Introdução
As consequências dos acidentes de trânsito no mundo vão além das áreas de trânsito e transporte, considerando-se um problema de saúde internacional. Em 2015, aproximadamente 1,25 milhão de pessoas morreram no mundo em consequência de acidentes de trânsito. Nos países de média e baixa renda, o custo com acidentes com vítimas foi superior a US$ 100 bilhões por ano.1
Em 2010, um consórcio internacional para a segurança viária chamado Road Safety in Ten Countries (RS-10), que envolvia instituições como a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Global Road Safety Partnership, a Associação Internacional de Seguro de Viagem Rodoviária, a Embarq e a Johns Hopkins University, recebeu financiamento da Bloomberg Philanthropies para realizar atividades que melhorassem a segurança viária nos dez países mais críticos em termos de mortes no trânsito, a saber: Brasil, Camboja, China, Egito, Índia, Quênia, México, Rússia, Turquia e Vietnã.2 O Brasil, em 2010, teve uma taxa de 22,5 mortes por cada 100 mil habitantes relacionadas com acidentes de trânsito.3
No Brasil, uma Comissão Nacional Interministerial foi criada em 2010 para coordenar a implementação e o desenvolvimento do Programa RS-10, que passou a ser chamado de Projeto Vida no Trânsito (PVT).4 Para início da implementação do PVT, foram escolhidas cinco capitais piloto: Belo Horizonte/MG, Campo Grande/MS, Curitiba/PR, Palmas/TO e Teresina/PI.5,6
O Processo de Integração de Dados (PID) é um modelo de gestão da informação aplicado à integração de múltiplas fontes de dados, desenvolvido a fim de apoiar a obtenção e integração de dados multissetoriais de acidentes de trânsito, bem como a gestão destas atividades, com base na abordagem de melhoria contínua - os dados produzidos por meio do processo são utilizados para subsidiar o planejamento e execução de ações de segurança viária em cidades que implementam o PVT.7
O PID foi desenvolvido pelo autor principal deste artigo, implementado inicialmente na cidade brasileira de Guaíba/RS, que executou a primeira versão dessa metodologia integrando dados de segurança viária a partir de múltiplas fontes.8 Para implementar o PID, as cinco capitais receberam capacitação e apoio oara a adoção da metodologia por meio de oficinas de formação e visitas de acompanhamento em base trimestral. Tal abordagem pode ser considerada como processo de monitoramento, semelhante ao proposto por Hsieh e Hsu.9
Este estudo tem por objetivo descrever o PID como um processo novo e replicável,10 suas principais etapas e sua implementação, assim como apresentar seus resultados.
Métodos
O processo foi realizado junto aos municípios objeto desta pesquisa e baseia-se na descrição da metodologia de implementação do PID e na descrição de suas etapas, seguindo-se com a apresentação de seus resultados. Na implementação do PID, já havia consenso local para se construir um banco de dados integrado de vítimas graves e fatais.
A definição de mortes e vítimas graves foi estabelecida com base no padrão da OMS, que considera "vítima fatal" uma pessoa morta imediatamente ou no prazo de 30 dias, como resultado de acidente de trânsito, e como "vítima grave" a pessoa hospitalizada por pelo menos 24 horas devido a ferimentos sofridos em acidente de trânsito.11
O PID é um modelo de gestão, desenvolvido com o objetivo de sistematizar a integração de múltiplas fontes de dados de acidentes de trânsito para a construção de indicadores de segurança viária. Esta abordagem fornece dados confiáveis e abrangentes, permitindo melhores processos de planejamento e intervenção.12
O PID é um processo cíclico de melhoria contínua, no qual as principais etapas são: (i) Integração de Pessoas, (ii) Diagnóstico Situacional, (iii) Definição e Execução do Fluxo de Trabalho, (iv) Entrega de Resultados, e (v) Ajustes e Melhorias.
