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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.13 n.4 Brasília dic. 2004

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742004000400002 

ARTIGO ORIGINAL

 

A escolaridade afeta, igualmente, comportamentos prejudiciais à saúde de idosos e adultos mais jovens? – Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil*

 

Are health lifestyles of older and younger adults in Brazil similarly affected by education? – Health survey in the Metropolitan area of Belo Horizonte, Minas Gerais State, Brazil

 

 

Maria Fernanda Lima-Costa

Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento da Fundação Oswaldo Cruz e da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte-MG

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho teve por objetivo determinar a prevalência de hábitos de vida prejudiciais à saúde entre idosos, compará-la ao observado entre os mais jovens, e examinar a influência da escolaridade nesses hábitos. Para tanto, foi analisada uma amostra representativa de residentes da Região Metropolitana de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, com 60 ou mais anos de idade (n=1.786) e 20-59 anos de idade (n=12.065). A prevalência de exposições de risco (consumo de cigarros e de álcool, ausência de atividades físicas nos momentos de lazer e consumo inadequado de frutas, verduras e/ou legumes frescos) foi alta nos dois grupos etários. Via de regra, os idosos apresentaram menores exposições de risco, em comparação aos mais jovens, provavelmente devido a viés de sobrevivência, problemas e/ou preocupação com a saúde. A escolaridade mostrou associação independente com vários dos comportamentos investigados, reforçando a hipótese da determinação social desses comportamentos, tanto em jovens quanto em idosos.

Palavras-chave: saúde do idoso; estilos de vida; epidemiologia do envelhecimento.


SUMMARY

The objective of this study was to determine the prevalence of health lifestyles among older adults, in comparison with younger ones, as well as examining the influence of educational level such lifestyles. The work was carried out in a representative sample of residents in the Metropolitan Area of Belo Horizonte, Minas Gerais State, aged 60 years or more (n=1,786) and those aged 20-59 years (n=12,065). The prevalence of risk factors (current tobacco smoking, binge drinking, no physical activity during leisure time, and inadequate consumption of fresh fruits and/or vegetables) was high in both age groups. As a rule, the older adults were less exposed than younger adults to risk factors, probably due to survival bias, health problems and/or health concerns. Education was independently associated with several lifestyles, reinforcing the hypothesis that these behaviors are socially determined in younger as well as in older adults.

Key words: health of the elderly; health lifestyles; epidemiology of aging.


 

 

Introdução

As prioridades da Saúde Pública brasileira, até muito recentemente, seguiam as determinações da Conferência de Alma-Ata, realizada 25 anos atrás: saúde materno-infantil; imunização contra as principais doenças infecciosas; nutrição; e prevenção e controle das doenças endêmicas. As doenças crônicas não transmissíveis não eram mencionadas entre as prioridades determinadas pelos delegados daquela conferência; eram consideradas doenças de países desenvolvidos e, portanto, conseqüentes a hábitos de vida diferentes daqueles observados na maioria dos países em desenvolvimento.1 Entretanto, a realidade é bem diferente. No Brasil, as principais causas de mortalidade são as doenças do aparelho circulatório (31% do total de óbitos em adultos), seguidas pelas neoplasias (14% do mesmo total) e pelas doenças do aparelho respiratório (10% do mesmo total).2 Como já foi mencionado em outra ocasião, parcela substantiva dessas doenças (ou da letalidade a elas associada) tem causas e formas de prevenção conhecidas, relacionadas ao comportamento e/ou diagnóstico precoce.3

