Introdução
Os sistemas de informações em saúde configuram fontes importantes para o monitoramento contínuo das estatísticas vitais.1 Apesar da relevância do acesso a informações confiáveis e oportunas para melhoria da saúde das populações, em muitos países de baixa e média renda, sistemas de estatísticas vitais ainda não cumprem seu objetivo.2 Tal fato dificulta o monitoramento do progresso de compromissos internacionais, a exemplo dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.3
No Brasil, diante da necessidade de padronização das estatísticas de mortalidade, o Ministério da Saúde implantou em 1976 o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e definiu um modelo único de Declaração de Óbito (DO).4 Embora a DO seja um instrumento amplamente utilizado, os médicos, ao preenchê-la, nem sempre identificam corretamente a causa de óbito.1 A classificação e registro adequados da causa básica de óbito favorecem a atribuição dos critérios de evitabilidade dos óbitos infantis.5 Essa classificação permite monitorar a qualidade dos serviços de saúde, analisar as tendências temporais da mortalidade e planejar ações para sua redução.6
Com o propósito de melhorar a qualidade das informações da DO, o ministério e as secretarias de estado e municipais de saúde desenvolvem diversas estratégias,7 entre elas a capacitação de médicos, o fortalecimento dos Serviços de Verificação de Óbito (SVO) e dos Institutos de Medicina Legal (IML). Em 2010, implantou-se a vigilância do óbito infantil e fetal.8
A vigilância do óbito infantil e fetal é recomendada para aprimorar a notificação da causa básica e determinar os critérios de evitabilidade.9 Essa estratégia também contribui com o aperfeiçoamento dos registros de mortalidade e possibilita a adoção de medidas de prevenção e promoção da saúde.10 O Ministério da Saúde orienta que a investigação de óbitos seja realizada por meio de fichas de investigação ambulatorial, hospitalar e domiciliar, necropsia e síntese do caso. A ficha de investigação do óbito infantil e fetal - contendo síntese, conclusões e recomendações - é empregada para sumarizar as informações após a discussão de cada caso. Esse instrumento também alimenta o módulo de averiguação dos óbitos infantis no âmbito federal, o SIM-Web.11
Com a incorporação da base normativa e legal da vigilância do óbito infantil e fetal, as investigações e a realização de sínteses dos casos no âmbito de grupos técnicos e ou de Comitês de Prevenção do Óbito ganharam escala, passando a colaborar para o esclarecimento das causas do óbito e das circunstâncias de sua ocorrência.9 Entretanto, poucos estudos avaliaram a contribuição da investigação do óbito infantil, realizada no cotidiano dos serviços, assim como a melhoria das informações vitais e suas implicações na classificação de evitabilidade do óbito.
Esta pesquisa teve como objetivo avaliar a concordância, descrever as causas e a evitabilidade dos óbitos infantis antes e após investigação na cidade do Recife, estado de Pernambuco, Brasil, em 2014.
Métodos
Trata-se de um estudo descritivo de avaliação. Foram incluídas as DO e fichas-síntese de investigação de todos os óbitos de menores de um ano de idade nascidos de mães residentes no Recife, ocorridos em 2014, investigados e discutidos pela Vigilância do Óbito Infantil.
