SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.11 número4Agradecimentos aos Pareceristas do Informe - 2001 e 2002Utilização de informações hospitalares do sistema único de saúde para vigilância epidemiológica e avaliação de serviços ambulatoriais em São José dos Campos-São Paulo índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

  • No hay articulos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Informe Epidemiológico do Sus

versión impresa ISSN 0104-1673

Inf. Epidemiol. Sus v.11 n.4 Brasília dic. 2002

http://dx.doi.org/10.5123/S0104-16732002000400003 

 

Participação da população em projeto de controle de dengue em Belo Horizonte, Minas Gerais: uma avaliação

 

Popular participation in a dengue control project in Belo Horizonte, Minas Gerais: an valuation

 

 

Elisabeth FrançaI; Juliana Colen de PaulaII; Rosânia Raquel SilvaIII; Luciana Rodrigues AnunciaçãoIII

IDepartamento de Medicina Preventiva e Social/FM/UFMG
IICoordenação SOS-Saúde/Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte
IIIEscola de Enfermagem/UFMG

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A participação da população na prevenção e controle da dengue é considerada uma questão crucial para o enfrentamento da doença. Em Belo Horizonte, com a ocorrência de epidemia de dengue clássico no primeiro semestre de 1998 - cerca de 87 mil casos e uma das maiores taxas de incidência em cidade de grande porte no Brasil - várias medidas de intervenção foram adotadas pelos serviços de saúde do município. Entre elas, destaca-se o projeto "Adote seu quarteirão", criado para incentivar a participação de moradores, em conjunto com o centro de saúde, no combate ao vetor da dengue e outros problemas relevantes de saúde da população. Com o objetivo de avaliar a implantação dessa proposta, realizou-se pesquisa para verificar o grau de participação do adotante de quarteirão e de resolução de problemas locais identificados. Retirou-se amostra probabilística de 324 adotantes para entrevista. Verificou-se que 93% dos respondentes classificaram o projeto como bom ou ótimo e 38% identificaram algum problema no seu local de moradia e participaram de sua solução. O grau de resolução dos problemas locais identificados foi considerado satisfatório (91%). Discutem-se neste artigo algumas questões relativas à implantação dessa proposta, que avançou ao criar mecanismos institucionais para a inserção ativa da população no controle da dengue.

Palavras-Chave: Controle da Dengue; Participação da População; Avaliação de Programas.


SUMMARY

Community participation is crucial to prevent and control dengue. A large epidemic of classical dengue occurred in Belo Horizonte during the first quarter of 1998. Approximately 87,000 cases were reported, one of the highest incidence rates among large Brazilian cities. A community participation project entitled "Adopt a block" was one of the intervention measures undertaken by municipal health authorities, among others. Its main objective was to stimulate residents of a given street block to participate in the fight against the vector of dengue and other relevant health problems, together with local health units. A survey was carried out to assess the degree of participation and possible results related to the resolution of locally identified problems. Interviews were conducted in a probability sample of 324 participants. Results indicated that 93% of the participants classified the project as good or very good and 38% had participated in the solution of problems identified in their area of residence. The degree of resolution was considered good (91%). In this paper we discuss the implementation of this project which created institutional mechanisms for an active community participation in dengue control activities.

Key Words:Control; Community Participation; Program Evaluation.


 

 

Introdução

A dengue é atualmente sério problema de saúde pública mundial. Em 1998, foram registradas 15 mil mortes e 1,2 milhões de casos de dengue e febre hemorrágica de dengue ou síndrome do choque de dengue. Estima-se em cerca de 50 milhões os casos de infecção por ano e mais de dois bilhões o número de pessoas que vivem em locais infestados pelos vetores.1 Epidemias da doença têm ocorrido em quase todos os Estados do Brasil. A circulação simultânea do sorotipo 1 (DEN-1) e do sorotipo 2 (DEN-2) e, mais recentemente, também do sorotipo 3 (DEN-3), aumenta o risco de epidemias por febre hemorrágica da dengue, como pôde ser verificado com a eclosão da grave epidemia ocorrida em 2002 no Rio de Janeiro.2-4

A prevenção da doença representa um desafio para os serviços de saúde, pois se resume no combate ao vetor, o Aedes aegypti, único transmissor com importância epidemiológica nas Américas.5 Para diminuir os criadouros do vetor, o Ministério da Saúde preconiza o saneamento ambiental e o controle químico. Propõe, para incentivar a participação comunitária, reforçar a educação em saúde, visando informar à população sobre a doença, o vetor e as medidas preventivas.2 Verifica-se, entretanto, que as campanhas educativas centradas na divulgação de informações não produzem mudanças significativas de comportamento, apesar de atingir a população, proporcionando conhecimento sobre a dengue, seus vetores e as medidas de controle.6,7