Do ponto de vista da Saúde Pública, os cinco mais importantes fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis são o tabagismo, o consumo de álcool, a obesidade ou sobrepeso, a hipertensão e a dislipidemia.1 O tabaco é um dos mais potentes agentes carcinogênicos para o ser humano e o seu consumo, assim como a exposição à fumaça produzida pelo fumante, é identificado como a maior causa passível de prevenção de doenças. Estima-se que os danos causados pelo tabagismo dobrarão em 20 anos, a menos que intervenções efetivas sejam adotadas urgentemente.1 O consumo aumentado de álcool está associado à hipertensão arterial, à cirrose, ao acidente vascular hemorrágico e aos cânceres da orofaringe, laringe, esôfago e fígado.4 Para efeito de estudos populacionais, pode-se definir o bebedor excessivo como aquele que consumiu cinco ou mais doses de bebidas alcoólicas em uma única ocasião, no último mês.5 Há evidências de que as atividades físicas e exercícios, em qualquer idade, reduzem a morbidade e a mortalidade para doença isquêmica do coração, hipertensão, obesidade, diabetes, osteoporose e transtornos mentais.4 Recomenda-se que todos os adultos realizem, minimamente, 30 minutos de atividade física moderada – que pode ser confortavelmente mantida por pelo menos 60 minutos – a vigorosa – de intensidade suficiente para levar à fadiga em 20 minutos – na maioria dos dias da semana, de preferência todos os dias.4 O risco de morrer apresenta uma relação linear com o índice de massa corporal. Pessoas com sobrepeso têm uma probabilidade mais alta de desenvolver hipertensão, diabetes do tipo II e fatores de risco para outras doenças, tais como hipercolesterolemia. A obesidade está associada a diversos tipos de cânceres.4 Para adultos que não fumam e não bebem excessivamente, a alimentação é o mais importante determinante modificável da sua condição de saúde. Dietas ricas em legumes, verduras e frutas têm sido associadas à redução de doenças cardiovasculares e alguns tipos de cânceres. Como medida de Saúde Pública, recomenda-se a ingestão diária de pelo menos cinco porções de frutas, verduras e legumes frescos6 ou a ingestão diária de 400-500 gramas desses alimentos.7

Estudo recente, conduzido em uma amostra representativa de residentes na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), mostrou que, de uma maneira geral, as prevalências de alguns dos fatores de risco acima mencionados eram altas. Um quinto dos adultos era constituído de fumantes atuais. A prevalência dos que bebiam excessivamente era duas vezes maior que a observada na população americana, e o consumo diário de cinco ou mais porções de frutas, verduras ou legumes frescos era sete vezes menor. Além disso, a população adulta da RMBH era predominantemente sedentária, no que se refere a atividades físicas durante os períodos de lazer.8

O presente trabalho é parte do inquérito de saúde da RMBH, acima mencionado, e tem por objetivo principal determinar, entre idosos, a prevalência do hábito de fumar, da tentativa de parar de fumar, da ingestão excessiva de bebidas alcoólicas, das atividades físicas durante os períodos de lazer, da auto-avaliação do peso e do consumo diário de frutas ou legumes frescos. Dois objetivos complementares do trabalho são:

a) comparar essas prevalências com as observadas entre adultos mais jovens; e

b) examinar a influência da escolaridade sobre a distribuição desses comportamentos nas duas faixas etárias.

 

Metodologia

Área e população estudadas

A RMBH é constituída por 24 municípios, sendo a terceira maior do país em tamanho da população (4,4 milhões de habitantes) e produção econômica.9 O presente inquérito de saúde foi conduzido em uma amostra representativa de adultos residentes na RMBH.

A coleta de dados para este trabalho foi realizada por meio de um questionário suplementar à Pesquisa de Emprego e Desemprego da Região Metropolitana de Belo Horizonte (PED/RMBH), periodicamente conduzida pela Fundação João Pinheiro, órgão do Governo do Estado de Minas Gerais. Os dados para o inquérito de saúde foram coletados entre 1º de maio e 31 de julho de 2003.

A PED/RMBH é realizada desde 1995, com o objetivo de investigar a estrutura e a dinâmica do mercado de trabalho regional, a partir de um levantamento mensal e sistemático sobre emprego, desemprego e rendimentos do trabalho. A PED/RMBH é realizada em uma grande amostra, baseada em 7.500 domicílios com cerca de 24.000 moradores. A amostra foi delineada para produzir estimativas da população não institucionalizada, com 10 ou mais anos de idade, residente nos 24 municípios mencionados. Trata-se de uma amostra probabilística de conglomerados, estratificada em dois estágios. Os setores censitários da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foram usados como unidade primária de seleção; e a unidade amostral foi o domicílio. As perdas estimadas no cálculo amostral são de 20%. Para o Inquérito de Saúde da RMBH, foram selecionados todos os participantes da PED/RMBH com idade igual ou superior a 20 anos. Maiores detalhes podem ser vistos em outras publicações.8,10

Dos 7.500 domicílios selecionados para o Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, participaram 5.922 (79,0%). A distribuição por sexo e idade dos participantes deste trabalho e as características correspondentes para a população adulta da RMBH, segundo o Censo Demográfico Brasileiro de 2000, foram muito semelhantes.8

A opção por uma amostra tão grande como a da PED/RMBH deve-se ao fato de os idosos (60 ou mais anos) serem a população de interesse no inquérito. Os idosos correspondem a 8% da população total da RMBH, e a estratégia adotada foi necessária para permitir estudos mais profundos dessa população.

