Introdução
O espaço social constitui categoria de síntese e convergência de diversos processos envolvidos na condição de vida, ambiente e saúde das populações,1-2 e muitos estudos confirmam a relevância dos processos sociais na conformação dos diferenciais intraurbanos e na distribuição dos agravos à saúde.3-6 No Brasil, as distintas estruturas sociais são reflexos da diversidade dos condicionantes históricos, culturais e ambientais, conferindo diferentes estágios de desenvolvimento regional que tornam a organização dos municípios em grupos relativamente homogêneos um grande desafio.7
A construção de tipologias dos municípios brasileiros tem adotado uma grande diversidade de variáveis, organizadas em blocos ou dimensões, e as técnicas estatísticas para análise e seleção das variáveis consideram a pertinência, a plausibilidade e seu poder discriminante.6-10 Variáveis, dimensões e técnicas assumidas para identificação das semelhanças e diferenças entre municípios são dependentes do objeto de análise, resultando em tipologias diversas.
Investigações que buscam a conformação de grupos homogêneos, para planejamento e organização de serviços ou para a construção de indicadores compostos,11-13 têm utilizado variáveis como: renda e escolaridade do chefe da família; características do ambiente e localização dos domicílios; acesso a serviços públicos, com destaque para saneamento básico; propriedade e número de pessoas por domicílio.3-6,13-15
A recente propagação de estudos avaliativos envolvendo a gestão em saúde no Brasil estabelece a necessidade de reflexão sobre os procedimentos metodológicos utilizados, e por conseguinte, o subsídio ao desenvolvimento de propostas de estratificação de municípios para análises futuras.
O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ)14 afere o desempenho dos municípios agrupados em estratos, definidos por aspectos sociais, econômicos e demográficos, a saber: porte populacional; produto interno bruto (PIB) per capita; percentual da população com plano de saúde; percentual da população inscrita no programa Bolsa Família; percentual da população em extrema pobreza; densidade demográfica. Para análise, os valores são convertidos em escala de zero a dez, e a média é combinada com estratos de porte populacional.
O índice de desempenho do Sistema Único de Saúde (IDSUS) utiliza três índices na identificação de grupos homogêneos de municípios:15 (i) índice de desenvolvimento socioeconômico (IDSE), que agrega o PIB per capita e o percentual de famílias com Bolsa Família; (ii) índice de condições de saúde (ICS), representado pela taxa de mortalidade infantil; e (iii) índice de estrutura do sistema de saúde do município (IESSM), que agrega as proporções de médicos da atenção básica e profissionais da vigilância em saúde, procedimentos ambulatoriais e internações de média e alta complexidade. A ponderação dos indicadores que compõem os índices é feita por análise de componentes principais.
No Projeto de Avaliação do Desempenho do Sistema de Saúde (Pro-Adess), não há proposta de agregação de indicadores-síntese, nem definição de grupos homogêneos para comparação; porém, a construção conceitual e a seleção dos indicadores oferecem uma grande contribuição para novas propostas de avaliação.16 Sua matriz conceitual é composta por quatro dimensões: (i) determinantes da saúde; (ii) condições de saúde da população; (iii) estrutura do sistema de saúde; e (iv) desempenho dos serviços de saúde.
Considerando-se os modelos já propostos e a ausência de tipologias dedicadas à agregação segundo aspectos que influenciam a gestão em saúde, o presente trabalho propõe e apresenta a aplicação de uma estratificação dos municípios brasileiros em grupos homogêneos para estudos de avaliação de desempenho da gestão em saúde.
Métodos
Estudo de natureza metodológica para o qual foram analisadas diferentes propostas de classificação de municípios.7,11-16 Foram definidas categorias básicas de identificação de indicadores: demográficos; socioeconômicos; de condições de saúde; e de estrutura de serviços. Tais propostas foram selecionadas a partir de levantamento nas bases científicas e em documentos oficiais do Ministério da Saúde. Foram excluídos os indicadores que não tivessem informação para o agregado municipal.
