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Informe Epidemiológico do Sus

versão impressa ISSN 0104-1673

Inf. Epidemiol. Sus v.9 n.4 Brasília dez. 2000

http://dx.doi.org/10.5123/S0104-16732000000400005 

Análises dos resultados de exames de escarros, provenientes de unidades de saúde, hospitais e presídios do município de São Paulo, para o diagnóstico da tuberculose

 

Analysis of sputum examinations results provided by health units. hospitais and jails of São Paulo city for the diagnosis of tuberculosis

 

 

Péricles Alves Nogueira; Regina Maura Cabral de Melo Abrahão; Maria lvette Carboni Malucelli

Laboratório de Micobactérias/Depto. de Epidemiologia/Faculdade de Saúde Pública -USP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Para o controle da tuberculose, é essencial o conhecimento da prevalência dos dados de positividade da baciloscopia e cultura de escarros. No Laboratório de Micobactérias da Faculdade de Saúde Pública -USP, de julho de 1996 a dezembro de 1999, foram examinados 3.713 escarros, sendo 3.087 para diagnóstico e 626 para o controle de tratamento. Os escarros foram provenientes de 12 Unidades de Saúde da cidade de São Paulo, de quatro Hospitais Públicos e de dois Presídios. Nas amostras das Unidades de Saúde foram realizadas baciloscopia e cultura em 2.394 para diagnóstico e em 626 para o controle de tratamento. A positividade dos diagnósticos foi de 12,6 % para a baciloscopia e 16,0 % para as culturas e dos controles de tratamento, 24,0 % para as baciloscopias e 16,0 % para as culturas. A positividade da baciloscopia e cultura para o diagnóstico das 167 amostras dos Hospitais foi de 41,3% e 42,0% e das 526 amostras dos Presídios de 15,6% e 15,8%, respectivamente. Observou-se uma maior positividade em pacientes do sexo masculino na faixa etária de 21 a 30 anos. Recomenda-se que os laboratórios tenham uma maior atuação e participação na Vigilância da Tuberculose para adoção de uma estratégia mais ativa.

Palavras-Chave:Tuberculose; Diagnóstico Laboratorial; Baciloscopia; Cultura; Controle de Tratamento.


SUMMARY

For tuberculosis control lhe knowledge of the prevalence of positive smear examinations and culture testing is essential. From July 1996 to December 1999, 3,713 samples of sputum (3,087 for diagnosis of tuberculosis and 626 for treatment control) were examined in lhe Laboratory of Mycobacteria of the School of Public Health of the University of São Paulo. The samples were provided by 12 health units, 4 hospitais and 2 jails of lhe City of São Paulo. Health units provided 2,394 samples for diagnosis and 626 for treatment controlo Of lhe samples provided for diagnosis, 12.6% were smear positive and 16.0% had positive cultures. Twenty-four percent (24.0%) and 16.0% of lhe treatment control samples were smear and culture positive, respectively. Of a total of 167 samples sent by hospitais for diagnosis, 41.3% were smear positive and 42.0% had positive cultures. Smear and culture positive samples were obtained in 15.6% and 15.8%, respectively, of a total of 526 samples sent by the jails. A greater number of positive smears in male patients, with ages between 21 and 30 years were observed. Laboratories should have. a greater performance and participation in tuberculosis surveillance in order to enhance control strategies.

Key Words: Tuberculosis; Laboratorial Diagnosis; Smears; Culture; Treatment Controlo.