Recife é a capital do estado de Pernambuco, localizado na região Nordeste do Brasil. No ano de 2014, o município possuía 1.608.488 habitantes estimados, distribuídos em 218km².12 Selecionou-se a causa básica informada na DO e na ficha-síntese de investigação do óbito infantil. Os dados foram agrupados por componente da mortalidade infantil (neonatal precoce, neonatal tardio e pós-neonatal) e tabulados com auxílio do programa Tabwin versão 3.6b. Foi analisada a concordância da causa básica dos óbitos infantis antes e após a investigação, mediante comparação das causas com base nos códigos da Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), por capítulos e agrupamentos específicos de causas de morte.13
Para a classificação da evitabilidade dos óbitos, foi adotada a Lista Brasileira de Evitabilidade (LBE) - uma lista de causas de mortes evitáveis por intervenções no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil para menores de cinco anos de idade. Os óbitos considerados evitáveis foram classificados por grupos de ações de saúde: imunização; adequado acompanhamento e cuidados à mulher na gestação, no parto e na atenção ao recém-nascido; ações adequadas de diagnóstico e tratamento; e ações adequadas de promoção da saúde, vinculadas a ações adequadas de atenção à saúde.14
Para avaliação da concordância, foi calculado o coeficiente kappa de Cohen, posteriormente classificado com base nos seguintes critérios: concordância excelente (0,80 a 1,00), substancial (0,60 a 0,79), moderada (0,40 a 0,59), razoável (0,20 a 0,39), pobre (0,00 a 0,19) e sem concordância (=0,00).15 Para indicar a confiabilidade dessa estimativa, foi calculado o intervalo de confiança de 95% referente a cada componente etário. As análises foram realizadas com auxílio do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 15.0.
O projeto da pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco (CEP/CCS/UFPE) (Parecer nº 1.702.600) em 30 de agosto de 2016, e obteve anuência da Secretaria de Saúde do Recife.
Resultados
Do total de 280 óbitos infantis registrados no SIM no ano de 2014, 76 (27,1%) apresentavam malformações congênitas, únicas causas de morte infantil não investigadas no Recife. Dos 204 (72,9%) óbitos elegíveis, 10 (4,9%) não foram investigados porque o endereço ou prontuário não foi localizado, ou por recusa familiar, e 11 (5,4%) tiveram a ficha extraviada, representando uma perda de 10,3%. Os 183 (89,7%) óbitos restantes foram incluídos neste estudo, correspondendo a 94 (51,4%) neonatais precoces, 50 (27,3%) neonatais tardios e 39 (21,3%) pós-neonatais (Figura 1).
Dos 183 (89,7%) óbitos investigados e discutidos, 117 (63,9%) tiveram a causa básica redefinida, sendo 59 (50,4%) neonatais precoces, 36 (30,8%) neonatais tardios e 22 (18,8%) pós-neonatais. Na DO original, observou-se 148 (80,8%) causas básicas de óbito do capítulo XVI, correspondente às afecções originadas no período perinatal. Desses, 91 (96,8%) referiam óbitos neonatais precoces, 42 (84,0%) neonatais tardios e 15 (38,5%) pós-neonatais. Uma vez realizada a investigação, aumentaram as causas relacionadas a esse capítulo, com 156 (85,2%) óbitos distribuídos em 92 neonatais precoces, 45 neonatais tardios e 19 pós-neonatais (Tabela 1).
Capítulos da CID-10 | Neonatal precoce | Neonatal tardio | Pós-neonatal | Óbito infantil | ||||
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Antes | Depois | Antes | Depois | Antes | Depois | Antes | Depois | |
n | n | n | n | n | n | n (%) | n (%) | |
I - Doenças infecciosas e parasitárias | 2 | 2 | 2 | 2 | 8 | 8 | 12 (6,6) | 12 (6,6) |
II - Neoplasias (tumores) | - | - | - | - | - | 1 | - | 1 (0,5) |
VI - Doenças do sistema nervoso | - | - | - | - | - | 1 | - | 1 (0,5) |
X - Doenças do sistema respiratório | - | - | 1 | - | 5 | 2 | 6 (3,3) | 2 (1,1) |
XIV - Doenças do aparelho geniturinário | - | - | - | - | 1 | 1 | 1 (0,5) | 1 (0,5) |
XVI - Afecções originadas no período perinatal | 91 | 92 | 42 | 45 | 15 | 19 | 148 (80,8) | 156 (85,3) |
XVII - Malformações congênitas, deformidades e anomalias cromossômicas | 1 | - | 1 | - | 2 | - | 4 (2,2) | - |
XVIII - Sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos e de laboratório, não classificados em outra parte | - | - | 1 | - | 3 | 1 | 4 (2,2) | 1 (0,5) |
XX - Causas externas | - | - | 3 | 3 | 5 | 6 | 8 (4,4) | 9 (5,0) |
Total | 94 | 94 | 50 | 50 | 39 | 39 | 183 (100,0) | 183 (100,0) |
Nota: para os demais capítulos da CID-10, não foram identificados óbitos.