Variáveis do estudo

Sexo, idade e escolaridade foram as características sociodemográficas consideradas neste trabalho. A idade foi dividida em dois subgrupos: 60 ou mais anos; e 20-59 anos. A opção pela faixa etária de 60 ou mais anos, em detrimento de 65 ou mais anos, foi feita para atender às diretrizes da Política Nacional de Saúde do Idoso.11 Neste trabalho, a escolaridade foi utilizada como indicador da situação socioeconômica, em substituição à renda pessoal ou familiar. A opção por essa variável deve-se ao fato de a escolaridade ser uma característica que tende a não mudar após certa fase da vida, ao passo que a renda pode apresentar modificações importantes. No caso da população idosa, as diferenças de renda tendem a diminuir após a aposentadoria.

As demais variáveis consideradas foram:

a) Consumo atual de cigarros (Qual das seguintes frases define melhor seu hábito em relação ao cigarro? Já fumou 100 cigarros durante toda a vida, mas parou de fumar; fuma alguns dias, mas não todos; fuma todos os dias – número de cigarros)

b) Tentativa de parar de fumar (Durante os últimos 12 meses, você parou de fumar durante um ou mais dias porque você estava tentando parar de fumar?)

c) Consumo excessivo de álcool (Quantas vezes, nos últimos 30 dias, você bebeu cinco ou mais drinques em um único dia?)

d) Atividades físicas ou exercícios (Durante seus períodos de lazer, nos últimos 30 dias, com que freqüência você caminhou para fazer exercícios ou fez ginástica ou praticou algum esporte por pelo menos 20-30 minutos?)

e) Auto-avaliação do peso (Qual das seguintes frases define seu peso atual? Satisfeito com o próprio peso; peso abaixo do que desejaria; peso acima do que desejaria)

f) Consumo de frutas, verduras e/ou legumes frescos (Quantas porções de frutas, verduras ou legumes frescos você consumiu por dia, nos últimos 30 dias?)8

O questionário para fatores de risco utilizado neste trabalho foi o da pesquisa americana sobre fatores de risco comportamentais ["Behavioral Risk Factor Surveillance System (BRFSS)"], com algumas modificações.5,8 Como havia restrição de tamanho, quanto ao questionário suplementar à PED/RMBH, procurou-se limitar cada uma das características investigadas a uma pergunta e, em caráter excepcional, a mais de uma pergunta. Sempre que possível, os resultados foram comparados aos observados para a população idosa norte-americana (65 ou mais anos de idade), em inquérito nacional, utilizando o instrumento mencionado.5

Análise dos dados

Foram comparadas as distribuições dos fatores de risco entre aqueles com 60 ou mais e 20-59 anos de idade, assim como entre aqueles que possuíam ou não segundo grau completo. A análise dos dados foi realizada, utilizando-se os procedimentos do programa Stata para inquéritos populacionais. A análise multivariada foi baseada em razões de prevalência e intervalos de confiança robustos, utilizando-se a regressão de Poisson.12-14 O sexo foi considerado, a priori, variável de confusão na análise das associações entre fatores de risco e faixa etária. Sexo e idade (variável contínua) foram considerados, a priori, variáveis de confusão na análise das associações entre fatores de risco e nível de escolaridade.

Considerações éticas

O Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro de Pesquisas René Rachou/Fundação Oswaldo Cruz, Belo Horizonte-MG.

 

Resultados

Dos 13.851 adultos participantes do Inquérito de Saúde da Região Metropolitana de Belo Horizonte, 12,5% eram idosos, 46,2% eram homens e 52,8% eram mulheres. A distribuição da escolaridade foi a seguinte: 56,8% possuíam até primeiro grau; 30,8% contavam com o segundo grau completo; e 12,4% referiam terceiro grau (Tabela 1). A maioria das entrevistas (72%) foi respondida pelo próprio participante; as demais foram respondidas por outro morador do domicílio (28,5%) ou por outro informante (0,5%).

 

 

Na Tabela 2, são apresentadas as prevalências de estilos de vida relacionados à saúde, segundo a faixa etária. As prevalências de fumantes atuais, da tentativa de parar de fumar, da ingestão excessiva de álcool e da avaliação do peso como acima do desejado foram significativamente menores entre idosos, em comparação com os mais jovens. Por outro lado, a prevalência da realização de exercícios durante os momentos de lazer, na freqüência e duração recomendadas, e a prevalência do consumo diário de cinco ou mais porções de frutas, verduras e/ou legumes frescos foi maior entre idosos.

 

 

Na faixa etária de 20-59 anos, o tabagismo atual foi menos freqüente entre aqueles com segundo grau completo, ao passo que, na faixa etária de 60 anos ou mais, esse hábito não esteve associado ao nível de escolaridade (Tabela 3). Em ambos os grupos etários, associações positivas e independentes com melhor escolaridade foram observadas para ingestão excessiva de bebidas alcoólicas, realização diária ou quase diária de exercícios físicos durantes os períodos de lazer e consumo diário de cinco ou mais porções de frutas, verduras e/ ou legumes frescos. A tentativa de parar de fumar no último ano foi igualmente freqüente entre aqueles com melhor ou pior escolaridade, em ambos os grupos etários. A avaliação do peso como acima do desejado foi mais freqüente entre adultos mais jovens com melhor escolaridade, mas não entre idosos.

 

 

 

Discussão

A prevalência de idosos que eram fumantes atuais no presente trabalho foi um pouco maior que a observada entre americanos com 65 ou mais anos de idade (13% versus 10%, respectivamente).5 Por outro lado, o consumo excessivo de álcool no último mês foi 1,9 vezes maior (15% vs. 8%) e o consumo diário de frutas, verduras e/ou legumes frescos foi 7,4 vezes menor (4,3% vs. 32%).5

Os resultados do presente trabalho são sugestivos de maior sedentarismo entre idosos residentes na RMBH, uma vez que apenas 15% relatavam ter realizado exercícios diários ou quase diários e 71% (dados não apresentados) não haviam realizado qualquer atividade física por 20-30 minutos nos momentos de lazer no último mês. Entre idosos americanos, a proporção daqueles que não referiram realização de atividades físicas nos momentos de lazer (independentemente da duração do exercício) é muito inferior (33%).5 Parte dessa diferença explica-se pela pergunta mais restritiva utilizada no presente trabalho (exercícios com duração de pelo menos 20-30 minutos); porém, dificilmente essa será a explicação para a totalidade da diferença observada. Por outro lado, nossos dados sugerem menor ocorrência de sobrepeso entre idosos residentes na RMBH (21% consideravam-se acima do peso), em comparação com os idosos norte-americanos, cuja proporção de sobrepeso (Índice de Massa Corporal >25kg/m2)varia entre 46 e 71%, dependendo da faixa etária considerada.5

Quando comparados aos mais jovens, os idosos apresentavam menos exposições de risco. Eles fumavam e bebiam menos, praticavam mais exercícios nos momentos de lazer, consumiam com mais freqüência cinco ou mais porções de frutas, verduras e/ou legumes frescos em bases diárias e percebiam-se com o peso normal. Esse comportamento, igualmente observado em outras populações idosas,5 deve-se a diversos fatores: maior preocupação com a saúde e/ou conseqüência do surgimento de doenças ou agravos (levando à adoção de hábitos mais saudáveis); viés de sobrevivência (mortalidade precoce entre pessoas com maiores exposições de risco ao longo da vida); e/ou efeito de coorte (coortes diferentes podem ter hábitos diferentes). Cabe salientar, entretanto, que as menores exposições aqui mencionadas não significam necessidade menor de investimento em mudanças de hábitos entre idosos. Pelo contrário, os riscos atribuíveis nessa faixa etária são mais altos devido à maior incidência de doenças ou agravos, assim como a maiores riscos devido à perduração dos hábitos. As atividades físicas constituem um bom exemplo dessa situação. Os benefícios por se tornarem ativos fisicamente são maiores entre os indivíduos mais velhos, comparativamente aos mais jovens. Isso acontece porque os idosos estão sob maior risco de desenvolver problemas de saúde que a atividade física é capaz de prevenir, tais como obesidade, hipertensão, diabetes, osteoporose, acidente vascular cerebral, depressão, câncer de cólon e morte prematura.12