 

 

Introdução

Graças ao crescimento da incidência e à grande mortalidade por tuberculose em vários países, com indícios desse aumento também no Brasil, torna-se necessário maior esforço no sentido de implementar todas as ações de controle da doença. A principal medida de controle da tuberculose continua sendo a busca de casos bacilíferos seguida de seu tratamento correto, esperando-se, assim, reduzir a transmissão.1

Considerando que o objetivo do Programa Nacional de Controle da Tuberculose é romper a cadeia de transmissão da doença, isto pode ser alcançado descobrindo-se e tratando-se mais precocemente, as fontes de infecção. Assim, o laboratório, através da bacteriologia, ocupa um papel fundamental no diagnóstico e controle da tuberculose.1,2

Por ser a tuberculose pulmonar a forma mais freqüente da doença, o principal material biológico investigado é o escarro de sintomáticos respiratórios (pessoas com tosse e expectoração por quatro semanas ou mais),3 grupo de grande interesse, pois oferece maior rendimento na descoberta de casos.1,2,3

Os métodos bacteriológicos (baciloscopia e cultura) ainda são prioritários para o diagnóstico da tuberculose, pois permitem a demonstração do bacilo, estabelecendo a etiologia da doença, ocupando um papel de fundamental importância na luta contra a tuberculose.

Em face à alta prevalência da doença, há a necessidade de utilização de métodos laboratoriais simples, rápidos, confiáveis e pouco onerosos, que permitam identificar a maioria dos doentes, em especial os "eliminadores de bacilos", os grandes responsáveis pela transmissão da tuberculose.

A bacteriologia permite o diagnóstico de certeza, pelo encontro do bacilo nos mais variados materiais e o faz com bastante precisão, enquanto os demais métodos utilizados, quando não é possível o diagnóstico bacteriológico, possibilitam o diagnóstico de modo indireto.

A baciloscopia é um exame simples, rápido, econômico e permite descobrir as fontes de infecção mais contagiantes; entretanto, segundo o I Consenso Brasileiro de Tuberculose, 1997,4 ainda há uma subutilização da baciloscopia de escarro em nosso meio.

A cultura é o método mais específico e sensível para detectar o bacilo da tuberculose e está indicada na confirmação dos casos de tuberculose pulmonar, sobretudo nos casos iniciais onde a baciloscopia é negativa, no diagnóstico da tuberculose extrapulmonar e no diagnóstico diferencial de outras doenças respiratórias.1,2,3,5,6

Entre os novos exames diagnósticos para a tuberculose, destacam-se o método radiométrico (BACTEC), métodos sorológicos (ELISA -Enzyme- linked immunosorbent assay) e técnicas de biologia molecular (RFLP -Restriction fragment lenght polymorphism; PCR - Polymerase chain reaction).1,2,3,5,7,8,9,10,11

O método radiométrico (BACTEC) tem várias desvantagens, incluindo a necessidade de radioisótopos, de equipamento mais sofisticado e tecnologia mais complexa, além de custo elevado, sendo usado em poucos laboratórios. Em casos de infecção mista, não se conseguem isolar outras espécies de micobactérias, sendo recomendado cultivar os espécimes nos meios tradicionais como Lowenstein-Jensen e 7H-10, concomitantemente ao sistema BACTEC.7,11

Os testes de radioimunoensaio ELISA são muito sensíveis nas áreas geográficas com alta prevalência de tuberculose, nas quais as formas clínicas avançadas são mais freqüentes, mas são menos sensíveis nos países com baixa prevalência. Seu emprego é vantajoso por ser de fácil execução, baixo custo operacional e de interesse para o diagnóstico da tuberculose em massa nos países em desenvolvimento. Há, no entanto, o inconveniente de o antígeno 5 (o primeiro antígeno empregado para fins epidemiológicos no diagnóstico da tuberculose ativa) não ser estável, dificultando a sua estocagem e transporte.8,11

Apesar de existirem técnicas diagnósticas mais modernas, ainda é aconselhável confiar nas já estabelecidas, pois as novas e, em particular o PCR, necessitam de mais avaliações no sentido de evitar resultado falso-negativo e falso-positivo,1,2,9,10,11 requerem tecnologia sofisticada e recursos elevados, fatores geralmente ausentes nas regiões de alta prevalência da tuberculose,1,2 devendo ser usadas em conjunção com a cultura (e não em seu lugar).9,10,11 Portanto, o exame bacteriológico com a realização da baciloscopia e cultura ainda é o padrão-ouro para o isolamento das micobactérias e para a avaliação de testes diagnósticos.2

O Laboratório de Micobactérias do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (Laboratório), há mais de 20 anos realiza exames de baciloscopia e cultura em escarros e outros materiais biológicos, de sintomáticos respiratórios atendidos no Centro de Saúde Escola dessa Faculdade.