Etapa 1 - Integração de Pessoas
A etapa de integração de pessoas é a primeira, pois, em termos de segurança viária, espera-se que diferentes agências possuam dados de acidentes de trânsito.13,14,15 O primeiro passo é o estabelecimento da Equipe de Gestão de Dados (EGD), composta por profissionais que trabalham com dados de instituições que lidam com acidentes de trânsito ou suas vítimas. As EGDs são compostas basicamente por profissionais das áreas de trânsito/transportes e saúde.14,15
Esse formato de equipe também visa aumentar a confiança e a cooperação entre as instituições que possuem dados de acidentes de trânsito para subsidiar o planejamento de ações integradas de segurança viária.16,17 Na caracterização das EGD, foram utilizadas as seguintes variáveis: organização de vínculo do integrante; nome da instituição; cargo/função; formação; se já trabalha com algum sistema de informação; nome do município; e se possui experiência em algum sistema de informação.
Etapa 2 - Diagnóstico Situacional
Na Etapa 2, realiza-se o diagnóstico situacional para proporcionar melhor compreensão sobre os sistemas de informações de acidentes de trânsito em cada cidade, o que propicia uma visão clara das possibilidades, obstáculos e possíveis equívocos quanto aos sistemas de informações que serão utilizados pela EGD.11,18,19
A EGD identifica todas as instituições que possuem dados sobre acidentes de trânsito (Tabela 1). As informações observadas são: nome da organização; se atende à cena da ocorrência do acidente; se gera boletim físico ou eletrônico; se armazena dados em formato físico ou eletrônico; se ela fornece dados do banco de dados; se alguém da EGD tem acesso ao banco de dados; natureza dos dados (da cena do acidente ou hospitalares/mortalidade); se é considerada crítica para o monitoramento de acidentes (significando que a equipe não pode prosseguir sem acesso a tal banco de dados); e se já está em uso pela EGD.
Cidade/UF | Área da Saúde | Área de Trânsito/Transportes | Área da Segurança Pública |
---|---|---|---|
Belo Horizonte/MG |
SAMU Sistema de informações de Mortalidade (SIM)b Sistema de Informações Hospitalares (SIH)b Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) Hospital João XXIII Hospital Risoleta Tancredo Neves Hospital Odilon Behrens Mídia local |
Empresa de transporte e trânsito de Belo Horizontea BHTrans - Vistoria |
Polícia Militar Polícia Civil Corpo de Bombeiros Polícia Rodoviária Estadual Polícia Rodoviária Federal Instituto Médico Legal |
Campo Grande/MS |
SAMU SIMb SIHb Hospital Santa Casa Hospital Universitário Hospital Regional |
Detran-MS Agência Municipal de transporte e trânsitoa |
Polícia Militar - Ciptran Polícia Civil Corpo de Bombeiros Instituto de Criminalística Instituto de Medicina e Odontologia Legal |
Curitiba/PR |
SAMUa SIMb SIHb Sinan Hospital Cajuru Hospital Evangélico Hospital do Trabalhador |
Concessionárias de rodovias |
Batalhão de Trânsito da Polícia Militara Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergênciaa Polícia Rodoviária Federala Polícia Rodoviária do Paraná Delegacia de Trânsito Instituto Médico Legal Instituto de Criminalística |
Palmas/TO |
SAMUa SIMb SIHb |
Agência de Trânsito, Transporte e Mobilidadea |
Polícia Militara Polícia Civil Corpo de Bombeiros |
Teresina/PI |
SAMUa SIMb SIHb |
Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito |
Companhia Independente de Trânsito (Polícia Militar)a Corpo de Bombeiros Polícia Rodoviária Estadual Polícia Rodoviária Federala Delegacia de Acidentes Instituto de Criminalística Instituto Médico Legal |
aFonte em formato eletrônico utilizada para constituição da Lista Única de Vítimas.
bFonte em formato eletrônico para classificação das vítimas da LUV como graves ou fatais.
Obs.: Demais fontes de dados utilizadas como fontes complementares, no período da execução do processo metodológico.
Fonte: Elaboração do autor.
Foi realizado mapeamento de fluxo de trabalho para cada instituição, de modo a se identificarem os documentos físicos e eletrônicos criados (como boletins de ocorrência e extratos de testes de alcoolemia) e se caracterizar como e onde os documentos foram armazenados, assim como os bancos de dados utilizados para tal fim. Neste ponto, a EGD identificava onde e como os dados poderiam ser obtidos.
