Serviços Personalizados
Journal
Artigo
Indicadores
- Citado por SciELO
Links relacionados
- Similares em SciELO
Compartilhar
Epidemiologia e Serviços de Saúde
versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622
Epidemiol. Serv. Saúde v.20 n.4 Brasília dez. 2011
http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742011000400006
ARTIGO ORIGINAL
Fatores associados aos componentes de aptidão e nível de atividade física de usuários da Estratégia de Saúde da Família, Município de Botucatu, Estado de São Paulo, Brasil, 2006 a 2007
Factors associated with the components of fitness and physical activity level in users of Family Health Strategy, Municipality of Botucatu, State of São Paulo, Brazil, 2006 to 2007
Edilaine MichelinI; José Eduardo CorrenteII; Roberto Carlos BuriniI
ICentro de Metabolismo em Exercício e Nutrição, Departamento de Saúde Pública, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil
IIDepartamento de Bioestatística, Instituto de Biociências de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil
RESUMO
OBJETIVO: diagnosticar o nível de atividade, aptidão física e fatores associados entre usuários da Estratégia Saúde da Família (ESF) do distrito de Rubião Jr., município de Botucatu-SP, Brasil, entre 2006 e 2007.
METODOLOGIA: estudo transversal que avaliou níveis de atividade física (NAF), informações demográficas, socioeconómicas e estado de saúde (NAF-IPAQ 8), composição corporal [índice de massa corporal (IMC) e circunferência abdominal (CA)], flexibilidade de tronco (FLEX) e força de preensão manual (FPM) entre os 394 usuários da ESF (35-85 anos de idade) estudados.
RESULTADOS: observou-se baixo e alto NAF em, respectivamente, 17,0% e 36,3% da amostra, com maior inaptidão para flexibilidade (77,2%) do que para FPM (48,4%); no modelo de regressão logística ajustado, indivíduos com estado de saúde regular/ruim apresentaram 60,0% menos chance de terem NAF alto, e mulheres e indivíduos com CA alterada tiveram, respectivamente, 90,0% e 60,0% menos chances de inaptidão para FPM; indivíduos com escolaridade até o ensino fundamental e má percepção de saúde tiveram, respectivamente, 3,2 e 2,7 vezes mais chance de terem FPM ruim.
CONCLUSÃO: o conhecimento do perfil de atividade e aptidão física nas ESF pode contribuir para o diagnóstico de saúde de seus usuários.
Palavras-chave: atividade motora; aptidão física; questionários; atenção primária à saúde; estudos transversais.
SUMMARY
OBJECTIVE: to diagnose physical activity level and fitness, and related factors among users of the Family Health Strategy (FHS) of Rubião Junior District, Municipality of Botucatu-SP, Brazil, from 2006 to 2007.
METHODOLOGY: a cross-sectional study that evaluated physical activity levels (PAL), demographic, socioeconomic, and health conditions (PAL-IPAQ-8), body composition [Body Mass Index (BMI), and waist circumference (WC)], trunk flexibility (FLEX), and handgrip strength (HGS) of 394 FHS studied users (aged 35-85 years).
RESULTS: there was a low and high PAL in, respectively, 17.0% and 36.3% of the sample with greater unfitness for flexibility (77.2%) than HGS (48.4%); after adjustment of the regression model, individuals with fair/poor health had 60.0% less likely to show high PAL, and women and individuals with altered WC showed, respectively, 90.0% and 60.0% less chance of being unfit for HGS; individuals with education level until elementary school andpoor health perception showed, respectively, 3.2 and 2.7 times more likely to have bad HGS.
CONCLUSION: the knowledge of FHS's activity and physical fitness profile may contribute to health diagnosis of their users.
Key words: motor activity; physical fitness; questionnaires; primary health care; cross-sectional studies.