Há cinco anos, a realização destes exames foi estendida à outras 11 Unidades de Saúde (US), quatro Hospitais Públicos e dois Presídios masculinos.

Visando a uma maior atuação e participação do Laboratório na Vigilância da Tuberculose, foi objetivo deste estudo analisar a positividade da baciloscopia e cultura dos exames de escarros, provenientes das diferentes Instituições, no qual se avaliaram os resultados dos exames realizados no período de 01 de julho de 1996 a 31 de dezembro de 1999.

 

Metodologia

Foram analisados escarros de pacientes provenientes de 12 Unidades de Saúde, quatro Hospitais Públicos e dois Presídios masculinos [um com superpopulação carcerária (A) e um Distrito Policial (B)] da cidade de São Paulo, Todos os exames foram encaminhados ao Laboratório de Micobactérias, acompanhados de uma papeleta de requisição contendo os seguintes dados: data, unidade requisitante, nome, idade, sexo, material enviado, diagnóstico ou controle de tratamento, e um campo para informação dos resultados da baciloscopia e cultura. Nessa papeleta não havia um campo destinado as doenças associadas e, as informações a respeito do HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana ), existiram até 1997.

Dessas 12 Unidades de Saúde apenas duas requisitaram exames para o diagnóstico e controle de tratamento da tuberculose. As outras dez Unidades de Saúde, os quatro Hospitais e os dois Presídios, requisitaram os exames apenas para o diagnóstico da doença.

As amostras foram submetidas à baciloscopia e cultura e processadas seguindo-se técnicas padronizadas pelo Laboratório, baseadas no Manual de Bacteriologia da Tuberculose do Ministério da Saúde, 1994. 1

As amostras destinadas ao controle de tratamento foram classificadas em:

  • 10 controle (c1) - quando a baciloscopia e cultura foram realizadas no 10 mês após o início do tratamento;
  • 20 controle (c2) - quando a baciloscopia e cultura foram realizadas no 20mês após o início do tratamento e assim sucessivamente, até o 100 controle (C10) cuja baciloscopia e cultura foram realizadas no 100 mês após o início do tratamento.

Todas as amostras enviadas foram processadas e analisadas somente por esse Laboratório.

Para a realização da baciloscopia, as amostras de escarros foram submetidas confecção de esfregaços em lâminas de vidro lapidadas, com uma extremidade fosca medindo 26 x76mm e espessura 0,9 a 1,1mm, sendo fixados e posteriormente corados pelo Método Fluorescente (Auramina), para triagem. A leitura foi efetuada em microscópio de fluorescência (Jenamed 2 -Carl Zeiss) e, quando positivas, o esfregaço foi recorado pela técnica de Ziehl-Neelsen e o resultado apresentado em cruzes.

Para a cultura, processou-se a descontaminação dos escarros pelo Método de Petroff, que consiste na concentração das amostras por centrifugação após tratamento com NaOH a 4% contendo vermelho de fenol como indicador, acidificação com HCl a 4% e posterior neutralização até atingir pH=7.

Em seguida, com uma pipeta de vidro de 1ml, foram semeadas quatro gotas do sedimento descontaminado de cada amostra, em dois tubos de meio de Lowenstein-Jensen e incubados a 37°C por um período de 30 a 60 dias, sendo o resultado apresentado em cruzes (quando positivo), de acordo com o número de colônias.

 

Resultados

O Laboratório, no período de 10 de julho de 1996 a 31 de dezembro de 1999, recebeu 3.771 amostras de escarros, das quais 58 não foram realizadas pelos seguintes motivos:

  • pote vazio: 46 amostras;
  • pote sem identificação: 7 amostras;
  • pote com nome de outro paciente: 1 amostra;
  • papeleta de requisição do exame enviada sem o pote: 1 amostra;
  • pote com fezes e não escarro: 1 amostra;
  • fragmentos de lóbulo de orelha: duas amostras

Foram examinados 3.713 escarros, dos quais 3.087 para o diagnóstico da tuberculose e 626 para o controle de tratamento.

Na Tabela 1 estão apresentados os resultados da baciloscopia e cultura das amostras de escarros provenientes das 12 Unidades de Saúde, num total de 2.394 exames; dos quatro Hospitais, com 167 exames e de dois Presídios, sendo 379 exames do Presídio A e 147 do Presídio B.

 

 

Nas amostras das US a positividade das baciloscopias de diagnóstico ocorreu em 296 (12,4%) das 2.394 amostras de escarro e em 375 (15,7%) culturas.

Os Hospitais enviaram 167 amostras somente para o diagnóstico dos pacientes internados e nenhuma para o controle de tratamento. A positividade dos exames para o diagnóstico da tuberculose dos pacientes foi de 69 exames (41,3%) para a baciloscopia e 70 (42,9%) para a cultura.

Os Presídios enviaram 526 amostras para o diagnóstico da tuberculose. Apositividade da baciloscopia e cultura das 379 amostras do Presídio A foi de 79 exames (20,8%) e 80 (21,1%), respectivamente. Nas 147 amostras do Presídio B foram encontrados três exames positivos (2,0%) tanto para a baciloscopia como para a cultura.

As amostras para controle de tratamento, enviadas por duas Unidades de Saúde, totalizaram 626 exames, dos quais 150 foram positivos na baciloscopia (24,0%) e 100 na cultura (16,0%). A Tabela 2 apresenta os resultados positivos na baciloscopia e cultura, respectivamente, em 46,1% e 41,4% das 152 amostras que eram 10 controle de tratamento (C1); em 32,7% e 15,0 % das 107 amostras que eram 20controle de tratamento (C2) e assim, sucessivamente: 17,0% e 5,3 % das 94 de C3; 15,7% e 4,5% das 89 de C4; 9,7% e 2,8% das 72 de C5; 7,1% e 7,1% das 70 de C6; 18,8% e 18,8% das 16 de C7; 0,0% e 8,3% das 12 de C8; 0,0% e 14,3 % das 7 de C9 e 0,0% e 0,0% das 7 de C10.

 

 

Em relação à faixa etária dos pacientes, observou-se (Tabela 3) uma maior positividade entre 21 a 30 anos, imediatamente seguida pela faixa de 31 a 40 anos, demonstrando que a tuberculose acomete as pessoas na fase mais produtiva da vida.

 

 

Quanto ao sexo, dos 3.713 exames realizados, 2.524 (68,0%) eram de pacientes do sexo masculino e 1.189 (32,0%), do sexo feminino. Desse total, 678 (18,3%) exames foram positivos, sendo 536 (79,1 %) da população masculina e 142 (20,9%) da feminina.

Em relação ao HIV, até 1997, existia na papeleta de requisição de exames um campo para fornecer informações ao laboratório se positivo, negativo ou ignorado. Entretanto, raramente o laboratório recebia essas informações. Na maioria das vezes, a papeleta estava preenchida com a opção "HIV ignorado". Mesmo com esta informação prejudicada, constaram nas papeletas de requisição 19 casos de HIV positivo, sendo dois casos de Unidades de Saúde; dez casos de Hospitais e sete casos do Presídio A.

 

Discussão

O Laboratório, no período estudado, recebeu 3.771 amostras de escarros, das quais 58 (1,5%) não foram realizadas devido ao envio de potes vazios, ou sem identificação, ou com nome de outro paciente, ou sem o material biológico, ou contendo fezes e não escarro, ou outro material biológico.

