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Boletim de Pneumologia Sanitária

versão impressa ISSN 0103-460X

Bol. Pneumol. Sanit. v.9 n.2 Rio de Janeiro dez. 2001

 

 

Avaliação do risco de tuberculose para os profissionais de saúde

 

 

Mônica Kramer de Noronha Andrade

Médica do Hospital Municipal Raphael de Paula Souza -RJ

 

 


RESUMO

Segundo vários trabalhos, publicados em países com prevalência alta de tuberculose, os profissionais de saúde encontram-se sob risco elevado, tanto para infecção, como para adoecimento por tuberculose. O município do Rio de Janeiro apresenta uma prevalência elevada de tuberculose. No entanto, temos poucos dados sobre o risco de infecção e adoecimento dos profissionais de saúde que trabalham em unidades de tratamento de tuberculose neste município. Necessitamos implementar inquéritos tuberculínicos nestas unidades de saúde e programarmos medidas preventivas tanto ambientais como terapêuticas. Assim, estaremos dando mais um passo para o controle da tuberculose.

Palavras chave: Risco de infecção, tuberculose


SUMMARY

According to the specialized literature, healthcare workers in countries with high prevalence of tuberculosis are exposed to higher risks of infection and of illness. The city of Rio de Janeiro has a high tuberculosis incidence. However, data on the risk of tuberculosis among the public servants in the Public Health system is incipient. There is a need to implement tuberculin surveys on this population and also to develop environmental and therapeutic preventive measures. This way, we will move ahead toward tuberculosis control.

Key words: Risk of infection, tuberculosis


 

 

Introdução

Dentre os indicadores epidemiológicos para o estudo da distribuição da tuberculose (tb) temos: o risco médio anual de infecção, a incidência e a mortalidade.

Entende-se por risco médio anual de infecção a probabilidade de um indivíduo, ainda sem infecção pelo bacilo da tuberculose (virgem de infecção), adquiri-la no período de tempo de um ano. O indivíduo, uma vez infectado, terá probabilidade de desenvolver a doença. Ao desenvolvê-la passará a ser um novo caso de tb. A incidência, por sua vez, é o número de novos casos que ocorrem no período de um ano. A mortalidade por tb, poderíamos dizer, é o desfecho epidemiológico dos casos que não obtiveram a cura.

O risco médio anual de infecção é mensurado através de inquéritos tuberculínicos, por um determinado período de tempo, em determinadas populações. Estes inquéritos são feitos através da aplicação do teste intradérmico com o PPD na população estudada, avaliando a prevalência da infecção pelo bacilo da tuberculose. No entanto, o resultado deste teste apresenta limitações, uma vez que ele é pouco específico e é dependente da técnica utilizada, tanto de aplicação quanto de leitura; por outro lado, pode ser causa de confusão na interpretação dos resultados em populações que tenham ampla cobertura vacinal com BCG(1). Ainda assim, continua a ser adotado e tem papel importante na avaliação do risco médio anual de infecção tuberculosa.

Em 1985, Styblo(2) tentou estabelecer a possibilidade de haver uma relação empírica constante entre o risco anual de infecção tuberculosa de uma população e a incidência de casos bacilíferos de tuberculose. Trabalhando com dados sobre correlação entre incidência e mortalidade, incidência e prevalência, obteve, através de estimativas, que existia esta relação, relativamente constante, para qualquer taxa de risco. Em países em desenvolvimento, o risco de 1% equivaleria a uma incidência aproximada de 50 a 60 casos de tb pulmonar bacilífera.

 

Avaliação de risco em profissionais de saúde

Veremos a seguir alguns trabalhos publicados quanto à avaliação do risco de infecção tuberculosa da população.

Em um estudo, Kritski et al(3), avaliaram, através de inquérito tuberculínico, 351 profissionais de saúde que trabalhavam no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A taxa de conversão tuberculínica foi de 8% sendo esta maior, comparativamente, nos médicos (15%) e enfermeiros (13%), do que nos profissionais que ocupavam cargos administrativos (0,9%).

