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Epidemiologia e Serviços de Saúde
versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622
Epidemiol. Serv. Saúde v.18 n.3 Brasília set. 2009
http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742009000300001
Carta aberta do Ministro da Saúde
O enfrentamento do Brasil diante do risco de uma pandemia de influenza pelo vírus A (H1N1)
José Gomes Temporão
Ministro da Saúde
Prezados profissionais de saúde de nosso País,
Venho até vocês para informar quais ações e medidas de controle o Governo Brasileiro vem tomando frente à possibilidade de uma pandemia de influenza pelo vírus A (H1N1). Em 24 de abril de 2009, a Organização Mundial da Saúde (OMS) comunicou a todos os países a ocorrência de uma emergência em saúde pública de importância internacional, de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional, causada pela infecção por um novo vírus influenza A (H1N1), que tem em sua composição genes humanos, suínos e aviários. A transmissão ocorre de pessoa a pessoa, por meio de contato direto ou com secreções respiratórias de pessoas infectadas O seu início possivelmente está associado a uma epidemia de doença respiratória febril, que a princípio acometeu o México, a partir do mês de março do corrente ano, e que apresentava um comportamento distinto da influenza sazonal: ocorrência fora do inverno, predominância entre adultos jovens e um maior número de casos graves, fato este que posteriormente não se comprovou associado à epidemia.
Imediatamente após o comunicado da OMS, instituímos o Gabinete Permanente de Emergência em Saúde Pública (GPESP), no Centro de Informações Estratégicas e Respostas em Vigilância em Saúde (CIEVS) da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS). O Gabinete vem realizando reuniões diárias para monitorar a situação mundial e nacional, com o objetivo de adotar as medidas de prevenção e controle mais indicadas ao País.
A detecção do vírus se deu a partir de exames realizados em duas crianças no estado da Califórnia, nos Estados Unidos (EUA), pelos Centers for Disease Control and Prevention (CDC) de Atlanta, em 17 de abril. Desde então começou a ser detectada a disseminação para os demais estados, com registro de transmissão comunitária. Em 25 de abril, a partir de uma das amostras coletadas na Califórnia, foi realizado o seqüenciamento genético do vírus, o que possibilitou a realização de diagnóstico por meio de biologia molecular e a confirmação de casos em outros países.
Após México e EUA, foram detectados casos no Canadá, onde também foi registrada transmissão comunitária. Até o dia 31 de maio, a doença já havia atingido 57 países, com a confirmação de mais de 17 mil casos. No Brasil, com mais de 574 amostras processadas laboratorialmente, foram confirmados, até aquela data, 20 casos. Vale ressaltar que esses números mudam a cada dia e o Ministério da Saúde está monitorando a situação epidemiológica no mundo e no Brasil. As informações, atualizadas diariamente, estão disponíveis no sítio do Ministério da Saúde: www.saude.com.br.
No dia 29 de abril, a OMS elevou o alerta pandêmico para o nível 5, tendo em vista a ocorrência de transmissão sustentada comunitária em mais de um país em uma mesma região, e adotou uma uma série de recomendações que visava diminuir os efeitos da epidemia. Muitas dessas medidas foram dirigidas para os países afetados, mas uma das mais abrangentes diz respeito à ativação dos planos nacionais de preparação para uma pandemia de influenza pelo H5N1 (gripe aviária), com as devidas adaptações para a atual epidemia.
Vários países apresentam evidência de autoctonia. No Brasil, havia seis casos autóctones – porém todos com vínculo epidemiológico com pessoas que vieram do exterior, procedentes do México e dos EUA – dentre os 20 confirmados até 31 de maio, assim distribuídos: oito em São Paulo, quatro em Santa Catarina, cinco no Rio de Janeiro, um em Tocantins, um no Rio Grande do Sul e um em Minas Gerais. Portanto, o Ministério da Saúde considera que a transmissão do vírus da Influenza A(H1N1) em nosso País é limitada e sem evidências de sustentabilidade de transmissão de pessoa a pessoa.
Com base em informações e observações ainda iniciais sobre os casos ocorridos fora do País, nota-se que a epidemia tem atingido principalmente crianças e adultos jovens e tem baixa letalidade (<1%). Há um predomínio de casos leves e moderados de síndrome gripal, sendo que a ocorrência de óbito tem sido associada à existência de doença subjacente. Ainda que o vírus tenha se mostrado susceptível ao tratamento com antivirais, grande parte dos pacientes tem se recuperado sem tratamento específico.
