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Informe Epidemiológico do Sus

versão impressa ISSN 0104-1673

Inf. Epidemiol. Sus v.8 n.2 Brasília jun. 1999

http://dx.doi.org/10.5123/S0104-16731999000200007 

Controle da Malária Pós-Transfusional na Amazônia Brasileira: proposta de modificação das normas técnicas

 

Relatório do encontro sobre controle da Malária Pós-Transfusional na Amazônia - Manaus/98*

 

 

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O encontro sobre o controle da malária pós-transfusional em áreas endêmicas permitiu a avaliação dos procedimentos de triagem rotineiramente empregados na hemorrede pública, além de ampliar o debate, no que se refere à malária, para a atualização das normas técnicas que constam na regulamentação da Medicina Transfusional do Cone Sul. Entre as questões debatidas pelos participantes, constaram os critérios epidemiológicos de seleção de doadores e o emprego de testes sorológicos e/ou parasitológicos na identificação de doadores de risco. Como propostas aprovadas, ficou estabelecido que se devem rejeitar candidatos à doação que apresentaram malária nos últimos 12 meses, ou febre nos últimos 30 dias; candidato com suspeita de malária nos últimos 30 dias; candidato procedente ou residente em área de alto risco de malária. Será aceito, porém, submetido a testes parasitológicos, o candidato que apresentou malária entre 12 a 36 meses antes da doação e for procedente de área de médio e baixo risco de malária. A classificação das áreas em alto, médio e baixo risco deverá ser baseada no Índice Parasitário Anual (IPA), cuja informação deverá ser regularmente fornecida pela Fundação Nacional de Saúde. Não serão empregados testes sorológicos na triagem de doadores.

Palavras-Chave: Malária Pós-Transfusional; Controle da Malária; Malária em Doadores de Sangue.


SUMMARY

The meeting on the control of transfusional transmitted malaria in endemic areas evaluated the screenning procedures used in public blood centers and enlarged the discussion about the updating of the technical norms for malaria existent in the regulation of the Transfusion Medicine of the South Cone. The epidemiological criteria for donors selection and the use of sorological and/or parasitological tests in the identification of risk donors were some of the subjects debated by the participants. It was approved and established that candidates for donation that presented malaria in the last 12 months; with fever in the last 30 days; with malaria suspicion in the last 30 days; procedent or resident of an area of high malaria risk, should be rejected. Candidates that presented malaria 12 to 36 months before the donation or coming from area of medium and low malaria risk, will be accepted after submittion to parasitological tests. The classification of the areas in high, medium and low risk should be based on the Annual Parasitic Index, information that should be supplied by the National Health Foundation. Sorological tests will not be used for donor screening.

Key Words: Post-transfusion Malaria; Malaria Control; Malaria in Blood Donors.


 

 

Introdução

O controle da malária pós-transfusional ainda representa um grande desafio para os serviços hemoterápicos situados na região amazônica, onde ocorrem cerca de 99% do total de casos registrados no país.

Na ausência de testes sorológicos capazes de detectar os doadores de sangue com risco de transmitir malária, tal como os empregados no controle de outras infecções pós-transfusionais, critérios epidemiológicos de triagem de candidatos a doação de sangue têm sido recomendados pelo Ministério da Saúde, em suas Normas Técnicas em Hemoterapia, desde 1989. Segundo estes critérios, em áreas endêmicas, deverão ser rejeitados para a doação aqueles candidatos que apresentaram malária há doze meses, com história febril há 30 dias, ou que se deslocaram para áreas com transmissão, nos últimos seis meses.

A regulamentação da Medicina Transfusional no Cone Sul, proposta na resolução de março de 1998 entre os países membros, preconiza que doadores que tiveram malária sejam excluídos permanentemente da doação. Tal resolução, se efetivada, traria um grande impacto aos centros hemoterápicos de áreas endêmicas devido ao elevado descarte de doadores. Mesmo em países industrializados, onde não há casos autóctones de malária, doadores de sangue que apresentaram malária não são excluídos definitivamente da doação.

Recentemente, o emprego de testes parasitológicos tem sido introduzido em alguns Hemocentros localizados na Amazônia, principalmente o teste Quantitative Buffy Coat (QBC), como teste complementar à triagem epidemiológica.

Com o objetivo de avaliar os criérios de seleção de doadores de sangue, atualmente em vigor na hemorrede pública de áreas endêmicas, e com a finalidade de subsidiar a revisão das normas em discussão no Mercosul, foi organizado um encontro sobre o "Controle da Malária Pós-Transfusional na Amazônia", que contou com a participação da Coordenação de Sangue e Hemoderivados (COSAH), da Organização Panamericana de Saúde (OPAS), da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), além de representantes dos vários hemocentros localizados na Amazônia.

