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Boletim de Pneumologia Sanitária

versión impresa ISSN 0103-460X

Bol. Pneumol. Sanit. v.10 n.1 Rio de Janeiro jun. 2002

 

EDITORIAL

 

Estaríamos no limiar de uma nova contagem regressiva?

 

 

Gilmário M. Teixeira

Editor

 

 

Em conjunto com as entidades que integram a parceria "Stop T-B", a Organização Mundial de Saúde, em três recentes publicações -"The Global Plan to Stop TB", "TB Towards a TB-Free Future" e "TB/HIV Strategic Framework to Decrease the Burden of TB/HIV" -dá-nos a medida precisa da importância que a tuberculose assume no contexto dos grandes problemas de saúde que afligem a sociedade humana contemporânea. Estes documentos encerram a vontade de governos e de organizações não-governamentais para reunir, em uníssono, e sob uma mesma linha programática, recursos, conhecimentos, experiências que, nos quatro cantos do mundo, estão voltados para o controle da tuberculose.

Em realidade, a tragédia mundial da tuberculose, dimensionada por estes valores que há anos repetimos, qual uma litania -um terço da população está infectada e, a cada ano, surgem mais de oito milhões de casos e morrem mais de dois milhões de pessoas -projeta-se assustadora com a consabida ineficiência das ações de controle praticadas que, em termos globais, diagnosticam menos da metade dos casos existentes e curam menos de sessenta por cento dos casos diagnosticados. Estes dados e mais o agravamento da tuberculose pela pobreza, a exclusão social, o baixo nível de desenvolvimento econômico, a associação com a aids, fazem desta entidade um crítico agente de ruptura do tecido social.

Afortunadamente, a partir de 1993, quando a OMS declara a tuberculose uma emergência mundial, tem lugar uma sucessão de iniciativas de repercussão global que buscam direcionar a pletora de recursos que, mundo afora, muitas vezes, são aplicados com inobjetividade e dispersão, para uma caudal comum que reúne em uma das maiores parcerias de saúde da atualidade -"Global Partnership to Stop TB" - esforços, técnica, inteligência, com o objetivo de racionalizar, no ambiente de cada país, o emprego dos meios que estão disponíveis para derrotar a tuberculose.

O Plano Global para Deter a Tuberculose, apresentado pela "Parceria Stop TB", surge como natural consequência da Conferência de Amsterdã e do Foro Mundial para Deter a Tuberculose e tem o propósito de eliminar esta doença como problema de saúde pública, definindo, para tanto, quatro objetivos e suas respectivas estimativas de gastos para o primeiro período de cinco anos: 1- expandir a estratégia DOTS (US$6.2 bilhões); 2- adaptar a DOTS ao desafio do H IV e da TBMR (US$1.7 bilhão); 3- melhorar os atuais e desenvolver novos instrumentos de controle (US$1.1 bilhão); 4- fortalecer a Parceria Global para Deter a Tuberculose (US$75 milhões). A estrutura do orçamento, segundo as fontes, mostra que 49,6% são de origem nacional, 8,9% recursos externos e 41,4% representam um "gap" financeiro.

As metas perseguidas pelo Plano são aquelas da OMS e estão fixadas para dois horizontes temporais: 2005 - detectar 70% dos novos casos de TB ativa, tratá-los com DOTS e curar pelo menos 85% dos casos tratados; 2010 - reduzir em 50%, comparativamente ao ano 2000, as taxas de morte e de prevalência da tuberculose.

Daqueles objetivos, o que abarca a expansão da estratégia DOTS e o que contempla o impacto determinado pelo H IV e a TBMR, representam um crítico desafio a ser superado pelos países, destacadamente os vinte e dois que formam o grupo com maior carga de tuberculose, dos quais o Brasil é um deles.

Com este propósito, poderíamos destacar que o Brasil conta com um Programa de Controle da Tuberculose que, enraizado na história da saúde pública nacional, descentralizado, hierarquizado, integrado nos diferentes níveis do sistema de saúde e fortalecido por equipes técnicas qualificadas e atualizadas, pode lastrear, com propriedade, as ações a serem implementadas para que o país cumpra os compromissos assumidos com o Plano Global para Deter a Tuberculose.

Neste sentido, o Ministério da Saúde, através da Área Técnica de Pneumologia Sanitária e em parceria com as secretarias estaduais e municipais de saúde, pôs em marcha, em Novembro de 2001, um Plano Nacional de Mobilização e Intensificação das Ações para Eliminação da Hanseníase e Controle da Tuberculose. Este Plano busca intensificar: a mobilização técnica, política e social para o alcance das metas de controle, a descentralização das ações, a mudança do modelo de atenção, a melhoria da vigilância epidemiológica, a ampliação e qualificação da rede de laboratórios, a garantia da assistência farmacêutica e a capacitação e desenvolvimento de recursos humanos.

De tudo que está implícito nestas grandes linhas de ação merece destacado o papel que se reserva aos Programas de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde que, ao incorporarem ao conjunto de suas atividades aquelas específicas do controle da tuberculose, põem em marcha um exército de dezenas de milhares de agentes, uma verdadeira força-tarefa, que comporta a possibilidade de cobertura, em nível útil, da estratégia DOTS em nosso país.

A idéia de contagem regressiva para eliminação da tuberculose que dá título a este editorial, em realidade, é mais uma provocação do que uma real expectativa a ser alcançada em um determinado espaço do tempo. Neste particular, não seria demasiado considerar que a tuberculose, em sua história natural, viveu sensíveis momentos que poderiam ter sinalizado o início dessa contagem regressiva. Três, pelo menos, foram marcantes: a descoberta do bacilo em 1882, o início da vacinação BCG na década de vinte e o emprego da quimioterapia, sobretudo depois da isoniazida, no começo dos anos cinqüenta.

Fiel a esta lógica, poder-se-ia admitir, sem incidir em exagero, que a atual reunião das forças anti-tuberculose de todos os países, sob a égide de um Plano Mundial que, encerrando recursos, inteligência e tecnologia multinacionais, desencadeia uma guerra sem fronteiras para vencer a tuberculose, marcasse mais um momento de início de uma nova contagem regressiva.

O "Stop TB", em "TB Towards a TB-Free Future", depois de repassar o progresso das múltiplas iniciativas dos últimos anos -"Global Plan to Stop TB", "Global DOTS Expansion Plan", "Global Drug Facility", "Global Fund to Fight AIDS, Tuberculosis and Malaria" e outras -formula esta pergunta: "Há esperança de um magnífico novo mundo livre de TB depois de 2005?" E responde: "Quanto ao controle, sim; quanto à eliminação, ainda não." E acrescenta:" Apesar de estarmos ainda em um mundo longe da eliminação, há o compromisso de eliminar a tuberculose como um problema global de saúde pública, dentro dos próximos 50 anos -um objetivo audacioso e alcançável. Podemos mandar a tuberculose para a lata de lixo da história".

Que esta provocação em torno do momento de início de uma nova contagem regressiva para eliminação da tuberculose, sirva, para quantos estamos envolvidos nesta luta, como estímulo mobilizador da consciência e potencialidade dos grupos técnicos e das forças da comunidade, para buscar, com ousadia, o encurtamento dos horizontes de programação e, assim, travar hoje, batalhas que se vislumbram em um futuro longínquo.