Devido ao atual grau de incertezas e à insuficiência das informações disponíveis de países mais afetados, é necessário mantermos o alerta e a ativação dos planos de preparação. Mais ainda, devemos sempre relembrar a experiência da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), em 2003, para a qual somente foi possível seu enfrentamento efetivo a partir do momento em que se compartilhou, internacionalmente, de forma coordenada e solidária, informações e tecnologias que propiciaram conhecer melhor a doença, desenvolver métodos diagnósticos e adotar medidas de controle adequadas. Para a influenza, será necessário ainda estender estes benefícios para produção e acesso universal às vacinas e medicamentos.
Neste contexto, nosso País vem adotando as seguintes medidas, em consonância com estados e municípios, para propiciar uma efetiva atuação do Sistema Único de Saúde (SUS) no enfrentamento desta emergência: monitoramento e ações de vigilância; notificações de casos; monitoramento de portos, aeroportos e fronteiras; recomendações aos viajantes; assistência aos casos e contatos; divulgação nos meios de comunicação; estruturação das redes de saúde; aquisição de insumos e tratamentos, além do desenvolvimento de capacidade para produção da vacina contra o vírus influenza A (H1N1).
Quanto ao monitoramento e ações de vigilância, destacamos a realização de reuniões diárias, inclusive nos fins de semana, com a presença do Ministério da Saúde e suas Secretarias; Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Ministério das Relações Exteriores; e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Também monitoramos sistematicamente os sítios na internet da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), da OMS e sítios governamentais de países afetados para atualização dos casos no mundo.
Além disso, elaboramos diariamente nota técnica, disponibilizada no portal do Ministério da Saúde (www.saude.gov.br), para atualização da situação epidemiológica no mundo e no País, e que contêm orientações aos serviços e profissionais de saúde e à população. No Portal há ainda informações úteis sobre a influenza A (H1N1), como informes técnicos; perguntas e respostas mais freqüentes; Hospitais de Referência; Plano Brasileiro de Enfrentamento de Pandemia de Influenza; histórico da Doença e notas à imprensa, entre outras. Os profissionais da área de saúde têm à disposição o link "Notifique Aqui", para notificação de casos suspeitos.
Todas as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde foram acionadas para intensificar o processo de monitoramento e detecção oportuna de casos suspeitos de influenza A (H1N1), a partir da rede de vigilância de influenza e de laboratórios. O MS também organizou o fluxo de envio de amostras para os três laboratórios de referência nacional: Instituto Adolfo Lutz (IAL), Instituto Evandro Chagas (IEC) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz/RJ). Além disso, realiza videoconferências semanais com países do Mercado Comum do Sul (Mercosul) e União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e com todas as Coordenações de Vigilância Epidemiológica, das Unidades da Rede CIEVS (Centro de Informações Estratégicas e Respostas em Vigilância em Saúde) e assessorias de Comunicação Social de todas as Secretarias Estaduais de Saúde para orientação das ações a serem adotadas.
O MS promoveu a organização da rede CIEVS, para notificação e investigação de casos suspeitos, e elaborou um Protocolo de Notificação e Investigação Imediata, inclusive com o desenvolvimento de aplicativo online do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Para a elaboração de rotinas de monitoramento dos casos, há gráficos, mapas e tabelas disponíveis na sala do CIEVS e acessíveis aos estados e municípios.
Os portos, aeroportos e fronteiras têm sido constantemente monitorados, com reforço da vigilância em todos os pontos de entrada no País, pela Anvisa e Secretaria Especial de Portos da Presidência da República, com medidas específicas para vigilância e controle em portos brasileiros. Os viajantes, em todos os vôos internacionais, recebem panfletos trilíngües (em português, espanhol e inglês) com orientações acerca da epidemia. Até o momento foram distribuídos 4,3 milhões de panfletos em todos os aeroportos do Brasil. Outra estratégia de informação são avisos sonoros feitos pela Infraero e divulgados pela tripulação durante os vôos e também nos saguões dos aeroportos, que contam ainda com televisores e banners espalhados em pontos estratégicos para alertar os passageiros. As principais recomendações aos viajantes procedentes e que se destinam aos países afetados estão contidas nas notas técnicas elaboradas diariamente e disponíveis no portal do Ministério da Saúde.