A pobreza está intimamente relacionada a vários comportamentos que afetam a saúde. No Reino Unido, por exemplo, os mais pobres fumam e bebem mais, têm uma dieta menos adequada, são mais sedentários e mais obesos.15 A pobreza também está claramente relacionada às condições de saúde de indivíduos e/ou de populações,15,16,17 mas existe alguma controvérsia se essa influência ocorre, igualmente, nas faixas etárias mais velhas e nas mais novas, uma vez que alguns estudos (não todos) demonstraram que a associação entre situação socioeconômica e saúde diminuiu ou desaparece nas faixas etárias superiores.18 Contudo, um estudo realizado no Brasil, utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicilio (PNAD)/1998, verificou que as desigualdades sociais afetavam as condições de saúde e o uso de serviços de saúde, tanto entre idosos quanto entre os mais jovens.19

Os resultados do presente estudo, utilizando a escolaridade como indicador da situação socioeconômica, são coerentes com essas observações. Eles nos revelaram que os idosos com pior escolaridade, bem como os mais jovens, eram mais sedentários e ingeriam menos frutas, verduras ou legumes frescos. Entretanto, o tabagismo esteve associado, de maneira significativa, à pior escolaridade entre os mais jovens, mas não entre os idosos. A ausência de associação entre escolaridade e tabagismo nos idosos residentes na RMBH pode-se dever a viés de sobrevivência, uma vez que se espera um aumento da mortalidade precoce entre indivíduos fumantes com pior nível socioeconômico. Um resultado surpreendente foi a maior freqüência de bebedores excessivos entre aqueles que possuíam segundo grau completo de escolaridade, em ambos os grupos etários, tendo sido essa associação mais forte entre os idosos do que entre os mais jovens.

O consumo de cigarros, álcool e outros estilos de vida são comportamentos individuais, envolvendo escolhas pessoais. Por essa razão, esses e outros estilos de vida relacionados à saúde são, muitas vezes, vistos como conseqüências de uma escolha ou responsabilidade individual, e não como reflexos de uma contextualização social.15 A influência da escolaridade sobre vários dos estilos de vida, considerados no presente trabalho, reforça a hipótese da determinação social desses comportamentos, tanto em jovens quanto em idosos.

A Organização Mundial da Saúde salienta que a efetividade de políticas voltadas para a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis envolve questões de legislação, regulamentação e educação em massa, uma vez que mudanças individuais de comportamentos são difíceis de acontecer na ausência de mudanças ambientais. O pequeno consumo de frutas, verduras e/ou legumes frescos, observado no presente trabalho, certamente deve-se a um componente cultural, mas não se pode subestimar a importância do acesso a esses alimentos, determinado, sobretudo, pelo poder aquisitivo da população e/ou pela falta de políticas públicas que os tornem mais acessíveis. Da mesma forma, sabe-se que as mais importantes barreiras para o indivíduo exercer atividades físicas são a falta de tempo, a falta de acesso a locais adequados para a realização dos exercícios; e de um ambiente seguro, que permita essas atividades.6 A baixa freqüência de atividades físicas nos momentos de lazer, relatada pelos participantes jovens e idosos do presente trabalho, é conseqüência, entre outros fatores, da baixa qualidade do ambiente para essas atividades na RMBH. Os resultados aqui apresentados mostraram altas prevalências de exposições de risco, indicando a necessidade premente de políticas públicas para a redução dessas exposições, tanto entre idosos quando entre adultos mais jovens.

 

Referências bibliográficas

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Endereço para correspondência:
Av. Augusto de Lima, 1715,
Belo Horizonte-MG.
CEP: 30190-002
E-mail:lima-costa@cpqrr.fiocruz.br

 

 

*Artigo desenvolvido pelo Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento (Nespe), da Fundação Oswaldo Cruz e da Universidade Federal de Minas Gerais, na qualidade de centro colaborador em saúde do idoso junto à Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. O estudo contou com o apoio de recursos do Projeto Vigisus.