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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.14 n.4 Brasília dez. 2005

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742005000400001 

EDITORIAL

 

Avaliação das ações descentralizadas em saúde

 

Maria Fernanda Lima-Costa

Membro do Comitê Editorial

 

A avaliação das ações decorrentes das políticas de saúde deve ser encarada como um dos seus componentes. Sem essa avaliação, não é possível saber se o esforço empreendido resultou no seu objetivo principal, a melhoria das condições de saúde da população.

A avaliação das ações em saúde não é uma tarefa simples. À medida que elas se tornam mais complexas e contam com mais atores envolvidos, surgem novos desafios para uma adequada conclusão sobre os seus efeitos. É o caso do Brasil, onde se observa uma progressiva descentralização das ações em saúde, iniciada com a promulgação da Constituição de 1998.

A Epidemiologia e Serviços de Saúde traz, nesta edição, dois artigos que utilizaram abordagens criativas para avaliar ações descentralizadas em saúde. O primeiro artigo refere-se a uma avaliação de impacto; e o segundo, a uma avaliação de processo. A título de recordação, as avaliações de impacto investigam mudanças na morbimortalidade – e/ou aspectos relacionados –, decorrentes das ações, e as avaliações de processo investigam oferta, qualidade, uso e cobertura;1 avaliações de impacto são menos comuns no Brasil.2

O trabalho intitulado "Brechas redutíveis de mortalidade em capitais brasileiras (1980-1998)" utiliza a mortalidade por algumas causas evitáveis, como eventos sentinela, para avaliar efeitos de ações em saúde nas capitais do País. Como indicadoras dessa efetividade, foram utilizadas as brechas redutíveis de mortalidade (BRM), que constituem uma medida de risco atribuível entre expostos.3 Os resultados mostraram declínios consistentes das BRM da mortalidade infantil por diarréia e das infecções respiratórias agudas, que refletem, possivelmente, o efeito das ações para o controle desses agravos, uma vez que as condições de vida foram consideradas na análise. Por outro lado, as BRM da mortalidade por tuberculose e por doença cerebrovascular aumentaram em algumas capitais, indicando problemas nas estratégias de controle.4

O segundo artigo intitula-se "Programa Saúde da Família: a experiência de implantação em dois Municípios da Bahia". O trabalho foi desenvolvido em um Município que possuía o sistema municipal de saúde mais estruturado; e em outro, que apresentava um sistema local de saúde incipiente. Por meio de grupos focais, foram investigados aspectos relacionados à gestão/organização, perfil das práticas e cobertura do Programa Saúde da Família (PSF). De maneira geral, o Município com melhores indicadores epidemiológicos e assistenciais apresentou melhor performance; em ambos os Municípios, entretanto, dificuldades de articulação entre os diversos níveis do sistema, de financiamento e a precariedade das condições de vida foram identificadas como obstáculos ao desenvolvimento do PSF.5

Esta edição também apresenta uma nota prévia, intitulada "Primeira injeção de drogas e hepatite C: achados preliminares", com resultados importantes para a orientação de ações preventivas. O estudo, desenvolvido junto a usuários de drogas injetáveis (UDI) da cidade do Rio de Janeiro, identifica uma redução na prevalência da infecção pelo vírus da hepatite C – provavelmente decorrente de redução da freqüência de injeções – e a importância das redes sociais de UDI para a iniciação do uso.6

As evidências produzidas pelos estudos avaliativos aqui publicados são preocupantes. Embora elas demonstrem que ações voltadas para a redução da mortalidade por diarréia e por infecções respiratórias agudas apresentam indícios de efetividade, para situações que representam desafios mais recentes – caso da re-emergência da tuberculose; e da doença cerebrovascular, que persiste como primeira causa de mortalidade entre adultos mais velhos 7 – e para o próprio Programa Saúde da Família, existem indícios de problemas nas estratégias adotadas. São evidências que reforçam a importância da avaliação das ações resultantes de políticas para o controle de problemas de saúde, e da necessidade da sua incorporação como atividade permanente do Sistema Único de Saúde, SUS.

 

Referências bibliográficas

1. Habicht JP, Victora CG, Vaughan JP. Evaluation designs for adequacy, plausibility and probability of Public Health programme performance and impact. International Journal of Epidemiology 1999; 28:10-18.

2. Victora C. Avaliando o impacto de intervenções em saúde [Editorial]. Revista Brasileira de Epidemiologia 2002; 5:2-4.

3. Miettinen OS. Proportion of disease caused or prevented by a given exposure, trait or intervention. Annals of Epidemiology 1974; 99:325-332.

4. Silva LMV, Costa MCN, Paim JS, Dias IB, Cunha ABO, Guimarães ZA, Sousa LF, Pimentel VN, Bispo RD. Brechas redutíveis de mortalidade em capitais brasileiras (1980-1998). Epidemiologia e Serviços de Saúde 2005; 14(4):203- 222.

5. Copque HLF, Trad LAB. Programa Saúde da Família: a experiência de implantação em dois Municípios da Bahia. Epidemiologia e Serviços de Saúde 2005; 14(4):223-233.

6. Oliveira MLA, Bastos FI, Telles PR, Oliveira SAN, Miguel JC, Hacker M, Yoshida CFT. Primeira injeção de drogas e hepatite C: achados preliminares. Epidemiologia e Serviços de Saúde 2005; 14(4):235-237.

7. Lima-Costa MF, Peixoto SV, Giatti L. Tendências da mortalidade entre idosos brasileiros (1980-200). Epidemiologia e Serviços de Saúde 2004; 13(4):217-228.