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Revista Paraense de Medicina

Print version ISSN 0101-5907

Rev. Para. Med. vol.20 no.3 Belém Sept. 2006

 

RELATO DE CASO

 

Carcinoma de células escamosas microinvasivo – relato de caso1

 

Squamous cells microinvasive carcinoma - case report

 

 

Roberto de CarvalhoI; Caroline Galvão LeiteII; David Ricardo da Silva PereiraII; Edna Ramalho de SouzaII; Sueleny do Socorro Lopes da SilvaII

IProf. Assistente da disciplina Tocoginecologia da UFPA-Setor de Colposcopia
IIGraduandos de Medicina da UFPA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: relatar um caso de carcinoma de células escamosas microinvasivo em uma paciente de 69 anos, demonstrando a elucidação diagnóstica e a importância dos métodos preventivos.
RELATO DO CASO: paciente G9 P6N A3, encaminhada ao Ambulatório de Patologia Cervical e Colposcopia da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará (FSCM), devido sangramento vaginal vermelho rutilante, há 7 meses, e citologia evidenciando alteração de células escamosas sugestiva de carcinoma invasivo. Ao exame colposcópico, observaram-se aspectos anormais: zona de transformação atípica com epitélio branco grosseiro e vasos atípicos irregulares, Schiller positivo, prova do iodo negativa. O resultado histopatológico da biópsia dirigida por colposcopia foi - carcinoma de células escamosas microinvasor -, concordando com o exame citológico.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: o exame citológico ou Papanicolau, a colposcopia e a biópsia com exame histopatológico constituem importantes métodos preventivos para neoplasia cervical, conforme comprovado neste estudo.

Descritores: câncer de colo uterino; papanicolau; carcinoma microinvasor.


SUMMARY

OBJECTIVE: report a case of squamous cells microinvasive carcinoma in a patient of 69 years, demonstrating the diagnostic elucidation and the importance of the preventive methods.
CASE REPORT: patient G9 P6N A3, directed to FSCM-PA´s Cervical Pathology and Colposcopic clinic due to a 7 months iridescent vaginal bleeding and cytology evidencing squamous cells alteration suggestive of invasive carcinoma. In colposcopic examination one observed abnormal aspects: atypical transformation zone with thick white epithelium and irregular atypical vessels, positive Schiller, negative iodine test. The histopatological results of the directed biopsia for colposcopia was flaky cells microinvasive carcinoma, according to the cytological examination.
FINAL CONSIDERATIONS: the cytological examination or Papanicolau, the colposcopy, and the histopatological results of the directed biopsia is an important preventive method for cervical neoplasia.

Key-words: uterine colo cancer; papanicolau; squamous cell carcinoma.


 

 

INTRODUÇÃO

O câncer de colo de útero representa uma das neoplasias mais freqüentes no sexo feminino, especialmente, nos países em desenvolvimento, com significativas taxas de mortalidade e constituindo um verdadeiro problema de Saúde Pública3,9,14,15.

A descoberta de cânceres iniciais e de condições pré-cancerosas é de grande importância, pois, torna-se evidente que grande parte dos tumores invasivos é curada pela ressecção precoce e pelo tratamento eficaz; mais importante, ainda, é que muitas pacientes com condições pré-cancerosas têm essas lesões erradicadas, oportunamente, por um tratamento adequado. Essa melhora dramática é explicada em grande parte pela eficácia do teste citológico de Papanicolaou na detecção de pré-cânceres cervicais e ao fácil acesso ao colo uterino para colposcopia e biópsia4.

A doença se inicia em idade precoce e tem evolução lenta, estimando-se que o tempo entre a lesão inicial e a fase clinicamente detectável é de 15,6 anos12.

O carcinoma invasor do colo uterino é quase sempre assintomático nas formas inicial e pré-invasiva, com episódios de perda de sangue ao coito. Define-se carcinoma microinvasor aquele que invade o estroma de forma precoce, originando-se ao nível da junção escamo-colunar, no canal endocervical ou no orifício externo cervical. A evolução das lesões precursoras (NIC II / III; SIL-alto grau) para o carcinoma é de 20 anos aproximadamente7. O prognóstico depende da presença de metástase glanglionares7.