Muzy de Souza et al(3), estudaram a reação tuberculínica e a conversão em profissional de saúde em um Hospital de Ensino no RJ, de 1994 a 1997. O número total da amostra foi 1358: 617 (49%), apresentavam PPD reator forte (10mm); 35/449 (7,8%) apresentaram efeito Booster e 32/368 (8,7%), conversão tuberculínica.

Vânia et al (4), fizeram um estudo de prevalência de infecção tuberculosa entre os estudantes da Escola de Medicina da UFRJ, no período de 1996 a 1997. Foram testados 445 alunos, resultando uma taxa de prevalência de 9,2%, sendo que no curso básico esta foi de 4,6%, no intermediário, 7,8% e no internato, 16,2%. Evidenciou-se assim, uma taxa bastante alta que cresceu gradativamente de acordo com o aumento da exposição.

Outra avaliação de risco para tb foi feita em uma Escola de Odontologia(5). A população estudada foi de 158 alunos, encontrando-se uma taxa de conversão tuberculínica de 10,6%. Como fatores de risco foram apontados, ser estrangeiros e ter sido vacinado com BCG.

Na Tailândia(6) , entre 911 profissionais de saúde estudados, quanto a presença de infecção tuberculosa, resultou: 68% PPD>10mm e 35%, PPD>15mm. Os fatores associados foram: tempo de trabalho maior que 1 ano; contato com tb; gênero masculino; vacinação com BCG associada com PPD>10 mm.

Nas Filipinas(7) realizou-se um inquérito nacional de prevalência da infecção tuberculosa, e de cobertura vacinal (BCG). A cicatriz vacinal estava presente em 66%; a prevalência de infecção era de 63,4% em adultos e de 16,1% em crianças; o risco médio anual de infecção foi de 2,3%.

Veremos a seguir trabalhos que avaliaram a tb como risco ocupacional em profissionais de saúde.

Na Estonia(8), estudou-se o risco ocupacional em profissional de saúde em dois hospitais. No Hospital Geral, a incidência de casos nos profissionais de saúde foi de 1,5 a 3 vezes maior que na população em geral. Já no outro hospital referência para tb, o risco foi de 30 a 90 vezes maior que na população geral.

Na Sérvia(9), foi estudado o risco dos profissionais de saúde durante 12 anos, no Instituto de Doenças do Tórax. Neste são admitidos 550 a 600 casos de tb por ano. Registrou-se uma incidência acumulada de 3451/100.000 e o risco foi de 7,6 vezes maior que na população geral.

Em Malawi(10), em 1996, 40 hospitais foram avaliados quanto a prevalência de tb nos profissionais de saúde. Foram encontrados 108 casos de tb em 3042 profissionais de saúde. Este trabalho enfatiza a necessidade de controle ambiental.

Outro estudo de prevalência de doença em profissional de saúde foi feito em Marrocos(11), onde a incidência de tb é de 100/100.000 hab. No período de 1994 a 1997, foram analisadas 30 províncias e prefeituras encontrando-se 130 novos casos, com uma incidência acumulativa de 85,3/100.000, sendo que em médicos especialistas chegou a 1094,8/100.000. Conclusão: risco muito elevado em profissional de saúde.

 

Fatores associados ao maior risco de transmissão

A tb pulmonar é transmitida por via aerógena. Com isto, os fatores ambientais são muito importantes, pois quanto maior o tempo que o núcleo seco ficar suspenso no ar, maior será o risco de contágio.

No Canadá(12), em estudo realizado em 17 hospitais, investigou-se a associação da viragem tuberculínica em profissional de saúde e a ventilação em ambiente hospitalar. Como critério de inclusão adotou-se o de freqüentar o hospital ao menos 2 vezes por semana. Foi empregado um questionário padronizado; verificado se havia vacinação e/ou teste tuberculínico prévio; prontuários revisados dos casos de tb nos últimos 3 anos e mensuração das mudanças de ar através de técnicas de marcação com gás. Os resultados obtidos mostraram: a viragem tuberculínica está associada com áreas que tenham menos de 2 trocas por hora; hospitais de risco moderado e alto; trabalhar em berçário e em fisioterapia. A viragem não esteve associada em quartos de isolamento.