No presente artigo, relatam-se a situação do controle da malária pós-transfusional apresentada durante o referido encontro e as propostas aprovadas para a atualização de normas técnicas voltadas para as áreas endêmicas de malária.

 

Metodologia da discussão

Nos dias 30 e 31 de julho de 1998, sob a organização do Centro de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas, os participantes reuniram-se para, em um primeiro momento, conhecer a situação epidemiológica da malária nas Américas e no Brasil, apresentadas pelos representantes da OPAS e FUNASA, respectivamente.

A seguir, cada hemocentro participante apresentou os critérios epidemiológicos e laboratoriais utilizados no controle da malária, além de dados relativos à quantidade de candidatos à doação, no período de janeiro de 1996 a junho de 1998. Com a finalidade de padronizar as informações apresentadas, cada hemocentro recebeu, antecipadamente ao evento, uma ficha para preenchimento, na qual constavam as seguintes informações: número de candidatos à doação; número de unidades coletadas; número de candidatos rejeitados na triagem clínica; número de candidatos rejeitados devido a procedência de área de malária; número de candidatos rejeitados por antecedente de malária; tipo de registro das informações sobre malária obtidas na triagem clínica; recebimento de dados periódicos sobre a ocorrência de casos de malária na área de abrangência, fornecidos pela Fundação Nacional de Saúde; critérios epidemiológicos e laboratoriais adotados na triagem dos doadores; existência de notificação sobre a ocorrência de casos de malária pós-transfusional pelos usuários da hemorrede.

Após as apresentações, os participantes foram divididos em pequenos grupos, com um roteiro previamente elaborado, no qual constavam perguntas referentes às condutas a serem adotadas na rotina de triagem de doadores para o controle da malária. Ao final, em plenária, os grupos apresentaram o resultado das discussões havendo debate para as questões não consensuais, de modo a ser possível estabelecer um critério único a ser adotado na triagem de candidatos à doação de sangue, nos vários Estados.

 

Dados Apresentados

De acordo com o que foi previamente solicitado, os representantes dos hemocentros apresentaram os dados relativos a sua rotina de triagem de candidatos à doação, cujas informações constam na Tabela 1.

 

 

Deve-se salientar que somente nos Estados do Pará e Amazonas adota-se o critério de rejeitar doadores procedentes de área com transmissão, conforme a Portaria 1.376, de 19/11/1993, do Ministério da Saúde que estabelece normas técnicas em hemoterapia. Os demais hemocentros empregam somente o critério de recusar candidatos com antecedente de malária nos doze meses anteriores à doação.

A contribuição da malária para a rejeição de candidatos à doação de sangue, nos vários Estados da Amazônia, pode ser observada na Figura 1.

 

 

Durante a triagem clínica do doador, são obtidas informações relacionadas ao risco de exposição à malária, que a maioria dos hemocentros registra na ficha de entrevista, em conjunto com os demais critérios estabelecidos nas Normas Técnicas em Hemoterapia. Entretanto, os Hemocentros de Rondônia e Roraima não registram estes dados rotineiramente, e o Hemocentro do Amazonas, além do registro na ficha de entrevista, utiliza um formulário específico para identificar o tipo de exposição, o local e as características do doador.

O Hemocentro do Amazonas também é o único que recebe informações periódicas sobre a ocorrência de casos de malária nos bairros da capital e nos municípios do interior do Estado, por meio de dados trimestrais fornecidos pela FUNASA, além de ser notificado, esporadicamente, sobre a ocorrência de casos de malária pós-transfusional.

Apesar das Normas Técnicas em Hemoterapia não recomendarem testes laboratoriais na triagem de doadores, a maioria dos hemocentros emprega testes parasitológicos como complemento aos critérios epidemiológicos. Para a pesquisa de plasmódios, adota-se a gota espessa, ou testes comercialmente disponíveis como o QBC (Becton-Dickinson), capaz de detectar as diferentes espécies de plasmódios, e o Parasight (Becton- Dickinson), teste específico para P. falciparum. Nenhum hemocentro emprega testes sorológicos para a detecção de anticorpos, devido ao elevado descarte que tal medida acarretaria.

Na Figura 2 apresenta-se o tipo de teste parasitológico empregado na triagem de doadores de sangue, nos vários Estados da Amazônia.

 

 

Recomendações aprovadas

Em relação aos candidatos à doação com antecedente de malária antecedente de malária recomenda-se :

• Rejeitar candidatos com malária há 12 meses.

• Rejeitar candidatos com febre nos últimos 30 dias.

• Rejeitar e submeter a teste parasitológico candidato com suspeita de malária nos últimos 30 dias.

• Coletar e submeter a teste parasitológico o candidato que teve malária entre 12 a 36 meses.