Os indicadores foram pré-selecionados considerando-se a análise dos dados de pelo menos três anos seguidos, para verificar sua consistência ao longo do tempo, análise da estabilidade dos valores segundo o porte populacional, validade conceitual na literatura, disponibilidade em base de dados para o ano de 2010 e desagregação para o nível municipal. Como resultado dessa pré-seleção, identificaram-se 28 indicadores: (a) demográficos (porte populacional; densidade demográfica; percentual de indivíduos que vivem em domicílios urbanos); (b) socioeconômicos (PIB per capita; percentual com Bolsa Família; percentual da população em extrema pobreza; índice de Gini; razão de dependência; razão de renda; renda média per capita; analfabetismo; média de anos de estudo; formalidade do emprego; taxa de desemprego; percentual da população com plano de saúde); (c) de condições de vida e saúde (esperança de vida ao nascer; índice de envelhecimento; abastecimento de água; coleta de lixo; esgotamento sanitário; mortalidade de crianças menores que cinco anos; proporção de óbitos por causas mal definidas); (d) de estrutura de serviços (cobertura da Estratégia Saúde da Família; percentual de médicos da atenção básica; razão de procedimentos ambulatoriais de média complexidade por residente; razão de procedimentos ambulatoriais de alta complexidade por residente; razão de internações clinico-cirúrgicas de média complexidade por residente; razão de internações clinico-cirúrgicas de alta complexidade por residente).
Os dados foram compilados das bases da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério da Saúde, estas últimas disponíveis no sítio eletrônico do Departamento de Informática do SUS (Datasus) (www.datasus.gov.br). Todos os indicadores foram convertidos em base logarítmica (log10) para teste de correlação. Em cada categoria, foi selecionado o indicador com correlações mais fortes com os demais, justamente aquele com maior poder de síntese. Logo, foram selecionados aqueles indicadores cuja correlação fosse fraca ou moderada (r<0,7) com o referido indicador-síntese, por considerar que teriam informação adicional ao primeiro.
A análise de correlação resultou na permanência de 14 indicadores:
a) Demográficos
b) Socioeconômicos
- PIB per capita
- índice de Gini
- cobertura de plano de saúde
- percentual de extrema pobreza
- taxa de desemprego da população com 18 anos ou mais de idade
c) Condições de saúde
- esperança de vida ao nascer
- taxa de mortalidade de menores de 5 anos de idade
- taxa de envelhecimento
d) Estrutura de serviços
- cobertura da Saúde da Família
- taxa de procedimentos de média complexidade
- razão de internações clínico-cirúrgicas de média complexidade
Em seguida, utilizou-se a análise fatorial de todas as variáveis pelo Iterated Principal Factors Method, sem rotação. Foram identificados os dois fatores com maior eigenvalue (fator 1 - 10,12 e 52,13% -; fator 2 - 2,93 e 15,06%). Logo, foi realizada análise com rotação orthogonal varimax, sendo mantidos os mesmos fatores. Os indicadores com maior peso para a composição dos dois fatores principais foram: densidade demográfica; taxa de urbanização; PIB per capita; percentual de extrema pobreza; e cobertura de plano de saúde. Em seguida, esses cinco indicadores foram organizados segundo seus significados, em três eixos: (a) características demográficas; (b) capacidade de financiamento; (c) poder aquisitivo da população.
Os indicadores nos eixos definidos foram convertidos em escala monotônica (0;1), que definiu as condições que influenciam a gestão em saúde (influentes) em três classes: favorável, regular ou desfavorável
O 'porte populacional' foi considerado como fator específico na identificação dos grupos homogêneos para gestão em saúde, sendo agregado apenas ao final do procedimento. O fator foi estratificado em 3 grupos: municípios com menos que 25 mil habitantes (pequeno porte), municípios com 25 a 100 mil habitantes (médio porte) e municípios com mais de 100 mil habitantes (grande porte).
A Figura 1 ilustra as etapas para a definição dos influentes (favorável, regular, desfavorável) que, juntamente com o porte populacional, definiram os estratos de municípios propostos. Na primeira etapa, todos os valores dos indicadores foram convertidos em escala (0;1), após identificação dos valores extremos. Na segunda etapa, a partir da soma dos indicadores convertidos, obtiveram-se os valores para 'características demográficas' e 'poder aquisitivo da população'. A 'capacidade de financiamento', representada apenas pelo indicador PIB per capita, assumiu o valor desse indicador. Na terceira etapa, a partir da distribuição quartílica, os valores dos eixos 'características demográficas', 'capacidade de financiamento' e 'poder aquisitivo da população' foram reduzidos a escores [0,1,2], sendo: 0 para os 25% com piores valores; 1 para valores interquartílicos; e 2 para os 25% com melhores valores. Na etapa final, a soma dos escores nos três eixos definiu a condição que influencia a gestão do sistema de saúde local em três categorias: influente desfavorável, até 2 pontos; influente regular, 3 a 4 pontos; ou influente favorável, 5 a 6 pontos.
