Em 2017, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou, por unanimidade, a resolução que declarou 2021 como o “Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil”.1 Tal resolução se alinha com a Agenda para o Desenvolvimento Sustentável (2015-2030), que reconhece a pobreza extrema como o maior desafio global e sua erradicação como requisito indispensável para o alcance do desenvolvimento sustentável, em suas três dimensões – econômica, social e ambiental –, e compreende um conjunto de objetivos e metas abrangentes e transformadoras. A meta 8.7 estabelece o compromisso de erradicar todas as formas de trabalho infantil até 2025.2
O trabalho infantil é qualquer forma de trabalho que priva as crianças de sua infância, de seus potenciais e dignidade, e prejudica seu desenvolvimento físico e mental. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) considera crianças os menores de 18 anos de idade, e elenca quatro categorias de piores formas de trabalho infantil (Figura 1).3
Fontes:
https://www.un.org/en/development/desa/population/migration/generalassembly/docs/globalcompact/ILO_C_182.pdf2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D10088.htm#art53
A definição de trabalho infantil varia conforme os marcos legais de cada país. No Brasil, as atividades laborais são proibidas até os 13 anos de idade. A partir dos 14, até os 24 anos de idade, é permitida a contratação como aprendiz.4 Adolescentes de 16 e 17 anos de idade têm permissão para trabalhar, desde que não realizem atividades noturnas, insalubres, perigosas, ou penosas, constantes na lista nacional das piores formas de trabalho infantil.6
No mundo, segundo a OIT, havia 152 milhões de crianças trabalhando, em 2016, com maior prevalência na África (19,6%), seguida pelas Américas (5,3%).7 No Brasil, de acordo com resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua – Trabalho das Crianças e Adolescentes, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, havia 1,8 milhão de crianças e adolescentes com idade entre 5 e 17 anos em situação de trabalho infantil, dos quais 706 mil estavam ocupados nas piores formas de trabalho infantil. Do total da população em trabalho infantil, 53,7% tinham de 16 a 17 anos, 25,0% tinham de 14 a 15 anos e 21,3% tinham de 5 a 13 anos de idade. A maior parte era do sexo masculino (66,4%) e de cor preta ou parda (66,1%).8
De 2016 a 2019, a prevalência do trabalho infantil declinou de 5,3% para 4,6% no país.8 Contudo, o trabalho infantil permanece como um dos mais graves problemas do Brasil, e a tendência de declínio pode ser interrompida a partir da emergência da COVID-19. A interrupção das atividades escolares, em decorrência das medidas de distanciamento necessárias ao enfrentamento da pandemia, e o aumento da pobreza, são fatores que contribuem para o crescimento do trabalho infantil. Organismos internacionais, como a OIT e o Fundo das Nações unidas para a Infância (Unicef) têm alertado para esta situação.9
A vigilância em saúde tem um papel importante no enfrentamento do trabalho infantil. Sistemas de vigilância que fornecem informações sobre o perfil das crianças e adolescentes em situação de trabalho, onde se encontram, assim como os tipos de lesões e doenças que ocorrem nessa população, são essenciais para direcionar e avaliar os esforços de prevenção.10 Para tanto, é necessário aprimorar os sistemas de informação em saúde nacionais, a fim de que tenham cobertura, qualidade e oportunidade adequadas para notificação dos agravos relacionados ao trabalho infantil, incluindo acidentes, violências e óbitos.
Com o intuito de chamar a atenção para o problema e destacar o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil, a Epidemiologia e Serviços de Saúde: revista do Sistema Único de Saúde do Brasil exibe, em sua capa do volume 30 (2021), as cores de uma das pás do cata-vento, símbolo da luta pela erradicação do trabalho infantil no mundo.