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Boletim de Pneumologia Sanitária

versão impressa ISSN 0103-460X

Bol. Pneumol. Sanit. v.7 n.1 Rio de Janeiro jun. 1999

 

 

Sensibilidade tuberculínica e vacina BCG entre os índios do Araguaia - MT/1997

 

 

Jorge Meireles AmaranteI; Vera Lúcia de Araújo CostaII; Fátima Aparecida SilvaII

IMédico Colaborador da FUNAI
IIEnfermeira da FUNAI

 

 


RESUMO

Como parte da rotina de trabalho de implantação das ações de controle da tuberculose nas aldeias indígenas dos povos Karajá e Tapirapé, jurisdicionadas à Administração Executiva Regional do Araguaia da Fundação Nacional do Índio, na fronteira entre os estados brasileiros de Mato Grosso e Tocantins, foi realizada uma busca ativa de casos da doença nos grupos de maior risco de adoecimento, abrangendo todos os sintomáticos respiratórios, portadores de tosse com expectoração há pelo menos três semanas, e os contatos de casos de tuberculose pulmonar com exame de escarro positivo registrados pelo sistema de saúde no ano de 1997. Na ocasião o PPD foi realizado em 1338 indivíduos, número correspondente a 67,2% da população geral e verificada a presença ou não de cicatriz vacinal do BCG. Os autores encontraram apenas 6,3% de reatores ao teste tuberculínico entre os menores de 1 ano e 5,0% entre os menores de 5 anos, revelando, portanto, baixíssima sensibilidade ao teste entre os vacinados recentes com BCG intradérmico. Esta constatação conferiu ao PPD um grande valor preditivo no diagnóstico da infecção natural pelo bacilo humano e na definição do grupo de risco para quimioprofilaxia.

Palavras-Chave: Tuberculose, Infecção tuberculosa, Sensibilidade tuberculínica, Saúde do índio.


SUMMARY

As part of the work routine for implementation for tuberculosis control actions among indigenous of the Karajá and Tapirapé villages under the Araguaia Regional Executive Administration for the Nacional Indian Foundation, on the frontier between the Brazilian States of Mato Grosso and Tocantins, an intensive search for tuberculosis cases among high risc groups was carried out, including all respiratory symptoms carriers of caugh with sputum during three weeks or more and contact of tuberculosis pacients with positive smear registered by the health system in 1997. On this occasion, tuberculin test was applicated in 1338 persons, corresponding to 67,2% of the general population and the presence of the vaccine scar for BCG was checked. The authors found only 6,3% of reactors to the tuberculin test among 1 year old children and 5% among 5 years old, thus indicating low sensitivity to the test among these recently vaccinated with intradermic BCG. This evidence revealed high PPD predictive value for the diagnosis of the natural infeccion by the human bacillus among contacts and so the tuberculin test was useful to define the risc group to be protected by chemoprophilaxis.

Key words: Tuberculosis, Tuberculosis infeccion, Tuberculin sensitivity, Health of indigenous people.


 

 

Apresentação

A prevalência da tuberculose é muito alta entre os índios do Araguaia, chegando, em 1997, segundo dados do Departamento de Saúde (DES) da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), à casa dos 398 por 100.000 (FUNAI,1997), vale dizer, perto de 1 tuberculoso para cada grupo de 250 índios, o que motivou a implementação, por parte das instituições responsáveis, de ações de saúde específicas para o controle dessa enfermidade na região.

Em maio de 1997 uma equipe de técnicos do Departamento de Saúde da FUNAI de Brasília, da Fundação Nacional de Saúde Coordenação Regional de Goiás e da Secretaria de Estadual de Saúde do Estado de Tocantins, deslocou-se para a região do Araguaia com a finalidade de coordenar, junto à equipe local, a execução de ações de controle da tuberculose nas aldeias das etnias Karajá e Tapirapé, jurisdicionadas à Administração Executiva Regional (AER) da FUNAI do Araguaia, face às altas taxas de incidência da doença verificadas entre os índios nos últimos anos.

O trabalho teve como objetivo principal, fazer uma busca ativa de casos de tuberculose para tratamento e eliminação de focos entre os grupos de maior risco de adoecimento, através do exame dos sintomáticos respiratórios e dos comunicantes dos casos de tuberculose pulmonar com ênfase nos eliminadores de bacilos, isto é, nos positivos à baciloscopia direta do escarro.