Introdução
A transição epidemiológica, caracterizada pela redução das doenças infectocontagiosas e aumento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), transforma o perfil de morbidade/mortalidade no mundo. Nos países pobres, as incapacidades e os óbitos por DCNT superam aqueles por doenças contagiosas.1
No Brasil, observa-se aumento da expectativa de vida e crescimento expressivo da população idosa. A maior longevidade populacional, entretanto, se não acompanhada de investimentos na promoção da saúde, pode resultar em aumento de anos vividos com DCNT e incapacidades.2 Há, portanto, a necessidade de preparar e adequar os serviços de saúde, e estruturar, formar e qualificar profissionais com vistas ao atendimento dessa nova demanda.3
O Ministério da Saúde, por meio da Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), enfatiza, no Pacto pela Vida, a importância do aprimoramento do acesso e da qualidade dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde - SUS -, a promoção de atividade física e hábitos alimentares saudáveis, bem como o controle do tabagismo, do uso abusivo de bebidas alcoólicas e, não menos importante, os cuidados especiais dirigidos ao processo de envelhecimento.4
Entre as ações citadas, a prática regular de atividade física mostra-se importante opção profilática e terapêutica para diversas DCNT, em adultos e idosos.5-10 Mesmo diante dos benefícios comprovados da atividade física, estudos populacionais brasileiros verificaram prevalências elevadas de inatividade.3,11-15 o que pode gerar elevados custos ao sistema público de saúde.15
A atividade física influencia positivamente os componentes da aptidão física relacionados à saúde, como a flexibilidade e força;16 esses, por sua vez, têm sido estudados como significantes preditores de incapacidades, limitações funcionais e de mortalidade, em adultos como em idosos.17-21
Diante da necessidade de transformar a atividade física da população em estilo de vida, medidas simples, se possível com a participação da Atenção Básica e seus profissionais, podem significar um grande impacto na melhoria dos índices de saúde populacional, e consequente redução dos custos a ela relacionados. A mudança no estilo de vida torna-se, portanto, caminho promissor no sentido de minimizar os prejuízos funcionais característicos da idade e da inatividade física.
Foi com essa convicção que se implantou, em uma unidade da Estratégia de Saúde da Família localizada no Município de Botucatu, Estado de São Paulo, um programa para mudança do estilo de vida com a prática de exercícios físicos (5x/semana) e aconselhamento nutricional (1x/mês). Esse programa de ações, oferecido a todos os indivíduos cadastrados na unidade, por meio de convite realizado pelos agentes comunitários de saúde, médicos e enfermeiros da mesma unidade, também contou com a equipe do Centro de Metabolismo em Exercício e Nutrição, composta por profissionais de educação física, nutricionistas, fisioterapeutas, médico, biomédicos e biólogos, responsáveis pela implantação e execução do programa.
A participação ainda se mostra pequena. Porém, a divulgação entre os participantes e amigos e os primeiros resultados alcançados pelos usuários farão com que a adesão ao programa aumente.
O presente estudo tem por objetivo diagnosticar o nível de atividade e aptidão física e fatores associados, entre usuários da Estratégia de Saúde da Família do Distrito de Rubião Júnior, município de Botucatu-SP, no período de 2006 a 2007.
Metodologia
A unidade da Estratégia de Saúde da Família de Rubião Júnior (ESF/Botucatu-SP) apresenta, em seu cadastro, 1.811 indivíduos com 35 anos de idade e mais.22 Em estudo transversal, com amostra de conveniência, de demanda espontânea, foram avaliados 394 indivíduos.