Etapa 3 - Definição e Execução do Fluxo de Trabalho
Nesta etapa, são definidas quais variáveis de cada banco de dados deverão ser compartilhadas, a fim de se construir um banco de dados integrado de vítimas de acidentes de trânsito. Foram utilizadas somente bases de dados eletrônicas as quais possuíam dados de identificação de vítimas e localização do acidente, como nome e idade/data de nascimento da vítima, endereço e data da ocorrência do acidente. Em seguida, iniciou-se uma fase de padronização na qual foram identificadas as variáveis comuns entre as bases de dados e procedeu-se à sua padronização para o mesmo tipo de dados, tamanho do campo, e códigos de formato e valores. As bases de dados foram unidas, originando-se um banco de dados integrado de vítimas de acidentes de trânsito a partir da utilização de registros que possuíam informações sobre o local do acidente (anotados como in loco). Tal procedimento era realizado em base trimestral. Cada base de dados teve suas chaves primárias preservadas. Quando vários registros (linhas) relacionados com a mesma vítima eram identificados, a linha com o nome mais completo da vítima era mantida e recebia valores da chave primária (referentes à base de dados à qual pertencia) das linhas que seriam removidas, e assim permanecia apenas um registro da vítima, agora contendo as chaves primárias de cada base de dados em que havia registro da vítima em questão (Tabela 2).
Id. LUVa | Id. fonte1b | Id. fonte2c | Data da ocorrência | Nome da vítima | Data de nascimento | Idade da vítima |
---|---|---|---|---|---|---|
S00001 | DS1S0001 | 02/02/2011 | Victim 1 | 01/01/1977 | 34 | |
S00002 | DS1S0002 | DS2S0001 | 02/02/2011 | Victim 2 | 28/01/1968 | 43 |
S00003 | DS2S0002 | 02/03/2011 | Victim 3 | 02/01/1935 | 76 | |
S00004 | DS1S0003 | DS2S0003 | 02/04/2011 | Victim 4 | 45 | |
S00005 | DS2S0004 | 02/05/2011 | Victim 5 | 04/01/1930 | 80 | |
S00006 | DS2S0005 | 02/06/2011 | Victim 6 | 30 |
a) Identificador numérico sequencial da LUV.
b) Campo referente ao código identificador da fonte de dados da cena do acidente (ex.: Polícia Militar).
c) Campo referente ao código identificador da segunda fonte de dados da cena do acidente (ex.: SAMU).
Esse procedimento viabilizou a remoção de registros duplicados relacionados à mesma vítima de uma determinada ocorrência de trânsito, ao mesmo tempo que todas as fontes de dados de identificação foram preservadas, criando-se a Lista Única de Vítimas (LUV). A estrutura LUV é mostrada na Tabela 2, na qual as variáveis apresentadas são as consideradas mínimas para sua elaboração. Cada EGD possuía autonomia para acrescentar outras variáveis que melhor atendessem a sua necessidade de trabalho.
Os registros das vítimas da LUV foram cruzados com o banco de dados de hospitalizações de cada município, com o intuito de se identificarem as vítimas que foram internadas por pelo menos 24 horas, para serem classificadas como "vítima grave". Para a classificação das “vítimas fatais”, os dados da LUV foram cruzados com a base de dados de declarações de óbito. Os dados de hospitalização foram obtidos a partir do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS). Os dados das declarações de óbito foram obtidos a partir do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM). Foram mapeadas as variáveis em comum entre o LUV, o SIH/SUS e o SIM, como nome, idade (eventualmente, data de nascimento), data de ocorrência e sexo. Entretanto, das variáveis em comum, nenhuma possuía características de “chave primária" (sozinha ou combinada), que permitisse o relacionamento determinístico (comparação entre duas ou mais tabelas de dados usando-se as variáveis com os mesmos valores em ambas as tabelas de dados). O relacionamento não determinístico (comparação de similaridade entre duas ou mais tabelas de dados usando variáveis que devem ter os mesmos valores em ambas as tabelas de dados) foi o método adotado pelo Ministério da Saúde do Brasil para cruzar as bases de dados.