A equipe estava incumbida, também, de estabelecer rotinas para o diagnóstico e tratamento da enfermidade, treinar em serviço os Auxiliares de Enfermagem e Agentes Indígenas de Saúde no manuseio do doente tuberculoso e dos suspeitos, bem como, garantir a continuidade das ações e estabelecer indicadores de saúde para acompanhamento e avaliação futura de sua eficácia.

O presente estudo é retrospectivo e decorre dessa experiência de trabalho dos autores no Departamento de Saúde da FUNAI em cumprimento à programação anual de ações de saúde previstas para 1997, aprovada pelo Conselho de Saúde do Distrito Sanitário Especial Indígena da Região do Araguaia (DSEIRA).

 

Introdução

Alguns documentos dão conta de frentes de contato da sociedade neo-brasileira com o povo Karajá que datam do século XVII. A primeira frente foi coordenada pelos jesuítas da então província do Pará. Em 1658, o Padre Tomé Ribeiro comandou a primeira expedição que saiu do Pará e chegou aos Karajá do baixo Araguaia (SERAFIM - 1943).

Outra frente de contato está relacionada com a movimentação das bandeiras paulistas rumo ao centro-oeste do Brasil. Bartolomeu Bueno, saiu de São Paulo em 1722 e chegou a terras goianas, nas minas do rio Vermelho, em 1725 (ELLIS - 1960).

Um outro fato que muito contribuiu para manter as aldeias dos Karajás em permanente contato com os "brancos", foi a política de navegação do general Couto de Magalhães, resultando na fundação de Leopoldina em 1850 (RIBEIRO - 1982).

O Karajá é o subgrupo mais numeroso da família lingüística Karajá, que reúne as línguas dos Xambioá, dos Javaés e dos Karajás. É classificada genericamente no tronco Macro-Jê.

Na confluência das águas dos rios Araguaia e Tapirapé, duas aldeias Karajá têm como vizinhos os Tapirapés, um povo do grupo Tupi que, historicamente, habitava uma extensa região que ia desde as cabeceiras do rio Tapirapé até a divisa do atual estado do Pará. Estima-se que teriam chegado ao Brasil central devido aos freqüentes ataques dos seus inimigos tradicionais, os Kaiapó, com os quais mantiveram contatos hostis seculares, incluindo o rapto de suas mulheres e crianças.

Estima-se que em 1900, a população Tapirapé era de 1000 a 1500 indivíduos, distribuídos por seis aldeias com 6 a 10 malocas cada; a distância entre elas era, geralmente, de um dia de viagem (30 a 40 Km) e estavam assentadas distando cerca de 40 a 50 km do rio Tapirapé, afluente do Araguaia (LIMA FILHO - 1994).

Segundo Baldus, as primeiras notícias desta tribo datam do século XVIII, a partir de incursões das bandeiras paulistas na região centro-oeste. A intensificação do contato dá-se somente no século XX com a chegada dos primeiros seringueiros que povoaram a região.

As drásticas reduções que sofreram em seu número, tiveram início antes de seus primeiros contatos com populações neo-brasileiras que, em 1909, começaram a se instalar naquela região. Antes desse ano, já haviam sido atingidos por epidemia de varíola e, logo em seguida, por uma epidemia de gripe, que levaram duas aldeias à extinção, obrigando os remanescentes a recolherem-se às quatro aldeias restantes. Por volta de 1920, mais duas aldeias se extinguiram face a epidemias de febre amarela e gripe "espanhola".

Em 1935, a população Tapirapé foi estimada em 147 indivíduos, residindo em duas aldeias. Em 1947, foram reduzidos a aproximadamente 100 pessoas, devido aos ataques dos índios Kaiapós, inimigos dos Tapirapés desde tempos imemoriais. No último ataque, a aldeia onde habitava a maioria, foi queimada e saqueada, tendo os Tapirapé se dispersado pela região (BALDUS - 1970).

Em 1953, se tem notícia de que a população era de apenas 51 indivíduos, habitando uma só aldeia, distando 3 km da sede do Serviço de Proteção ao Índio, local da atual aldeia Tapirapé (Ribeiro - 1992).