Para avaliação do nível de atividade física (NAF) e caracterização demográfica e socioeconómica (sexo; faixa etária; estado civil; renda familiar; escolaridade; e estado de saúde) utilizou-se informações obtidas pelo Questionário Internacional de Atividades Físicas (IPAQ versão 8 - forma longa), o qual permite estimar o tempo gasto em caminhadas, atividades físicas de moderada e vigorosa intensidades, no trabalho, transporte, tarefas domésticas e de lazer em uma semana usual ou nos últimos sete dias.23 A classificação do NAF obedeceu às orientações fornecidas pelo Guidelines for Data Processing and Analysis of the International Physical Activity Questionnaire (IPAQ) - Short and Long Forms, o qual considera: a) baixo NAF menos que 150 minutos/semana, b) moderado NAF o daqueles que acumulam pelo menos 150 minutos/semana e c) alto NAF indivíduos que acumulam pelo menos 750 minutos/semana em atividades vigorosas, moderadas e caminhadas.24
Optou-se pela aplicação do questionário na forma de entrevista individual. Desta forma, colhe-se exemplos de atividades comuns à população entrevistada e não se incorre no risco de incompreensão, por essa população, dos termos técnicos contidos em um questionário lido, a ser preenchido. Outro fator que contribuiu para essa opção foi o fato de a recusa em responder às questões ser menor, quando comparada à de outras formas de aplicação de questionário.14
Peso corporal e estatura foram aferidos segundo as técnicas preconizadas por Heyward & Stolarczyk;25 e o índice de massa corporal (IMC), calculado por meio do quociente peso/estatura2. A classificação para IMC, bem como a medida da circunferência abdominal (CA), seguiram as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS): IMC maior que 25kg/m2 foi considerado alterado; e foi adotado, como ponto de corte para risco cardiovascular, CA acima de 88cm para mulheres e de 102cm para homens.26
Como indicadores funcionais da aptidão física, avaliaram-se a flexibilidade de tronco (FLEX) pelo teste de sentar e alcançar; e a força de preensão manual (FPM) foi aferida por dinamómetro hidráulico com escala de 0 a 100kg, cujo valor adotado é a máxima pressão exercida com o membro dominante em três tentativas. Para ambas as aptidões, adotaram-se classificações segundo sexo e idade.27,28
As variáveis foram assim categorizadas: NAF - baixo, moderado e alto; sexo - masculino (grupo referência) e feminino; faixa etária - <60 anos (grupo referência) e >60 anos; estado civil - casado (grupo referência) e outros; escolaridade - ensino fundamental e ensino médio/superior (grupo referência); estado de saúde - excelente/muito bom/bom(E/MB/B, grupo referência) e regular/ruim (Reg/Ru); IMC - ≤24,9kg/m2 (grupo referência) e >25kg/m2; CA - normal (grupo referência) e alterada -; flexibilidade - ótimo/bom (grupo referência) e Ruim; e FPM - ótimo/bom (grupo referência) e ruim.
Utilizou-se análise de frequência para as variáveis qualitativas (sexo; faixa etária; estado civil; estado de saúde; renda familiar; escolaridade) e categorizadas (IMC; CA; FLEX; FPM; e NAF), para caracterização da amostra.
Utilizou-se o teste de qui-quadrado (χ2) para verificar a associação dos desfechos NAF alto e baixo e das inaptidões de flexibilidade e força com fatores demográficos, socioeconómicos e antropométricos. Considerando-se os mesmos desfechos, utilizou-se modelo de regressão logística múltipla para ajuste de possíveis fatores de confusão, considerando NAF alto versus baixo/moderado e NAF baixo versus moderado/alto; e para aptidão, NAF ruim versus ótimo/bom.
O programa utilizado foi SAS for Windows, versão 9.1, e o nível de significância adotado para todos os testes foi de 5% ou p-valor correspondente.
Considerações éticas
Os usuários da ESF de Rubião Junior, Botucatu-SP, na qualidade de participantes, assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido sobre a proposta e procedimentos do estudo. A coleta de dados ocorreu no período de outubro de 2006 a setembro de 2007, de maneira a evitar vieses de sazonalidade.
Os preceitos éticos da Resolução no 196/96 foram seguidos e o estudo recebeu parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu/UNESP em 4 de setembro de 2006, sob no OF. 460/2006.
Resultados
Foram avaliados 394 usuários da ESF de Rubião Jr. com média de idade de 53,9±11,6 anos e detectou-se baixo e alto NAF em, respectivamente, 17% e 36,3% da amostra. Houve predomínio de indivíduos do sexo feminino, idade inferior a 60 anos, casados, renda familiar de até dois salários mínimos, ensino fundamental, estado de saúde regular e ruim e inaptidão para flexibilidade (Tabela 1).
No presente estudo, optou-se por analisar somente NAF baixo e alto, pretendendo, dessa forma, avaliar apenas aqueles indivíduos pouco ou muito ativos. Entre os indicadores estudados, estado de saúde mostrou associação positiva com NAF baixo (χ2=9,5; p=0,0021). Todavia, após ajuste do modelo de regressão logística, a referida associação perdeu significância e isso se deve à inclusão no modelo de todos os possíveis fatores confundidores (Tabela 2).
