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Revista Paraense de Medicina

versão impressa ISSN 0101-5907

Rev. Para. Med. v.21 n.2 Belém jun. 2007

 

RELATO DE CASO

 

Fasciíte nodular em região cervical1 - relato de caso

 

Nodular fasciitis in the neck - case report

 

 

Alexandre RobertiI; Maria do Rosário Ferraz RobertiII; Siderley de Souza CarneiroIII; Abrão rapoportIV; Rogério Aparecido DedivitisV

IMestre pelo Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, HOSPHEL, São Paulo; Professor da Disciplina de Práticas Integradoras II da Universidade Federal de Goiás
II
Doutora em Hematologia pela Universidade de São Paulo; Médica do Departamento de Hematologia do Hospital Geral de Goiânia; Professora da Disciplina de Práticas Integradoras I da Universidade Federal de Goiás
IIIMestre em Ciências da Saúde pelo Instituto de Patologias Tropicais e Professor Assistente da Disciplina de Anatomia Patológica da Universidade Federal de Goiás
IVDocente Livre pelo Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, HOSPHEL, São Paulo
V
Doutor em Medicina pelo Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina; Docente do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, HOSPHEL, São Paulo Instituição: Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis, HOSPHEL, São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: a fasciíte nodular é um processo reacional benigno que ocorre em decorrência da proliferação miofibroblástica, de etiologia desconhecida. É um tumor solitário, indolor e de crescimento rápido. O diagnóstico, geralmente, é um desafio, pois pode ser confundido com tumores malignos, devido o seu comportamento clínico agressivo associado aos achados histológicos. É uma doença auto-limitada e o diagnóstico adequado é essencial para evitar tratamentos agressivos desnecessários. Localiza-se, preferencialmente, nas extremidades superiores e no tronco, sendo a cabeça e pescoço menos acometidos. A maioria dos casos origina-se nos tecidos moles, como fascia, músculos e tecido subcutâneo. O tratamento de escolha é a exérese cirúrgica.
OBJETIVO: relatar o caso de uma paciente com apresentação não usual dessa doença, como seja, na região cervical.

Descritores: fasciite; cirurgia, imunoistoquímica.


SUMMARY

INTRODUCTION: nodular fasciitis is a benign reactive myofibroblastic proliferative process of unknown etiology. It presents as a solitary painless nodule with rapid growing. The condition is self-limited, and the proper diagnosis is essential in order to avoid unnecessary aggressive treatment. The diagnosis is often a challenge because it may be confused with a malignant tumor due to its aggressive clinical behavior and histological features. Although most commonly located on the upper extremities and the trunk, in the head and neck region it occurs less frequently. The majority of cases arise in the soft tissue, i.e. fascia, muscle, or subcutaneous tissue. The treatment of choice is the surgical excision.
OBJECTIVE: it is described a case report of a 42-year-old woman with an unusual presentation of that illness.

Key words: fasciitis, surgery, immunohistochemistry.


 

 

INTRODUÇÃO

A fasciíte nodular (FN) é uma condição benigna, usualmente auto-limitada, que ocorre em decorrência da proliferação miofibroblástica. Os sítios anatômicos preferenciais são as extremidades superiores, tronco e região da cabeça e pescoço de adultos jovens. A FN geralmente se origina no tecido subcutâneo, podendo, também, ocorrer em musculatura esquelética. Raramente é observada na derme ou no espaço intravascular. O surgimento intra-articular também não é comum e pode levar a erro diagnóstico 1.

 

RELATO DO CASO

Anamnese

U’a mulher de 42 anos procurou o serviço de atendimento especializado em cirurgia de cabeça e pescoço com queixa de abaulamento cervical há 60 dias. Apresentava uma lesão nodular cervical de nível I à esquerda, de crescimento rápido, indolor, negando trauma na região. Referia, há 15 dias, um episódio de sinusite maxilar homolateral.

Exame físico

Apresentava lesão nodular cervical, palpável, em nível I à esquerda, de 2,5cm de diâmetro, endurecida, indolor e não aderida aos planos profundos, tendo sido formulada hipótese clínica de linfadenomegalia, confirmada pela ultra-sonografia. A paciente foi submetida à exérese do nódulo.

Histopatologia

Lesão composta por células fusiformes sem atipias nucleares, dispostas em várias direções em estroma edematoso e áreas com deposição de colágeno, áreas microcísticas com infiltrado inflamatório discreto e extravasamento de hemácias. Algumas figuras de mitose foram observadas e margens livres.

Estudo imunoistoquímico

O estudo imunoistoquímico revelou positividade para calponina e, em raras células, positividade para actina muscular e negatividade para CD-34, desmina, proteína S-100 e citoceratinas.