Instalaram-se junto à nova aldeia, missionárias da "Ordem das Irmãzinhas de Jesus", a quem os Tapirapés devem, em grande parte, sua preservação e recuperação, que até hoje atuam junto àquela comunidade, totalmente integradas ao cotidiano da aldeia e voltadas ao incentivo da manutenção da cultura e da identidade étnica Tapirapé.

Os povos indígenas Karajá e Tapirapé enfocados no presente estudo, habitam, hoje, as diversas aldeias situadas, em sua maioria, à margem esquerda do rio Araguaia e afluentes. As aldeias Tapirapé, Hawalorã, Itxalá, Tytemã, Urubu Branco e São Domingos , estão situadas no continente e pertencem ao Estado de Mato Grosso. As demais são insulares, localizadas na Ilha do Bananal que é território do Estado de Tocantins. As aldeias Tapirapé e Urubu Branco pertencem à etnia Tapirapé, enquanto as demais à Karajá.

A tuberculose é conhecida pelos Tapirapés e, principalmente, pelos Karajás desde o início do século, embora os índios de um modo geral tenham tido contato com a doença desde o descobrimento, quando os europeus, muitos deles jesuítas, a introduziram nas populações nativas (HIJJAR - 1993).

 

Metodologia

A equipe visitou cada uma das aldeias identificando as pessoas portadoras de tosse com expectoração há, pelo menos 3 semanas, muitas das quais foram apontadas pelos Agentes Indígenas de Saúde.

Estes sintomáticos respiratórios foram submetidos a exame clínico pelo médico da equipe e em seguida foi colhida amostra de escarro na presença do baciloscopista. O material foi acondicionado de acordo com as recomendações técnicas, em recipiente térmico adequado e foi encaminhado no mesmo dia à unidade de referência localizada no município de São Félix do Araguaia, Santa Terezinha ou Luciara-MT, de acordo com a maior proximidade em relação a cada aldeia.

O material foi processado pelo método de Koch, coloração de Ziehl-Neelsen no máximo no dia seguinte pelo mesmo técnico da equipe que fizera a colheita na aldeia. Na ocasião da coleta do material, os sintomáticos eram imediatamente agendados para exame radiográfico do tórax na unidade de referência, à qual eram conduzidos em grupos por via fluvial.

Os sintomáticos respiratórios positivos à baciloscopia ou que, mesmo negativos, apresentaram imagens suspeitas de tuberculose pulmonar em atividade sendo reatores fortes à tuberculina, foram considerados casos de tuberculose, notificados e em seguida tratados com esquema padronizado pelo Ministério da Saúde.

Os comunicantes, isto é, os que coabitam com casos confirmados de tuberculose registrados nos últimos dois anos foram submetidos ao teste tuberculínico com PPD, Rt 23, Tween 80, 2 UT, 0,1 ml intradérmico, aplicado na face ventral, terço médio do antebraço esquerdo, com leitura após 72 a 96 horas, obedecendo às recomendações técnicas do Ministério da Saúde.

Foram considerados não reatores resultados com menos de 5mm de induração, reatores fracos induração de 5 a 9 mm e reatores fortes os que apresentaram induração igual ou superior a 10 mm. Na ocasião foi verificada e anotada a presença ou ausência de cicatriz vacinal válida do BCG na região deltoide do braço direito, bem como, a existência ou não de cicatriz de reforço vacinal.

Os comunicantes reatores ao PPD foram, em seguida, submetidos ao exame radiográfico, e à baciloscopia quando sintomáticos, para avaliar a presença ou ausência de tuberculose doença. Os casos de tuberculose descobertos através desses procedimentos iniciaram tratamento específico com esquema padronizado pelo Ministério da Saúde.

Foram considerados como grupo de alto risco de adoecimento os contatos de tuberculosos pulmonares bacilíferos, assintomáticos, com radiografia de tórax normal, sem qualquer sinal de tuberculose doença, reatores fortes ao teste tuberculínico, os quais foram submetidos a quimioprofilaxia com Isoniazida em regime diário com duração de 6 meses, independentemente do estado vacinal e da idade.

