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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.14 n.2 Brasília jun. 2005

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742005000200002 

RELATÓRIO

 

O Concurso Nacional de Artigos Científicos como estratégia de desenvolvimento das pessoas que trabalham com HIV/aids

 

National Scientific Article Contest as a strategy of development for people working with HIV/aids

 

 

Antonio José Costa CardosoI; Júlio César Borre SouzaII; Islaine SilvaII; Dráurio BarreiraII

IFundação Oswaldo Cruz, Brasília-DF
IICoordenação Nacional de DST e Aids, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília-DF

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Como ação indutora do Ministério da Saúde, o Concurso Nacional de Artigos Científicos pretendeu identificar e difundir resultados de pesquisas em saúde que pudessem vir a subsidiar a Resposta Nacional à epidemia de HIV/aids. Lançado o Edital do Concurso em dezembro de 2003, inscreveram-se, até 29 de fevereiro de 2004, 52 trabalhos nas seguintes linhas de pesquisa: monitoração e análise da situação epidemiológica da infecção pelo HIV; e avaliação de serviços, programas e tecnologias direcionadas à prevenção, assistência ou vigilância do HIV/aids. Dos 52 artigos inscritos, 45 (87%) tiveram como autor principal uma mulher, com formação em enfermagem, medicina ou psicologia (72%), inserida em algum serviço de saúde (81%), com alguma especialização (48%), residente em capital de Estado (58%) e nas Regiões Sudeste (33%), Nordeste (29%) ou Sul (25%) do País. Os trabalhos foram submetidos, sem folha-de-rosto, à avaliação estruturada de dois pareceristas ad hoc. Com base no parecer final, 15 artigos aceitos pelos dois analistas passaram à etapa final, quando se procedeu a seleção de sete. Entre os sete artigos selecionados, 100% dos autores principais são mulheres, 58% enfermeiras ou médicas, 86% têm mestrado ou doutorado (versus 42% entre os inscritos), 72% têm origem na academia e 57% residem na Região Sudeste ou em capital de Estado.

Palavras-chave: ciência e tecnologia em saúde; HIV; aids; concurso de artigos científicos.


SUMMARY

As an inductive action of the Brazilian Ministry of Health, the National Scientific Article Contest tried to identify and disseminate results of health research that could enhance the National Response to the HIV/AIDS epidemic. Launched in December, 2003, 52 papers were registered by 2nd February, 2004 in the following research fields: monitoring of HIV infection and risk behaviors; and evaluation of services, programs and technologies directed to the prevention, assistance or surveillance of HIV/AIDS. Among the 52 articles submitted, 45 (87%) had a woman as the first author, 72% were graduates of nursing, medicine or psychology, 81% were working in health services, 48% with some specialization, 58% residing in a State capital (33% in the Southeast, 29% in the Northeast and 25% in Southern regions of the Country). The papers were submitted anonymously for a structured evaluation by two ad hoc specialists. Based on the final evaluation, 15 articles were accepted by both specialists, out of which seven were selected, with 100% of the main authors being women, 58% nurses or phisicians, 86% having Master’s or Ph.D. degree (vs. 42% in overall participation), 72% coming from the university and 57% residing in the Southeast region or a State capital.

Key words: science and technology in health; HIV; AIDS; scientific article contest.


 

 

Introdução

Embora os processos de tomada de decisão em ambientes democráticos sejam extremamente complexos, é de se supor que as decisões têm maior chance de ser efetivas quando fundadas em conhecimentos científicos. Em um contexto de "crise da saúde pública institucionalizada"em escala planetária,1 tal noção de uma "política de saúde baseada em evidência" vem recebendo especial atenção do Estado moderno.2

No Brasil, não obstante o enorme descompasso entre a produção de conhecimentos e a sua incorporação pelos serviços de saúde, a Saúde Coletiva tem ampliado a sua capacidade de resposta a essa "crise da Saúde" com propostas de uma interação estreita entre o Sistema Único de Saúde (SUS), o Sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (CTIS) e uma política de formação de recursos humanos em saúde.3,4,5,6

