Introdução
A saúde bucal é um indicador-chave da saúde geral, bem-estar e qualidade de vida.1 Algumas desordens odontológicas vêm sendo consideradas problemas de Saúde Pública, uma vez que podem resultar em deficiências nutricionais, comprometimento da estética, fonação, mastigação e deglutição.2, 3 Ademais, desordens psicológicas, principalmente aquelas associadas à baixa autoestima, podem ser consequência de problemas relacionados à saúde bucal.3
Esforços voltados para a prevenção e promoção de saúde bucal têm-se apresentado como uma realidade mundial.4 Apesar de existir uma melhora significativa na saúde bucal de crianças e adolescentes, a prevalência de problemas dentários durante essa etapa de vida ainda é alta, majoritariamente em grupos desfavorecidos do ponto de vista econômico.4 No Brasil, em 2010, 60,8% das crianças aos 12 anos de idade apresentaram alguma necessidade de tratamento autorreferida; resultado semelhante foi observado para jovens entre 15 e 19 anos, dos quais aproximadamente 65% referiram necessitar de tratamento dentário.5
Crianças e adolescentes com algum problema odontológico podem apresentar desvantagens no desenvolvimento social, fisiológico e mental, comparados a indivíduos sem doenças bucais.6 Há evidências sugestivas de que indivíduos com doenças bucais são mais propensos a ausência em sala de aula devido à necessidade de visita ao dentista, além de demonstrarem maior dificuldade de concentração, prejudicando a aprendizagem na escola.7-11 Uma revisão sistemática com metanálise, recentemente publicada, junto a crianças e adolescentes entre 6 e 18 anos, observou que a doença ‘cárie’ e/ou a dor dentária estão associadas negativamente ao desempenho do aluno e a sua presença na escola.11
A literatura sobre o impacto dos problemas relacionados à saúde bucal no cotidiano escolar de crianças e adolescentes, em termos populacionais, ainda é escassa. Este estudo teve por objetivo analisar a associação entre dor dentária, uso de serviços odontológicos e absenteísmo escolar em adolescentes de 13 a 17 anos, participantes da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2015.
Métodos
Estudo com delineamento transversal, utilizando-se de dados secundários da PeNSE realizada no ano de 2015.12
A coleta dos dados ocorreu nos meses de abril a setembro de 2015, com duas amostras distintas: uma de escolares frequentando o 9º ano do ensino fundamental, para comparabilidade com edições anteriores da pesquisa; e a outra amostra com escolares de 13 a 17 anos de idade que estivessem frequentando do 6º ao 9º ano do ensino fundamental (antigas 5ª a 8ª séries) e da 1ª à 3ª série do ensino médio. Foram incluídos escolares que frequentavam regularmente instituições de ensino públicas e privadas, situadas nas zonas urbana e rural, nos 26 municípios das capitais e no Distrito Federal do Brasil.12, 13
A PeNSE 2015 abordou questões socioeconômicas, demográficas, de contexto escolar, de saúde geral e da saúde bucal.13 O absenteísmo escolar, variável dependente do estudo, foi definido como o número de dias de ausência às aulas por motivo de saúde, mensurado pela pergunta “Nos últimos 12 meses, quantos dias você faltou à escola por motivo(s) relacionado(s) à sua saúde?” e as seguintes opções de resposta: “Não faltei à escola nos últimos 12 meses por motivos de saúde”; ou “Faltei à escola algum dia nos últimos 12 meses por motivos de saúde”.
A raça/cor da pele foi coletada segundo a classificação proposta pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): branca; preta; parda, amarela; indígena - as categorias amarela e indígena foram consolidadas como ‘outras’. A região geográfica do país foi classificada segundo a divisão proposta pelo IBGE e adotada universalmente, de cinco grandes regiões nacionais - Norte; Nordeste; Sudeste; Sul; e Centro-Oeste. A escolaridade materna foi definida pela pergunta: “Qual nível de ensino (grau) sua mãe estudou ou estuda?” e as seguintes opções de resposta: “Minha mãe não estudou”; “Minha mãe começou o ensino fundamental ou 1º grau, mas não terminou”; “Minha mãe terminou o ensino fundamental ou 1º grau”; “Minha mãe começou o ensino médio ou 2º grau, mas não terminou”; “Minha mãe terminou o ensino médio ou 2º grau”; “Minha mãe começou a faculdade (ensino superior), mas não terminou”; ou “Minha mãe terminou a faculdade (ensino superior)”. A procura por serviços de saúde foi definida pela pergunta “Nos últimos 12 meses, você procurou algum serviço ou profissional de saúde para atendimento relacionado à própria saúde?” e as opções de respostas “Sim” ou “Não”.