O Município de Belo Horizonte enfrenta epidemias de dengue desde 1996. Em 1998, ocorreu uma epidemia pelo DEN-1 de grande magnitude, com cerca de 87 mil casos notificados, correspondendo a uma das maiores taxas de incidência verificada em cidade de grande porte no Brasil - taxa anual de cerca de 4.100 por cem mil habitantes.8 A epidemia foi explosiva: concentrou-se nos meses de março e abril e diminuiu abruptamente em junho e julho, com poucos casos notificados. Em setembro, entretanto, foi verificado aumento de casos pelo DEN-2 e se confirmaram casos de dengue hemorrágico, prevendo-se a ocorrência de nova epidemia da doença no verão de 1999.9

Para fazer frente à epidemia, a Secretaria de Saúde do município intensificou o combate ao vetor e criou um serviço específico para atendimento de demandas da população, o SOS-Saúde. Para inserir a população de forma mais organizada no programa de controle da dengue, foi criado, em setembro de 1998, o projeto "Adote seu quarteirão" com o objetivo de mobilizar moradores de uma mesma quadra para atuarem em conjunto com o centro de saúde mais próximo e agente sanitário no combate ao vetor da dengue e outros problemas relevantes de saúde da população.10 Desde o início, essa proposta contou com o apoio da Universidade Federal de Minas Gerais, que disponibilizou estagiários para atendimento de demandas telefônicas no SOS-Saúde.11

A partir de solicitação da coordenação do SOS-Saúde, foi proposta avaliação do projeto "Adote seu quarteirão", buscando identificar o grau de participação do adotante e alguns resultados relativos à resolução de problemas locais identificados.

 

Material e métodos

Após inscrição voluntária do participante (denominado adotante) no projeto, os centros de saúde eram responsáveis pelo fornecimento de material informativo e de curso de capacitação para o repasse de informações relativas à dengue e outros problemas de saúde. A partir de então, os adotantes deveriam participar das atividades de controle de dengue no seu quarteirão, contatando os vizinhos e acompanhando, sempre que possível, o agente sanitário durante as visitas domiciliares.10

Para a avaliação, foi retirada amostra probabilística dos adotantes inscritos desde o início da proposta (setembro), até a primeira quinzena de novembro de 1998. Esse período foi definido para garantir ao adotante tempo suficiente para inserção efetiva no projeto antes da entrevista, realizada na última quinzena de dezembro. Utilizou-se amostragem proporcional ao número de inscritos em cada uma das nove regionais de saúde do município, com seleção aleatória sistemática dentro de cada regional. Para isso, usou-se listagem dos adotantes por ordem de inscrição. Para o cálculo do tamanho da amostra, utilizou-se uma proporção esperada de adesão de 50%, intervalo de confiança de 95% e precisão de 5%.

Os adotantes selecionados foram entrevistados por telefone por estagiários treinados, utilizando-se um questionário com nove perguntas fechadas e duas abertas. Os adotantes sem telefone ou com registro de telefone de terceiros (vizinhos) e os não localizados após pelo menos duas tentativas de contato (respeitando-se um intervalo de 24 horas entre a primeira e a segunda tentativa) foram substituídos pelo próximo da listagem. Antes da coleta de dados, realizou-se pré-teste para readaptar o questionário aos objetivos do estudo e adequar o tempo da entrevista.

Na entrevista, procurou-se verificar a forma de participação do adotante e o tempo decorrido entre sua inscrição e o início da atividade. Para investigar a sua real inserção, avaliou-se seu contato com o centro de saúde, com os agentes sanitários e com a vizinhança, além de sua disponibilidade para o acompanhamento do agente sanitário e se tinha identificado algum problema a ser solucionado no quarteirão. A resposta positiva ao último quesito foi considerada como indicadora de participação efetiva. A opinião do adotante sobre o projeto e suas observações, críticas e sugestões também foram consideradas.

Para a realização deste estudo, foram considerados princípios éticos. A participação dos adotantes foi voluntária e os dados obtidos na entrevista foram confidenciais e processados sem identificação do entrevistado.

