento,19,20 seja por preocupações de que o profissional não manterá a confidencialidade,19 seja pela própria dificuldade de autopercepção da gravidade do problema.20,21
Neste estudo, os adolescentes que mais aderiram foram aqueles que estavam estudando no início da intervenção, com renda domiciliar acima da linha da pobreza e participação da família no acompanhamento psicossocial. Estes resultados são semelhantes àqueles encontrados na literatura, demonstrando que a educação facilita a obtenção de informação, conhecimento, acesso aos serviços de saúde e maiores chances de buscar apoio e recursos,8,9 e que as famílias com renda melhor, além de contar com os mesmos benefícios proporcionados pela educação, apresentam melhores condições de transporte para si e o adolescente em tratamento.20 Diversos estudos mostram que a participação da família está associada com a adesão à intervenção.18,20-22 O apoio da família durante o tratamento melhora a comunicação entre pais e filhos e auxilia no gerenciamento de conflitos, mantendo o adolescente envolvido e motivado para o tratamento, mesmo em programas cuja participação é voluntária.18 Se a participação da família é tão importante, alguns autores, entretanto, chamam a atenção para a dificuldade dessa participação, sobretudo entre aquelas famílias sob alto risco social, enfrentando condições precárias de vida e moradia, sujeitas a situações de violência. São dificuldades que podem inviabilizar a participação familiar no tratamento do filho, mesmo nos casos em que a família recebe apoio assistencial e auxílio para transporte.17
A intervenção psicossocial contribuiu para o adolescente estar estudando após seis meses de seguimento. A condição de estar estudando no início da intervenção, ademais, mostrou-se predominante para esse sucesso. O impacto dos fatores de desempenho escolar e saúde relacionados ao próprio adolescente são destacados em outro estudo, cuja preocupação foi mais além do alcance das intervenções psicossociais.10 Contudo, as intervenções em serviços de saúde podem ser uma oportunidade para enfrentar o risco de evasão escolar influenciada pelo estado de saúde do adolescente.10
Problemas de comportamento, tais como uso de substâncias psicoativas, agressividade, gravidez precoce, entre outros comportamentos considerados disruptivos, têm sido destacados como fortes preditores de abandono escolar.23-25 Entretanto, esses problemas encontrados na adolescência podem ser minimizados com a implementação de programas de saúde dirigidos à mudança dos comportamentos considerados de risco, que invistam em relações interpessoais positivas.24
Os motivos aos quais se atribui o sucesso da intervenção foram as estratégias que enfatizam o acolhimento do adolescente, oferecendo-lhe apoio social e emocional, mediado por um acordo mútuo de confiança e livre de julgamento moral, que reconhece e valoriza o adolescente como cidadão, com direito a receber informações e exercer sua autonomia na tomada de decisões.13,26,27 A ausência de referências e apoio social a esses adolescentes justifica o trabalho voltado à promoção de sua autonomia e construção de pontos de vista críticos, instrumentalizando-os a lidar sozinhos com a realidade da sociedade. O estímulo ao papel ativo do adolescente, enquanto participante voluntário do PAS, permite que ele se engaje na medida da consciência de sua necessidade e iniciativa, assumindo a corresponsabilidade pelo processo terapêutico. Importante ressaltar que a construção desse vínculo positivo depende da estabilidade da equipe de profissionais18,22 e da qualidade da interação entre estes e o adolescente.20,28
Uma vez estabelecido esse vínculo, a abordagem terapêutica procura minimizar os prejuízos individuais e sociais, associados aos comportamentos de risco na adolescência,26 mediante o oferecimento de alternativas ao desenvolvimento de suas potencialidades.27 Aqui, partiu-se do pressuposto de que ensinar os adolescentes a reduzir e se proteger de danos maiores a sua saúde constitui a melhor opção para essa fase da vida, por meio de ações educativas contínuas e direcionada ao desenvolvimento de hábitos mais seguros. As estratégias que facilitam as oportunidades, as habilidades e o reconhecimento dos adolescentes tornam mais consistentes os vínculos sociais, comunitários e familiares e assim, abrem-se possibilidades de mudanças de trajetória ao longo da adolescência, favorecendo o desenvolvimento de fatores de proteção.29 O sucesso das intervenções de promoção da saúde entre os adolescentes de baixa renda tem-se atribuído, especialmente, às intervenções que envolvem os familiares e a comunidade.30 Tais abordagens se baseiam naquelas preconizadas pelos estudos de redução de danos e promoção da saúde.13, 26,27
O presente estudo, entretanto, apresenta limitações. Nesse sentido, não se pode descartar a possibilidade de vieses. Em primeiro lugar, foram incluídos no estudo apenas os adolescentes encaminhados para o PAS: a amostra não é representativa da população de adolescentes em situação de risco, porque é composta por encaminhamentos a um serviço específico. A participação ou não do PAS não foi aleatorizada, pois os adolescentes que não sofreram intervenção foram justamente aqueles que a abandonaram, ou seja, o grupo-controle formado pelos adolescentes desistentes da intervenção depois de terem-na recebido (por menos tempo), sugerindo viés de seleção e de aferição.
Em segundo lugar, a proporção de adolescentes estudando no início da intervenção era maior no grupo de adesão, podendo refletir em viés de confundimento, visto que tal variável está distribuída desigualmente entre os grupos e pode ter influenciado no sucesso da intervenção. Após controle estatístico para reduzir o efeito confundidor, verificou-se que, independentemente de estar estudando ou não no início da intervenção, houve mais adolescentes estudando após seis meses entre os que aderiram à intervenção, comparativamente aos do grupo de abandono (controle). Contudo, a magnitude da associação em relação a variável 'estar estudando no início da intervenção' ainda é maior do que a efetividade da intervenção.
Outra limitação refere-se às informações obtidas dos dados dos prontuários da instituição e dos autorrelatos. Embora tenham sido complementadas com dados de outras fontes, foram perdidas muitas informações entre aqueles do grupo que abandonou o serviço.
Outrossim, o limite de seis meses estabelecido como variável de desfecho pode ter sido pequeno: a depender, do período quando o adolescente entrou no estudo, não houve tempo para que se iniciasse em outro ano letivo.
Apesar dessas limitações, é importante considerar que no contexto brasileiro, o presente estudo pode evidenciar resultado positivo para uma intervenção psicossocial nessa população.
A adesão a um programa de atendimento psicossocial com as características do PAS foi efetiva para a permanência ou retorno dos adolescentes à escola após seis meses, embora características do adolescente também tenham desempenhado papel importante nesse resultado. As características do serviço - acolhimento mediado pela confiança e livre de julgamento moral, estabilidade da equipe e estratégias terapêuticas baseadas em pressupostos do referencial teórico-conceitual de Redução de Danos e de Promoção da Saúde - foram responsáveis pelo sucesso do programa. Um serviço com essas características pode ser uma alternativa para enfrentar o abandono escolar, comum nessa população, e alcançar os benefícios à saúde dos adolescentes, daí decorrentes. Estudos futuros devem ser conduzidos com o objetivo de avaliar a eficácia desse tipo de intervenção no longo prazo, com grupo-controle não exposto à intervenção, para garantir e controlar a distribuição das variáveis importantes nos dois grupos, assegurando que a intervenção é a única responsável pelo resultado.