Para avaliar com maior precisão qual a interferência da alta cobertura vacinal pelo BCG encontrada entre esses índios nas taxas de reatores à prova tuberculínica e, desta forma, melhorar a especificidade do teste no diagnóstico da infecção natural, o PPD e a verificação da cicatriz vacinal foram estendidos à outras casas das aldeias, além daquelas onde residiam os focos de infecção

Na população Karajá e Tapirapé estudada, 49,6% foram reatores ao teste tuberculínico e 50,4% não reatores, apontando, mesmo com as limitações metodológicas já referidas, para uma alta prevalência da infecção nessas comunidades indígenas, provavelmente motivada pela infecção natural adquirida por contágio direto, haja vista que, entre os vacinados pelo BCG, apenas 46,0% resultaram reatores ao PPD, contra 73,6% de infectados encontrados entre os não vacinados (Tabela 1). Vale dizer, em todas as idades, a condição de vacinado, mesmo em presença alta cobertura (87,0%), não parece estar influindo na sensibilidade tuberculínica.

 

 

Com isto pretendeu-se acumular um número maior de observações, principalmente no grupo dos não vacinados pelo BCG, que é extremamente reduzido em virtude da alta cobertura vacinal, permitindo uma avaliação mais precisa do comportamento da infecção adquirida naturalmente pelo contágio.

Foram examinadas, no total, 1.338 pessoas, o equivalente a 67,2% da população geral. Foram excluídas do teste tuberculínico as crianças com idade inferior a 3 meses para evitar a possibilidade de resultados falso-negativos, melhorando a sensibilidade do exame, já que o PPD leva em geral 3 a 8 semanas para apresentar viragem após a infecção (CARDOSO LIMA - 1973).

 

Resultados e discussão

Uma vez que o que se pretendia inicialmente era a busca ativa de casos, a amostra não foi obtida totalmente ao acaso, havendo sido incluídos os grupos adrede selecionados dos sintomáticos respiratórios e dos comunicantes, onde se concentram os infectados e, por conseguinte, os prováveis doentes.

Este viés da amostra, entretanto, não prejudicou a verificação da correlação entre a cobertura vacinal pelo BCG e a sensibilidade tuberculínica ao PPD intradérmico, que depende somente da observação direta e objetiva da presença de cicatriz vacinal e sua relação com a sensibilidade tuberculínica verificada pelo teste intradérmico.

Com efeito, uma comparação entre a sensibilidade tuberculínica detectada em cada faixa etária e a cobertura vacinal, aponta para uma correlação quase que inversa, mostrando uma menor ocorrência de reatores ao PPD justamente onde é maior a cobertura vacinal (Figura 1).

 

 

Ainda mais marcante é o fato de que, para uma cobertura vacinal pelo BCG de 97,8% na faixa etária de menores de 5 anos, apenas 5% das crianças apresentaram induração de 5 mm ou mais ao teste tuberculínico.

A vacinação BCG na terra indígena do Araguaia é realizada, geralmente, no primeiro mês de vida. Entre os menores de 1 ano vacinados pelo BCG há mais de 3 meses, somente 6,3% foram reatores ao PPD, mostrando uma viragem tuberculínica baixíssima ocasionada pela vacinação, mesmo quando muito recente.

Entre os Tapirapés, onde é bem menor que entre os Karajás a incidência da tuberculose doença e da infecção natural pelo bacilo de Koch, em virtude, dentre outros fatores, do menor contato que mantêm com a sociedade envolvente, todas as crianças menores de 1 ano, num total de 13, foram não reatoras ao PPD, embora vacinadas. Na faixa de 0 a 4 anos, dentre 67 crianças apenas 1 (1,5%) estava reatora. A cobertura vacinal entre os Tapirapés examinados na faixa etária de 0 a 5 anos é de 100% (Tabela 2).

 

 

Mesmo entre aqueles que foram alvo de reforço da vacina, que ocorre geralmente na entrada para a escola, embora existam ré-vacinados em quase todas as idades, o percentual de reatores ao teste tuberculínico (48,3%), mostrou-se maior que entre os vacinados com uma única dose, mas, ainda assim, menor que o dos não vacinados (73,6%) no total da amostra (tabelas 1 e 3).