Concernente à saúde bucal, foram utilizadas as variáveis ‘dor dentária’ e ‘uso de serviços odontológicos’. O relato de dor dentária nos últimos seis meses foi mensurado pela pergunta “Nos últimos seis meses, você teve dor de dente? (excluir dor de dente causada por uso de aparelho)?” e as opções de resposta “Sim” ou “Não”. O uso de serviços odontológicos foi definido pela pergunta “Nos últimos 12 meses, quantas vezes você foi ao dentista?” e as seguintes opões de resposta: “Nenhuma vez nos últimos 12 meses (0 vez)”; “Uma vez nos últimos 12 meses”; “Duas vezes nos últimos 12 meses”; ou “Três ou mais vezes nos últimos 12 meses”.
Como variáveis independentes, foram utilizadas as características demográficas e as socioeconômicas, a procura por serviços de saúde, o uso de serviços odontológicos e a dor dentária. Já as variáveis socioeconômicas e demográficas foram incluídas como potenciais variáveis de confusão (Figura 1).6, 11, 14, 15
A análise estatística dos dados foi realizada pelo programa Stata 15.0 (StataCorp, College Station, TX, Estados Unidos). As frequências absolutas e relativas e os intervalos de confiança de 95% (IC95%) da variável dependente ‘absenteísmo escolar por motivo de saúde’, assim como das variáveis independentes, foram verificados pelo teste do qui-quadrado de Pearson. Para analisar a associação das variáveis de saúde bucal com absenteísmo escolar por motivo de saúde, foi realizada a análise de regressão logística bruta e ajustada, estimando-se odds ratio (OR, razão de chances) e respectivos IC95%. O comando svy foi utilizado, considerando-se o efeito de delineamento.
Na análise ajustada, foram utilizadas variáveis de ajuste que podem confundir a associação entre a variável dependente (absenteísmo escolar) e as variáveis independentes relacionadas a saúde bucal (uso de serviços odontológicos; dor dentária). As variáveis de ajuste foram ‘sexo’, ‘raça/cor da pele’, ‘idade’, ‘escolaridade materna’ e ‘procura por serviços de saúde geral’. A relação foi estabelecida segundo modelo teórico, com dois níveis hierárquicos: (i) Características demográficas e socioeconômicas; (ii) Variáveis relacionadas à condição de saúde bucal e aos serviços de saúde geral e bucal (Figura 1), com base na literatura.6, 11, 14, 15As variáveis que obtiveram valor p menor que 0,20 na análise bruta foram incluídas na análise ajustada, permanecendo no modelo aquelas com valor p≤0,05.
A pesquisa foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, do Conselho Nacional de Saúde (CONEP/CNS): Parecer nº 1.006.467, emitido em 30 de março de 2015. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi apresentado na primeira página do smartphone utilizado para aplicação do questionário. Voluntariamente, os estudantes concordaram em participar do estudo, podendo desistir a qualquer momento sem qualquer prejuízo ou sanção. Não foi colhida a autorização dos responsáveis dos estudantes devido à autonomia do adolescente, garantida por lei: Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. As Secretarias de Estado e Municipais de Educação e a direção de cada escola, igualmente, autorizaram a realização da pesquisa.13
Resultados
Foram avaliados na PeNSE um total de 102.072 escolares do ensino fundamental e do ensino médio, de escolas públicas e privadas do Brasil, a maioria do sexo feminino (51,3% -IC95% 50,7;51,8) e com 14 anos de idade (51,0% - IC95% 50,5;51,6). Dos estudantes entrevistados, 43,1% (IC95% 43,5;43,6) autodeclararam-se de raça/cor da pele parda. A macrorregião nacional com maior proporção de estudantes respondentes foi o Sudeste (43,4% - IC95% 42,8;43,9). Aproximadamente 31% (IC95% 30,3;31,5) das mães dos estudantes pesquisados possuíam ensino médio completo (Tabela 1).