O NAF alto associou-se negativamente com idade (χ2=6,1; p=0,0132) e estado de saúde (χ2=14,4; p=0,001) e CA (χ2=6,0; p=0,0l40). Porém, após ajuste de modelo de regressão logística, incluindo todas as possíveis variáveis confundidoras, apenas os indivíduos com percepção de saúde regular/ruim apresentaram 60,0% menos chances de terem NAF alto, enquanto as demais variáveis deixaram de ser significantes (Tabela 2).
Quanto às aptidões físicas, força de preensão manual ruim mostrou associação negativa com sexo (χ2=40,2; p<0,0001), CA (χ2=17,5; p<0,0001), IMC (χ2=4,1; p=0,0431); e associação positiva com faixa etária (χ2=10; p=0,00l6), escolaridade (χ2=3,9; p=0,0480) e estado de saúde (χ2=5,4; p=0,0201).
Após ajuste do modelo de regressão, incluídos todos os possíveis fatores confundidores, encontrou-se que mulheres e indivíduos com CA alterada mostraram, respectivamente, 90,0% e 60,0% menos chances de serem inaptas para FPM. De maneira semelhante, indivíduos com escolaridade até o ensino fundamental e má percepção de saúde exibiram, respectivamente, 3,2 e 2,7 vezes mais chances de apresentarem FPM ruim. As associações com faixa etária e IMC não foram confirmadas pela análise de regressão (Tabela 3).
Flexibilidade de tronco ruim associou-se negativamente com sexo χ2=5,5; p=0,0192) e CA (χ2=4,5; p=0,0341). Contudo, após ajuste de regressão, incluindo todas as variáveis estudadas, não foi possível determinar a magnitude dessa associação (Tabela 3).
Discussão
A amostra, de conveniência, com abordagem em sala de espera contou com a participação de 394 usuários da ESF os quais representaram 12,0% dos homens, 32,0% das mulheres, 20,4% com menos de 60 anos e 25,4% com idade igual ou superior a 60 anos dos indivíduos cadastrados na ESF.
Sugere-se precaução na extrapolação dos resultados desta pesquisa para a população geral, em razão das diferenças no padrão cultural e estilo de vida específicos da amostra. Outra limitação é o tipo de amostra, de conveniência, com abordagem em sala de espera e que, embora pareça tendenciosa, atingiu indivíduos que realmente se utilizavam dos serviços públicos de saúde, mais especificamente da Atenção Primária, não representativa da população de fato.
Dos avaliados, apenas 17,0% apresentaram baixo NAF e tais resultados não são consistentes com estudos que detectaram atividade física insuficiente em amostra populacional de Joaçaba-SC - 57,4% -11 e entre indivíduos residentes em Pelotas-RS - 41,1%.14 Sedentários e insuficientemente ativos totalizaram 46,4% da população do estado de São Paulo.15 Pesquisa nas capitais dos estados brasileiros e Distrito Federal observou maior prevalência de indivíduos fisicamente inativos em Rio Branco-AC (22,1%) e menor em Manaus-AM (10,7%) ,13 ademais de encontrar 31,8% de sedentarismo em adultos residentes em áreas de abrangência de unidades básicas de saúde de duas regiões do país.3
A maioria dos estudos supracitados utilizou a versão curta do IPAQ, a qual tende a superestimar a inatividade física.11,14,23 Diante de tal constatação, no presente estudo, optou-se pela versão longa do instrumento buscando, assim, distinguir atividades de transporte, ocupacionais, de lazer e tarefas domésticas.
Nos países em desenvolvimento, as atividades físicas no trabalho e meio de transporte ativo representam parcela substancial na atividade física total dos indivíduos,14 confirmando os dados apurados no presente estudo, os quais mostraram que a inexistência de atividades físicas vigorosas e moderadas no trabalho, a não utilização da bicicleta e da caminhada como meios de transporte e, também, o fato de não constarem registros de tarefas domésticas moderadas externas foi determinante para o baixo NAF (resultados não mostrados).