A assistência aos casos e contatos está descrita no Protocolo de Procedimentos para o Manejo de Casos e Contatos de Influenza A(H1N1), onde constam: definição de casos; manejo clínico em unidades de saúde; manejo de contatos; indicação de tratamento antiviral; biossegurança, entre outras recomendações, disponíveis no endereço: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/influenza_a_h1n1_protocolo_tratamento.pdf.
Foi instalada uma rede para capacitar os profissionais de saúde nas seguintes áreas: hospitais de referência; portos, aeroportos e fronteiras; Serviço de Atendimento Móvel de Urgância (SAMU); centrais de regulação e equipes de saúde da família. Esta rede é coordenada pela Secretaria da Gestão do Trabalho e Educação em Saúde e funciona em parceria com a Rede Universitária de Telemedicina (RUTE), Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), Hospitais Universitários Federais e os Núcleos do Telessaúde da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS). Em articulação com a Secretaria de Vigilância em Saúde e Anvisa, esta rede produziu material de capacitação profissional sobre Influenza A (H1N1) para os profissionais de saúde. São vídeos, áudios, cartilhas e guias de bolso para reprodução local que estão disponíveis no portal do Ministério da Saúde.
A busca de esclarecimentos acerca da epidemia por parte da população no Disque Saúde (080061 1997), coordenado pela Ouvidoria do Ministério da Saúde, representa uma média de 5% do total das ligações diárias, o que demonstra a efetividade das ações de comunicação. Foram veiculadas 53 inserções de lettering (comunicado em que uma voz narra um texto) em oito emissoras de televisão (até 30/04) e peças publicitárias com o personagem "Dr. Bactéria", sobre as medidas de prevenção, na TV e no rádio. O Ministério da Saúde publicou anúncios de esclarecimentos nos principais jornais do País, disponibilizou um hotsite sobre a doença, com links no Portal e confeccionou um milhão de folders e 400 mil cartazes sobre medidas de prevenção contra gripe, para distribuição na rede pública.
A estruturação das redes de saúde pelo MS é mais uma arma no combate à Influenza A (H1N1). Implantada a partir de 2006, a Rede CIEVS conta com 22 Centros de Informações Estratégicas e Resposta em Vigilância em Saúde, que desenvolvem atividades de manejo de emergências de saúde pública, incluindo o monitoramento de situações sentinelas e apoio para o manejo oportuno e efetivo das emergências. Foi implementado o Novo Regulamento Sanitário Internacional (2005) que, dentre outros aspectos, aprimora o processo de reconhecimento e de enfrentamento de doenças com potencial de disseminação internacional por todos os países. Também faz parte da meta da Rede CIEVS, no âmbito do Mais Saúde, a implantação de 54 unidades e de um novo Centro Nacional até 2011.
O Brasil dispõe atualmente de 53 unidades de referência hospitalar para acompanhamento e tratamento de pacientes com infecção por influenza A (H1N1), com 1270 leitos reservados pelas Secretarias Estaduais de Saúde, sendo 173 com pressão negativa. Tais centros se enquadram em parâmetros exigidos pela OMS para o atendimento à doença, com área para isolamento de contato, equipamentos de proteção individuais para acompanhamento, exames e tratamento dos casos. Para esta fase, os números são suficientes. Havendo necessidade, podem ser incorporadas outras unidades à rede. A lista completa das unidades de referência encontra-se disponível no sítio do Ministério da Saúde. Adicionalmente, trabalhamos com quase 191 Núcleos Hospitalares de Epidemiologia, que têm a função de notificar e investigar doenças de importância para a saúde pública no ambiente hospitalar.