Características | N (%)a | IC95%b | Absenteísmo escolar: “Sim” | ||
---|---|---|---|---|---|
%a | IC95%b | p-valorc | |||
Sexo (n=102.072) | <0,001 | ||||
Masculino | 49.290 (48,7) | 48,2;49,3 | 50,2 | 49,4;51,0 | |
Feminino | 52.782 (51,3) | 50,7;51,8 | 57,1 | 56,3;57,8 | |
Idade, em anos (n=102.072) | <0,001 | ||||
≤13 | 17.260 (18,2) | 17,8;18,7 | 56,2 | 54,8;57,6 | |
14 | 51.611 (51,0) | 50,5;51,6 | 55,2 | 54,4;55,9 | |
15 | 20.864 (19,8) | 19,4;20,2 | 50,9 | 49,7;52,1 | |
≥16 | 12.337 (11,0) | 10,7-11,3 | 48,0 | 46,5;49,5 | |
Raça/cor da pele (n=101.964) | <0,001 | ||||
Branca | 33.775 (36,2) | 35,6;36,7 | 56,5 | 55,6;57,5 | |
Preta | 12.849 (13,4) | 13,0;13,8 | 47,5 | 45,9;49,0 | |
Parda | 46.935 (43,1) | 43,5;43,6 | 53,6 | 52,8;54,4 | |
Outras | 8.405 (7,4) | 7,1;7,7 | 52,2 | 50,4;54,2 | |
Macrorregiões do país (n=102.072) | <0,001 | ||||
Norte | 23.937 (9,6) | 9,4;9,8 | 45,1 | 44,1;46,1 | |
Nordeste | 36.334 (27,7) | 27,3;28,1 | 49,5 | 48,8;50,3 | |
Sudeste | 17.772 (43,4) | 42,8;43,9 | 58,6 | 57,5;59,7 | |
Sul | 9.850 (11,9) | 11,6;12,2 | 52,8 | 51,5;54,1 | |
Centro-Oeste | 14.179 (7,5) | 7,3;7,6 | 53,5 | 52,5;54,5 | |
Escolaridade materna (n=76.638) | <0,001 | ||||
Nenhuma escolaridade | 5.531 (7,4) | 7,1;7,7 | 47,3 | 45,2;49,5 | |
Ensino fundamental incompleto | 18.217 (26,5) | 25,9;27,1 | 52,9 | 51,7;54,2 | |
Ensino fundamental completo | 12.299 (17,3) | 16,6;17,6 | 54,8 | 53,2;56,3 | |
Ensino médio completo | 23.359 (30,9) | 30,3;31,5 | 57,5 | 56,4;58,7 | |
Ensino superior completo | 17.232 (18,1) | 17,7;18,6 | 60,5 | 59,1;61,9 | |
Procura por serviços de saúde nos últimos 12 meses (n=100.992) | <0,001 | ||||
Não | 44.681 (44,7) | 44,1;45,2 | 38,8 | 38,0;39,7 | |
Sim | 56.311 (55,3) | 54,8;55,9 | 65,8 | 65,1;66,5 | |
Uso de serviços odontológicos nos últimos 12 meses (n=101.411) | <0,001 | ||||
Nenhuma vez | 30.319 (30,3) | 29,8;30,8 | 46,9 | 45,9;47,9 | |
Uma vez | 17.645 (17,2) | 16,8;17,6 | 53,4 | 52,1;54,7 | |
Duas vezes | 16.424 (15,4) | 14,9;15,8 | 57,4 | 56,0;58,7 | |
Três vezes ou mais | 37.023 (37,1) | 36,6;37,7 | 57,9 | 56,9;58,8 | |
Dor de dente nos últimos seis meses (n=91.547) | <0,001 | ||||
Não | 70.605 (76,6) | 76,1;77,1 | 51,4 | 50,7;52,1 | |
Sim | 20.942 (23,4) | 22,9;23,9 | 60,0 | 58,8;61,2 | |
Absenteísmo escolar por motivo de saúde (n=101.015) | |||||
Não | 48.576 (46,3) | 45,7;46,8 | - | - | |
Sim | 52.439 (53,7) | 53,2;54,3 | - | - |
Notas: a) Estimativa corrigida para peso amostral e efeito de delineamento; b) IC95%: intervalo de confiança de 95%; c)Teste do qui-quadrado de Pearson.
Sobre as variáveis referentes à saúde dos escolares, 55,3% (IC95% 54,8;55,9) procuraram por serviços de saúde no último ano (últimos 12 meses), e 37,1% (IC95% 36,6;37,7) responderam terem usado serviços odontológicos três vezes ou mais, no mesmo período. A prevalência de dor dentária nos últimos seis meses, na população estudada, foi de 23,4% (IC95% 22,9;23,9). Ainda, quando foi perguntado ao estudante se havia faltado algum dia à aula por motivo de saúde, 53,7% (IC95% 53,2;54,3) responderam “Sim”.