O tipo de contato e a forma da doença também têm papel importante. São considerados grupos de risco: os contatos intra-domiciliares, os idosos, as crianças e os profissionais de saúde. As formas de tb mais contagiosas são a pulmonar e a laríngea.

A incidência de tb no Brasil (1999) foi de 78.760 casos com um coeficiente de 48,1/100.000. No Rio de Janeiro, este coeficiente é de 98/100.000 e de 160/100.000 no município do Rio de Janeiro (2000). A forma clínica predominante, no Rio de Janeiro, é a pulmonar (81%), sendo 54% dos casos com baciloscopia positiva e 23% com baciloscopia não realizada. A oferta do teste para HIV foi de 53%, resultando 26,6% positivos(13).

Com os dados expostos acima, vimos que torna-se imprescindível implantarmos medidas de biossegurança em nossas unidades para que possamos diminuir o risco de infecção e adoecimento dos profissionais de saúde. Em hospitais que atendam mais de 50 casos por ano de tb, que sejam referência para SIDA e/ou imunocomprometidos, ou que realizem procedimentos diagnósticos, torna-se necessária a implementação de medidas de controle(14).

Os marcadores de eficiência deverão ser aferidos posteriormente como parâmetro das intervenções realizadas em cada unidade.

 

Referências bibliográficas

1. Tuberculin surveys-why?[editorial]. Int J Tuberc Lung Dis 1998; 2 (4): 263-4.

2. Styblo K. Relación entre riesgo infeccion tuberculosa y riesgo de desarollar una tiberculosis contagiosa. Bol UICT 1985; 60 (3-4):117-9.

3. Kritski A, Conde M, Muzy de Souza, G. Tuberculose do ambulatório à enfermaria. 2000; 7-20. 2a ed. São Paulo: Atheneu.

4. Silva VMC, Oliveira JR, Santos FMS, et al. Prevalência de infecção pelo “Mycobacterium tuberculosis” entre alunos da Faculdade de Medicina. J Pneumol 2001; 27(2):77-82.

5. Murphy DC, Younai FS. Challenges associated with assesment of risk for tuberculosis in a dental school setting. Am J Infect Control 1996 Aug; 24(4):223-5.

6. Do AN, Limpakarnjarat K, Uthaivorait W, et al. Increased risk of Mycobacterium tuberculosis infection related to the occupational exposures of health care workers in Chiang Rai, Thailand. Int J Tuberc Lung Dis 1999; 3(5):377-81.

7. Tupasi TE, Radhakrishna S, Pascual ML, et al. BCG coverage and the annual risk of tuberculosis infection over a 14-year period in the Philippines assessed from tha Nationwide Prevalence Surveys. Int J Tuberc Lung Dis 2000 Mar 4; (3):216-22.

8. Kruuner A, Danilovitsh M, Pehme L, et al. Tuberculosis as an occupational hazard for health care workers in Estonia. Int J Tuberc Lung Dis 2001 Feb; 5 (2):170-76.

9. Skodric V, Savic B, Jovanic M, et al. Occupational risk of tuberculosis among health care workers at Institute for Pulmonary Diseases of Serbia. Int J Tuberc Lung Dis 2000 Sept 4; (9):826-31.

10. Harries AD, Nyrenda TE, Banerjee A, et al. Tuberculosis in health care workers in Malawi. Trans R Soc Trop Méd Hyg 1999; 93(1):32-5.

11. Laraqui CH, Ottmani S, Hammou MA, et al. Étude de la tuberculose chez les profissionnel de santé du secteur public au Maroc. Int J Tuberc Lung Dis 2001; 5 (10):939-45.

12. Menzies D, Fanning A, Yuan L, et al. Hospital ventilation and risk for tuberculous infection in canadian health workers. Ann Intern Med 2000; 133(10):779-89.

13. Muzy de Souza GR, Gonçalves M, Carvalho ACC, et al. Controle de infecção hospitalar por tuberculose. Pulmão RJ 1997; 6 (4):220-27.