Resultados
A partir da definição da condição que influencia a gestão do sistema de saúde nos municípios, a agregação final com o porte populacional municipal identificou os sete estratos propostos:
Pequeno desfavorável: municípios com até 25 mil habitantes e influentes desfavoráveis para gestão
Pequeno regular: municípios com até 25 mil habitantes e influentes regulares para gestão
Pequeno favorável: municípios com até 25 mil habitantes e influentes favoráveis para gestão
Médio desfavorável: municípios com 25 a 100 mil habitantes e influentes desfavoráveis para gestão
Médio regular: municípios com 25 a 100 mil habitantes e influentes regulares para gestão
Médio favorável: municípios com 25 a 100 mil habitantes e influentes favoráveis para gestão
Grande: municípios com mais de 100 mil habitantes, independentemente dos influentes.
Os municípios de grande porte não foram diferenciados por influentes da gestão (favorável, regular, desfavorável) devido ao pequeno número de municípios em condição desfavorável (n=9) e regular (n=47), não justificando tal distinção.
A maioria (76,9%) dos municípios brasileiros é de pequeno porte e a análise de agregação segundo as condições que influenciam a gestão em saúde identificou a concentração dos municípios na situação regular (40,5%) ou desfavorável (36,8%) (Tabela 1).
A variabilidade de população e densidade demográfica é grande em todos os estratos, sendo menor no percentual de domicílios urbanos e de população sem plano de saúde. A densidade demográfica nos municípios de porte médio e influente favorável é 4,2 vezes maior quando comparada à do grupo de porte médio e influente desfavorável; e quase o dobro em municípios de pequeno porte e influente favorável, comparada à densidade demográfica do grupo de pequeno porte e influente desfavorável. O estrato de porte médio com influente favorável apresenta 91,2% de seus domicílios em área urbana, enquanto entre os de porte médio e influente desfavorável, pouco mais da metade encontra-se em área rural. Comportamento similar é observado nos estratos de pequeno porte. O PIB per capita dos municípios com influente favorável é superior àqueles com influente desfavorável à gestão em saúde, às razões de 5,0 e 3,9 nos grupos de médio e pequeno porte respectivamente. Os municípios do estrato denominado de grande porte apresentam indicadores similares aos de médio porte com influentes favoráveis (Tabela 1).
Os indicadores que caracterizam o poder aquisitivo da população também apresentam características similares para influentes da gestão no interior dos grupos de médio e pequeno porte, no sentido inverso aos indicadores apresentados anteriormente. O percentual de pobreza é superior nos grupos classificados como influentes desfavoráveis à gestão, atingindo valores próximos a 12 vezes os dos municípios de influentes favoráveis em ambos os portes populacionais. Pouco mais de 98% da população dos municípios com influentes desfavoráveis dependem exclusivamente do SUS, uma vez que não possuem planos de saúde. Esses valores são menores nos municípios com influentes favoráveis, e variam entre 77,0% nos de porte médio e 82,1% nos pequenos (Tabela 1).
Os três eixos (características demográficas, capacidade de financiamento e poder aquisitivo da população) compostos a partir da agregação das variáveis foram analisados em distribuição quartílica (Tabela 2). Os municípios de grande porte estão concentrados nos melhores valores para características demográficas e poder aquisitivo da população, embora essa característica seja ainda mais evidente nos municípios do estrato médio e influentes favoráveis. Nos municípios de pequeno porte com influentes favoráveis, o destaque é para a ausência de municípios abaixo do primeiro quartil para os três eixos, resultado semelhante ao encontrado para os municípios de porte médio e influentes favoráveis. As influências desfavoráveis à gestão são fundamentalmente definidas por concentração de municípios abaixo do primeiro quartil para capacidade de financiamento e poder aquisitivo da população.
a) 0 para os 25% piores valores; 1 para os 50% de valores interquartílicos; 2 para os 25% melhores valores.