Das causas redefinidas, 98 (83,8%) apresentaram equivalência nos capítulos (Tabela 2). A concordância para os óbitos infantis antes e após a investigação, segundo o coeficiente kappa, foi razoável (0,338; IC95% 0,303;0,373) para a causa básica, e moderada (0,439; IC95%0,389;0,489) para a evitabilidade. Entre os componentes, a concordância mais alta observada foi no período pós-neonatal, classificada como moderada (0,418; IC95% 0,339;0,497) para a causa básica e também para a evitabilidade (0,549; IC95% 0,462;0,636) (Tabela 3).
Capítulos da CID-10 das causas básicas na DO original | Realocação por capítulos após investigação | Total na DO original | ||||||||
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I | II | VI | X | XIV | XVI | XVII | XVIII | XX | ||
I | 6 | - | - | - | - | 6 | - | - | - | 12 |
II | - | - | - | - | - | - | - | - | - | - |
VI | - | - | - | - | - | - | - | - | - | - |
X | 3 | - | - | 2 | - | - | - | - | 1 | 6 |
XIV | - | - | - | - | 1 | - | - | - | - | 1 |
XVI | 2 | - | - | - | - | 146 | - | - | - | 148 |
XVII | - | - | 1 | - | - | 3 | - | - | - | 4 |
XVIII | 1 | 1 | - | - | - | 1 | - | 1 | - | 4 |
XX | - | - | - | - | - | - | - | - | 8 | 8 |
Total na DO corrigida | 12 | 1 | 1 | 2 | 1 | 156 | - | 1 | 9 | 183 |
Nota:
Capítulos da CID-10.
I - Algumas doenças infecciosas e parasitárias.
II - Neoplasias (tumores).
VI - Doenças do sistema nervoso.
X - Doenças do aparelho respiratório.
XIV - Doenças do aparelho geniturinário.
XVI - Algumas afecções originadas no período perinatal.
XVII - Malformações congênitas, deformidades e anomalias cromossômicas.
XVIII - Sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos e de laboratório, não classificados em outra parte.
XX - Causas externas de morbidade e de mortalidade.
Componente | Kappa CB a | Classificação | IC 95% b | Kappa LBE c | Classificação | IC 95% b |
---|---|---|---|---|---|---|
Neonatal precoce | 0,343 | razoável | 0,293;0,393 | 0,327 | razoável | 0,247;0,407 |
Neonatal tardio | 0,247 | razoável | 0,188;0,306 | 0,396 | razoável | 0,304;0,488 |
Pós-neonatal | 0,418 | moderada | 0,339;0,497 | 0,549 | moderada | 0,462;0,636 |
Total | 0,338 | razoável | 0,303;0,373 | 0,439 | moderada | 0,389;0,489 |
a) CB: causa básica.
b) IC95%: intervalo de confiança de 95%.
c) LBE: Lista Brasileira de Evitabilidade.
Antes da investigação, 170 (92,9%) óbitos foram classificados como evitáveis, 90 desses como parte do componente neonatal precoce, 47 do período neonatal tardio e 33 do pós-neonatal. Depois da investigação, a proporção de óbitos evitáveis aumentou para 178 (97,3%), com incremento em todos os componentes, especialmente no neonatal precoce, no qual todos os óbitos foram considerados evitáveis (Tabela 4).