Para as vítimas da LUV entre as quais foi encontrado tempo de internação maior que 24 horas, foi atribuído status de "vítima grave".11 Para as vítimas entre as quais foi identificado registro correspondente no banco de dados de mortalidade e a data da morte foi até 30 dias a partir da data do acidente, foi atribuído o status "vítima fatal";11 vítimas que morreram após 30 dias foram classificadas como "vítimas graves". As demais vítimas receberam o status de “vítima leve”.
As variáveis dos registros pareados (registros da LUV encontrados na base do SIH/SUS ou do SIM), considerados como “chave primária” no SIH/SUS (número do documento de autorização de internação hospitalar - AIH), e para o SIM (número da declaração de óbito), foram adicionadas às variáveis da LUV.
Neste ponto, a LUV foi atualizada com as novas variáveis obtidas das bases de dados do SIH/SUS e do SIM, permitindo identificar vítimas graves e fatais conforme padrão da OMS.
Etapa 4 - Entrega de Resultados
A entrega de resultados se dá por meio de duas maneiras principais. Primeiro, as variáveis são selecionadas e organizadas em uma ou mais tabelas para se viabilizar uma tabulação de dados dos acidentes de modo a atender variados propósitos, tais como identificação de local de ocorrência dos acidentes de trânsito, hora do dia, dias da semana etc.11,22 Segundo, os dados são entregues para serem utilizados pela equipe de análise de acidentes na identificação de fatores e condutas de risco, usuários que contribuíram para o ocorrência do acidente e grupos de vítimas.7
Os dados produzidos são disponibilizados no âmbito da EGD em base trimestral, e compartilhados com as instituições que forneceram dados para o estabelecimento do PID. Devido à existência de dados de identificação das vítimas, as informações produzidas passam a ser manipuladas pelos técnicos de cada EGD, e solicitações externas para acesso aos dados produzidos, quanto atendidas, não contêm os elementos de identificação de vítimas.
Etapa 5 - Ajustes e Melhorias
Os ajustes e melhorias são feitos quanto à estrutura e uso de dados, sempre que percebidas a necessidade ou oportunidade para tal. Este procedimento leva à primeira e segunda etapas do PID, reiniciando o processo como um ciclo de melhoria contínua sistemática, o qual conduz a uma revisão estratégica ativa da gestão das informações de acidentes de trânsito.23
Resultados
Na etapa Integração de Pessoas, equipes multissetoriais foram estabelecidas em cada capital, criando-se as EGDs municipais, conforme mostrado na Tabela 3. A quantidade de fontes de informação identificadas para as cidades é descrita como segue: Belo Horizonte/MG utilizou 16 fontes de dados distintas; Campo Grande/MS, 13; Curitiba/PR, 15; Palmas/TO, 7; e Teresina/PI, 11. Na Tabela 2, são detalhadas as fontes de informação de cada município, por área, e a forma como estas foram utilizadas.
Cidade/Unidade da Federação | Área da Saúde | Área de Trânsito/Transportes | Área da Segurança Pública |
---|---|---|---|
Belo Horizonte/MG | 3 | 3 | 1 |
Campo Grande/MS | 5 | 3 | - |
Curitiba/PR | 4 | 3 | 5 |
Palmas/TO | 3 | 4 | 3 |
Teresina/PI | 5 | - | - |
Das fontes de dados identificadas, 53,2% são de instituições que atendem à cena do acidente. A média para o número de fontes de dados para cada cidade foi de 12. Das fontes consideradas críticas para monitoramento de acidentes, 94,4% foram efetivamente utilizadas (total de fontes em uso dividido pelo total de fontes consideradas críticas).
Os dados de 90,0% das fontes de informações são armazenados em formato eletrônico. Nas cidades de Campo Grande/MS e Palmas/TO, todas as fontes de informação de acidentes armazenavam seus registros em formato eletrônico. Curitiba/PR possuía 12 de suas bases em formato eletrônico, Teresina/PI possuía 4 e Belo Horizonte/MG contava com 10.
Curitiba/PR, Palmas/TO e Teresina/PI, em toda a etapa de Definição e Execução do Fluxo de Trabalho, combinando múltiplas fontes de dados in loco e a metodologia de elaboração da LUV, alcançaram incrementos de 3.054, 756 e 5.054 registros, respectivamente, no total de vítimas identificadas em vias locais. As cidades de Campo Grande/MS e BeloHorizonte/MG decidiram trabalhar apenas com dados da área de trânsito/transportes.