Evolução

A paciente encontra-se sem evidencias de recidiva após 12 meses.

 

DISCUSSÃO

A fasciíte nodular (FN) foi descrita por Konwaler et al., em 1955, como uma condição benigna caracterizada pela proliferação de fibroblastos e que, freqüentemente, é confundida com sarcomas, devido a seu rápido crescimento, rica celularidade e alta atividade mitótica2. Os termos fasciíte proliferativa, fasciíte pseudosarcomatosa, infiltrativa e nodular têm sido usados para descreverem este tumor de tecido fibroso3.

Acomete adultos jovens, entre 20 a 35 anos, ocorrendo, igualmente, em ambos os gêneros3,4. De 80 a 90% dos casos de cabeça e pescoço ocorrem na infância3. Em 43% dos casos, as lesões ocorrem em extremidades superiores, seguido do tronco em 25%, extremidades inferiores em 22% e cabeça e pescoço em 10%4,5. Nos adultos, a região da cabeça e do pescoço é acometida entre 10 a 20% dos casos, principalmente na face ou região cervical, como na paciente descrita. Outros locais menos acometidos incluem crânio, órbita, glândula parótida, conjuntiva e mucosa oral6.

A maioria dos pacientes queixa-se de tumor de crescimento rápido, em geral, há uma ou duas semanas, fato observado no caso relatado. Embora as lesões sejam bem delimitadas, elas não são encapsuladas e podem estender-se a outros tecidos, em geral ao longo do plano da fascia2. São lesões não ulceradas, amolecidas, indolores, solitárias e de crescimento rápido, sem processo inflamatório associado em 50% dos casos2,3,4,5. Em 10 a 15% dos casos, há história prévia de traumatismo na região2,4,5.

As lesões apresentam-se homogêneas e o diagnóstico de fasciíte nodular não pode ser firmado apenas com os achados radiológicos, devido à inespecificidade dos mesmos2,6. A ultra-sonografia comumente mostra massa sólida, hipoecogênica, com margens bem definidas e, em alguns casos, com sombra acústica posterior. À tomografia computadorizada, pode se observar aumento de densidade e comportamento agressivo com destruição óssea. À ressonância magnética, a intensidade do sinal varia conforme o predomínio da natureza mixóide ou celular da lesão7,8. No caso citado, a ultrasonografia descreveu a lesão como uma adenomegalia. Considerando apenas os aspectos radiológicos, as hipóteses diagnósticas formuladas incluem neuroma, neurofibroma, sarcoidose, fibromatose agressiva, dermatofibroma, fibrosarcoma e fibro-histiocitoma maligno5.

Existem várias classificações da FN baseadas em aspectos anatômicos: (I) forma subcutânea, com nódulo arredondado ou oval localizada no tecido subcutâneo; (II) forma intramuscular, que tem formato maior e mais ovóide; e (III) forma fascial, que se dissemina entre a fascia superficial e o septo inter-lobular da gordura subcutânea, sendo esta última a da paciente citada. Nos casos onde há disseminação da lesão pela fáscia, ocorre proliferação celular, com espessamento da mesma e seu rompimento, com padrão infiltrativo. O tecido subcutâneo e a gordura ao redor estão comprometidos. Embora as lesões possam ocasionalmente surgir em estruturas fibrosas rodeando vasos e nervos, a grande maioria dos casos origina-se na fascia superficial3. Todos os casos consistem no aparecimento de fibroblastos com aspectos imaturos que variam pouco em tamanho e formato. O núcleo é oval e pálido, tipicamente vesiculoso e com nucléolo proeminente. Uma a duas figuras de mitose são vistas em campo de maior aumento, mas nenhuma hipercromasia nuclear ou pleomorfismo são evidenciados, devendo descartar-se malignidade4. Os fibroblastos são arranjados em pequenos feixes celulares entremeados por estroma mixóide. Células gigantes osteoclasto-símile podem estar presentes, assim como um infiltrado de linfócitos e extravasamento de eritrócitos, sem depósito de hemossiderina2,3,4.

Como a lesão é composta por fibroblastos e miofibroblastos, a imunoistoquímica é importante como critério de exclusão para outros processos patológicos que expressem antígenos que não são encontrados nessas células. Tipicamente, as células exibem positividade para actina músculo-específica e actina de músculo liso, além do CD683,9. Nesta paciente, o exame imunoistoquímico revelou positividade para calponina e, em raras células, para actina muscular, que associados aos achados histopatológicos, confirmaram o diagnóstico de FN.

