Introdução
Os acidentes de transporte terrestre são um importante problema de Saúde Pública, responsáveis por grande impacto no perfil de adoecimento e morte da população. Estima-se que ocorram, a cada ano, 1,24 milhões de óbitos e 50 milhões de ferimentos decorrentes de acidentes em vias públicas de todo o mundo.1
No período de 2004 a 2013, o Brasil registrou um crescimento progressivo no número de óbitos por acidentes de transporte terrestre, com maior proporção de vítimas do sexo masculino, na idade entre 20 e 39 anos, e motociclistas.2
Em 2012, o estado de Pernambuco registrou 1.997 óbitos por acidentes de transporte terrestre.3 Alguns estudos apontam o setor Transporte como um dos ramos de atividade em que há mais registros de acidentes de trabalho, como por exemplo, os que envolvem motofretistas, condutores de ônibus e de caminhões, refletindo os riscos presentes no trânsito das cidades que acabam por vitimizar esses trabalhadores.4 Amorim e colaboradores,5 em inquérito realizado para estimar a incidência anual de acidentes de trabalho com mototaxistas cadastrados na Secretaria Municipal de Transporte e Trânsito de Feira de Santana-BA, identificou que dos 267 entrevistados, 10,5% sofreram acidente de trabalho.
O acidente de trabalho (AT) é aquele que ocorre no exercício do trabalho a serviço da empresa ou no exercício do trabalho dos segurados, conforme o artigo 11 da Lei nº 8.213, de 24/07/91, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.6 Um acidente de trabalho classifica-se em (i) típico, decorrente da característica da atividade profissional desempenhada pelo acidentado, e (ii) de trajeto, ocorrido no percurso entre a residência e o local de trabalho do segurado e vice-versa.6 No Brasil, em 2013, ocorreram 3.867 mortes de trabalhadores por causas externas.2 Em 2001, Ministério da Saúde publicou a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências.7 Posteriormente, em 2002, o Ministério propôs o 'Projeto de Redução da Morbimortalidade por Acidentes de Trânsito - Mobilizando a sociedade e promovendo a saúde'8 com o objetivo de fomentar a vigilância e o monitoramento dos fatores de risco e proteção relacionados às lesões e mortes no trânsito. Essa iniciativa de intervenção, desenvolvida primeiramente em cinco cidades - São Paulo, Goiânia, Belo Horizonte, Recife e Curitiba -, estendeu-se a outros municípios com o apoio financeiro e técnico do Ministério da Saúde, fortalecendo-se com a implantação da Rede Nacional de Núcleos de Prevenção de Violências e Promoção da Saúde, em 2004, e da Política Nacional de Promoção da Saúde, em 2006.
Para ampliar o conhecimento sobre o perfil das vítimas não fatais de acidentes de transporte terrestre em Pernambuco, no ano de 2010, a Secretaria Estadual de Saúde instituiu a notificação dos casos assistidos em dez serviços de urgência e emergência com atendimento em traumatologia e/ou ortopedia, designados de Unidades Sentinelas de Informação sobre Acidentes de Transporte Terrestre. Essa notificação foi regulamentada pela Portaria SES nº 219, de 11/04/2011,9 que acrescentou os acidentes de transporte terrestre aos demais agravos da Lista de Notificação Compulsória em Unidades Sentinelas, Anexo III da Portaria MS/GM nº 104, de 25/01/2011, vigente na ocasião. No mesmo ano de 2011, a estratégia foi ampliada para mais dez unidades sentinelas e em 2012, houve a inclusão de mais uma unidade, totalizando 21 Unidades Sentinelas em Pernambuco.10
Por se tratar de um sistema de informações em saúde recentemente implantado e que contempla informações não exploradas em outras fontes de dados, como os fatores de risco e de proteção para a ocorrência de acidentes de transporte terrestre, a análise proposta no presente estudo contribuirá para dar maior visibilidade aos acidentes de trabalho típicos e de trajeto que, de acordo com a literatura, são subnotificados.11 Ao considerar a real situação dos acidentes de transporte terrestre no Brasil e no mundo e sua relação com o trabalho, além do impacto que esses acidentes ocasionam na produtividade e na economia, atingindo também os familiares da vítima, este estudo objetiva descrever o perfil das vítimas de acidentes de transporte terrestre relacionados ao trabalho, notificados nas Unidades Sentinelas de Informação sobre Acidentes de Transporte Terrestre em Pernambuco, no período de 2012 a 2014.