Entendida por Donnangelo7 como "conjunto de saberes que dá suporte às práticas de distintas categorias e atores sociais em face das questões de saúde-doença e da organização da assistência", a Saúde Coletiva pode ser considerada como uma área do conhecimento de natureza interdisciplinar; e também como o âmbito de práticas que envolve a organização da prestação do cuidado, a pesquisa e o ensino, três setores da realidade distintos, analiticamente, mas que precisam estar – cada vez mais – imbricados, se o que se pretende é a melhoria da saúde da população brasileira.8

Embora a primeira dessas atividades tenha o serviço de saúde como local privilegiado de prática, e as duas últimas, as instituições de ensino superior e os institutos de pesquisa, importante parcela da pesquisa operacional em saúde é realizada nos serviços, subordinada aos mesmos princípios que regem a pesquisa acadêmica – mérito técnico-científico e competitividade –, que buscam resolver os problemas vivenciados na implantação de programas e ações de saúde valendo- se da grande abertura dos pesquisadores atuantes no cotidiano dos serviços e das diferentes abordagens metodológicas.9,10,11,12,13

Com o propósito de estreitar as relações entre o SUS, o sistema de CTIS e a política de formação de recursos humanos em saúde, a 2a Conferência Nacional de CTIS definiu sete eixos condutores e sete estratégias de implementação da Política Nacional de CTIS.6 Em suma, o que se propõe é a priorização de uma agenda de pesquisas cujos resultados possam ser aplicados no sentido de solucionar os problemas de saúde da população (princípios da seletividade, complementaridade e relevância social).

Quanto às estratégias da Política Nacional de CTIS, embora reconhecendo que um nível de separação entre serviço e academia é não apenas inevitável como desejável, acredita-se que o SUS possa se beneficiar do fortalecimento dos laços colaborativos entre os pesquisadores, os profissionais de saúde e o complexo produtivo. Confirmada essa previsão e respeitadas as diferentes vocações institucionais, será necessário aprofundar os mecanismos de cooperação entre serviços, universidades e indústria, contribuindo para a qualificação da decisão técnico-gerencial no SUS.8

A idéia de uma "política de saúde baseada em evidência" apenas frutificará se houver maior convergência entre a pesquisa que se realiza e as necessidades de saúde da população brasileira; e se forem introduzidas formas de comunicação acessíveis, compreensíveis para os profissionais de saúde. Com o propósito de socializar a produção científica e tecnológica em prol da eqüidade e valorizar a capacitação científica e tecnológica das pessoas que trabalham com HIV/aids nos serviços, o Ministério da Saúde promoveu, por meio da Coordenação do Programa Nacional de DST e Aids (CN-DST/AIDS/MS), um Concurso Nacional de Artigos Científicos.

 

Inscrição dos artigos

Lançado o Edital do Concurso na segunda quinzena de dezembro de 2003, com o objetivo expresso de identificar e divulgar resultados de pesquisas em saúde que pudessem subsidiar a Resposta Nacional à epidemia de HIV/aids e, também, contribuir para a consolidação do Sistema Único de Saúde, inscreveram-se, no período de 1o de janeiro a 29 de fevereiro de 2004, 52 trabalhos. Coerentemente com os objetivos estratégicos do Concurso Nacional, foram habilitados a participar apenas os trabalhadores do SUS, individualmente, em grupo ou – o que seria preferível – em colaboração com professores, pesquisadores ou técnicos de algum centro de formação ou instituto de pesquisa em saúde.

Cada participante pôde apresentar até dois artigos originais, nas seguintes linhas de pesquisa: monitoração e análise da situação epidemiológica da infecção pelo HIV; e avaliação de serviços, programas e tecnologias direcionadas à prevenção, assistência ou vigilância do HIV/aids. A primeira dessas linhas de abordagem refere-se às análises de situação de saúde, as quais, valendo-se dos próprios registros de saúde, permitem estabelecer prioridades e estratégias de controle da epidemia. A segunda linha beneficia-se de análises que permitem a avaliação de serviços e de programas, destacando-se a sua utilização na vigilância epidemiológica e na análise da incorporação de tecnologias. Goldbaum14 também identifica esses dois grandes eixos de atuação em pesquisa nos serviços de saúde.