Nas fases de invasão franca, a perda de sangue induzida ou espontânea é o sinal mais sugestivo e o corrimento aquoso, fétido, comumente de cor rósea é constante13.

Com relação aos agentes sexualmente transmissíveis, o HPV é considerado, atualmente, um importante fator na oncogênese cervical, porém outros cocarcinogênios, o estado imunológico do indivíduo, a nutrição e inúmeros outros fatores ditam se a infecção pelo HPV continua subclínica (latente), transforma-se em um pré-câncer ou acaba progredindo para um câncer4.

No diagnóstico do pré-câncer cervical, a citologia, colposcopia e patologia estão interligados e são complementares. Quando usados em associação, a acurácia fica próxima de 100%. O emprego isolado desses exames implica em margem de erro ao redor de 10 a 15%12,18.

Os procedimentos empregados em exames de prevenção são variáveis: quando se deseja rastrear uma população, procede-se à anamnese dirigida e citologia oncótica; se o objetivo for aclarar citologias suspeitas ou positivas executa-se o exame ginecológico, propriamente dito, e a colposcopia, seguida de biópsia dirigida e avaliação anatomopatológica10

Sobre o carcinoma microinvasivo, a FIGO aprovou uma modificação no estádio I, em 1994, em que o estádio Ia1 inclui lesões com profundidade máxima de 3 cm e o estádio Ia2 agrupa neoplasias com mais de 3 e menos de 5 cm de profundidade. A principal característica desse grupo é o rompimento da membrana basal e a penetração no cório conjuntivo. O carcinoma microinvasivo deve ser diagnosticado somente em biópsias representativas que contenham toda a lesão ou, preferencialmente, em peça oriunda de conização cervical 12,13. Na avaliação histopatológica das peças de cirurgias de conização, pode ser encontrada doença invasora ou microinvasora não diagnosticada na biópsia em mais de 10% dos casos19,20.

 

OBJETIVO

Relatar um caso de carcinoma de células escamosas microinvasivo em uma paciente de 69 anos, demonstrando a elucidação diagnóstica e a importância dos métodos preventivos.

 

RELATO DE CASO

Identificação

MLFC, sexo feminino, 69 anos, casada, paraense, atendida no Ambulatório de Patologia Cervical e Colposcopia da FSCMP.

Queixa principal

Sangramento vaginal

Historia da doença atual

Paciente refere sangramento vaginal há cerca de 7 meses, de intensidade moderada, de aspecto vermelho rutilante e, por vezes, misturado a um liquido branco (sic), e dor no baixo ventre de grande intensidade.

Antecedentes ginecológicos, obstétricos e cirúrgicos Menarca aos 15 anos; coitarca aos 23 anos; parceiros sexuais, 3; menopausada há 23 anos; não soube referir antecedente de DST. Não realizou terapia de reposição hormonal, cauterização, nem curetagem. História de dispareunia, sinorragia e corrimento sanguinolento, G9 P6N A3.

Antecedentes pessoais e familiares

Paciente hipertensa, com história familiar de câncer de mama.

Exame especular

Colo ectopiado e sangrante, com conteúdo vaginal sanguinolento.

Conduta no momento da admissão

Paciente foi submetida a PCCU e encaminhada para a realização de colposcopia e biópsia dirigida, com fragmento encaminhado para análise histopatológica.

PCCU

Citologia no 06/0391, estudo 1396, data da colheita 31/01/06, realizado pela Dra Terezinha Carvalho: - alteração de células escamosas, (carcinoma?); esfregaço exibindo hemorragia, necrose, solinqueratose, intensa degeneração e células escamosas atípicas.

Colposcopia

Data 01/02/2006, registro No 06/524, médico responsável Dro Roberto de Carvalho : - aspectos colposcópicos anormais; zona de transformação atípica com epitélio branco grosseiro e vasos atípicos, irregulares, caóticos -. Teste de Schiller positivo, prova do iodo negativo.

Biópsia

Data 10/02/06, Registro: No 004-0003270/C- 250519, realizada pela Dra Vanda Arnaud. Diagnóstico: - Carcinoma de células escamosas microinvasor.