Critérios de evitabilidade | Neonatal precoce | Neonatal tardio | Pós-neonatal | Óbito infantil | ||||
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Antes | Depois | Antes | Depois | Antes | Depois | Antes | Depois | |
n | n | n | n | n | n | n (%) | n (%) | |
Causas evitáveis | 90 | 94 | 47 | 49 | 33 | 35 | 170 (92,9) | 178 (97,3) |
Reduzíveis pelas ações de imunização | - | - | - | 1 | 3 | 5 | 3 (1,6) | 6 (3,3) |
Reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação | 52 | 73 | 20 | 37 | 5 | 16 | 79 (43,2) | 126 (68,9) |
Reduzíveis por adequada atenção à mulher no parto | 13 | 11 | 4 | 3 | 2 | 1 | 19 (10,4) | 12 (6,6) |
Reduzíveis por adequada atenção ao recém-nascido | 25 | 13 | 17 | 5 | 6 | 3 | 48 (26,2) | 21 (11,5) |
Reduzíveis por ações de diagnóstico e tratamento adequado | - | - | 2 | - | 10 | 3 | 12 (6,6) | 3 (1,6) |
Reduzíveis por ações de promoção à saúde | - | - | 4 | 3 | 5 | 7 | 9 (4,9) | 10 (5,5) |
Causas mal definidas | 1 | - | 1 | - | 3 | 1 | 5 (2,7) | 1 (0,5) |
Demais causas (não claramente evitáveis) | 3 | - | 2 | 1 | 3 | 3 | 8 (4,4) | 4 (2,2) |
Total | 94 | 94 | 50 | 50 | 39 | 39 | 183 (100,0) | 183 (100,0) |
No componente neonatal precoce, houve aumento de 52 para 73 nos óbitos classificados no grupo de causas reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação. No grupo de causas evitáveis por adequada atenção ao recém-nascido, ocorreu redução de 25 para 13 óbitos. As causas mal definidas e demais causas não claramente evitáveis foram totalmente esclarecidas com a investigação (Tabela 4).
No componente neonatal tardio, após a investigação, constatou-se aumento no número de óbitos por causas reduzíveis pelas ações de imunização e adequada atenção à mulher na gestação. Entretanto, verificou-se diminuição das causas reduzíveis por adequada atenção ao recém-nascido. As causas mal definidas foram esclarecidas, e uma causa não claramente evitável assim permaneceu após a investigação (Tabela 4).
Após a investigação nos óbitos pós-neonatais, observou-se aumento - de 3 para 5 - no grupo de óbitos por causas reduzíveis mediante ações de imunização. Os óbitos reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação aumentaram de 7 para 16. As causas reduzíveis por adequada atenção à mulher no parto reduziram, de duas para uma, e as causas por adequada atenção ao recém-nascido, de 6 para 3. Apenas uma causa mal definida não foi esclarecida, e três causas permaneceram não claramente evitáveis (Tabela 4).
Discussão
A maioria dos óbitos teve alteração na causa básica após a investigação, embora tenham predominado óbitos reclassificados no seu capítulo de origem da CID-10. Ao considerar as causas básicas de óbito antes e após a investigação, verificou-se concordância razoável para a causa básica, e concordância moderada para a classificação de evitabilidade. Após investigação, houve crescimento do número de óbitos evitáveis por intervenções do SUS. A grande maioria dos óbitos foram considerados evitáveis, com destaque para aqueles ocorridos no período neonatal precoce.