Os trabalhos, a serem encaminhados aos organizadores do Concurso Nacional, deveriam ser elaborados de acordo com os Requisitos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Periódicos Biomédicos, anexados a carta de apresentação, atestando-se que o artigo não fora publicado em outros periódicos. Todos os trabalhos foram enviados em três vias impressas, contendo:

a) folha-de-rosto;

b) resumo;

c) três a cinco palavras-chave;

d) summary (resumo), seguido pelas palavras-chave em inglês;

e) introdução;

f) metodologia;

g) resultados;

h) discussão;

i) conclusões ou considerações finais;

j) considerações éticas, quando pertinentes; e

l) referências bibliográficas.

O encaminhamento dos artigos pelos autores implicou aceitação das disposições do regulamento do Concurso Nacional e autorização para publicação, pelos organizadores.

De um total de 52 trabalhos inscritos, 45 (87,0%) tiveram como autor principal uma mulher. Se, à primeira vista, tal achado pode sugerir algum viés de participação/seleção, deve-se observar que, à exceção da área médica, praticamente todas as outras categorias profissionais que atuam no setor Saúde são constituídas, em sua maioria, por mulheres.15

Quanto à distribuição geográfica, foram inscritos trabalhos de todos os Estados das Regiões Sul e Centro-Oeste. Houve grande participação de pesquisadores dos Estados do Ceará (oito artigos) e do Rio Grande do Sul (sete artigos).

Quanto à distribuição capital versus interior, o destaque ficou por conta de uma concentração de artigos oriundos do interior – no caso, da Região Sul (77,0%) –, e das capitais nas Regiões Norte (100%) e Nordeste (87,0%). Entre os artigos vindos do Sudeste e do Centro-Oeste, observou-se um equilíbrio de produção por pesquisadores da capital e do interior dos Estados. Uma possível explicação para esses achados encontra-se no valor atribuído à oportunidade – menos restrita ao Sudeste e às capitais do que às demais macrorregiões e ao interior do país – de publicar em uma revista de divulgação científica.

 

Avaliação dos artigos inscritos

A avaliação dos artigos foi realizada em três etapas:

a) a partir do dia 1o de abril, cada um dos trabalhos foi submetido, sem folha-de-rosto, à avaliação estruturada de dois analistas ad hoc;

b) fundamentada nessa avaliação, a comissão organizadora identificou 15 artigos que, aceitos por ambos os analistas, habilitavam-se à etapa final;

c) então, procedeu-se a seleção de sete artigos com base na pontuação alcançada na avaliação estruturada.

Como se pode observar na Tabela 1, 100% dos artigos selecionados apresentavam mulheres na condição de autor principal (percentual superior aos 87% observados entre os inscritos), 57% com origem na Região Sudeste (o que confirma a proporção esperada segundo a distribuição dos médicos e enfermeiros empregados e grupos de pesquisa em epidemiologia) e 57% na capital do seu Estado (mesmo percentual verificado entre os inscritos). Observou-se uma maior proporção de artigos selecionados de autoria de enfermeiros e médicos (58%), pesquisadores com mestrado ou doutorado (86%) e elaborados a partir do ambiente da academia (72%).

 

 

A análise das palavras-chave (Figura 1) revelou a ocorrência de, pelo menos, seis grandes macrotemas, assim distribuídos:

 

 

1) DST, infecção pelo HIV/aids e soropositividade.

2) Exposição ao HIV/cadeia de transmissão.

3) Tendências/características da epidemia do HIV no Brasil.

4) Recortes/grupos populacionais.

5) Ações e serviços de controle da epidemia.

6) Atributos dos sistemas e serviços de saúde (Figura1).

É mister destacar, nessa breve análise temática:

- o fato de as palavras HIV e aids serem as mais freqüentes;

- a concentração, na macrocategoria "Categoria de exposição ao HIV", do "Comportamento sexual" e da "Transmissão vertical";

- a referência a interiorização, pauperização e feminização da epidemia, ainda que esta última apareça como "gestantes", "mulher" e "mães";

- a ausência de estudos com grupos mais vulneráveis ao HIV, como homens que fazem sexo com homens, profissionais do sexo e usuários de drogas injetáveis;

- a referência a ações de prevenção e promoção da saúde, como "aconselhamento", "educação", "pré-natal", "diagnóstico/teste anti-HIV" e "assistência em saúde"; e

- a referência ao "acolhimento", à "humanização", ao "controle social" e à "intersetorialidade", como importantes atributos dos serviços de saúde.