Utilizando a metodologia de relacionamento não determinístico, as cidades foram capazes de classificar suas vítimas de acidentes de trânsito como “fatal”, “grave” ou “leve”, de acordo com os padrões da OMS.11 Na Tabela 4, é descrito o aumento do número de vítimas fatais identificadas por meio do PID.
Cidades/ Unidade da Federação | Antes do PID | Após o PID | |||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Total de vítimas | Vítimas fatais | Total de vítimas | Vítimas fatais (30 dias) | Vítimas graves (24 horas) | Vítimas leves | Incremento no total de vítimasb | Incremento no total de vítimas fatais | ||
Curitiba/PRa | 3.767 | 66 | 6.821 | 163 | 749 | 5.909 | 81,1% | 147,0% | |
Belo Horizonte/MG | 17.689 | 170 | 17.689 | 231 | 1.729 | 15.389 | - | 35,9% | |
Palmas/TO | 1.817 | 29 | 2.573 | 42 | 329 | 2.022 | 41,6% | 44,8% | |
Campo Grande/MS | 8.284 | 56 | 8.284 | 116 | 1.065 | 7.103 | - | 107,1% | |
Teresina/PI | 1.617 | 38 | 6.671 | 147 | 7.634 | 816 | 312,5% | 286,8% |
Fonte: Equipes de Gestão de Dados de Belo Horizonte/MG, Campo Grande/MS, Curitiba/PR, Palmas/TO e Teresina/PI.
aDados relacionados ao 1º semestre de 2011.
bAs cidades de Belo Horizonte/MG e Campo Grande/MS não adicionaram dados do SAMU.
Utilizando a etapa Ajustes e Melhorias, a EGD de Teresina/PI criou um banco de dados eletrônico para registrar informações de atendimentos do Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), que passou a ser utilizado para registro de atendimentos às vítimas de trânsito. Essa base de dados vem sendo mantida desde 2011.
Discussão
O PID apresentou resultados relevantes na sua implementação: potencial para alinhamento de equipes multissetoriais de gestão de dados; integração de bancos de dados de acidentes de trânsito obtidos de múltiplas instituições; criação e desenvolvimento da LUV, com incremento médio de 87,5% nos totais de registros de acidentes de trânsito das capitais que utilizaram o processo e que, sem ele, não seriam identificados; reclassificação de acidentes graves e fatais de acordo com os padrões da OMS,4 com um aumento médio de 124,3% no total de vítimas fatais identificadas em relação aos dados de mortos no local; e melhoria contínua na integração e gestão de dados de acidentes de trânsito. Tais benefícios vão de encontro à recomendação da OMS para dados confiáveis de acidentes trânsito, sendo uma base sólida para subsidiar o planejamento e a tomada de decisões em ações de segurança viária.24
Cabe destacar que foi percebido ao longo do processo de implementação do PID, embora não seja explícito nos resultados, que um dos grandes desafios para a sustentabilidade da produção dos dados qualificados da LUV com sua classificação de graves e fatais é o apoio político por parte dos gestores locais. Isto é um elemento chave, pois a rotatividade de integrantes das EGDs e a dificuldade de acesso à bases de dados são situações nas quais os gestores desempenham papel crítico para a solução de eventuais entraves. Isto se aplica ainda às interlocuções entre os níveis municipal, estadual e federal, para a disponibilização de acesso a bases de dados, como no caso de dados de bancos de dados das polícias militares. Estes são gerenciados no nível estadual, e seu acesso depende de articulação entre município e estado para que seja mantido de forma contínua.
Os resultados apresentados sugerem que o PID pode ser expandido e implementado no Brasil e internacionalmente como modelo confiável de gestão de dados de segurança viária, contribuindo para políticas públicas que permitam a redução da morbimortalidade por acidentes de trânsito e para a definição de novas práticas de registro e compartilhamento de informações nas áreas de saúde, trânsito/transportes e segurança pública. Sua flexibilidade está atualmente sendo testada em outras cidades brasileiras, e seus resultados serão apresentados em artigo futuro.