Após a coleta de dados, as variáveis foram codificadas e posteriormente digitadas e analisadas no programa Epi- info 6.04.12 Inicialmente, foi feita análise de distribuição de freqüência de cada um dos quesitos, bem como identificadas as principais observações relativas ao projeto. Para determinar as variáveis associadas à participação efetiva do adotante, utilizou-se o teste do qui-quadrado. A magnitude da associação entre essa participação e as variáveis de interesse foi estimada pelo odds ratio (OR) e intervalo de confiança a 95% (IC95%). O nível de significância considerado foi de 0,05.

 

Resultados

Até a segunda quinzena do mês de novembro de 1998, tinham sido adotados cerca de 12% dos 16.183 quarteirões existentes em Belo Horizonte. Foram entrevistadas 324 pessoas, inscritas como adotantes do seu quarteirão, com maior proporção nos distritos sanitários Oeste e Leste (Tabela 1).

 

 

Os adotantes inscreveram-se principalmente nos centros de saúde e cerca de 19% durante palestras e em escolas. A maioria dos adotantes (57%) foi contatada pelos centros de saúde para participar de curso de capacitação em menos de 30 dias da data de inscrição. Entretanto, parcela dos adotantes (36%) relatou não ter sido convocada para o curso. Quando a iniciativa do contato era do próprio adotante, a maioria considerou adequadas as informações repassadas pelos centros de saúde. Quanto ao tempo para o trabalho junto ao agente, pequena proporção (15%) relatou não ter disponibilidade. Verificou-se que 45% deles relataram contato com o agente sanitário do local e 67% com a vizinhança, após identificar-se como adotante. Cento e vinte e três adotantes (38%) identificaram problemas em seu quarteirão, sendo então classificados como participantes efetivos (Tabela 2).

 

 

Na tabela 3 verifica-se que a participação efetiva do adotante associou-se significativamente com a forma de inscrição, com maior chance para os adotantes que se inscreveram nos centros de saúde ou por intermédio do agente sanitário (OR:1,70; IC95%:1,02-2,84). A realização de curso de capacitação no centro de saúde também se associou significativamente com maior participação no projeto (OR:2,58; IC95%:1,51-4,41). Variáveis relacionadas ao adotante, como sua disponibilidade e a iniciativa de contato com o centro de saúde, com o agente sanitário e com a vizinhança também se associaram significativamente com a participação efetiva. Como problemas importantes no quarteirão (Tabela 4), os adotantes identificaram alguns específicos relativos a focos do vetor, como eliminação de criadouros e caixas d'água sem tampa, além de outros mais gerais relacionados ao lixo, como limpeza de lotes vagos e de via pública. Os problemas identificados pelos adotantes foram considerados solucionados em sua maioria.

 

 

 

A maior parte dos adotantes considerou o projeto como bom (53%), ou ótimo (41%). Apesar de favoráveis, 43% (n=140) dos entrevistados explicitaram críticas ao seu funcionamento. A participação e conscientização da população, a resistência dos vizinhos e a falta de atuação da mídia na divulgação da proposta foram pontos críticos apontados por 14%, 11% e 8%, respectivamente, dos entrevistados. A atuação deficiente dos serviços de saúde foi também ressaltada, sendo atribuída a alguns fatores: demora no contato entre o centro de saúde e o adotante para o treinamento e para a resolução dos problemas levantados; número insuficiente de visitas do agente sanitário, seu despreparo e não envolvimento na proposta; falta de gratificação e de motivação do adotante; definição pouco precisa do papel do participante; inscrição sem a aquiescência do interessado; campanhas educativas e materiais informativos ineficazes; e não tratamento diferenciado para favelas. Alguns ado-tantes salientaram a boa recepção dos vizinhos e a importância do trabalho conjunto entre os serviços de saúde e a população.

 

Discussão

No Brasil, a circulação de mais de um sorotipo do vírus e a ocorrência crescente de epidemias periódicas e casos graves de dengue tornam crucial o envolvimento da população nos programas de controle da doença, que são baseados no combate ao vetor, de hábitos sabidamente domiciliares e peridomiciliares.6,13 A maioria das campanhas de incentivo à participação comunitária privilegia a divulgação de informações sobre a doença, em lugar de criar mecanismos institucionais que garantam a participação efetiva e contínua da população. O "Adote seu quarteirão", da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte, avançou um pouco mais ao promover, com a participação de voluntários, uma "mobilização social inteligente" para o combate ao vetor e outros problemas de saúde e ambientais.14

Planejado como estudo transversal, este trabalho não avaliou a continuidade do "Adote seu quarteirão" em Belo Horizonte, após a não eclosão da esperada epidemia em 1999. Entretanto, como proposta de avaliação pontual, desenvolvida a partir de solicitação de uma instância pública diretamente envolvida no processo de definição das ações de saúde municipais, com necessidade de respostas rápidas para perguntas colocadas conjunturalmente, este estudo teve o mérito de divulgar seus resultados de forma oportuna - cerca de dois meses após a solicitação da pesquisa. Isso, entretanto, implicou algumas limitações metodológicas. Uma refere-se a possível viés de seleção ao entrevistar somente adotantes com telefone (cerca de 31% dos sorteados não possuíam telefone e foram substituídos).

O êxito relativo do projeto é indicado pelo fato de que cerca de 40% dos participantes identificaram pelo menos um problema no seu quarteirão, ou seja, envolveram-se efetivamente com a proposta. A participação mais ativa associou-se com variáveis relacionadas à implantação do projeto, como a realização de curso de capacitação pelo adotante e o fato de sua inscrição ter sido feita no centro de saúde ou com o agente sanitário da área. Os participantes efetivos relataram proporcionalmente maior contato com o centro de saúde, com o agente sanitário e com a vizinhança - o que era esperado. Tanto essas variáveis quanto a identificação de algum problema pelo adotante estão associadas, indicando maior interesse e participação do adotante.

É importante lembrar, no entanto, que este estudo foi realizado no início de implantação do "Adote seu quarteirão", quando a dengue tinha grande importância para os serviços de saúde e para a população, devido à ocorrência de epidemia pelo DEN-1 no primeiro semestre de 1998. Em setembro do mesmo ano, com o aumento de casos pelo DEN-2, esperava-se epidemia mais grave que a anterior. Dessa forma, o projeto surgiu em um contexto de grande mobilização social, inserido em proposta ampla de controle da doença pelos serviços de saúde, que incluía utilização maciça dos meios de comunicação, ampliação das visitas dos agentes sanitários para todos os imóveis do município para tratamento de focos de vetores e trabalho educativo com a população, realização de mutirões de limpeza, além de medidas coercitivas, como a divulgação na imprensa de uma "lista suja" das instituições ou dos imóveis com alto índice de infestação larvária.15

Apesar de o projeto ter sido planejado para ter abrangência em todo o município, verificou-se menor proporção de adotantes em alguns distritos sanitários, indicando menor engajamento na proposta. Chama a atenção o fato de o participante efetivo ter relatado maior contato com a vizinhança do que com o agente sanitário, indicando pouco entrosamento com os profissionais do serviço de controle de zoonoses. O rodízio dos agentes nas áreas foi provavelmente um fator importante para o menor vínculo com os moradores. Em estudo qualitativo realizado em um bairro periférico de Catanduva, São Paulo, uma das sugestões apresentadas pelas mulheres entrevistadas foi a "(...) necessidade de o agente conhecer melhor a comunidade em que atua (...)", dificultada pelo rodízio dos agentes.16 Esses profissionais, responsáveis por visitas periódicas às moradias para o levantamento de índice e o tratamento de focos, muitas vezes não estão devidamente capacitados para o trabalho educacional com a população.17 Eles representam, entretanto, a face visível das práticas preventivas oficiais e podem ter um papel fundamental para a maior interação entre a população e os serviços de saúde.

Essas considerações, como quaisquer outras avaliações de participação popular em programas de controle de doenças, devem ser vistas com reserva, pela complexidade do seu objeto de estudo, em que o próprio termo "participação popular" pode conter diversas concepções e diferentes perspectivas. Para os serviços de saúde, o mutirão representa uma das propostas mais freqüentes de participação enquanto que, para a população, a participação popular efetiva implicaria conseguir os investimentos governamentais necessários para a provisão dos serviços básicos. A inoperância das instituições e a falta de investimento na infra-estrutura de consumo coletivo, como sistemas adequados de abastecimento de água e de coleta de lixo, adquirem maior visibilidade nos momentos epidêmicos.18,19 Ficam, entretanto, encobertas pelo enfoque individualizado da doença, em um processo de "culpabilização da vítima", ou seja, coloca-se sobre a pessoa a responsabilidade da doença, "por não ter seguido corretamente os conselhos de prevenção e combate ao mosquito".18

Sabe-se que um dos maiores problemas para o controle da dengue é que a luta contra o vetor deve ser contínua e não restrita às epidemias.4,13 Experiências em outros países têm demonstrado que a atuação do governo e a participação da comunidade podem assegurar o êxito no combate às epidemias.20,21 Entretanto, quando os casos da doença diminuem, arrefecem os esforços e o problema dengue é substituído na agenda oficial por outros problemas de saúde considerados mais urgentes.