De acordo com os resultados descritos na Tabela 1, a prevalência de absenteísmo escolar foi maior em estudantes que apresentaram dor dentária nos últimos seis meses (60,0% - IC95% 58,8;61,2). Ao se comparar as prevalências de absenteísmo escolar com o uso dos serviços odontológicos, observou-se um crescendo na prevalência de absenteísmo à medida que aumentou o número de consultas nos últimos 12 meses. A diferença das prevalências de absenteísmo escolar entre aqueles com três consultas odontológicas ou mais nos últimos 12 meses (57,9% - IC95% 56,9;58,8) e os que não foram ao dentista (46,9% - IC95% 45,9;47,9) foi de aproximadamente 10 pontos percentuais. As variáveis ‘escolaridade materna’, ‘uso de serviços odontológicos’ e ‘idade’ (esta, inversamente) apresentaram associação linear com o absenteísmo escolar, sendo o teste de tendência linear significativo para as três (p<0,001).
Variáveis | Absenteísmo escolar por motivo de saúde | |
---|---|---|
ORa bruta (IC95%b) | ORa ajustadac (IC95%b) | |
Uso de serviços odontológicos nos últimos 12 meses (n=100.818) | ||
Não | Referência | Referência |
Uma vez | 1,29 (1,21;1,38) | 1,09 (1,01;1,18) |
Duas vezes | 1,52 (1,42;1,63) | 1,22 (1,12;1,33) |
Três vezes ou mais | 1,55 (1,47;1,64) | 1,12 (1,04;1,19) |
Dor de dente nos últimos seis meses (n=91.015) | ||
Não | Referência | Referência |
Sim | 1,42 (1,34;1,50) | 1,35 (1,26;1,45) |
Notas: a) OR: odds ratio (razão de chances); b) IC95%: intervalo de confiança de 95%; c) OR ajustada para sexo, idade, raça/cor da pele, escolaridade materna e procura por serviços de saúde.
Na Tabela 2, são apresentadas as associações de dor dentária e uso de serviços odontológicos com o absenteísmo escolar por motivo de saúde. Após ajuste para as variáveis socioeconômicas e de procura por serviços de saúde geral, observou-se aumento na ocorrência de absenteísmo escolar conforme foi maior o número de consultas odontológicas para crianças e adolescentes. Os escolares que usaram serviços odontológicos por três vezes ou mais no último ano apresentaram 12% maior odds ratio de faltar às aulas (OR=1,12 - IC95% 1,04;1,19) quando comparados aos escolares que não usaram serviços odontológicos no mesmo período; e escolares que apresentaram dor dentária nos últimos seis meses tiveram odds ratio 35% maior de faltar às aulas (OR=1,35 - IC95% 1,26;1,45), comparados àqueles que não relataram dor dentária.
Discussão
O presente estudo encontrou associação do absenteísmo escolar por motivo de saúde com a ocorrência de dor dentária e o uso de serviços odontológicos no último ano. Quando analisada a frequência de uso de serviços odontológicos, a força da associação foi maior entre os que consultaram esses serviços mais de uma vez nos últimos 12 meses, em relação aos que os buscaram uma única vez, sendo o grupo de referência aqueles que relataram não ter ido ao dentista no último ano. Estes resultados podem representar, entre essa população, maior busca de atendimento odontológico com a finalidade de solucionar e tratar problemas bucais, do que para sua prevenção.
O absenteísmo escolar é caracterizado pela ausência não justificada do estudante na escola. Ele pode decorrer de problemas bucais, capazes de impactar negativamente a qualidade de vida relacionada à saúde bucal e o desenvolvimento de atividades cotidianas, a exemplo da presença em sala de aula.16 Os resultados sugerem a existência de uma associação de aspectos relacionados à saúde bucal, como o uso de serviços odontológicos e a ocorrência de dor dentária, com o absenteísmo escolar em adolescentes brasileiros. Provavelmente, isso ocorre devido à característica, muitas vezes incapacitante, da dor dentária, e à necessidade de buscar os serviços de saúde bucal. A dor dentária, apesar de depender da capacidade de percepção do indivíduo, pode vir a produzir um incômodo em diferentes graus de intensidade, a ponto de afetar as atividades cotidianas e relações sociais.17-19
A relação entre a saúde bucal e o absenteísmo e performance escolar apoia-se em algumas teorias, desde a falta de concentração do estudante em sala de aula, dada sua insatisfação com a condição bucal, até a ausência na escola, decorrente da limitação gerada pela dor dentária ou necessidade de visita ao dentista em horário coincidente com o escolar.20, 21Sabe-se que a dor de dente é uma das consequências da cárie dentária, uma doença multifatorial, dependente de dieta e hábitos adequados de higiene bucal, logo passível de prevenção.22 Nesse contexto, a escola poderia atuar como um ambiente adequado a esse papel, contribuindo para a prevenção de doenças bucais e do absenteísmo, e, consequentemente, para a melhora tanto da saúde bucal quanto da frequência e desempenho escolar.