Contrariamente, NAF alto (36,3%) foi definido pela presença de caminhadas e atividades físicas moderadas no lazer e tarefas domésticas moderadas internas e externas (resultados não mostrados). As atividades de lazer poderiam ser explicadas pela existência, há quatro anos, de programa de mudança de estilo de vida (exercício físico diário e orientação nutricional), oferecido a todos os indivíduos cadastrados na ESF local e conduzido por equipe multiprofissional do Centro de Metabolismo em Exercício e Nutrição, vinculado ao Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu-SP, além de a amostra ser predominantemente composta por mulheres de baixa renda, responsáveis pelos serviços domésticos.
Os resultados observados estudo foram plausíveis. Trata-se de uma população de baixa renda (59,4%), usuária dos serviços públicos de saúde, que tem como atividades físicas cotidianas a caminhada - como meio de transporte - e a realização de tarefas domésticas para elevar seu nível de atividade física, e ademais, conta com exercícios físicos diários para os interessados no programa.
A utilização de questionários como método diagnóstico do nível de atividade física pode não ser o 'padrão-ouro' e, dessa forma, significar uma limitação da metodologia adotada, porém se mostra um instrumento viável em estudos populacionais. O IPAQ - testado em 12 países, inclusive o Brasil - foi criado para produzir medida de atividade física mundialmente comparável, o que o torna altamente recomendável,23 embora ainda seja necessário padronizar os termos utilizados, principalmente quando se trata da classificação do nível de atividade física.
A associação entre níveis de atividade física e indicadores demográficos e socioeconómicos vem despertando o interesse de epidemiologista e profissionais ligados à Saúde Pública. No presente estudo, indivíduos com percepção de saúde regular/ruim exibiram 60,0% menos chances de terem alto NAF, resultados que corroboram aqueles obtidos em pesquisa com industriários de Santa Catarina29 e em adultos e idosos das áreas de abrangência de unidades básicas de saúde de municípios das regiões Sul e Nordeste do Brasil:3 os dois estudos detectaram percepção de saúde positiva naqueles com maiores níveis de NAF, e vice-versa.
A inaptidão para FLEX atingiu mais de 2/3 da amostra e apresentou significativa associação com sexo. Por exemplo, a avaliação da aptidão física de adultos participantes de projeto de extensão universitária e um estudo com 8.116 adultos canadenses observaram menor FLEX no sexo masculino do que no feminino.16,19 Esse indicador não se apresenta como preditor significativo de mortalidade;20 por ser específico para cada articulação, a relação da FLEX - em diferentes articulações - com saúde ou mortalidade constitui importante área para futuras pesquisas.
Os achados do presente estudo apuraram FPM deficiente em aproximadamente metade da amostra, e associação com sexo: as mulheres apresentaram 90,0% menos chances de serem inaptas para esse componente quando comparadas aos homens. Estudos com adultos participantes de projeto de extensão universitária e com amostra representativa da população adulta canadense mostraram o sexo masculino mais forte do que o feminino.16,19 Possível explicação para nossos resultados é a constituição da amostra, de conveniência e de predominância feminina.
Indivíduos com CA alterada exibiram 60,0% menos chances de terem FPM regular/ruim. Sabe-se que indivíduos idosos são mais acometidos por perda de massa muscular e consequente aumento de gordura corporal, inclusive a visceral, o que resulta em redução da força muscular. A presente amostra apresentou 69,3% de indivíduos com menos de 60 anos de idade, ou seja, adultos com massa muscular preservada, resultando na manutenção da força independentemente do acúmulo de gordura.
Quase 90,0% dos indivíduos avaliados apresentaram escolaridade até o ensino fundamental e esse nível educacional aumentou em 3,2 vezes as chances de a amostra apresentar FPM ruim. Essa deve ser considerada uma característica peculiar da presente amostra, pois indivíduos com maior escolaridade são aqueles que, normalmente, apresentam menor força, por referirem mais atividades cotidianas sedentárias.
A percepção de saúde regular/ruim apontou para 2,7 vezes mais chances de os indivíduos serem inaptos para FPM. Por ser uma aptidão bastante utilizada nas atividades da vida diária, a força muscular, quando diminuída, pode impactar negativamente a percepção de saúde.