O diagnóstico diferencial de FN irá depender, em parte, da localização da lesão. Quando esta é encontrada nas extremidades, a FN poderá ser confundida com tumores de tecidos moles, tais como: fibroma, lipoma, tumor desmóide, sarcoma, condroma, mixoma, histiocitoma fibroso maligno, schwanoma. Quando a lesão é encontrada na cabeça e no pescoço, fibroxantoma e tumores da parótida devem ser também considerados. O diagnóstico diferencial com outros tumores de células fusiformes, inclui entre as condições benignas: fibromatose, miofibroma, fibroma, mixoma, neurofibroma, leiomioma e neurilemoma3. Os processos malignos que merecem destaque são: fibrosarcoma, histiocitoma fibroso maligno, mixofibrossarcoma, rabdomiossarcoma, lipossarcoma e angiossarcoma2,3.

As causas de FN são desconhecidas, porém, presume-se que a proliferação fibroblástica seja desencadeada por um trauma local ou por um processo inflamatório localizado4. Análise citogenética das células tumorais demonstraram clonalidade envolvendo os cromossomos 3, particularmente a região 3q2110 e o cromossomo 1511. Alterações numéricas podem estar presentes em células normais, porém, rearranjamento cromossômico clonal é indicativo de processo neoplásico ou pré-neoplásico11.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tratamento cirúrgico é a terapêutica de escolha3, com uma taxa de recorrência que varia de 1 a 10%, provavelmente resultante de ressecção incompleta3,4,5. Regressão espontânea também tem sido observada. Nesta paciente, o tratamento escolhido foi a exérese cirúrgica completa da lesão, sem necessidade de tratamento complementar. Há relatos de remissão completa da lesão com a corticoterapia intra-lesional

 

REFERÊNCIAS

1. HORNICK JL, FLETCHER CD. Intraarticular Nodular Fasciitis - A Rare Lesion: Clinicopathologic Analysis of a Series. Am J Surg Pathol 2006;30(2):237-241.

2. ASKIN FB, WESTRA WH. Pathology Quiz case 2: Diagnosis. Arch Otolaryngol Head Neck Surg 2005;131(12):1123-24.

3. THOMPSON LDR. Nodular Fasciitis. Ear Nose Throat J 2002;81(12):830.

4. GELFAND JM, MIRZA N, KANTOR JBS, YU G, REALE D, BONDI E, et al. Nodular Fasciitis. Arch Dermatol 2001;137(6):719-21.

5. LEUNG LYJ, SHU SJ, CHAN ACL, CHAN MK, CHAN CHS. Nodular Fasciitis: MRI appearance and literature review. Skeletal Radiol 2002;31(1):9-13.

6. YOSKOVITCH A, HIER M, BEGIN LR, BLACK M. Diagnosis Pathologic Quiz Case 1: Pathologic Diagnosis: Nodular fasciitis (NF). Arch Otolaryngol Head Neck Surg 1998;124(8):926-28.

7. SHIN JH, LEE HK, CHO K, HAN MH, NA DG, CHOI CG. Nodular fasciitis of the head and neck radiologic findings. Clin Imaging 2003;27:31-7.

8. WANG XL, DE SCHEPPER AMA, VANHOENACKER F, DE RAEVE H, GIELEN J, APARISI F, et al. Nodular fasciitis: correlation of MRI findings and histopathology. Skeletal Radiol 2002;31(1):155-161.

9. PEREZ-Montiel MD, PLAZA JÁ, DOMINGUEZ-MALAGON H, SUSTER S. Differential Expression of Smooth Muscle Myosin, Smooth Muscle Actin, H-Caldesmon, and Calponin in the Diagnosis of Myofibroblastic and Smooth Muscle Lesions of Skin and Soft Tissue. Am J Dermatopathol 2006;28(2):105-11.

10. WEIBOLT VM, BURESH CJ, ROBERTS CA, SUIJKERBUIJK RF, PICKERING DL, Neff Jr et al. Involvement of 3q21 in nodular fasciitis. Cancer Genetics Cytogenetics 1998;106:177-9.

11. DONNER LR, SILVA T, DOBIN SM. Clonal rearrangement of 15p11.2, 16p11.2 and 16p13.3 in a case of nodular fasciitis: additional evidence favoring nodular fasciitis as a benign neoplasm and not a reactive tumefaction. Cancer Genetics Cytogenetics 2002;139:138-40.

12. NISHI SPE, BREY NV, SANCHEZ RL. Dermal nodular fasciitis: three case reports of the head and neck and literature review. J Cutan Pathol 2006;33(5):378-82.

 

 

 

 

 

Endereço para correspondência
Dr. Rogério A. Dedivitis
Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis
Rua Cônego Xavier, 276 – 04231-030
SÃO PAULO SP
Telefax: (11) 2273-8224
E-mail:hosphel.cpg@terra.com.br

 

 

1Trabalho realizado no Hospital Heliópolis - São Paulo