É de fundamental importância que os profissionais de saúde conheçam as condições que asseguram a confiabilidade dos resultados da baciloscopia e da cultura, dando suporte ao laboratório para fornecer resultados confiáveis. Para isto, é necessário que o laboratório receba espécimes adequados, ou seja, os que provêm do local da lesão que se investiga, obtidos em quantidade suficiente, colocados em recipiente apropriado, corretamente identificados, conservados e transportados.1

Entretanto, parece existir um problema de comunicação entre os pacientes e os profissionais que lhes transmitem as informações, gerando dificuldades na compreensão e apreensão destas informações.1

Nas amostras provenientes das Unidades de Saúde e destinadas ao diagnóstico, o resultado obtido na baciloscopia (12,4% de positividade), foi concordante com estudos realizados por Nagpaul et al12 na Índia, os quais apontaram uma variação de 3,0% a 13,0% de positividade na baciloscopia. Um percentual de 11,0% foi relatado por Grzybowski,13 também na Índia, entre os sintomáticos respiratórios examinados em uma zona rural. Valenzuela et al,14 em alguns laboratórios do Chile, obtiveram, em média 3,1% de positividade na baciloscopia, com variação de 1,8% a 6,5%. No Brasil, Arantes & Trivelatto,15 em estudo de cadastramento bacteriológico realizado em Ribeirão Preto, observaram uma positividade de 5,3% e, em avaliações das atividades de controle realizadas pela Divisão Nacional Contra a Tuberculose,1 observou-se uma variação de 8,0% a 13,0%, destacandose que a maior taxa (10,4%) foi encontrada na Região Sudeste. Possivelmente, o rendimento da baciloscopia seja mais elevado nos grandes centros urbanos, onde é maior a disponibilidade do exame radiológico como primeiro recurso diagnóstico.

Quanto ao resultado obtido na cultura (15,7% de positividade nas amostras provenientes das Unidades de Saúde destinadas ao diagnóstico) também foi concordante com diversos estudos realizados, que apresentaram uma variação de 4,0 a 30,0% de positividade para a cultura. Gordim & Slutkin 16 encontraram taxas de positividade na cultura de 4,3% a 8,4%, e Kinyanjui et al 17 obtiveram um percentual de 7,0% a 17,4% de positividade.

Não foi possível uma avaliação do impacto causado por esta busca de casos na população de estudo, uma vez que esse laboratório realiza somente a baciloscopia e a cultura para o diagnóstico da tuberculose, não tendo acesso à informações sobre o tratamento; além de que, os dados contidos nas papeletas de requisição do exame são escassos, constando apenas nome do paciente, idade, sexo, material enviado, diagnóstico ou controle de tratamento e um campo para as informações dos resultados da baciloscopia e cultura. Até o final de 1997, havia um campo para HIV nas papeletas, mas, a partir desta data, essas informações foram omitidas. Além do mais, os Presídios enviaram apenas uma amostra de escarro por paciente. Entre as Unidades de Saúde, somente duas requisitaram exame para diagnóstico e demais controles.

A similaridade da positividade da baciloscopia e cultura, obtida nos exames enviados pelas Unidades de Saúde, provavelmente deve-se ao fato de que a maioria das amostras provinha de pacientes sintomáticos respiratórios, com suspeita de tuberculose.

Em relação às amostras provenientes dos Hospitais, uma positividade elevada de 41,3% para a baciloscopia e 41,9% para a cultura demonstra que o material biológico enviado era, provavelmente, de pacientes com o estado geral comprometido e que necessitaram de internação hospitalar em uma fase mais adiantada da doença, indicando o diagnóstico tardio da tuberculose pulmonar. No momento em que os pacientes são diagnosticados como positivos, são imediatamente encaminhados a outras instituições especializadas para o tratamento da doença, uma vez que estes Hospitais não realizam o tratamento e, portanto, não houve acesso às informações sobre a notificação e controle dos pacientes.