 

DISCUSSÃO

Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA) e Ministério da Saúde, o câncer de colo de útero ocupa o terceiro lugar em incidência e o quarto lugar em mortalidade. As regiões que apresentam maior número de casos são: Norte (22/100.000), Nordeste (17/ 100.000) e Centro-Oeste (21/100.000) . Belém e Goiânia são os locais de maior incidência dessa neoplasia2 .

Para o ano de 2006, estima-se a ocorrência de 19.260 novos casos de câncer do colo do útero, sendo que se torna relevante na faixa etária de 20 e 29 anos, atingindo o seu pico entre 45 e 49 anos 2.

No caso clínico descrito, concordando, parcialmente, com a faixa etária mais atingida, tem-se a idade de 69 anos, o que supõe que a infecção tenha ocorrido em idade mais precoce.

Sabe-se que este tipo de câncer é, em princípio, uma doença evitável, uma vez que apresenta evolução lenta, com longo período entre o aparecimento das lesões precursoras e o seu desenvolvimento; estimase que este tempo seja, em média, de 15,6 anos5,11,14,16. Devido este longo período de evolução, é possível o diagnóstico em uma fase inicial da lesão, até mesmo em mulheres assintomáticas, quando o tratamento possui baixo custo e apresenta altas taxas de cura, permitindo alterar o quadro epidemiológico da doença11,16.

O Papilomavírus continua sendo um importante agente causal deste câncer ,estando os fatores de riscos relacionados ao número de parceiros e iniciação sexual precoce. Outros fatores sugeridos na etiopatogenia do câncer cervical seriam o uso de anticoncepcionais orais, multiparidade, DSTs (HSV-2, Chamydia trachomatis, outros), tabagismo, exposição ao HIV e imunossupressão6.

Entretanto, cerca de 15% dos tumores malígnos cervicais não estão envolvidos com o HPV, indicando outros modos de desenvolvimento, incluindo mutações genéticas no hospedeiro4 .

Durante a anamnese e exame físico da referida paciente não foram identificados achados clínicos sugestivos de infecção por HPV.

Muitas mulheres são assintomáticas e só descobrem a doença através do preventivo. Sangramento vaginal, sangramento pós-coito, corrimento vaginal e dor pélvica pode ocorrer em mulheres com doença invasiva. A doença avançada apresenta-se com sinais e sintomas de envolvimento pélvico local, que incluem edema de perna e dor no dorso e membro inferior8.

Uma das estratégias mais bem sucedidas para a prevenção de câncer de colo de útero é a realização do exame citológico de Papanicolaou, sendo um método de baixo custo, simples e de fácil execução, permitindo o rastreamento ou screening das lesões em fases iniciais5,11,14,16. O êxito no rastreamento do câncer de colo uterino e de suas lesões precursoras está relacionado a acuidade diagnóstica do exame colpocitológico5,6.

Os procedimentos empregados em exames de prevenção são variáveis: quando se deseja rastrear uma população, procede-se à anamnese dirigida e citologia oncótica; se o objetivo for aclarar citologias suspeitas ou positivas executa-se o exame ginecológico propriamente dito e a colposcopia, seguida de biópsia dirigida e avaliação anatomopatológica17.

Concordando com os estudos de Ribalta e FOCCHI, para a elucidação diagnóstica do caso foi realizado, inicialmente, o PCCU, sendo encontrado esfregaço exibindo hemorragia, necrose, soliqueratose, intensa degeneração e células escamosas atípicas.

Histologicamente, existem 2 tipos de neoplasia do colo uterino: o epidermóide que surge ao nível da junção escamo-colunar e o adenocarcinoma que surge no epitélio glandular da endocérvix, sendo o primeiro mais freqüente (numa relação de 20:1). Devido a sua localização, o epidermóide apresenta maior facilidade de diagnóstico através dos métodos citopatológocos e colposcópicos1.

Neste estudo, o exame histopatológico conclui presença de carcinoma de células escamosas microinvasivo, concordando com a maior incidência deste tipo de neoplasia levantada na literatura.

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Roberto de Carvalho Av. Serzedelo Correa, 354
Belém, PA
Fone: 99810060

Recebido em 20.03.2006
Aprovado em 21.06.2006

 

 

1Trabalho realizado no ambulatório do DAMI-II da Universidade Federal do Pará