SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 número3Imagem corporal real e imagem ideal em adultos obesosAsma brônquica no idoso índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Paraense de Medicina

versão impressa ISSN 0101-5907

Rev. Para. Med. v.21 n.3 Belém set. 2007

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Avaliação ergonômica de movelarias e ocorrências de queixas osteoarticulares entre os moveleiros, em Tomé-açú (PA)1

 

Ergonomic evaluation of movelarias and occurrences of complaints osteoarthropatys between the moveleiros, in Tomé-açú (Pará)

 

 

Silvia Helena Arias BahiaI; Carlos Teixeira DinizII; Marco Túlio de Souza e SouzaII; Stanley Soares XavierII

IMestre em Saúde Pública. Profa Assistente III da Disciplina Saúde Coletiva da UFPA
IIFisioterapeutas graduados pela UEPA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: avaliar ergonomicamente os ambientes em fábricas de móveis no município de Tomé-açu (PA), verificando a ocorrência de queixas osteoarticulares relacionadas à atividade laboral entre os trabalhadores moveleiros.
MÉTODO: estudo epidemiológico transversal onde foram selecionados 40 trabalhadores de 13 movelarias, os quais foram submetidos a um questionário com itens referentes ao perfil sócio-demográfico, à percepção do trabalhador sobre seu ambiente de trabalho e a presença de queixas osteo-articulares.
RESULTADOS: a maior porcentagem dos entrevistados são adultos jovens, com baixo nível de escolaridade, casados, acima do peso ideal e apontaram o acabamento do móvel como atividade mais cansativa e a poeira como fator ambiental que mais incomoda. Os trabalhadores não utilizavam Equipamento de Proteção Individual (EPIs), citaram a concentração e atenção como essenciais para realizarem suas atividades e ficavam a maior parte do tempo em pé com semi-flexão do tronco. A principal queixa dos trabalhadores foi a dor, principalmente em região lombar e 25% já faltaram ao trabalho por causa da mesma.
CONCLUSÃO: o trabalho nas movelarias do município de Tomé-açu é realizado em condições inadequadas de segurança, oferecendo riscos à saúde dos trabalhadores.

Descritores: Saúde do trabalhador, ergonomia, movelaria.


SUMMARY

OBJECTIVE: ergonomicaly to evaluate environments in plants of furniture in the city of Tomé-açu (Pará), verifying the occurrence of related complaints osteo-to articulate to the labor activity between the moveleiros workers.
METHOD: study transversal epidemiologist where 40 workers of 13 referring movelarias had been selected which they had been submitted to a questionnaire with itens to the partner-demographic profile, the perception of the worker on its environment of work and the presence of complaints osteo-to articulate.
RESULTS: the biggest percentage of the interviewed ones is adult young, with low level of escolaridade, married, above of ideal weight e, had pointed the finishing of the furniture as more tiring activity and the dust as ambient factor that more bothers. The workers did not use Equipment of Individual Protection (EPIs), had cited the concentration and attention as essential to carry through its activities and, they were most of the time in foot with half-flexão of the trunk. The main complaint of the workers was pain, mainly in lumbar region, and 25% already had lacked to the work because of the same one.
CONCLUSION: the work in the movelarias of the city of Tomé-açu is carried through in inadequate conditions of security, having offered risks to the health of the workers.

Keywords: health of the worker, ergonomics.


 

 

INTRODUÇÃO

Os distúrbios osteo-articulares relacionados ao trabalho (DORT), que no Brasil são mais conhecidos como Lesões por Esforços Repetitivos (LER), são afecções que acometem o sistema músculo-esquelético, principalmente dos trabalhadores jovens, liderando as estatísticas de morbidade de todos os países, quer sob a forma de acidentes ou de doenças. Caracteriza-se pela sua evolução progressiva e crônica, com etiologia múltipla, onde o principal sintoma é a dor1,2.

No Brasil, segundo as estatísticas do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) de concessão de benefícios, em 1998, as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) responderam por mais de 80% dos diagnósticos3,4,5.

O setor madeireiro é uma das atividades produtivas de maior destaque no estado do Pará e, neste, destacam-se as fábricas de móveis, responsáveis por grande parte do emprego das camadas pobres da população masculina. No segmento de móveis sob encomenda, a matéria-prima básica é a madeira compensada conjugada com madeiras nativas, seus equipamentos e instalações são quase sempre deficientes, ultrapassadas e o trabalho ainda é bastante artesanal 6,7.

Os trabalhadores em fábricas de móveis podem estar expostos a agentes físicos (como ruído intenso e iluminação precária), agentes químicos (como poeira e solventes), aos riscos de acidentes de trabalho, riscos ergonômicos decorrentes do transporte manual de peso, jornadas de trabalho prolongadas, monotonia, repetitividade e utilização de máquinas sem as medidas de proteção7.

A ergonomia visa melhor adaptação dos operários às condições otimizadas de trabalho e ambiente.