Em relação aos candidatos à doação que se deslocaram para áreas com ocorrência de casos de malária recomenda-se:

• Rejeitar por 30 dias candidato procedente de área de alto risco de malária, definida segundo o Índice Parasitário Anual (IPA). Após 30 dias, o candidato poderá ser aceito se não apresentou malária ou febre sugestiva de malária. O IPA é igual ao total anual de casos novos de malária de uma área dividido pela população exposta vezes 1.000.

• Coletar e submeter a teste parasitológico candidato procedente de área de médio e baixo risco.

Em relação aos candidatos à doação que residem em área com ocorrência de casos de malária recomenda-se:

• Rejeitar candidato com residência em área de alto risco (ver classificação segundo o Índice Parasitário Anual). O doador será considerado apto somente quando o IPA de seu local de residência permitir, ou seja, quando for de médio ou baixo risco.

• Coletar e submeter a teste parasitológico candidato que reside em área de médio e baixo risco.

Reafirmou-se a necessidade de que todas as unidades de triagem e coleta de doadores de sangue recebam boletins epidemiológicos atualizados da Fundação Nacional de Saúde contendo o Índice Parasitário Anual, segundo as localidades (bairros ou municípios).

Foi sugerida a classsificação do IPA em baixo, médio ou alto risco de acordo com os seguintes critérios:

Baixo Risco: IPA = 0 a 9.9
Médio Risco: IPA = 10 a 49.9
Alto Risco: IPA = 50 ou mais

 

Quanto ao registro das informações

Recomenda-se que as informações da triagem clínica e o resultado do teste parasitológico sejam registrados em ficha de entrevista específica para malária.

 

Conduta diante de caso notificado de malária pós-transfusional

O hemocentro, após obter a confirmação do diagnóstico do receptor, deverá investigar o caso convocando os doadores envolvidos, os quais devem ser submetidos a testes parasitológicos e/ou sorológicos. No caso de confirmação de transmissão transfusional, recomenda-se o registro do caso.

Recomenda-se que os hemocentros estimulem a notificação de casos suspeitos de malária pós-transfusional, por meio de comunicação escrita aos usuários da Hemorrede.

 

Participantes

Aldenor Lopes de Oliveira (HEMOAM)
Carlos Alberto Gomes (HEMORAIMA)
Carlos José Mangabeira Silva (FUNASA)
Dagmar Kiesslich (HEMOAM)
Dione Liza Lessa (HEMOAM)
Felícia Aragão Adler (HEMOMAR)
Francisco de Assis Maia Jr. (HEMOMAR)
Francisco R. dos Santos (HEMERON)
Graça Alecrim (I.M.T.M./AM)
Hélio Moraes dos Souza (COSAH)
Hildenete Monteiro Fortes (HEMOMAT)
João Bosco Bagio (FUNASA/AM)
João Carlos Pina Saraiva (HEMOPA)
José Carlos Catão (OPAS)
José Joaquim F. Sandoval (I.M.T.M./AM)
Kátia Luz Torres Silva (HEMOAM)
Leny Nascimento M. Passos (HEMOAM)
Luciano G.Cavalcanti (HEMORAIMA)
Luisa Lopes Simões (FUNASA/AM)
Maria de Fátima Nascimento (FUNASA/AM)
Marcelo Urbano Ferreira (HEMERON)
Márcia Araújo (HEMOAM)
Márcia da Silva e Silva (HEMOAM)
Maria Augusta de Morais (HEMOACRE)
Maria Auxiliadora M. Lima (HEMOACRE)
Maria Jucilene F. Soares (HEMORAIMA)
Maria Luzanilda Oliveira (HEMOAM)
Maria Peixoto Corrêa Costa (HEMOMAT)
Marineide Souza Bastos (HEMOPA)
Neide Tavares (HEMOAM)
Nelson Abrahim Fraiji (HEMOAM)
Petrônio Bezerra Lola (HEMOTO)
Raimundo Nonato A. Silva (FUNASA/AM)
Rosalice B. F. Feitosa (HEMORAIMA)
Rosângela Augusto Elias (FUNASA/AM)
Rubenita da Silva Costa (HEMOAM)
Socorro Viga (HEMOAM)
Sônia Campelo (HEMOAM)
Tereza Jaqueline C. Cortês (HEMOAM)
Wamberto de Souza Lira (FUNASA/AM)
Wanderley José Silva (HEMOTO)
Wilson Alecrim (I.M.T.M./AM)

 

 

Endereço para correspondência:
Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas
Av. Constantino Nery, 3240,
Chapada - Manaus - AM
CEP: 69.050-002
E-mail:hemoam@hemoam.org.br

 

 

*Coordenado por: Dagmar Kiesslich com a colaboração de: Márcia Almeida de Araújo, Maria do Socorro Viga Yurtsever e Kátia Torres da Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas.