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Informe Epidemiológico do Sus

versão impressa ISSN 0104-1673

Inf. Epidemiol. Sus v.2001 n.1 Brasília mar. 2001

http://dx.doi.org/10.5123/S0104-16732001000100002 

 

O Sistema de Informação de Atenção Básica como fonte de dados para os Sistemas de Informações sobre Mortalidade e sobre Nascidos Vivos*

 

The basic care information system as a data source for the mortality and live birth information systems

 

 

Maria Helena Prado de Mello Jorge; Sabina Léa Davidson Gotlieb

Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

No Brasil, a subenumeração dos dados dos Sistemas de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) e sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde (MS) é fato reconhecido. A atual ampliação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) do MS, que gera dados para o Sistema de Informação de Atenção Básica (SIAB/MS), fornece a oportunidade de avaliar sua contribuição para sanar parcial ou totalmente as deficiências de cobertura do SINASC e do SIM. Com esse objetivo, foram comparados os totais dos dados de 1998, informados pelos três Sistemas (SINASC, SIM e SIAB), verificando-se, em 92, 9 e 19 municípios do Ceará, de Sergipe e do Tocantins, respectivamente, que a informação do SIAB ultrapassa o total de nascidos vivos coletados pelo SINASC. Da mesma forma, em 43 e 48 municípios de Sergipe e de Tocantins, os dados do SIAB apresentaram-se em maior número do que o total de óbitos fornecido pelo SIM. Quanto aos óbitos menores de um ano, em 53 municípios do Sergipe, 125 do Ceará e 42 do Tocantins, o total do SIAB foi maior do que o do SIM. São propostos métodos para comparar os dados baseando-se em notificações dos fatos vitais. Tais formulários seriam preenchidos pelos agentes comunitários do PACS e encaminhados às Secretarias Municipais de Saúde que, por sua vez, após eliminação das possíveis duplicações, os transfeririam às Secretarias Estaduais e, dessa forma, suplementariam os dados do SIM e do SINASC.

Palavras-Chave: Sistemas de Informação; Natalidade; Mortalidade.


SUMMARY

The existence of under enumeration in the Live Birth and Mortality Information Systems of the Brazilian Ministry of Health (SINASC and SIM) is well known. The current enlargement of the Program of Health Community Agents of the Ministry of Health (PACS/MH), which produces data for the Basic Care Information System (SIAB), gives the opportunity to evaluate its contribution in improving, partially or completely, the insufficient coverage of the two Systems: SINASC and SIM. With this objective, the total number of events reported in 1998 by the three systems (SINASC, SIM and SIAB) was compared. It was verified that in 92, 9 and 19 municipalities of the States of Ceará, Sergipe and Tocantins, respectively, the number of live births informed in SIAB was larger than the total collected by SINASC. In relation to death information, SIAB presented a higher number than SIM, in 43 municipalities in the State of Sergipe and 38, in the State of Tocantins. Regarding to deaths under one year of age, the total informed by SIAB was higher than SIM data in 53, 125, and 42 municipalities of the States of Sergipe, Ceará and Tocantins, respectively. A method of comparison of the three systems is proposed based on the notification of vital events. Notification cards would be filled by the community agents and delivered to the Municipalities Health Offices. After duplication verification the cards would be delivered to the State Health Offices, to complete the Mortality and Live Birth Information Systems.

Key Words: Health Information System; Live Birth; Mortality.


 

 

Introdução

O conhecimento relativo à existência de subenumeração de mortes - e, dentre essas, principalmente a de menores de um ano - não é novo. Desde fins da década de 40, reiniciando-se nos anos 70, alguns autores chamavam a atenção para o fato de que, no Brasil, particularmente em áreas menos desenvolvidas, a situação do sub-registro de óbitos podia ser comprovada pela existência de número não desprezível de cemitérios clandestinos. Essa é a terminologia usada por pesquisadores da área específica de estatísticas de saúde para designar locais onde são feitos sepultamentos sem a exigência de qualquer documentação ou registro relativo às pessoas falecidas. Vários trabalhos foram feitos mostrando sua ocorrência, com o relato dos problemas encontrados, com o levantamento de hipóteses, bem como apresentando sugestões para a resolução desses problemas.1-5

Situação análoga ocorria em todo o país, quanto ao registro civil de nascimento vivo. As causas mais freqüentes pelas quais as famílias deixavam de promover o registro de nascimento de crianças eram, em geral, ligadas ao custo desses registros e à legitimidade da filiação.6-8 O registro de nascidos mortos, considerado também como obrigatório pela lei brasileira (Lei dos Registros Públicos),9 apresentava dificuldade equivalente.10,11

Visando solucionar, ou ao menos minimizar, esse estado de coisas, alguns investimentos foram feitos no setor, culminando com a promulgação da Lei no 9.534, de 10 de dezembro de 1997,12 que, finalmente, liberava de quaisquer ônus os registros de nascimentos vivos e mortos e de óbitos, no país.

Até hoje, entretanto, os problemas não estão resolvidos, e os Ministérios da Justiça e da Saúde, bem como o Poder Judiciário e o Programa Comunidade Solidária da Presidência da República, continuam a preocupar-se com o assunto e a tentar equacionar possíveis soluções.

Quanto à utilização das estatísticas relativas a esses eventos, o Ministério da Saúde, principal usuário dos dados advindos dos sistemas oficiais de informação sobre nascimentos e óbitos, tem optado por utilizar estimativas desses valores. Essa Instituição, na elaboração de suas políticas públicas para a área materno-infantil, baseia-se no comportamento de indicadores de saúde que, em nível de numerador, de denominador, ou ambos, dependem dos dados de nascimentos e óbitos (coeficiente de natalidade, coeficiente de mortalidade infantil e seus componentes, coeficiente de mortalidade perinatal, coeficiente de natimortalidade, coeficiente de mortalidade fetal, coeficiente de mortalidade materna, entre outros).

Ao calcular essas taxas, o Ministério da Saúde, a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), algumas outras Instituições e a própria Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) em seus Indicadores e Dados Básicos para a Saúde13,14 o fazem com dados estimados. Isso acontece, por exemplo, com a mortalidade infantil, com base em pressuposto de que os dados oficiais não são completos, deixando a desejar do ponto de vista quantitativo. Uma das principais falhas, quando se usam estas estimativas indiretas, seria a incapacidade de detectar mudanças de curto prazo nos indicadores, em decorrência de intervenções na área de saúde.

Uma forma de avaliar essa situação é a que se baseia nas razões entre os números de eventos informados e estimados (nascimentos e óbitos, e em especial os de menores de um ano) pela Fundação IBGE, segundo unidades da federação. Verifica-se que, em algumas áreas, seus valores são extremamente baixos, o que mostra as possíveis falhas de cobertura dos sistemas.

Assim, com referência ao SINASC (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos), em 1997, a razão para o país foi igual a 87,2%,1 variando entre 43,1% na Paraíba e cerca de 50% no Piauí e no Maranhão até razões maiores que 100% nos Estados das Regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, exceção feita aos Estados de Minas Gerais (56,9%) e de Mato Grosso (90%). Quanto a Minas Gerais, é preciso esclarecer que o Sistema não se encontrava ainda totalmente implantado.

Relativamente aos óbitos (cobertura média de 80%), Maranhão e Piauí também apresentaram os piores desempenhos, não alcançando, sequer, a metade desse valor. Quanto às mortes de menores de um ano, a razão média obtida para o país foi de pouco mais de 55%, enquanto nas Regiões Sul e Centro-Oeste a previsão de cobertura foi de cerca de 75%, na Região Sudeste, 90%, e nos Estados do Norte e Nordeste os óbitos informados não atingiram 50% dos estimados.

Como conseqüência, o IDB-98,14 ao apresentar a taxa de mortalidade infantil para estados brasileiros, em apenas uma pequena parcela deles (São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Rio Grande do Sul) admite basear sua informação em dados provenientes do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), justificando esse procedimento em razão da cobertura inadequada dos dados de nascimentos e óbitos para grande número de áreas do país (para essas, os coeficientes são estimados). Para o IDB-99/00 (no prelo) as estimativas passam a ser referidas para 20 unidades da federação, e em sete Estados (Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul) as taxas de mortalidade infantil são calculadas diretamente com os dados do SIM e do SINASC (informação verbal).

Com relação ao Coeficiente de Mortalidade Infantil, os valores obtidos pelos sistemas oficiais SIM e SINASC e as estimativas feitas pelo IBGE bem como as apresentadas por Simões,15 também, não são iguais. As diferenças entre eles são explicadas em razão da cobertura incompleta do número de óbitos de menores de um ano e de nascidos vivos, bem como de cálculos feitos por métodos indiretos, com diferentes metodologias.

