Sra. Editora,
Gostaria de tecer alguns comentários acerca de importante artigo publicado neste periódico, bem como acrescentar algumas informações. Trata-se do artigo de revisão de Zara e colaboradores, sobre estratégias de controle do Aedes aegypti.1
Primeiramente, parabenizo a revista Epidemiologia e Serviços de Saúde e os autores do artigo de revisão pela iniciativa de abordar esse tema. A discussão de estratégias de controle de mosquitos é fundamental para que possamos interagir com a população, a fim de se evitarem possíveis surtos de doenças transmitidas por mosquitos no Brasil.
O vírus do Oeste do Nilo (do inglês West Nile Virus - WNV) pertence ao gênero Flavivirus.2 Foi isolado pela primeira vez em 1937, em Uganda.3 Desde então, casos esporádicos têm sido registrados em vários países no mundo.4 Surtos já foram registrados na Argélia, Romênia, República Tcheca, Congo, Rússia, Estados Unidos e Israel.5 Recentemente, houve registros de casos humanos do WNV no Canadá, Caribe, México e Brasil.6,7
A infecção em humanos é acompanhada geralmente por sinais leves, porém em pessoas imunocomprometidas os sintomas podem se agravar.8 A doença é caracterizada por sintomas como cefaleia, fadiga, dores musculares e hipertermia, e eventualmente podem aparecer manchas vermelhas na pele e sinais gastrointestinais.9 Os casos mais graves podem desenvolver paralisia flácida e dificuldade de concentração.8
Na natureza, o ciclo de transmissão envolve pássaros e mosquitos.10 Os principais hospedeiros são pássaros silvestres, que servem como reservatórios e amplificadores do vírus.11 Os seres humanos e outros mamíferos podem ser infectados, todavia especula-se que a infecção seja acidental.4 Entre os mosquitos que podem servir como vetores do WNV, o Culex pipiens é considerado vetor primário, participando principalmente de ciclos enzoóticos do vírus2,8,11 e mosquitos do gênero Aedes como possíveis vetores secundários.12
Alterações ecológicas produzidas pelo homem estão relacionadas com o aumento das populações de vetores, que conseguem adaptar-se aos novos ambientes e utilizam novas fontes sanguíneas com a entrada do homem e de animais domésticos, que podem se constituir em novos reservatórios de agentes etiológicos, o que torna a emergência e a reemergência desses agentes um fenômeno recorrente.13
Um fato histórico foi a introdução do WNV na cidade de Nova Iorque em 1999, onde 21 pessoas e várias aves de vida livre e de zoológicos morreram.10 Rapidamente o vírus se espalhou por quase todos os estados norte-americanos, causando, por onde passava, a morte de pássaros, mamíferos e humanos.8,11,14-16 Em 2010, nos Estados Unidos, foram registrados 1.021 casos de WNV em humanos, dos quais 629 apresentaram doença neuroinvasiva e 57 morreram.17
Em 2011, foi relatada a primeira evidência sorológica do WNV em cavalos no Pantanal Mato-Grossense. Notou-se que nenhum dos cavalos avaliados possuía histórico de viagens para fora do Pantanal - ou seja, a infecção autóctone pelo WNV foi confirmada.18 Posteriormente, o vírus também foi detectado em frangos e cavalos no Mato Grosso do Sul e na Paraíba, respectivamente.19,20
Recentemente, em 2014, um trabalhador de área rural no Brasil apresentou sintomas clínicos de encefalite aguda. Em seguida, amostras de material biológico (sangue, líquido cefalorraquidiano e fezes) foram colhidas e enviadas ao Instituto Evandro Chagas. Após análises, confirmou-se o primeiro caso de WNV em humanos no Brasil.7 Esse fato levanta a hipótese de possíveis surtos do WNV no Brasil, o que pode ocasionar grandes problemas para a saúde pública.
Desde então, nenhum outro caso do WNV foi notificado. Isso não significa que a circulação tenha sito interrompida, talvez casos da doença estejam sendo negligenciados, levando-se em consideração que o diagnóstico nas áreas rurais é realizado apenas pelos sintomas clínicos. Ademais, pelo fato de a febre do Nilo Ocidental possuir sintomas parecidos com outras arboviroses,10 pode acabar sendo negligenciada, deixando, consequentemente, de ser notificada.
Esse primeiro registro do WNV no país demonstra a capacidade de transição e adaptação de arbovírus no mundo. A cada ano, surtos causados por arbovírus têm aumentado nas Américas, como foram os casos do vírus Chikungunya e do vírus Zika.21,22
Sabe-se que o Brasil é um grande país tropical e que, apesar do intenso desmatamento, mais de um terço do território brasileiro ainda é coberto por florestas tropicais.23 Assim, é importante problematizar a possível introdução do WNV no Brasil, tendo em vista que as cidades brasileiras estão infestadas por Culex e Aedes, mosquitos conhecidos por serem vetores de diversos vírus.13,24,25
É preciso ressaltar a necessidade de melhorar o controle vetorial nos municípios infestados por esses mosquitos e aumentar a vigilância epidemiológica, na tentativa de se minimizarem os efeitos sobre a população em caso de possíveis surtos causados pelo WNV.