A Tabela 3 apresenta a distribuição dos municípios por porte populacional nas categorias dos influentes da gestão em saúde. Essa distribuição revela um importante contraste entre os municípios: 77 a 100% dos municípios de grande porte estão na categoria favorável, enquanto 10 a 17% dos municípios de pequeno porte apresentam a mesma condição. Nos municípios de médio porte, destaca-se a diferença no percentual de municípios desfavoráveis entre as faixas de 25-50 mil habitantes (35,4%) e 50-100 mil habitantes (17,8%). Os municípios com 25-50 mil habitantes ficaram com distribuição relativamente homogênea entre as categorias desfavorável, regular e favorável.
A Tabela 4 apresenta a distribuição regional dos municípios segundo grupo homogêneo. Aproximadamente dois terços dos municípios brasileiros foram caracterizados como de pequeno porte populacional com influente regular (34,3%) e desfavorável (31,4%) à gestão em saúde. A região Nordeste concentra 63,4% de municípios do grupo de pequeno porte e influente desfavorável do país, que, somados aos classificados como de pequeno porte e influente regular, representam 75,6% dos municípios nordestinos. A região Norte apresenta comportamento similar ao da região Nordeste, com 67,3% de seus municípios agrupados nas categorias de pequeno porte desfavorável e regular, com predomínio para o primeiro grupo (39,2%). O Centro-Oeste também concentra 72,9% de seus municípios nessas categorias, com predomínio da condição regular (63,5%). As regiões Sul e Sudeste apresentam mais de 62,0% de seus municípios nas categorias de pequeno porte e influente regular e favorável: concentram 91,1% dos municípios brasileiros no grupo de pequeno porte de influente favorável, 87,4% dos agrupados no grupo de médio porte favorável e 66,1% dos grandes municípios.
Discussão
A revisão das propostas de estratificação e agrupamento em grupos homogêneos identificou muitas técnicas possíveis para essa finalidade, tais como: conversão dos valores em escores, com ou sem ponderação;14 distribuição em grupos, por meio de amplitude quartil; análise de componentes principais; agrupamento por Cluster;15 análises fatoriais, seguidas de classificação hierárquica;11 e programação linear.17
A agregação dos municípios por porte populacional é frequente. Ao utilizar o porte populacional como variável determinante na distribuição dos municípios em grupos homogêneos, não se pode considerar apenas o estabelecimento de faixas populacionais, uma vez que municípios com a mesma população apresentam características territoriais, culturais e níveis de desenvolvimento econômico diversos; e, a depender da macrorregião ou estado onde se localizam, diferentes papéis no desenvolvimento econômico local. Municípios de pequeno porte, em geral, exercem um papel de caráter local, de atendimento às necessidades básicas da população, e dependem de municípios de médio ou grande porte para diversos serviços, destacando-se aqui os do setor Saúde.18 Por esse motivo, a classificação proposta neste trabalho, além de considerar o porte dos municípios, inclui indicadores que buscam agrupar municípios semelhantes quanto aos influentes da gestão em saúde. Essa composição favorece a identificação de grupos comparáveis de municípios em estudos de avaliação de desempenho e outros estudos que busquem comparação entre semelhantes.
A classificação dos municípios de acordo com os influentes da gestão em saúde - favorável, regular, desfavorável - considerou características demográficas, capacidade de financiamento e poder aquisitivo da população. A taxa de urbanização e a densidade demográfica foram utilizadas para diferenciar municípios com características rurais e população dispersa daqueles com características mais urbanizadas e maior concentração populacional, uma vez que as ações de gestão em saúde são dificultadas nos municípios rurais ou com baixa densidade demográfica, devido a fatores como acesso geográfico aos serviços, precariedade das condições de vida, ausência de participação popular e dificuldade de alocação e contratação de recursos humanos. O produto interno bruto - PIB - per capita reflete a capacidade de financiamento municipal para o provimento das ações e serviços em saúde, uma vez que boa parte do orçamento da Saúde provém de recursos próprios municipais. Municípios mais desenvolvidos economicamente possuem diferentes demandas em relação aos municípios com pouca atividade econômica, além de terem maior capacidade de atender a essas demandas por conta da maior arrecadação de impostos, que implica maior disponibilidade de recursos.19
O percentual da população sem cobertura de plano privado de saúde foi utilizado para diferenciar municípios conforme a dependência dos serviços públicos de saúde, que, por sua vez, implica diferentes ações da gestão em saúde. Segundo Costa e colaboradores,19 a proporção da população com cobertura privada de saúde está relacionada, ainda, a uma maior ou menor necessidade de intervenção estatal no sentido de corrigir as falhas de mercado desse setor. O percentual da população em extrema pobreza foi utilizado juntamente com o percentual da população sem cobertura de plano privado de saúde para diferenciar os municípios cuja população possui muito baixo poder aquisitivo, demandando políticas e ações da gestão em saúde que minimizem sua situação de carência e vulnerabilidade.