 

OBJETIVO

Analisar ergonomicamente os ambientes em fábricas de móveis no município de Tomé-açú, PA, relacionando com a presença de queixas osteoarticulares entre os trabalhadores.

 

MÉTODO

Pesquisa aprovada no Comitê de Ética em Pesquisa do Núcleo de Medicina Tropical-UFPA, em 24 de novembro de 2005.

Tipo de Estudo

Estudo epidemiológico seccional descritivo.

População de Estudo

Trabalhadores de ambos os sexos, com mais de 18 anos de idade, que atuem há mais de 6 meses no setor de produção desse ramo de atividade.

Coleta de dados

Um questionário foi aplicado a 40 trabalhadores no próprio local de trabalho e de maneira individualizada, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, com questões referentes às variáveis sócio-demográficas, processo e condições de trabalho, percepção do trabalhador sobre seu ambiente de trabalho, queixas osteoarticulares e medidas de proteção individual. Nenhum trabalhador faltou no dia da coleta de dados ou recusou-se a responder os questionários.

Análise de dados

Os dados foram analisados utilizando o programa Microsoft Office Excell 2000. Para editoração do texto foi utilizado o programa Microsoft Office Word 2003.

Trabalho aprovado pelo Comitê de Ética do Núcleo de Medicina Tropical (NMT) de acordo com o parecer N.o154/2005.

 

RESULTADOS

As movelarias possuem, em média, quatro marceneiros, os quais são polivalentes e desempenham várias funções na linha de produção. Em sua maioria, os próprios donos exerciam a atividade de marceneiro, todos os trabalhadores eram do sexo masculino e não possuíam registro em carteira de trabalho. A jornada de trabalho em todas as movelarias visitadas tinha duração de 9hs, no período de segunda à sexta-feira e abriam aos sábados das 8 às 12hs. O intervalo para almoço tinha duração de 1hora, entre 12 e 13hs.

O tempo dos marceneiros na função variou de 7 meses a 40 anos, sendo 50% deles marceneiros há mais de 10 anos. A maioria aprendeu a profissão na empresa em que trabalha, começando como ajudante de marceneiro. O Quadro 1 mostra o perfil sócio-demográfico dos trabalhadores entrevistados, além de variáveis relacionadas à percepção dos mesmos do ambiente e atividade de trabalho.

 

 

Quanto à atividade mais cansativa desempenhada na movelaria, 47% dos trabalhadores apontaram o acabamento do móvel, como lixar ou polir. Já a poeira e o ruído gerado pelas máquinas foram citados por 58% dos trabalhadores como fatores ambientais que mais incomodam.

Consideraram o trabalho estressante 53% dos entrevistados, apesar de 70% dizerem estar satisfeitos com seu trabalho.

Os trabalhadores ficam a maior parte do tempo durante o trabalho na posição em pé realizando semi-flexão do tronco (Figura 1).

 

 

No que se refere à segurança no trabalho, somente 40% dos trabalhadores utilizavam algum Equipamento de Proteção Individual (EPIs), e apenas 30% receberam algum treinamento de como evitar acidentes no trabalho.

Apesar de 50% dos trabalhadores considerarem bom o seu ambiente de trabalho, as movelarias caracterizavam-se por apresentar espaço físico pequeno, onde os trabalhadores deslocavam-se entre as máquinas e a serragem da madeira. A iluminação era natural e tornava-se insuficiente no final do período vespertino.

A maioria dos trabalhadores (90%) referiu queixa de dor em algum segmento corporal durante a entrevista (Figura 2), e destes, 25% já faltaram ao trabalho por causa da dor e 36% já fizeram uso de medicação para seu alívio; 23 trabalhadores relataram sentir dores exclusivamente na coluna vertebral e dentro desta amostra, a maioria de localização na região lombar (Figura3).

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A maioria da amostra foi de adultos jovens, com menos de 40 anos de idade (87%). Carneiro (1998)10 comenta que a alta incidência na faixa etária de 20 a 29 anos é característica peculiar da LER, revelando a agressividade dos fatores geradores da patologia, o que corrobora para o afastamento precoce do trabalho e conseqüente aumento do ônus previdenciário.

Segundo Silva, Fassa e Valle (2004)11 o nível de escolaridade dos indivíduos está inversamente associado à prevalência de dor lombar, mediado pela maior exposição a cargas ergonômicas, tanto no domicílio quanto no trabalho. No presente estudo, 50% dos trabalhadores não terminou o ensino fundamental, ou seja, possuem menos de 9 anos de estudo.

Os trabalhadores das movelarias, em sua grande maioria, recebem entre 1 e 2 salários-mínimos. Carneiro (1998)10 afirma que a maioria da clientela dos portadores de LER atendida pela Previdência Social concentra-se nas faixas salariais inferiores. Quanto à localização da dor, a maioria ocorreu na coluna (64%). Estudo realizado por Silva, Souza e Minetti (2002)12, encontrou maior prevalência de dor na coluna (21,4%) e nas pernas (21,4%) dos marceneiros, e creditou essa ocorrência ao trabalho realizado na posição em pé. Entretanto, Silva, Fassa e Valle(2004)11 ponderam que a dor lombar decorre de um conjunto de fatores sócio-demográficos, comportamentais e ergonômicos.