A redefinição da maioria das causas básicas do óbito infantil e a concordância das causas de óbito e da evitabilidade identificadas neste estudo podem ser consideradas indicadores da adequação das ações da vigilância do óbito infantil. Pesquisa avaliativa da representação social dos médicos sobre as DO perinatais, realizada no município de São Paulo em 2012, aponta que a qualidade das informações sobre mortalidade está relacionada, sobretudo, aos processos adequados de coleta e registro dos dados nos locais de assistência à saúde da mulher e da criança, refletindo-se na consistência das informações disponibilizadas.16
A importância das investigações dos óbitos e da ação dos Núcleos Hospitalares de Epidemiologia para o aperfeiçoamento da informação sobre a causa básica de morte na DO é reconhecida.8,17 A condução da investigação viabiliza a capacitação em serviços do corpo clínico dos estabelecimentos de saúde, minimizando o desconhecimento médico quanto a seu papel na cadeia de produção das informações vitais.18 Não obstante os investimentos na formação dos médicos e os avanços alcançados no adequado preenchimento das DO, persistem fragilidades.19
A identificação das circunstâncias dos óbitos apenas por grupos de causas não é suficiente para compreender as condições de sua ocorrência. Estudos ressaltam que as alterações na causa de morte e sua classificação quanto à evitabilidade dos óbitos redirecionam as ações para sua consecução, constituindo elemento definidor de maior ou menor possibilidade de êxito no enfrentamento e prevenção das mortes infantis.1,5,20
Após a investigação e a reclassificação dos óbitos de acordo com os critérios de evitabilidade, constatou-se que nove em cada dez óbitos foram considerados evitáveis por intervenções do SUS. Entre esses óbitos, o componente neonatal precoce apresentou os maiores percentuais de causas evitáveis quando comparado aos demais componentes, tanto antes como após a investigação. Pesquisas têm demonstrado que as informações obtidas próximas ao nascimento apresentam melhor preenchimento, seja no aspecto da completitude, seja na fidedignidade.2,21 A disponibilidade de dados confiáveis permite verificar, com maior precisão, as condições de nascimentos, óbitos e seus determinantes.22
Após a investigação, observou-se aumento nas mortes por causas reduzíveis pelas ações de imunização, com maior incremento no componente pós-neonatal. A correção dessas causas de morte contribui potencialmente para o conhecimento de fatores intimamente relacionados à mortalidade dos recém-nascidos, e para a definição e dimensionamento das medidas de prevenção e promoção da saúde.23
Aproximadamente 70% dos óbitos poderiam ter sido prevenidos se houvesse adequada atenção à mulher na gestação. As causas por afecções maternas observadas após a investigação representaram duas vezes mais mortes, quando comparadas com as registradas na DO original. O maior aumento nessas causas foi observado no componente neonatal tardio. Com acompanhamento de pré-natal e pré-parto adequados e realização dos exames laboratoriais previstos na rotina das consultas, pode-se não só identificar precocemente como também reduzir as complicações da gravidez.24 Assim, é possível controlar as infecções por transmissão vertical e evitar possíveis óbitos maternos e infantis.20
Constatou-se que o grupo de causas reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação apresentou o maior percentual de óbitos evitáveis na DO original, e também após a investigação realizada. O registro inadequado de causas intermediárias, em detrimento de causas específicas, pouco contribui para a compreensão das condições de mortalidade;9 o que também compromete a identificação dos fatores de risco ao recém-nascido, possivelmente relacionados a problemas intrauterinos, maternos, placentários ou do próprio feto.25,26 A alteração do perfil epidemiológico desses óbitos pode subsidiar mudanças decisivas nas intervenções em saúde destinadas a otimizar o prognóstico dos recém-nascidos e evitar o desfecho desfavorável.5
As causas de óbito não claramente evitáveis e mal definidas também foram reduzidas após a investigação. Este achado reforça que a investigação dos óbitos por meio da execução das auditorias de mortalidade e autópsia verbal tem contribuído para a qualificação das informações sobre os eventos vitais.27-30
Como limitações do estudo, destacam-se a ausência de avaliação da confiabilidade da investigação e a perda amostral. Esta, embora tenha representado 10,3% dos óbitos elegíveis para investigação, não comprometeu a análise dos resultados encontrados.
A concordância da causa básica e da evitabilidade variou de razoável a moderada nos óbitos infantis, com melhor concordância em seu componente pós-neonatal. As principais mudanças foram observadas nas causas reduzíveis por adequada atenção à mulher na gestação. A vigilância do óbito infantil contribuiu para uma melhor especificação das causas básicas, redirecionando as causas intermediárias registradas nas DO e classificando corretamente a evitabilidade das mortes infantis. Essa estratégia favorece o fortalecimento do sistema de saúde, pela análise sistemática dos eventos que desencadearam a ocorrência do óbito; ela também permite a correção das informações vitais e a identificação de falhas na assistência à saúde, com vistas à evitabilidade de óbitos semelhantes e redução da mortalidade infantil. Para tanto, é necessário monitorar continuamente os dados produzidos com a investigação dos óbitos. Sugere-se a realização de estudos posteriores, com o objetivo de avaliar a confiabilidade das informações geradas pela vigilância do óbito infantil.