Os achados desta análise concordam com os de estudos recentes,6, 8, 11, 23, 24 que apontam para o impacto negativo de uma saúde bucal ruim, não só no absenteísmo como no desempenho escolar dos jovens.11 O absenteísmo escolar crônico, muitas vezes, está relacionado a problemas persistentes de saúde, sendo por isso considerado como um possível indicador do desempenho escolar. Entretanto, faltas repetidas à escola não puderam ser avaliadas neste estudo.25 A associação entre dor dentária e absenteísmo escolar nos adolescentes indica que os escolares com comprometimento da saúde bucal enfrentam barreiras consideráveis, capazes de contribuir para as faltas na escola, dificuldade de atenção e, por conseguinte, influenciar em seu desempenho.11 No Brasil, ainda existem regiões com indicadores expressivos de necessidade de tratamento odontológico em crianças e adolescentes,5 além da alta prevalência de dor dentária,17 situações que podem representar um impacto na frequência escolar ou na performance e aprendizado desses indivíduos.
A análise dos achados, especialmente sobre os adolescentes que usaram serviços odontológicos e experimentaram a dor dentária terem apresentado uma maior chance de faltar às aulas, coincide com as associações encontradas em adolescentes de diferentes países,9, 15 reforçando a provável relação entre saúde bucal e frequência escolar. Contudo, é importante ressaltar que fatores de risco associados, seja à saúde bucal, seja à ausência em sala de aula, e a direção dessa associação, não estão totalmente esclarecidos. Determinantes sociais, ambientais e psicológicos também estão relacionados às condições bucais e ao absenteísmo escolar.9 É mister ressaltar que, devido à dificuldade de controle na análise desses determinantes, não se pode descartar a existência de confundimento residual. Sendo assim, dados secundários, como os utilizados nesta pesquisa, suscitam hipóteses e apontam a necessidade de novas pesquisas, o desenvolvimento de mais estudos prospectivos, com adequada metodologia, para uma avaliação mais consistente dessa associação.9
Quanto às limitações do presente estudo, cita-se a impossibilidade de mensurar se a utilização dos serviços odontológicos aconteceu por motivos relacionados a prevenção ou tratamento; porém, o absenteísmo por motivo odontológico, mesmo que motivado pela prevenção, poderia implicar, ainda que em menores proporções, prejuízo no desempenho escolar, devido à perda do conteúdo didático. Além disso, foi realizada análise ajustada para evitar confundimento quanto ao absenteísmo pelo uso de outros serviços de saúde que não o odontológico. Em relação aos pontos fortes da pesquisa, os dados analisados são de base populacional, colhidos nas capitais dos estados e no Distrito Federal, nas cinco macrorregiões brasileiras, de alunos pertencentes a escolas públicas e privadas, sob diferentes condições de vida, o que permite uma maior representatividade amostral.
Conclui-se que os problemas odontológicos em adolescentes podem aumentar a chance de absenteísmo escolar. Quando o absenteísmo escolar decorre do uso de serviços odontológicos, ele pode estar a indicar a necessidade de agendamento das consultas odontológicas nas unidades básicas de saúde (UBS) em horário diverso do ocupado pela carga horária escolar, visando prevenir tanto danos à saúde bucal quanto ao aprendizado desses estudantes. Porém, não se pode comprometer a universalidade do serviço odontológico público com essa demanda específica. Embora esforços sejam feitos para a promoção e proteção da saúde bucal, os resultados do estudo podem contribuir como indicadores da necessidade do desenvolvimento de políticas públicas voltadas a escolares, visando reduzir o impacto de problemas bucais nas faltas à escola e, consequentemente, no desempenho acadêmico.