 

 

É fato conhecido que a alergia tuberculínica não reflete necessariamente a imunidade conferida pela infecção. Estes dois fenômenos, alergia e imunidade, embora não sejam paralelos, devem ser considerados na clínica sob certa unidade, como dois aspectos que caracterizam as modificações biológicas do organismo infectado (BRÓLIO LIMA FILHO - 1982).

Estudos de Bleiker, na Holanda, em 5000 recém-nascidos, concluíram que a sensibilidade tuberculínica decorrente da vacinação BCG, foi mais elevada 6 meses após a imunização, decrescendo rapidamente depois (BLEIKER - 1986).

No Brasil, Ruffino Netto observou alto percentual de não reatores (36,6%) com einduração menor que 5 mm na prova tuberculínica nos escolares de Ribeirão Preto no Estado de São Paulo, após dois anos de imunização (RUFFINO NETTO - 1976).

Easom, nas Ilhas Salomon, realizou a vacinação BCG em 188 pré-escolares e observou uma queda dramática na positividade do teste tuberculínico pós-vacinal de 81% para 18%, a partir do 2o ano de vida, mas faz a ressalva de que no grupo estudado havia uma alta parcela de desnutridos, o que pode ter influído no resultado (EASON - 1987).

É muito farta a experiência mundial demonstrando a diminuição da alergia tuberculínica induzida pela vacina BCG em tempo e grau variáveis após a imunização, o que, embora não esteja necessariamente relacionado à imunidade conferida pela vacina, que também diminui com o tempo (MAHMOUD - 1989; TIDJAIN - 1986), não corresponde ao que acontece com a infecção natural pelo bacilo humano, em que a sensibilidade à tuberculina se mantém por muitos anos, sendo, por vezes, indelével.

 

Conclusão

A condição essencial para a eficácia da vacina BCG é a sua qualidade, incluindo nisto a forma como é produzida, acondicionada, distribuída, preservada, transportada, aplicada.

A vacinação BCG nas terras indígenas do Araguaia é realizada diretamente por pessoal experiente da Fundação Nacional de Saúde / Coordenação Regional de Goiânia-GO, de acordo com as recomendações e normas emanadas do próprio Ministério da Saúde, sendo improvável que o fato se deva à problemas técnicos com a vacina em nível regional ou local.

Por ocasião da implementação das ações de controle da tuberculose em outras terras indígenas, tais como Xavante, Kaiapó, Guarani, Kaiowá, Terena, Pataxó, em circunstâncias idênticas, a sensibilidade tuberculínica atribuível à vacina BCG resultou, da mesma forma, quase nula, mesmo nos vacinados recentes pelo BCG (Amarante - 1996). Em cada uma dessas ações o pessoal de saúde era diferente, tanto para a vacinação quanto para a aplicação e leitura do PPD, diminuindo a possibilidade de erro técnico em ambos os procedimentos.

Esta constatação, que vem se repetindo, não nos autoriza, entrementes, a questionar a proteção contra o adoecimento conferida pela vacina BCG que vem sendo utilizada nessas áreas indígenas, mesmo face à concomitância de altas taxas de prevalência de tuberculose e de cobertura vacinal. Porém, nos tem permitido novamente, na prática, atribuir um alto valor preditivo ao PPD intradérmico no diagnóstico da infecção natural pelo bacilo humano para a definição dos grupos de alto risco de adoecimento, principalmente entre os contatos.

Nessas terras indígenas, uma pessoa de qualquer idade, convivendo com doente tuberculoso bacilífero, que apresente uma forte reação ao teste tuberculínico, tem grandes possibilidades de ser, com pequena margem de erro, um infectado natural pelo bacilo humano, independentemente de sua condição de vacinado.

Este fato se reveste de grande importância se levadas em conta as lastimáveis condições sócioeconômicas a que foram submetidos os nossos índios, a vida gregária que levam, suas habitações coletivas geralmente escuras, úmidas e mal ventiladas e a baixa resistência que possuem à enfermidade em razão do contato relativamente recente da maioria das etnias brasileiras com o bacilo de Koch, por que devolve ao teste tuberculínico a condição de valioso meio para o diagnóstico da tuberculose, mormente na infância, onde predominam as formas fechadas, nas quais dificilmente se consegue demonstrar a presença do bacilo.

 

Bibliografia

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