Isso ocorreu, por exemplo, após a epidemia de 1986 do Rio de Janeiro quando, com a diminuição da transmissão e sua limitação às áreas periféricas, deixou de interessar à imprensa e seu controle de ser prioritário, tornando propícias as condições para o estabelecimento do processo endêmico-epidêmico.22 É reconhecida a dificuldade de manter a população constantemente mobilizada, às vezes por perceber-se a doença como inevitável e destituída de gravidade, mas, principalmente, quando a intervenção se baseia unicamente na divulgação de conhecimentos, ficando excluída a interlocução entre usuário e serviço.7,16,23 A relação autoritária assumida pelos serviços desconsidera o saber popular,18 e estes são vistos pela população como omissos em relação ao espaço público, como lotes vazios, por exemplo, e por isso desacreditados.16

A incidência da dengue, no entanto, geralmente é subestimada, principalmente nos períodos inter-epidêmicos, quando permanece a circulação dos vírus da doença. Conseqüentemente, muitas vezes a detecção da transmissão epidêmica é tardia.24 Além disso, mesmo quando a doença está sob controle em um município, epidemias freqüentes em outros locais dificultam a manutenção de níveis reduzidos de transmissão. Dessa forma, a dengue deve ser abordada como um importante e cotidiano problema de saúde pública, em que a participação da população é fundamental para seu controle.

Embora vários trabalhos apontem a falta de associação entre conhecimentos e práticas de controle da dengue,6,25 alguns programas de intervenção comunitária têm relatado mudança de atitudes da população, com diminuição dos criadouros do vetor.26 No projeto de Belo Horizonte, os adotantes identificaram problemas no seu quarteirão relacionados ao controle do vetor e outras questões ambientais e tiveram uma ação direcionada para sua solução, com resposta satisfatória dos serviços públicos envolvidos. Restou medir o impacto em relação ao cuidado com criadouros potenciais nas residências ou em suas mediações, de importância vital para o controle da dengue. Apesar disso, pode-se concluir que o "Adote seu quarteirão" teve méritos indiscutíveis, ao propor um trabalho de mobilização social para a participação efetiva da população no enfrentamento de um problema de saúde prioritário.

 

Agradecimentos

À Ludmila Lana Silva, da Coordenação do SOS-Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte e aos alunos bolsistas Marcelo Luís Moreira Silva, Sayonara Rodrigues das Graças e Vera Lúcia Vieira de Oliveira, pelo apoio e coleta de dados. Agradecimentos especiais a Mariângela Carneiro, do Instituto de Ciências Biológicas, e a Daisy Maria Xavier e Maria Suzana de Lemos Souza, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, pelas sugestões.

Pesquisa financiada pelo Centro de Extensão da Universidade Federal de Minas Gerais (bolsistas) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

 

Referências bibliográficas

1. Organização Mundial da Saúde. Dengue. Disease status. Burdens and Trends [online] (s.d.) [Capturado em 2002 Feb 15]. Disponível em: http://www.who.int/ctd/dengue/burdens.htm .

2. Fundação Nacional de Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 4ª ed. Brasília: Ministério da Saúde; 1998.

3. Nogueira RMR, Miagostovich MP, Marize P, Filippis AMB, Pereira MAS, Schatzmayr HG. Dengue vírus 3 in Rio de Janeiro, Brazil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 2001;96(7): 925-926.

4. Jurberg C. Dengue epidemic strikes Rio de Janeiro: as expected. Bulletin of the World Health Organization 2002;80(7):606-607.

5. Teixeira MG, Barreto ML, Guerra Z. Epidemiologia e medidas de prevenção do dengue. Informe Epidemiológico do SUS 1999;8(4):5-33.

6. Chiaravalloti Neto F, Moraes MS, Fernandes MA. Avaliação dos resultados de atividades de incentivo à participação da comunidade no controle da dengue em um bairro periférico do Município de São José do Rio Preto, São Paulo, e da relação entre conhecimentos e práticas desta população. Cadernos de Saúde Pública 1998;14(Supl.2):101-109.

7. Winch P, Lloyd L, Godas MD, Kendall C. Beliefs about the prevention of dengue and other febrile illnesses in Mérida, Mexico. Journal of Tropical Medicine and Hygiene 1991;94:377-387.

