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Informe Epidemiológico do Sus

versión impresa ISSN 0104-1673

Inf. Epidemiol. Sus v.10 n.2 Brasília jun. 2001

http://dx.doi.org/10.5123/S0104-16732001000200001 

EDITORIAL

 

A saúde coletiva e o impacto crescente dos acidentes e violências

 

 

Marilisa Berti de Azevedo Barros

Comitê Editorial - IESUS

 

 

No cenário dos agravos à saúde ganharam relevância nas últimas décadas aqueles decorrentes de acidentes e violências. Se foi fenômeno de alcance quase universal, ficaram evidentes as peculiaridades com que se expressa em diferentes momentos e contextos: sejam de países, regiões, cidades ou segmentos sociais. E quão impressionantes são as diferenças entre as taxas observadas. São agravos que irremediavelmente remetem às formas de relações e organização da vida social, às condições de vida e de trabalho e de como as subjetividades se expressam.

Um conjunto relevante de doenças, lesões e mortes se origina no ambiente e nas condições de trabalho. A tendência das taxas de mortalidade por acidentes de trabalho registra sabidamente apenas parte da gravidade do problema que afeta os trabalhadores brasileiros. E isto se agudiza com o crescimento relativo do trabalho no setor informal e o processo contínuo de exclusão social. Muitos estudos brasileiros têm contribuído para o dimensionamento dos problemas de saúde dos trabalhadores, enfocando diferenciados agravos, em variados setores da produção. Mas muito ainda está por ser feito. Em particular com respeito aos trabalhadores de pequenas e micro empresas que têm sido pouco estudados.

O artigo de Binder e colaboradores,1 incluído neste número do Informe Epidemiológico do SUS, vem ajudar a sanar lacunas desse conhecimento trazendo importante subsídio ao mapear as principais exposições ocupacionais dos trabalhadores de oficinas de reparação de veículos automotores, ramo que se encontra fundamentalmente organizado em micro e pequenas empresas. E os achados dos autores quanto ao cumprimento de exigências legais pertinentes e quanto à existência de equipamentos de segurança trazem conhecimento que descortina as possíveis estratégias de intervenção para prevenção de doenças e acidentes neste ramo de atividade ocupacional.

No campo da Saúde Coletiva / Saúde Pública esforços importantes têm sido investidos na organização de programas de Saúde do Trabalhador e em sistemas de vigilância de doenças e acidentes de trabalho. Têm sido relatadas e analisadas muitas experiências, inclusive em dissertações de mestrado e teses de doutorado, que revelam o engajamento do trabalho acadêmico nesta área de pesquisa e intervenção. Verifica-se que as investigações e programas em Saúde e Trabalho ocorrem num campo em que com mais agudeza se expressam os conflitos de interesses dos segmentos sociais envolvidos, o que tem constituído um desafio difícil para os que investem neste terreno.

O artigo de Vilela e colaboradores2 apresenta a experiência que vem sendo desenvolvida no Programa de Saúde do Trabalhador de Piracicaba, SP. Analisando os avanços que vem sendo obtidos com as diretrizes que norteiam o trabalho da equipe interinstitucional, os autores apresentam a proposta com que pretendem prosseguir em sua tarefa, oferecendo importantes subsídios que podem ser compartilhados por outros grupos envolvidos na construção de novas estratégias para os programas de saúde do trabalhador. A potencialidade e insuficiência das fontes de dados existentes é considerada pelos autores e significativa é a proposta de desenho de novo instrumento de informação que atinja também os trabalhadores que não estão registrados pela Consolidação das Leis do Trabalho.

Além dos acidentes de trabalho, os de transporte são responsáveis por outro importante conjunto de lesões e mortes que afetam a população. Com taxas decrescentes em algumas capitais brasileiras, os acidentes de transporte persistem com taxas muito elevadas e crescentes em outras, especialmente as das Regiões Norte e Centro-Oeste. A possibilidade de redução das lesões e mortes provocadas por acidentes de transporte fica exemplarmente reconhecida pela sua inclusão no pequeno grupo de causas de óbito componentes da lista de mortes evitáveis selecionadas pelo Grupo de Trabalho da Comunidade Européia; inclusive as mortes por transporte são assumidas nessa lista como item capaz de avaliar políticas de saúde.

Porém, a mais impressionante mudança no perfil de lesões e mortes foi presenciada nos grandes centros urbanos brasileiros com o aumento da violência e sua expressão fatal, os homicídios; quadro que acabou por tomar conta do cotidiano das pessoas, dominando o conjunto da mídia e constituindo hoje reconhecidamente um dos ou o principal enfrentamento a ser feito pela sociedade brasileira. A onda de violência, na fúria com que se apresenta, acaba por atravessar todos os segmentos sociais, embora os estudos realizados, revelem taxas muitas vezes mais elevadas entre os segmentos menos afluentes. Se a intensidade dos contrastes sociais, produto de maiores concentrações de renda, e da crescente fragilização da coesão social, ao lado de uma organizada rede de narcotráfico, com presença cada vez mais acintosa, geram o aumento das taxas que não poupa segmentos da população, o fato é que formidáveis diferenças de risco se apresentam entre grupos etários, de gênero ou étnicos.

O impacto da violência sobre os serviços de saúde tem sido estudado por alguns autores com estimativas sobre o volume de internações e consultas e dos custos que representam para o sistema. Também a violência gerada pelos próprios serviços, tem sido sujeita ao escrutínio de pesquisadores da área.

A disponibilidade e progressivo aprimoramento dos Sistemas de Informação de Saúde do país tem possibilitado melhor compreensão do quadro de saúde e de seus condicionantes, também no que diz respeito aos acidentes e violências.

O artigo de Koizumi e colaboradores3 ilustra o uso do SIH-SUS, para o conhecimento do perfil de internações por traumatismos crânio-encefálicos de crianças menores de 10 anos. Verificar a importância das quedas, dos acidentes de transporte e das agressões, entre outras causas, na origem dessas internações só se tornou possível a partir de Portaria do Ministério da Saúde, de final de 1997, estabelecendo a necessidade de informar também a causa externa da internação, naquelas provocadas por acidentes e violências. As autoras destacam o potencial que ainda resta para esta informação à medida que se qualifique mais o preenchimento das AIH.

Os artigos incluídos neste número ilustram as possibilidades de análises que se descortinam com as informações existentes, a potencialidade do aprimoramento das informações e necessidade de complementação por novos dados e pesquisas, contribuindo os três artigos com significante conhecimento para a construção de novas estratégias de pesquisa e intervenção no campo da Saúde Coletiva.

 

Referências bibliográficas

1. Binder MCP, Wernick R, Penaloza ER, Almeida, IM. Condições de trabalho em oficinas de reparação de veículos automotores de Botucatu (São Paulo): nota prévia. Informe Epidemiológico do SUS 2001;10(2):63-75.

2. Vilela RA, Ricardi GVF, Iguti AM. Experiência do Programa de Saúde do Trabalhador de Piracicaba: desafios da vigilância em acidentes do trabalho. Informe Epidemiológico do SUS 2001;10(2):77 - 88.

3. Koizumi MS, Jorge MHPM, Nóbrega LRB, Waters C. Informe Epidemiológico do SUS 2001;10(2):89-97.