Diante do exposto e da estreita relação da FPM com as atividades da vida diária, com qualidade de vida e mortalidade, a FPM merece atenção das autoridades em saúde, podendo ser adotada como indicador de saúde. Seu método de avaliação simples, relativamente barato e não invasivo poderia, facilmente, ser inserido na prática das ESF.
O acesso e qualidade dos serviços prestados pelo SUS, enfatizando o fortalecimento e qualificação da Saúde da Família, a promoção, informação e educação em saúde com ênfase nas promoções da atividade física e hábitos alimentares saudáveis, o controle do tabagismo e do uso abusivo de álcool e os cuidados especiais direcionados ao processo de envelhecimento são prioridades do Ministério da Saúde e se encontram no Pacto pela Vida.4 No que diz respeito à atividade física, a inserção dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família - NASF -, em fase de estruturação, com a efetiva participação de profissionais de educação física na prescrição e orientação de atividade física, é promissora.
Contrariando as estatísticas populacionais brasileiras, a amostra estudada apresentou prevalência reduzida de baixo nível de atividade física e isso se deve, principalmente, às tarefas domésticas, meios de transportes ativos e à prática de exercícios físicos diariamente, por esses indivíduos.
Conhecer o perfil de atividade física nas ESF e fatores associados pode contribuir para o planejamento de ações e políticas públicas que minimizem os efeitos deletérios da inatividade física na saúde dos usuários da rede básica de saúde.
A proposta de avaliação da aptidão física também acrescenta informações objetivas relacionadas à saúde e pode trazer contribuições preciosas ao diagnóstico de saúde dos usuários das ESF.
Agradecimentos
Ao Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP -, pelo apoio financeiro a este estudo.
Referências
1. World Health Organization. Global burden of disease and risk factors. Washington: WHO; 2006.
2. Barreto SM, Pinheiro ARO, Sichieri R, Monteiro CA, Schimidt MI, Lotufo P, et al. Análise da estratégia global para alimentação, atividade física e saúde, da Organização Mundial da Saúde. Epidemiologia e Serviços de Saúde. 2005; 14(1): 41-68.
3. Siqueira FV, Facchini LA, Piccini RX, Tomasi E, Thumé E, Silveira DS, et al. Atividade física em adultos e idosos residentes em áreas de abrangência de unidades básicas de saúde de municípios das regiões Sul e Nordeste do Brasil. Cadernos de Saúde Pública. 2008; 24(1):39-54.
4. Ministério da Saúde. Política Nacional de Promoção da Saúde: Pactos pela Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.
5. Sternfeld B, Wang H, Quesenberry CP Jr, Abrams B, Everson-Rose SA, Greendale GA, et al. Physical activity and changes in weight and waist circumference in midlife women: findings from the Study of Women's Health Across the Nation. American Journal of Epidemiology. 2004; 160(9):912-22.
6. Zhu S, St-Onge MP, Heshka S, Heymsfield SB. Lifestyle behaviors associated with lower risk of having the metabolic syndrome. Metabolism Clinical and Experimental. 2004; 53(11):1503-1511.
7. Bardia A, Hartmann LC, Vachon CM, Vierkant RA, Wang AH, Olson JE, et al. Recreational physical activity and risk of postmenopausal breast cancer based on hormone receptor status. Archives of Internal Medicine. 2006; 166(22):2478-2483.
8. Barengo NC, Kastarinen M, Lakka T, Nissinen A, Tuomilehto J. Different forms of physical activity and cardiovascular risk factors among 24-64-year-old men and women in Finland. European Journal of Cardiovascular Prevention & Rehabilitation. 2006; 13(1):51-59.
9. Guedes DP, Gonçalves LAVV. Impacto da prática habitual de atividade física no perfil lipídico de adultos. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia. 2007; 51(1):72-78.
10. Franco OH, Laet C, Peeters A, Jonker J, Mackenbach J, Nusselder W. Effects of physical activity on life expectancy with cardiovascular disease. Archives of Internal Medicine. 2005; 165(20):2355-2360.
11. Baretta E, Baretta M, Peres KG. Nível de atividade física e fatores associados em adultos no Município de Joaçaba, Santa Catarina, Brasil. Cadernos de Saúde Pública. 2007; 23(7):1595-602.
12. Barros MVG, Nahas MV. Comportamentos de risco, auto-avaliação do nível de saúde e percepção de estresse entre trabalhadores da indústria. Revista de Saúde Pública. 2001; 35(6):554-563.
13. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crónicas por inquérito telefónico. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.
14. Hallal PC, Victora CG, Wells JCK, Lima RC. Physical inactivity: prevalence and associated variables in Brazilian adults. Medicine and Science in Sports and Exercise. 2003; 35(11):1894-1900.
15. Matsudo SM, Matsudo VR, Araújo T, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC, et al. Nível de atividade física da população do Estado de São Paulo: análise de acordo com o sexo, idade, nível sócio-econômico, distribuição geográfica e de conhecimento. Revista Brasileira de Ciência e Movimento. 2002; 10(4): 41-50.
16. Coelho-Ravagnani CF, Ravagnani FCP, Michelin E, Burini RC. Efeito do protocolo de mudança do estilo de vida sobre a aptidão física de adultos participantes de projeto de extensão universitária: influência da composição corporal. Revista Brasileira de Ciência e Movimento. 2006; 14(1):45-52.
17. Rantanen T, Volpato S. Handgrip strength and cause-specific and total mortality in older disabled women: exploring the mechanism. Journal of the American Geriatrics Society. 2003; 51(5):636-641.
18. Rantanen T, Harris T, Leveille SG, Visser M, Foley D, Masaki K, et al. Muscle strength and body mass index as long-term predictors of mortality in initially healthy men. Journals of Gerontology Series A: Biological Sciences and Medical Sciences. 2000; 55(3):168-173.
19. Katzmarzyk PT, Craig CL. Musculoskeletal fitness and risk of mortality. Medicine and Science in Sports and Exercise. 2002; 34(5):740-744.
20. Holland JG, Tanaka K, Shigematsu R, Nakagaichil M. Flexibility and physical functions of older adults. A review. Journal of Aging and Physical Activity 2002; 10:169-206.
21. Douris P, Chinan A, Gomez M, Aw A, Steffens D, Weiss S. Fitness levels of middle aged martial art practitioners. British Journal of Sports Medicine. 2004; 38(2):143-147.
22. Prefeitura Municipal de Botucatu. Sistema Municipal de Informações em Saúde. Botucatu: Prefeitura Municipal de Botucatu; 2007.
23. Craig CL, Marshall AL, Sjõstrom M, Bauman AE, Booth ML, Ainsworth BE, et al. International physical activity questionnaire: 12-country reliability and validity. Medicine and Science in Sports and Exercise. 2003; 35(8):1381-1395.
24. International Physical Activity Questionnaire. Guidelines for Data Processing and Analysis of the International Physical Activity Questionnaire (IPAQ) - Short and Long Forms, 2005. Sweden: IPAQ; 2005. [acessado em 15 mar. 2010]. Disponível em http://www.ipaq.ki.se.
25. Heyward VH, Stolarczyk LM. In: Avaliação da composição corporal aplicada. São Paulo: Manole; 2000. Método Antropométrico. p. 73-98.
26. World Health Organization.: Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Geneva:WHO; 2002. (Technical Report Series; no 916)
27. Nahas MV. Atividade física, saúde e qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. Londrina: Midiograf; 2003. Aptidão musculoesquelética: força e mobilidade. p.67-89.
28. Baumgartner, TA, Jackson AS. Measurement for evaluation in physical education and exercise science. Dubuque: Brown & Benchmarc;. 1995.
29. Fonseca SA, Blank VLG, Barros MVG, Nahas MV Percepção de saúde e fatores associados em industriários de Santa Catarina, Brasil. Cadernos de Saúde Pública. 2008; 24(3):567-576.
Endereço para correspondência:
Rua Padre Salústio Rodrigues Machado 540,
Vila dos Lavradores, Botucatu-SP, Brasil.
CEP:18609-610
E-mail:edimichelin@yahoo.com.br
Recebido em 28/02/2011
Aprovado em 09/12/2011