8. França E, Pastor V, Machado D, Ferreira AG, Savassi L, Aranha IA. Investigação epidemiológica de dengue em favela de Belo Horizonte. In: Caderno de Resumos do I Congresso Mineiro de Epidemiologia e Saúde Pública; 2000 Mai 24-27; Belo Horizonte, Brasil. Belo Horizonte: AMEP; 2000. p.14.

9. Siqueira M. Dengue volta a atacar: confirmado primeiro caso de hemorrágica após a grande epidemia. Estado de Minas 1998 Set 9;3:25.

10. Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Adote seu quarteirão ou beco. Informativo Adote seu Quarteirão e SOS-Saúde 1998;1(1):1-4.

11. França E, Martins MA, Tavares AP, Pastor MVA, Eiras AE, Gontijo RA et al. Atuação interdisciplinar de uma universidade durante epidemia de dengue em Belo Horizonte, MG, em 1998 [resumo]. Ciência e Saúde Coletiva 2000;5(Supl.1):456.

12. Dean AG, Burton AH, Dicker RC. Epi-info: a word processing, database and statistics program for epidemiology [computer program]. Version 2. Atlanta: Centers for Disease Control; 1994.

13. Dias JCP. Problemas e possibilidades de participação comunitária no controle das grandes endemias no Brasil. Cadernos de Saúde Pública 1998;14 (Supl.2):19-37.

14. Lisboa AH. Adote seu quarteirão. Belo Horizonte: PBH; 1998.

15. Sampaio C. Prefeitura faz caça a "amigos da dengue". O Tempo 1998 Set 24; Cidades:5.

16. Chiaravalloti VB, Morais MS, Chiaravalloti Neto F, Conversani DT, Fiorin AM, Barbosa AAC et al. Avaliação sobre a adesão às práticas preventivas do dengue: o caso de Catanduva, São Paulo, Brasil. Cadernos de Saúde Pública 2002;18(5):1321-1329.

17. Lenzi MF, Camillo-Coura L, Grault CE, Val MB. Estudo do dengue em área urbana favelizada do Rio de Janeiro: considerações iniciais. Cadernos de Saúde Pública 2000;16(3):851-856.

18. Valla VV. Sobre participação popular: uma questão de perspectiva. Cadernos de Saúde Pública 1998;14(Supl.2):7-18.

19. Oliveira RM. A dengue no Rio de Janeiro: repensando a participação popular em saúde. Cadernos de Saúde Pública 1998;14(Supl.2):69-78.

20. Gubler DJ, Casta-Valez A. Programa de prevención del dengue epidémico y el dengue hemorrágico en Puerto Rico y las Islas Vírgenes Estadounidenses. Boletin de la Oficina Sanitaria Panamericana 1992;113(2):109-119.

21. Donalisio MR. Reflexões sobre o controle de epidemias de dengue. In: Donalisio MR. O dengue no espaço habitado. São Paulo: Hucitec; 1999. p.173-174.

22. Sabroza PC, Toledo LM, Osanai CH. A organização do espaço e os processos endêmico-epidêmicos. In: Leal MC, Sabroza PC, Rodriguez RH, Buss PM, organizadores. Saúde, ambiente e desenvolvimento. v.2. São Paulo: Hucitec; 1992. p.56-77.

23. Yasumaro S, Silva ME, Andrighetti MTM, Macoris MLG, Mazine CAB, Winch PJ. Community involvement in a dengue prevention project in Marília, São Paulo State, Brazil. Human Organization 1998;57(2):209-214.

24. Gubler DJ. Vigilancia activa del dengue y de la fiebre hemorragica del dengue. Boletin de la Oficina Sanitaria Panamericana 1989;107(1):22-30.

25. Rosenbaum J, Nathan MB, Ragoonanansingh R, Rawlins S, Gayle C, Chadee DD et al. Community participation in dengue prevention and control: a survey of knowledge, attitudes and practice in Trinidad and Tobago. American Journal of Tropical Medicine and Hygiene 1995;53(2):111-117.

26. Lloyd LS, Winch P, Ortega-Canto J, Kendall C. Results of a community-based Aedes aegypti control program in Merida, Yucatan, Mexico. American Journal of Tropical Medicine and Hygiene 1992;46(6):635-642.

 

 

Endereço para correspondencia:
Av. Alfredo Balena, 190 - 10o andar
Belo Horizonte/MG.
CEP: 30.130-100.
E-mail:efranca@medicina.ufmg.br