As variáveis utilizadas neste estudo para definição dos estratos foram também utilizadas em diversas outras metodologias, com o objetivo de estabelecer tipologias ou grupos homogêneos dos municípios brasileiros. A densidade demográfica foi utilizada em quatro estudos identificados na literatura;8,10,20,21 a taxa de urbanização, em cinco estudos;8,9,12,13,20 PIB per capita, em três estudos;13,19,20 e percentual de extrema pobreza, em dois estudos,9,12 assim como a cobertura de plano de saúde.10,19 Avaliações institucionais realizadas pelo Ministério da Saúde14,15 também incluíram as variáveis densidade demográfica, PIB per capita, percentual de extrema pobreza e cobertura de plano de saúde, em suas análises de agregação.
Na estratificação proposta, observa-se que 75% do total de municípios classificados como pequenos com influentes desfavoráveis localizam-se nas regiões Norte e Nordeste, enquanto 11% pertencem à região Sudeste. Maia e Quadros7 destacam que na região Norte está a segunda maior concentração de municípios agrícolas de autoconsumo do país, constituídos por comunidades ribeirinhas com precárias condições de desenvolvimento socioeconômico e contando com o extrativismo como principal fonte de subsistência. Os mesmos autores caracterizam a região do Sertão nordestino como a mais isolada geográfica, econômica e culturalmente, onde os condicionantes climáticos dificultam e castigam uma população cuja sobrevivência depende da pecuária extensiva, da agricultura de subsistência e de baixa produtividade. Por sua vez, mais da metade da riqueza do país continua a ser produzida na região Sudeste, onde o estado de São Paulo é responsável por 32% de todo o PIB nacional.
Embora as características demográficas, capacidade de financiamento e poder aquisitivo da população tenham colocado os municípios com mais de 100 mil habitantes predominantemente no grupo de influentes favoráveis da gestão em saúde, ressalta-se o fato de que esses grandes municípios apresentam significativos bolsões de miséria em suas áreas urbanas, as quais possuem dinâmicas sociais próprias que, por vezes, dificultam o equacionamento das ações para o adequado acesso às políticas públicas.7- A identificação de municípios em grupos homogêneos a partir de análise estatística conta com limites inerentes a características não mensuráveis, que interferem na gestão de serviços.
A proposta metodológica adotada demonstra validade interna e coerência com o referencial teórico, na medida em que os municípios classificados no grupo influente desfavorável à gestão concentram a maioria das características que prejudicam ou dificultam as ações de gestão em saúde. Destaca-se a concentração desses municípios em área rural, com baixa densidade demográfica, baixo PIB per capita, alto percentual de pobreza e baixa cobertura de planos de saúde, validando as variáveis eleitas para conformação dos estratos. A concentração de municípios de influente favorável nas melhores condições de poder aquisitivo e de capacidade de financiamento, bem como os de influente desfavorável nas regiões Norte e Nordeste, indicam a validação dos estratos alcançados segundo a proposta metodológica adotada.
A classificação por influentes da gestão auxilia a composição de grupos homogêneos, assumindo uma coerência dentro dos diferentes portes populacionais, os quais foram mantidos por se entender que agregam valor a essa proposta de estratificação. A manutenção dos portes populacionais na composição dos estratos tanto respeita as disparidades internas como permite identificar semelhanças e desafios da gestão, segundo sua classificação. Essa análise auxilia nos estudos avaliativos com enfoque na gestão, permitindo a comparação entre municípios semelhantes.
Evidencia-se o caráter de proposta metodológica, que implica novas construções em diferentes momentos históricos uma vez que o grupo de indicadores selecionados pode ser alterado segundo o contexto e disponibilidade. Todavia, a exemplo das informações censitárias, as alterações de valores e de robustez nos indicadores não devem ocorrer em curtos períodos de tempo, assegurando sua utilidade para estudos comparativos sempre que se considere a distância temporal das bases de dados.