O Sistema de Informações sobre Mortalidade, quando criado, em 1975/76, pretendia incluir, entre suas fontes, tanto as informações do Registro Civil quanto os dados informais. Em meados da década de 90, com base no que fora adotado pelo SINASC - de uma via do documento básico permanecer na instituição de saúde onde havia sido gerado - o SIM implantou mais uma via da Declaração de Óbito (DO). A recomendação do Ministério da Saúde era a de que esta deveria ser retirada diretamente pelo órgão responsável pelas estatísticas de saúde, em nível local; com esse procedimento, almejava-se poder alcançar cobertura de maior número de eventos, já que se passava a depender menos do registro civil, ou seja, para os óbitos ocorridos no hospital, mesmo que não viessem a ser registrados, o Serviço de Saúde passaria a conhecê-los, na medida em que retiraria a DO de sua própria fonte geradora - hospital. Com relação às informais, entretanto, o fato nunca chegou a se concretizar, em razão das inúmeras dificuldades encontradas.

Recentemente, após a implantação, no país, de alguns programas específicos do Ministério da Saúde, abrem-se novas perspectivas para essa possibilidade. Assim, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), que objetiva preparar pessoas da própria comunidade para transmitir informações básicas de saúde à população, e o Programa de Saúde da Família (PSF), que, além dessas noções, oferece tratamento primário , ambos iniciados na década de 90, prevêem um cadastramento das famílias atendidas, com levantamento de dados demográficos, socioeconômicos, culturais, relativos ao meio ambiente, bem como os referentes à mortalidade e morbidade. Esses Programas, idealizados para aproximar os serviços de saúde da população, têm gerado significativa quantidade de dados que, hoje, estão reunidos no Sistema de Informação de Atenção Básica (SIAB). O sistema produz relatórios, cujo objetivo é permitir conhecer a realidade sociossanitária da população acompanhada, avaliar a adequação dos serviços de saúde oferecidos, readequá-los sempre que necessário, visando, em última análise, melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados.16 Com relação, especificamente, aos eventos vitais, nascimentos e óbitos passam a ser conhecidos localmente em sua quase totalidade, dependendo da cobertura dos Programas.

Visto que os Programas estão se ampliando sensivelmente17,18 e, segundo informações verbais, em alguns municípios a abrangência é praticamente integral, justifica-se este trabalho. Com base no princípio pelo qual, cada vez mais, é necessário e importante usar os dados dos sistemas oficiais de informação - que devem, assim, ser aprimorados - objetiva-se sugerir um modo viável para incorporar às informações do SIM e do SINASC aquelas obtidas por fontes alternativas, no caso, o SIAB, um sistema de informações também oficial do Ministério da Saúde.

Embora o SIAB esteja voltado à atenção básica, é indiscutível que poderá contribuir, de forma bastante efetiva, para, no caso de serem descobertos eventos não incluídos nas estatísticas do SIM e do SINASC, aumentar a sua cobertura.

 

Metodologia

O material de trabalho é constituído por dados de óbitos (totais e de menores de um ano) e nascimentos vivos, provenientes do SIM e SINASC e dos obtidos por meio do banco de dados do SIAB, todos cedidos pelo CENEPI/FUNASA/MS.

As informações do SIM e do SINASC provêm respectivamente dos documentos DO e DN que seguem fluxo estabelecido e têm críticas já discutidas em outros trabalhos.19-23

O número de nascidos vivos do SIAB provém da Ficha B-GES (ficha de acompanhamento da gestante) onde é anotado o resultado de cada gravidez acompanhada pelo Programa. É importante salientar que a definição de nascido vivo adotada no Programa de Saúde da Família é também a usada internacionalmente, razão pela qual os eventos podem ser comparados.16 O número de óbitos (totais e de menores de um ano) provém da ficha D, consolidado no relatório SSA-2. Embora a idéia inicial deste trabalho fosse estabelecer a ligação (linkage) entre os registros desses eventos nos bancos referidos (SIAB versus SINASC e SIAB versus SIM) isso não foi possível em razão de o banco de dados do SIAB não apresentar os eventos individualizados mas, sim, já tabulados, mostrando apenas suas freqüências totais.

Para o projeto piloto, selecionaram-se os Estados do Ceará e Sergipe, na Região Nordeste, e Tocantins, na Região Norte, cujos dados, relativos ao ano de 1998, foram coletados.