Nosso País conta com uma Rede Nacional de Diagnóstico de Influenza implantada nos laboratórios Centrais de Saúde Pública de todos os estados e no Distrito Federal. Na atual fase de alerta de emergência em saúde pública de importância internacional, o processamento das amostras de secreção respiratória de casos suspeitos para o diagnóstico de infecção pelo vírus de Influenza A(H1N1) deve ser realizado apenas nos laboratórios de referência nacional citados anteriormente, para realizar o diagnóstico por método de PCR-RT, em média entre 24 e 48 horas. Os três laboratórios estão credenciados junto à OMS como Centros de Referência para Influenza (National lnfluenza Center – NIC), o que inclui o Brasil na Rede Global de Vigilância da Influenza. Quanto à aquisição de insumos, preparamos primers para realização do diagnóstico molecular da influenza A(H1N1) com o apoio da OPAS e CDC para recebimento dos kits diagnósticos, adquirimos 80.000 testes rápidos e distribuímos 1.000.000 de kits de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para a rede de referência.
O Brasil possui matéria-prima estocada e condições para utilização de nove milhões de tratamentos para influenza. Em articulação com Fiocruz e laboratórios das Forças Armadas, o MS poderá encapsulá-los, se necessário. Para uso imediato, foram adquiridos 6.250 tratamentos para adultos e 6.250 tratamentos pediátricos de Oseltamivir. Está em processo de aquisição mais 7.400 tratamentos infantis e 800.000 para adultos. O medicamento será utilizado no tratamento de casos suspeitos ou confirmados de Influenza A (H1N1). Reitera-se que o risco da emergência de resistência a este antiviral requer critérios claros para a prescrição do referido medicamento e que ele deve estar de acordo com o Protocolo de Procedimentos para o Manejo de Casos e Contatos, disponível no sítio do Ministério da Saúde.
A Organização Mundial de Saúde fornecerá o lote semente da vacina para todos os laboratórios com capacidade de produção, incluindo o Instituto Butantan, em São Paulo. Segundo a OMS, o número de doses por pessoa necessário para obter a imunização contra a Influenza A (H1N1) não será conhecido até que os primeiros ensaios clínicos em seres humanos tenham sido concluídos. A cepa que compõe a vacina contra influenza sazonal é composta de vírus humano, enquanto que o da presente epidemia é um vírus com composição mista (humano, suíno e aviário). Não há nenhuma evidência de que a vacina sazonal confira alguma imunidade contra a Influenza A (H1N1). No entanto, até o presente momento, ainda não há indicação de quando a produção da vacina poderá ser iniciada no País.
Cabe ressaltar que o Brasil vem se preparando para uma possível pandemia de influenza desde 2003, quando o Governo Brasileiro constituiu o Grupo Executivo Interministerial (GEI), que elaborou o Plano Brasileiro de Preparação para o Enfrentamento de uma Pandemia de Influenza, por meio de Decreto Presidencial. O GEI se reúne mensal ou semanalmente, e é composto pelos seguintes órgãos: Ministério da Saúde -Coordenação; Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Casa Civil da Presidência da República; Secretaria-Geral da Presidência da República; Ministério da Fazenda; Ministério da Justiça; Ministério da Defesa; Ministério das Relações Exteriores; Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Ministério da Integração Nacional; Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério do Meio Ambiente; Ministério da Educação; Ministério dos Transportes; e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Esse Grupo, sob a coordenação da Secretaria de Vigilância do Ministério da Saúde, tem por função acompanhar o processo de preparação no Brasil e prover as condições para a execução do Plano. O trabalho do Grupo é focado em aspectos como: subsidiar a Presidência da República no processo de tomada de decisão referente à preparação do Brasil frente ao risco de pandemia; viabilizar a articulação interinstitucional necessária para o encaminhamento das decisões; criação de Grupos de Trabalho para a proposição de novas normas e rotinas necessárias ao enfrentamento desta emergência em saúde pública; e elaboração de proposta orçamentária para viabilizar a operacionalização de ações contingenciais necessárias ao reforço da infra-estrutura do País para lidar com emergências em saúde pública desta natureza. O Brasil mantém o Plano atualizado já em sua terceira versão e em processo de revisão para a elaboração da quarta versão.
Por fim, quero ressaltar que a atual mobilização do Sistema Único de Saúde para o enfrentamento desta epidemia, envolvendo de forma solidária as três esferas de gestão, tem por objetivo maior aprimorar e fortalecer a infra-estrutura dos serviços de saúde pública do País para a detecção precoce e resposta efetiva a esta e a eventuais futuras emergências de saúde pública. Registro o agradecimento e o reconhecimento aos milhares de profissionais que trabalham por uma saúde melhor para os nossos cidadãos.
Brasília, 31 de maio de 2009.