Uma atenção especial deve ser dada aos grupo de maior risco de adoecimento, como recomendado pelo Manual de Normas para o Controle da Tuberculose (Ministério da Saúde, 1995),3 representados sobretudo por portadores do HIV e pacientes com AIDS, não abordados em detalhes neste trabalho, dado que o acesso a estas informações não consta mais da papeleta de requisição para exames desde o final de 1997. Nas comunidades fechadas como: presídios, manicômios, abrigos e asilos, justifica-se a periódica busca ativa de casos, assim como em indivíduos marginalizados (alcoólatras, usuários de drogas e mendigos) e em trabalhadores em situações especiais, nas quais haja contato íntimo com paciente portador de tuberculose pulmonar bacilífera.

Os resultados obtidos quanto à positividade das amostras provenientes dos dois Presídios, quando analisados individualmente, foram diferentes, ou seja, o Presídio A, com superpopulação carcerária, teve 20,8% de suas amostras positivas na baciloscopia e 21,1 % na cultura, enquanto o Presídio B apenas 2,0% em ambos os testes. Uma possível explicação para este fato seria que, no Presídio A, os escarros foram colhidos após a triagem dos detentos e os exames realizados apenas nos sintomáticos respiratórios; ao passo que não houve uma triagem no B, onde o escarro de todos os detentos foram investigados.

A baciloscopia possui um grande valor na avaliação da quimioterapia, e, pela repetição mensal de exames baciloscópicos quantitativos, nos casos com evolução favorável, observa-se (Tabela 2) uma redução progressiva do número de bacilos até o seu desaparecimento completo, ao redor dos três meses. A persistência da baciloscopia positiva servirá como sinal de advertência à mudança de um esquema terapêutico ineficaz.

Em relação às amostras destinadas ao controle de tratamento, provenientes de duas Unidades de Saúde, a positividade tanto da baciloscopia quanto da cultura foi maior no primeiro controle de tratamento (C1), geralmente realizado um mês após o diagnóstico da tuberculose, com decréscimo nos meses subseqüentes, demonstrando um tratamento adequado. O fato de haver mais baciloscopias positivas do que culturas indica que, devido à ação dos quimioterápicos, os bacilos expelidos no escarro dos pacientes já estavam mortos ou permaneceram viáveis mas não cultiváveis. A persistência da positividade na cultura dos controles C8 e C9 não significaram falha no tratamento ou aparecimento de cepas resistentes, mas, sim, a presença de outras micobactérias, posteriormente identificadas em que não foi possível verificar associação com o HIV por falta de informações na papeleta.

Apesar de existirem outras metodologias mais sofisticadas e modernas para o diagnóstico da tuberculose pulmonar, ainda hoje, a baciloscopia e a cultura são os métodos de eleição tanto para o diagnóstico como para o controle do tratamento, principalmente em função da situação epidemiológica e econômica no Brasil, que, por ser um pais em desenvolvimento, sofre pela escassez de recursos financeiros. Assim, este estudo sugere uma maior atuação e participação do laboratório na Vigilância da Tuberculose, na tentativa do abandono da atual atitude passiva e adoção de uma estratégia mais ativa.

Esforços devem ser direcionados no sentido de que todas as informações relativas a pacientes com tuberculose no país sejam catalogadas e arquivadas em uma Unidade Central, fornecendo assim um perfil completo desses pacientes. Esta Unidade deveria ser de fácil acesso aos Serviços de Saúde Especializados, possibilitando estudos de correlação entre as diferentes variáveis, como, por exemplo, doenças associadas (alcoolismo, HIV, diabetes, etc.) e facilitando a troca de informações entre as diferentes Instituições de Saúde, contribuindo para uma sensível melhoria na notificação dos casos e aprimorando a Vigilância Epidemiológica da Tuberculose para que seja possivel atingir as metas no controle da doença.

 

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Endereço para correspondência:
Laboratório de Micobactérias -
Depto. de Epidemiologia -
Faculdade de Saúde Pública-USP
Av. Dr. Amaldo, 715
CEP: 01246- 904
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