Métodos
Estudo descritivo dos casos de acidente (fatais e não fatais) de transporte terrestre relacionados ao trabalho notificados nas 21 Unidades Sentinelas de Informação sobre Acidentes de Transporte Terrestre de Pernambuco.
O estado de Pernambuco, com área territorial de 98.149.119 km2 e população de 9.277.727 habitantes (2013), compõe-se por 184 municípios e a Ilha de Fernando de Noronha.12 Divide-se, administrativamente, em 12 Regiões de Saúde, onde estão distribuídas as referidas unidades sentinela. Cada município-sede das Gerências Regionais de Saúde (Geres) - da II à XI Região - possui uma unidade sentinela; na I Região de Saúde, sediada na capital do estado, Recife, estão localizadas dez unidades sentinelas.
O presente estudo analisou todos os registros de vítimas de acidentes de transporte terrestre, notificados nas 21 Unidades Sentinelas de Informação sobre Acidentes de Transporte Terrestre, que foram identificados como acidente de trabalho no período 1° de janeiro de 2012 a 31 de dezembro de 2014, incluindo vítimas fatais e não fatais.
O Sistema de Informação de Acidentes de Transporte Terrestre adota as definições da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - Décima Revisão (CID-10 - Capítulo XX). As variáveis selecionadas contemplaram as características da vítima, do acidente e os fatores relacionados ao risco e à proteção da vítima:
a) Dados das vítimas
- sexo (masculino; feminino);
- faixa etária, em anos (16-19, 20-29, 30-39, 40-49, 50-59 e ≥60); e
- ocupação;
b) Dados do acidente
- dia da semana do evento;
- zona de ocorrência (urbana; rural);
- tipo de vítima (condutor, pedestre, passageiro, pessoa conduzida em local inadequado [situações de transporte: não ocupando local normalmente reservado aos passageiros ou condutor; ou ocupando lugar reservado ao transporte de mercadorias]);
- meio de locomoção da vítima no momento do acidente (motocicleta, automóvel, bicicleta, a pé, ônibus/similar, ambulância/SAMU/resgate, veículo de tração animal/animal montado, veículo pesado ou outro [inclui trem/metrô]);
- natureza do acidente (atropelamento, choque com objeto fixo, colisão/abalroamento, queda em/do veículo, tombamento ou capotamento, ou outro [especificado pelo informante]);
- outra parte envolvida no acidente (mesmas opções do meio de locomoção da vítima) ou nenhuma outra parte envolvida ('não se aplica', nos casos de tombamento ou capotamento);
- acidente relacionado ao trabalho (a partir de agosto de 2013, a opção de registro positivo de acidente de trabalho foi desagregada nas situações 'Durante o serviço/trabalho' ou 'Indo ou voltando do trabalho');
c) Fatores relacionados ao acidente e à proteção da vítima
- fatores de risco relativos ao condutor (excesso de velocidade, uso de bebida alcoólica, sono/fadiga);
- fatores de proteção da vítima (uso de cinto de segurança/equipamento de retenção e uso de capacete).
Após o recorte dos casos de acidente de trabalho, procedeu-se à qualificação (limpeza) da base de dados, com exclusão dos registros multiplicados, por meio do método probabilístico, utilizando-se os recursos do aplicativo RecLink III. Na etapa de duplicidade, foram utilizadas como campos de blocagem as opções PBloco, Ubloco e sexo, e as variáveis nome e data de nascimento como campos de comparação. Em seguida, utilizou-se a plataforma Excel para identificar, manualmente, os pares sinalizados na etapa de duplicidade do RecLink, por meio da comparação de variáveis como data do acidente, data do atendimento, tipo de vítima, meio de locomoção, outra parte envolvida no acidente, ocupação etc.; foram considerados verdadeiros os pares nos quais essas variáveis estivessem idênticas, permitindo, ainda, que as múltiplas ocorrências de um indivíduo não fossem excluídas da análise.
Considerou-se como multiplicidade a existência de mais de uma notificação da mesma vítima para o mesmo evento/acidente. A ocorrência de acidentes diferentes com a mesma vítima não foi considerada multiplicidade. Posteriormente, para evitar distorções na distribuição da frequência das ocupações, foram excluídas as ocorrências para as quais a natureza da ocupação não foi informada ou as atividades descritas não se enquadravam como ocupação.
As ocupações das vítimas foram agrupadas segundo setor de atividade econômica, de acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) - Subclasses, versão 2.2. Trata-se de instrumento de padronização dos códigos de atividade econômica de âmbito nacional, amplamente utilizado por diversos órgãos da Administração Tributária.13
Também foram utilizados os recursos da tabela dinâmica do Microsoft Excel 2010 e a ferramenta de análise do software Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 13.0.
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), sendo aprovado mediante expedição do Certificado de Apreciação Ética (CAAE) de nº 43031715.8.0000.5201.
Resultados
De janeiro de 2012 a dezembro de 2014, foram notificados 131.607 casos de vítimas de acidente de transporte terrestre atendidas nas 21 Unidades Sentinelas de Informação sobre Acidentes de Transporte Terrestre de Pernambuco; 19.570 desses casos foram identificados como acidentes de transporte relacionados ao trabalho, ou seja, 14,9% dos registros (Figura 1). Durante o processo de limpeza da base de dados a ser analisada, foram excluídos 308 registros, identificados como multiplicidades, e 8.879 notificações de acidentes de trabalho: seja porque a natureza da ocupação não foi informada (8.292), seja porque as atividades descritas não se enquadravam como ocupação (587). Assim, a amostra do estudo foi constituída por 10.691 casos (Figura 1).
Do total de 10.691 notificações, 87,8% das vítimas eram do sexo masculino e mais da metade dos casos envolveu indivíduos com idade entre 20 e 39 anos (69,0%) (Tabela 1).
Os setores de Transporte, Armazenagem e Correio (23,4%) e de Comércio e Reparação de veículos automotores e motocicletas (21,3%) representaram as maiores proporções, individualmente, entre essas notificações (Tabela 2). Nesses setores, as ocupações que registraram mais vítimas foram Motociclista de entrega rápida (motofretista/motoboy e mototaxista: 55,4% dos casos) e Vendedor (26,4%). O setor Agricultura, Pecuária, Produção Florestal, Pesca e Aquicultura foi o terceiro mais frequente em notificações (18,2%): em praticamente todos esses casos, as vítimas se encontravam na ocupação de Trabalhador volante da agricultura (98,4%) (Tabela 2).
Em relação às características do evento, a maioria dos casos notificados ocorreu na zona urbana (72,4%) e na segunda-feira (17,1%). As principais vítimas eram condutores (82,0%); a motocicleta mostrou ser o meio de locomoção mais utilizado no momento do acidente (77,0%); as colisões/abalroamentos foram identificadas em 52,0% das notificações; e o automóvel foi referido com maior frequência como outra parte envolvida no acidente (31,0%) (Tabela 3).
a) SAMU: Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
b) Especificado no sistema a partir de agosto de 2013
No que diz respeito ao tipo de acidente de trabalho, o total de registros analisados restringiu-se a 5.054 casos, porque essa especificação foi incorporada ao sistema analisado a partir de agosto de 2013, destacando-se que 69,8% dos casos foram de acidentes de trajeto (Tabela 3).
Em relação aos fatores de risco para ocorrência dos acidentes, em 9,4% dos casos houve relato de excesso de velocidade do condutor; uso de bebida alcoólica, de celular ou sonolência/fadiga do condutor foram referidos, respectivamente, em 3,7%, 0,8% e 1,8% dos casos (Tabela 4).
a) Uso de cinto de segurança pela vítima em meios de locomoção como automóvel, ônibus, veículo pesado e ambulância.
b) Uso de capacete pela vítima quando o meio de locomoção é a motocicleta.
Quanto à utilização de equipamentos de proteção pelas vítimas, 88,0% dos motociclistas referiram o uso de capacete no momento do acidente e 44,0% das vítimas que eram ocupantes de automóvel ou ônibus/similar ou veículo pesado referiram uso de cinto de segurança no momento do acidente (Tabela 4).
Discussão
Entre os trabalhadores que sofreram algum tipo de acidente de transporte terrestre relacionado ao trabalho e que foram notificados em unidades sentinelas em Pernambuco, os adultos jovens (20-29 anos) e do sexo masculino foram as vítimas mais frequentes. Motociclistas também se destacaram como as principais vítimas.
Bastos e colaboradores14 relataram resultados semelhantes ao analisar o perfil de vítimas de acidentes de trânsito socorridas pelo serviço de atendimento pré-hospitalar na cidade de Londrina-PR. Esses achados, de forma geral, acompanham os resultados de estudos sobre vítimas de acidente de transporte terrestre cujos danos acometem, em sua maioria, indivíduos jovens, em fase produtiva.14
A ocorrência de acidentes de transporte relacionada aos setores de Transporte e Comércio, afetando principalmente motociclistas de entrega rápida e vendedores, respectivamente, aponta em direção semelhante à do estudo de Lacerda e cols.,15 sobre acidentes de trabalho fatais em Salvador-BA, onde a maioria das vítimas eram trabalhadores do comércio, construção, atividades imobiliárias, alojamento e alimentação, transporte e armazenagem. Outro estudo realizado por Lacerda e cols.16 também informa sobre a ocorrência dos acidentes de trânsito com trabalhadores em via pública; nesse estudo, tanto o acidente típico como o de trajeto foram identificados. Esses achados podem refletir a vulnerabilidade dos trabalhadores, a falta de segurança no trânsito e a precariedade dos meios utilizados, tanto no deslocamento para o trabalho como nas situações em que o trabalho é executado em via pública.
Merecem destaque, também, os trabalhadores volantes da agricultura que representaram quase todos os casos do setor Agricultura, Pecuária, Produção Florestal, Pesca e Aquicultura notificados nas unidades de saúde sentinelas. Alves e cols.17 encontraram resultados similares em relação à mortalidade por acidente de trabalho no estado do Tocantins, no período de 2000 a 2010, quando predominaram os óbitos de trabalhadores em ocupações relacionadas aos setores de Agricultura e Construção Civil. Esses autores ainda analisaram as causas básicas dos óbitos, tendo observado como mais frequentes aquelas do agrupamento W (Outras lesões de causas externas) e do agrupamento V (Acidentes de transporte) da CID-10.
É possível que o acometimento dos trabalhadores da agricultura, observado nos estudos referidos, esteja relacionado aos acidentes de trajeto, tendo em vista que as condições de deslocamento desses trabalhadores, na maioria das vezes, são precárias. Estudos também referem que o não cumprimento das leis de trânsito, más condições das vias, falta de manutenção preventiva dos veículos e não utilização de equipamentos de proteção individual podem contribuir para a ocorrência e gravidade desses acidentes.18
Pordeus e cols.19 afirmam que a utilização da motocicleta por trabalhadores de pequenas cidades brasileiras ou áreas rurais, como instrumento de trabalho em substituição ao cavalo e ao jumento no transporte de pessoas e cargas, tem repercutido no perfil dos atendimentos de emergências nas grandes cidades, a exemplo de serviço de emergência de um hospital em Fortaleza-CE. Essa substituição pode ser atribuída à rapidez, fácil circulação e baixo custo desse veículo.
A maior frequência dos acidentes de trajeto, possivelmente, está ligada à utilização de motocicletas no deslocamento da residência para o trabalho e vice-versa. Reforçando esse panorama, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), houve um crescimento ao longo dos anos na frota de motocicletas, em relação aos outros meios de locomoção.20
Os resultados acerca do meio de locomoção utilizado no momento do acidente reforçam os dados do Denatran, demonstrando que a maioria das vítimas utilizavam a motocicleta durante o evento. Este achado condiz com o de Barros e cols.,21 a partir da verificação dos registros de boletins de ocorrência de vítimas de acidentes de trânsito em Pelotas-RS. Legay e cols. também corroboraram esse achado, destacando a motocicleta como o meio de transporte mais referido nas ocorrências de acidente de transporte com vítimas em Vitória-ES, Rio Branco-AC e Palmas-TO.22
É evidente a maior vulnerabilidade dos ocupantes de motocicletas envolvidas em acidentes, sofrendo, em sua maioria, lesões mais graves em relação àqueles que se acidentam com outros tipos de veículos.14 Urgem medidas específicas para reduzir a quantidade dessas vítimas no país.