 

Divulgação dos resultados e premiação dos autores

A divulgação do resultado do Concurso Nacional foi feita no dia 5 de julho de 2004, no endereço eletrônico da Coordenação do Programa Nacional de DST e Aids. A premiação aconteceu na cidade do Recife, Estado de Pernambuco, durante o I Congresso Brasileiro de Aids, realizado no período de 29 de agosto a 1o de setembro, compreendendo: a) entrega de Certificado, expedido pela CN-DST/AIDS/MS em nome de todos os autores dos sete artigos premiados; b) publicação dos artigos, uma vez reformulados, segundo os questionamentos e sugestões propostos pelos pareceristas; e c) participação do autor principal de cada um dos sete artigos premiados no I Congresso Brasileiro de Aids, com passagens aéreas, hospedagem e inscrição oferecidas pela CN-DST/AIDS/MS.

Como ação indutora do Ministério da Saúde, o Concurso Nacional de Artigos Científicos pretendeu identificar e difundir resultados de pesquisas em saúde que pudessem subsidiar a Resposta Nacional à epidemia de HIV/aids e, assim, contribuir para a consolidação do Sistema Único de Saúde; mas, principalmente, funcionar como mecanismo de fomento à cooperação entre as pessoas que trabalham nos serviços de saúde e pesquisadores, visando promover maior convergência entre a pesquisa que se realiza e as necessidades de saúde da população brasileira.

 

Referências bibliográficas

1. Mendes EV. Os Grandes dilemas do SUS – Tomo I. Salvador: Casa da Qualidade Editora; 2001.

2. Barreto ML. O Conhecimento científico e tecnológico como evidência para políticas e atividades regulatórias em saúde. Ciência e Saúde Coletiva 2004 abr./jun.;9(2):329-338.

3. Paim J, Almeida-Filho N. A Crise da saúde pública e a utopia da saúde coletiva. Salvador: Casa da Qualidade Editora; 2000.

4. Teixeira CF. O Futuro da prevenção. Salvador: Casa da Qualidade Editora; 2001.

5. Barreto ML. A Pesquisa em saúde coletiva no Brasil. Cadernos de Saúde Pública 2003 mar./abr.;19(2): 354-355.

6. Ministério da Saúde. 2a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde; 2004 jul 25-28; Brasília, Distrito Federal. Brasília: Conselho Nacional de Saúde; 2004. Série Reuniões e Conferências.

7. Donnangelo MCF. A Pesquisa na área de saúde coletiva no Brasil: a década de 70. In: Ensino da saúde pública, ensino da medicina preventiva e social no Brasil – v.II. Rio de Janeiro: Abrasco; 1982. p.17-35

8. Guimarães R. Editorial. Ciências e Saúde Coletiva 2004 abr./jun.;9(2):258-258.

9. Guimarães R, Lourenço R, Cosac S. A Pesquisa em epidemiologia no Brasil. Revista de Saúde Pública 2001 ago.;35(4):321-340.

10. Guimarães R. Pesquisa no Brasil: a reforma tardia. São Paulo em Perspectiva 2002 out./dez.;16(4): 41-47.

11. Guimarães R. Editorial. Cadernos de Saúde Pública 2002 nov./dez.;18(6):1496-1497.

12. Hartz ZMA, Camacho LAB. Formação de recursos humanos em epidemiologia e avaliação dos programas de saúde. Cadernos de Saúde Pública 1996;12(Supl.2):13-20.

13. Novaes HMD. Avaliação de programas, serviços e tecnologias em saúde. Revista de Saúde Pública 2000 out.;34(5):547-549.

14. Goldbaum M. Epidemiologia e serviços de saúde. Cadernos de Saúde Pública 1996;12(Supl.2):95- 98.

15. Ministério da Saúde. Saúde Brasil 2004: uma análise da situação de saúde. Brasília: MS; 2004.

 

 

Endereço para correspondência:
SQN 215, bloco A, apto. 311,
Brasília-DF.
CEP: 70874-010
E-mail:antoniojcc@uol.com.br ou antoniocardoso@fiocruz.br