Além dos fatores sócio-demográficos já identificados e comentados, destacam-se aspectos comportamentais dos trabalhadores como sedentarismo e obesidade. A maioria dos trabalhadores (53%) estava com o peso acima do desejável de acordo com o IMC. Segundo Silva, Fassa e Valle (2004)11, a prevalência de dor lombar aumenta linearmente com o aumento do IMC, pois a "carga extra" que a estrutura osteo-músculo-articular é obrigada a sustentar pode alterar o equilíbrio biomecânico do corpo.

A maioria dos trabalhadores relatou sentir-se estressado (53%) e este é um importante fator desencadeante de fadiga muscular, portanto, agente cronificador das dores musculares, como afirmam Teixeira et al. (2001)13. O estresse se deve não apenas ao esforço físico mas também à sobrecarga mental e, nesse sentido, diversos aspectos foram observados, como precárias condições de higiene, baixa remuneração, ausência de EPI's e realização de atividades que exigem concentração e atenção constante dos trabalhadores.

 

CONCLUSÃO

As atividades de fabricação de móveis no município de Tomé-açu são realizadas em condições inadequadas e oferecendo risco à saúde da classe trabalhadora.

Por fim, os fatores ergonômicos vêm contribuir de forma relevante para as queixas álgicas dos trabalhadores. O maquinário inadequado que não leva em consideração os padrões antropométricos dos trabalhadores, obriga os mesmos a assumirem uma posição em pé com o corpo inclinado para frente por um longo período de tempo. Essa posição provoca contração dos músculos e estiramento dos ligamentos das costas, principalmente na parte inferior do tronco.

 

REFERÊNCIAS

1. OLIVEIRA, CR. Conceituação da LER. In: OLIVEIRA, CR. Manual Prático de LER. 2aed. Belo Horizonte: Editora Health, 1998, p.21-28.

2. ROCHA, L. E.; JUNIOR, M. F. Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho. In: JUNIOR, M. F. Saúde no Trabalho: Temas Básicos para o Profissional que Cuida da Saúde dos Trabalhadores. São Paulo: Editora Roca, 2002. p. 287-317.

3. KNOPLICH, J. Sistema músculo-esquelético: coluna vertebral. In: MENDES, E. Patologia do Trabalho. Rio de Janeiro: Atheneu, 1995. p. 213-226.

4. RIBEIRO, H.P. Lesões por Esforços Repetitivos (LER): Uma doença emblemática. Cad. Saúde Pública, v.13, n.2, p.85-93, 1997.

5. WALSH,I.A.P. et al. Capacidade para o trabalho em indivíduos com lesões músculo-esqueléticas crônicas. Rev. Saúde Pública, v.38, n.2, p.149-156, 2004.

6. PARÁ. Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente. Programa Paraense de Tecnologias Apropriadas. Diagnóstico do Setor Moveleiro do Estado do Pará. Belém, 2002.

7. Revista Proteção. São Paulo: MPF publicação Ltda, n. 101, maio. 2000.

8. DUL, J.; WEERDMEESTER, B. Ergonomia Prática. São Paulo. Ed. Edgard Blucher LTDA, 1998, p.13-49.

9. FERREIRA, L.L.; MACIEL, R.H.; PARAGUAY, A.I. A contribuição da ergonomia. In: ROCHA, L.E.; RIGOTO, R.M.; BUSCHINELLI, J.T.P. Isto é trabalho de gente?: Vida, doença e trabalho no Brasil. São Paulo: Vozes, 1993, p.215-231.

10. CARNEIRO, C.M. Perfil social da LER. In: OLIVEIRA, CR. Manual Prático de LER. 2aed. Belo Horizonte: Editora Health, 1998, p. 65-94.

11. SILVA, M.C.; FASSA, A.G.; VALLE, N.C. Dor lombar crônica em uma população adulta do Sul do Brasil: Prevalência e fatores associados. Cad. Saúde Pública, v.20, n.2, p.377-385, 2004.

12. SILVA, K.R.; SOUZA, A.P.; MINETTI, L.J. Avaliação do perfil de trabalhadores e das condições de trabalho em marcenarias no município de Viçosa-MG. Revista Árvore, v.26, n.6, p.769-775, 2002.

13. TEIXEIRA,M.J. et al Fisiopatologia da dor músculo-esquelética. Rev.Med.,v.80(ed.esp.), p.63-77, 2001.

 

 

Endereço para correspondência:
Carlos Teixeira Diniz
Conjunto Pedro Álvares Cabral Av. B, N.o 223,
CEP 66615-235,
Belém-PA.
Telefone: 32316022 e 91751039.
Email: carlostdiniz@yahoo.com.br

Recebido em 04.01.2007
Aprovado em 22.08.2007

 

 

1Monografia de Especialização em Epidemiologia (Núcleo de Medicina Tropical/UFPA) realizada em fábricas de móveis