As colisões envolvendo automóveis aparecem como os acidentes mais frequentes, dado semelhante ao encontrado por Almeida e cols.,23 ao descrever que os principais acidentes de trânsito em Fortaleza-CE, no período de 2004 a 2008, consistiram de colisões, sendo o automóvel/caminhonete o principal veículo envolvido. Corroborando os achados dessa pesquisa, o presente estudo também identificou os condutores como principais vítimas notificadas.
A maior frequência dos acidentes em dias úteis (segunda e quarta-feira), possivelmente, está relacionada ao hábito de concentração das atividades de trabalho em dias úteis da semana. Este resultado deveria servir como indicador para a criação e implementação de ações intersetoriais, com o objetivo de prevenir a ocorrência de acidentes de trânsito e consequentes danos à saúde dos trabalhadores.
A maior parte dos acidentes ocorreu em zona urbana, resultado semelhante ao encontrado por Marín-Leon e cols.24 em análise de distribuição espacial dos acidentes de trânsito fatais em Campinas-SP, no período de 1995 a 2008, ao constatarem maiores ocorrências desses acidentes na zona urbana e nas rodovias que cortam a cidade paulista.
Em relação aos fatores de risco para acidentes, identificou-se que a maioria das vítimas negaram uso de bebida alcoólica pelo condutor, excesso de velocidade, uso de celular ou sonolência/fadiga. Resultado semelhante foi relatado por Silva e cols.,25 em pesquisa realizada com motoboys no estado do Paraná, no período de 2005 a 2006: o consumo de bebida alcoólica antes de dirigir foi negado pela maior parte dos entrevistados, como também negaram excesso de velocidade e uso de celular/rádio comunicador. Entretanto, no que se refere à questão de dirigir cansado, segundo o mesmo estudo, a maior parte dos entrevistados assumiu que pilota mesmo quando se encontra fatigado.
Embora a maior parte dos motociclistas vítimas de ATT relacionados ao trabalho estivesse usando capacete, aproximadamente 1/5 não faziam uso desse equipamento de proteção no momento do acidente. Estudo realizado por Dutra26 em Porto Alegre-RS, no período de 2012 a 2013, registrou: 51,6% de vítimas de acidentes com motocicleta referiram uso de capacete no momento do acidente; 17,6% não o utilizavam adequadamente, admitindo que o equipamento caiu no momento do acidente; 6,4% não o utilizaram; e em 24,5% dos casos, não havia registro do uso ou não do capacete.
Na análise da variável uso de cinto de segurança pela vítima, observou-se pouca diferença entre a frequência de vítimas que utilizavam o cinto e as que não o utilizavam no momento do acidente. Já em estudo realizado por Yokota e cols.27 em 2010, nas capitais do Brasil e no Distrito Federal, mais de 70% das vítimas referiram uso de cinto de segurança no banco da frente e 40% no banco traseiro.
A análise revelou que o Sistema de Informação de Acidentes de Transporte Terrestre é uma valiosa fonte de informação, embora apresente algumas limitações. Apesar de não se constituir em uma pesquisa avaliativa, o presente estudo identificou limitações no preenchimento da variável ocupação. O estudo sugere que o preenchimento desse campo da notificação deveria ser obrigatório. Especialmente quando o acidente de transporte terrestre é notificado como acidente de trabalho, é importante que se estabeleça o nexo causal entre as circunstâncias dos acidentes e a natureza da ocupação.
Os achados apresentados aqui confirmam a importância do conhecimento sobre o perfil de adoecimento e morte relacionado aos registros de trabalhadores vítimas de acidentes de transporte terrestre. Tais informações subsidiam e auxiliam na organização dos serviços de vigilância e assistência à saúde dos trabalhadores, na tomada de decisões, no planejamento de ações de saúde, além de nortear políticas de prevenção de acidentes no contexto intersetorial, envolvendo planejamento urbano, segurança viária, previdência e assistência social. Tais ações devem ser direcionadas principalmente a indivíduos do sexo masculino, adultos jovens, trabalhadores dos setores de Transporte e Comércio, em especial os condutores de motocicleta, buscando mecanismos que possibilitem a redução dos acidentes de transporte terrestre em Pernambuco e no Brasil.