Para a complementação dos dados do SINASC (ou do SIM), há necessidade de serem distinguidas situações diferentes:

1o) os dados não apresentam intersecção, isto é, os totais informados por cada um dos Sistemas (SINASC e SIAB ou SIM e SIAB) são excludentes, referindo-se a conjuntos diferentes (Figura 1). Por se considerar pouco provável sua ocorrência, não houve neste trabalho, simulação admitindo esta situação;

 

 

2o) os dados apresentam intersecção, isto é, existe um subconjunto de eventos comuns, pertencentes tanto a um sistema como ao outro (SIM e SIAB ou SINASC e SIAB). Esta intersecção pode ser parcial ou total, conforme as Figuras 2 e 3. Até o momento, não há possibilidade de serem reconhecidos os eventos comuns aos dois Sistemas, como anteriormente referido. Portanto, restou admitir que, caso a quantidade observada no SIAB fosse maior, a sua contribuição seria representada pela diferença numérica entre os totais de eventos por ele coletado e pelo SIM (ou SINASC), pressupondo-se que todos os pertencentes ao SIM (ou SINASC) também teriam sido coletados pelo SIAB (Figura 2, situação B).

 

 

 

 

Ainda na situação de intersecção, existe a possibilidade de que o total coletado pelo SIM (ou o SINASC) seja maior do que o do SIAB. Este fato ocorreu nas capitais dos estados analisados, onde se pressupôs que todos os eventos captados pelo SIAB já estavam contidos no SIM (ou SINASC).

A Figura 3 simula uma perfeita equivalência entre os fatos vitais pertencentes ao SIAB e ao SIM (ou SINASC). Considera-se, entretanto, que a probabilidade de sua ocorrência seja mínima.

Sabe-se que, com maior probabilidade, o SIAB atua mais intensamente nos municípios do interior dos estados; como decorrência, nas análises mais detalhadas, foram excluídas as informações relativas às capitais dos estados, em todos os sistemas. Complementarmente, em função de haver no SIM e no SINASC eventos em que o município de residência era ignorado, estes também foram excluídos.

O enfoque dado a este trabalho consistiu em admitir como modelo a situação B, da Figura 2. Para tanto, foram analisados os totais de eventos em cada um dos Sistemas (SIM, SINASC e SIAB) em cada um dos municípios pertencentes aos três estados selecionados. Somente naqueles em que o total do SIAB superou o total do SIM (ou do SINASC) foi analisado o ganho possível de informação.

Cabe ressaltar que, no Ceará, segundo informação obtida na Secretaria Estadual de Saúde, para o ano de 1998, o SIAB só foi alimentado com dados do PACS e do PSF, a partir do segundo semestre, visto que o Estado possuía sistema próprio de informação. Por essa razão, para nascidos vivos e óbitos de menores de um ano, os dados usados neste trabalho foram os existentes na referida Secretaria e correspondentes ao ano calendário.24 Relativamente aos óbitos totais, nesse Estado, trabalhou-se com os dados de julho a dezembro, motivo pelo qual algumas avaliações deixaram de ser feitas.

 

Resultados e discussão

Nascimentos vivos

Foi observado que, para os três Estados, o SINASC captou maior número de nascimentos do que o SIAB. A razão entre os totais oriundos dos dois sistemas variou de 1,5 no Ceará a 2,7 no Tocantins. Ao serem retirados os dados das capitais e referentes a municípios ignorados, as razões diminuem, embora, ainda permaneçam altas, no Tocantins (Tabela 1).

 

 

O fato de o SINASC ter cobertura mais completa é esperado em função de o próprio manual do SIAB prever: "ao identificar um nascido vivo que não possua Declaração de Nascido Vivo (DN) a equipe do programa deve providenciar a sua emissão".16 Cabe dizer que este incentivo à utilização da DN já constitui, por si mesmo, um aspecto bastante importante. Como decorrência, poder-se-ia pensar que não haveria contribuição possível do SIAB ao SINASC. Todavia, procedendo-se à distribuição dos nascimentos por município de residência, verifica-se que, em alguns deles, os totais informados pelo SIAB são maiores que os do SINASC. Para Sergipe, isto ocorreu em 12,2% dos municípios e para o Tocantins, a proporção foi de 16,2%. A possível contribuição seria de 201 nascidos vivos em Sergipe e 496, no Tocantins, imaginando a ocorrência da situação B da Figura 2, referida anteriormente. É importante salientar que, no Ceará, 50,6% de seus municípios (excluindo o da Capital) apresentaram, no SIAB, maior número de nascidos vivos que o verificado pelo SINASC, dando uma contribuição de 7.629 nascidos vivos desconhecidos do SINASC, adotando, também, a mesma hipótese.

Em termos de ganho para o SINASC, verifica-se que o acréscimo percentual variou entre 0,6%, em Sergipe, e 7,8%, no Ceará (Tabela 2).

 

 

Óbitos totais

A situação relativa à captação de óbitos totais pelos dois sistemas, SIM e SIAB, nos estados, permite verificar que a do SIM é sempre maior, sendo as razões, em Sergipe e no Tocantins, respectivamente, iguais a 2,3 e 2,4. Com a exclusão dos eventos relativos às capitais, esse valor passa a ser 2,1 no Tocantins, sendo surpreendente o caso de Sergipe, onde se verifica que o SIAB coleta um número um pouco maior de óbitos do que o próprio SIM, com razão igual a 0,99 (Tabela 3).

 

 

Relativamente ao Ceará, considerando apenas os óbitos ocorridos no segundo semestre, pelos motivos anteriormente apresentados, nota-se que as razões entre os totais fornecidos pelo SIM e SIAB foram 1,47 (para o Estado como um todo) e 1,04 com a exclusão dos eventos de Fortaleza e de residência em município ignorado.

Analisando os municípios do interior dos Estados, constata-se que em 43 municípios de Sergipe (58,1%) e 38 de Tocantins (32,8%) houve maior número de eventos coletados pelo SIAB (Tabela 4).

 

 

A contribuição desses municípios, diante da hipótese referente à situação B (Figura 2), levaria a um maior incremento, comparativamente aos verificados com os nascidos vivos. A percentagem de ganho seria 7%, no Tocantins, e 23,7%, em Sergipe. A análise relativa ao Estado do Ceará não pôde ser realizada por falta de informações.

Óbitos de menores de um ano

Diante de sua importância, os óbitos de menores de um ano, por serem componentes essenciais para a elaboração de indicadores de nível de saúde, principalmente na área materno-infantil, foram estudados separadamente.

A avaliação dos dois sistemas (SIM e SIAB) mostra que, do ponto de vista da cobertura desse evento, as diferenças são menores do que aquelas apresentadas para os óbitos totais, para os Estados de Sergipe e Tocantins (Tabela 5).

 

 

Excluindo-se os eventos referentes às capitais, nos dois sistemas, bem como os óbitos de residentes em local ignorado, no SIM, verifica-se que, no Tocantins, a razão foi de 1,3; de novo, no Estado de Sergipe, o SIAB capta mais eventos do que o SIM, com razão de 0,36; o mesmo acontecendo no Ceará, onde a razão foi igual a 0,77 (Tabela 5).

Analisando os resultados provenientes dos dois sistemas, nos diferentes municípios das três unidades da federação, com exceção das capitais, nota-se que, em 71,6% das cidades de Sergipe, houve predomínio do total de óbitos informado pelo SIAB em relação aos coletados pelo SIM. No Ceará, esse valor foi de 68,7% e, no Tocantins, bem menor (36,2% dos municípios).

É interessante verificar que o ganho propiciado pela possível inclusão dos dados do SIAB aos do SIM, em Sergipe, foi de 658 óbitos de menores de um ano, 909, no Ceará, e 145, no Tocantins, com acréscimos de 68,8%, 32,3% e 25,2%, respectivamente (Tabela 6).

 

 

Coeficiente de mortalidade infantil

Com base nos resultados obtidos e calculando-se uma taxa de mortalidade infantil corrigida, verifica-se ter havido um ganho importante no seu significado numérico. Estes dados, ainda que não completos, em razão dos pressupostos adotados, permitem reconhecer que esse indicador assume valores mais próximos da realidade do que os anteriormente considerados. Dessa forma, os aumentos nas taxas foram, respectivamente, de 23% no Ceará, 30% em Tocantins e 219% em Sergipe, lembrando que os valores correspondem às taxas estaduais, não incluídos os eventos das capitais (Tabela 7).

 

 

 

Considerações Finais

Ainda que o trabalho tenha sido feito com base em pressupostos, possivelmente nem sempre totalmente verdadeiros, é de se ver que o contato direto dos membros das equipes do Programa de Saúde da Família, principalmente, os agentes comunitários de saúde, constitui-se, ao menos nos municípios menores e mais afastados dos grandes centros, em uma excelente fonte de informações sobre os eventos vitais.

A partir dessa constatação, duas recomendações podem ser elaboradas:

1a) que os agentes de saúde incentivem a população a promover os seus registros a partir de declarações de nascido vivo e de óbito que os próprios agentes e médicos dos Programas poderiam fornecer, como aliás, já vem ocorrendo com relação à DN;

2a) que seja incluída, entre as atividades dos agentes, a elaboração de uma notificação para cada nascimento e cada óbito, ocorridos em suas áreas de atuação, e o encaminhamento às Secretarias Municipais de Saúde ou Secretarias Estaduais (na dependência do fluxo da informação de cada área). É necessário esclarecer que esta notificação não corresponde àquela já prevista no Manual do SIAB, mas diz respeito a uma notificação especial, com vistas a comunicar o evento aos responsáveis pelo SIM e pelo SINASC.

Com relação à primeira idéia, como aliás já comentado anteriormente, a situação já vem ocorrendo relativamente aos nascimentos vivos. Mesmo assim, entretanto, o trabalho permitiu apontar maior cobertura do SIAB em relação ao SINASC, em várias áreas, com contribuição que, embora pequena, possibilita aumentar o número de nascidos vivos no Estado, diminuindo, com isto, o nível de subenumeração desse evento. Dessa forma, sugere-se ao Ministério da Saúde que os agentes de saúde, para cada nascido vivo descoberto em razão de suas visitas, façam uma notificação às Secretarias Municipais de Saúde, conforme modelo a seguir (Figura 4).

 

 

No que se refere aos óbitos, apesar de ser extremamente importante a sua inclusão no sistema, existe o problema da causa de morte, assunto já bastante discutido, mas sobre o qual não há, ainda, na doutrina, entendimento uniforme. Tem sido comentado, e parece ser opinião da maioria, que as causas de morte declaradas por leigos não devam ser agregadas àquelas declaradas por médicos. Entretanto, considera-se fundamental que o SIAB faça a comunicação para que, ao menos do ponto de vista quantitativo, a correção possa ser feita.

Dessa forma, pode-se concluir que, relativamente às mortes, a segunda idéia parece ser a mais recomendável. Imagina-se, então, que, descoberto um caso de óbito, os agentes devam preencher uma notificação que seria enviada à Secretaria Municipal de Saúde (que, por sua vez, a enviaria à Secretaria Estadual), instância na qual seria verificado se essa morte já estaria ou não incluída no Sistema, a partir das informações constantes na ficha apresentada a seguir (Figura 5).

 

 

Nesse nível, se for constatado que o óbito já se encontra no SIM, a notificação é apenas arquivada; caso contrário, no nível estadual, o caso deve ser incorporado ao Sistema, sugerindo-se que passe a haver, na Declaração de Óbito oficial, quando esta vier a sofrer modificação de desenho, uma anotação especial, referindo que se trata de um óbito notificado pelo SIAB.

É importante salientar que os dados aqui apresentados referiram-se à situação B (Figura 2), isto é, caso em que houve intersecção dos dados provenientes dos dois sistemas, e que o total do SIAB foi maior do que o total do SIM (ou SINASC). Entretanto, caso houvesse dois conjuntos completamente diferentes, a contribuição do SIAB seria muito maior. Portanto, pode-se afirmar que o ganho real está entre o mínimo apresentado pela situação B e o máximo, por esta última hipótese.

Apesar de não ter sido possível conhecer a real cobertura dos Programas PACS e PSF, nestas áreas, mas, imaginando que ela pudesse ser ainda expandida, provavelmente o ganho seria também maior.

A despeito da simulação realizada, verifica-se que os valores das novas taxas de mortalidade infantil, para o Ceará, Sergipe e Tocantins, mostram-se ainda bem distantes das estimativas feitas pelo IBGE ou por Simões15. A hipótese a ser aventada seria a de que, possivelmente, estes últimos valores, estariam superestimando a real situação. Recomenda-se que pesquisas operacionais locais sejam realizadas, a fim de detectar onde está a verdade.

 

Agradecimentos

As autoras agradecem a Roberto Men Fernandes, do CENEPI da Fundação Nacional de Saúde, Ministério da Saúde, pela prestimosa colaboração ao fornecer as tabulações relativa aos dados solicitados.

 

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Endereço para correspondência:
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
Av. Dr. Arnaldo, 715.
São Paulo/SP.
CEP: 01246-940.
Tel.: (11) 3066-7744 / FAX: (11) 282-2920.
E-mail: mhpjorge@usp.br / sgotlieb@usp.br

 

 

* Trabalho apresentado na 2a Reunião dos Comitês Assessores de Mortalidade e Nascidos Vivos, em setembro de 2000, em Brasília, e cujos resultados originaram reuniões entre os técnicos do CENEPI e da Secretaria de Políticas Públicas, responsáveis pelo SIAB.