SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número4Programa Saúde da Família: a experiência de implantação em dois Municípios da Bahia índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.14 n.4 Brasília dez. 2005

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742005000400004 

NOTA PRÉVIA

 

Primeira injeção de drogas e hepatite C: achados preliminares*

 

The first drug injection and hepatitis C: preliminary findings

 

 

Maria de Lourdes Aguiar OliveiraI; Francisco Inácio BastosII; Paulo Roberto TellesIII; Sabrina Alberti Nóbrega de OliveiraI; Juliana Custódio MiguelI; Mariana HackerII; Clara Fumiko Tachibana YoshidaI

ILaboratório de Referência Nacional para Hepatites Virais, Departamento de Virologia, Instituto Oswaldo Cruz, Fundação Instituto Oswaldo Cruz

IIDepartamento de Informação em Saúde, Centro de Informação Científica e Tecnológica, Fundação Instituto Oswaldo Cruz

IIINúcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas, Universidade Estadual do Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 


Resumo

Investigou-se o contexto da primeira injeção de drogas e sua possível associação com a infecção pelo vírus da hepatite C (HCV). Usuários de drogas injetáveis (UDI) – N=606 – foram recrutados em "cenas de uso" no Rio de Janeiro, Brasil. Os voluntários foram entrevistados e testados para a presença de anti-HCV. A utilização anterior, não injetável, da mesma droga injetada (basicamente cocaína) foi relatada por 92,0% dos UDI (último mês), administrada semanal/diariamente (86,2%). O primeiro injetador foi um amigo próximo (51,7%), utilizando uma seringa/agulha usada (51,5%), e as drogas foram obtidas como "presente" em 40,0% dos casos. Cerca de 68,0% dos UDI introduziram novos usuários: 88,1% iniciaram um a cinco outros indivíduos. A prevalência de anti-HCV foi menor entre injetadores que iniciaram o uso de drogas após 1980. Visando controlar a infecção pelo HCV nessa população, as estratégias voltadas à prevenção/redução de danos deveriam considerar distintos cenários e gerações de usuários, desde a primeira injeção.

Palavras-chave: hepatite C; usuários de drogas injetáveis (UDI); primeira injeção de drogas.


Summary

The study investigated the context of first drug injection, and its possible relationship with Hepatitis C Virus (HCV) infection. Injection drug users (IDUs) – N=606 – were recruited in "drug scenes" in Rio de Janeiro, Brazil. After signing informed consent, individuals were interviewed and tested for HCV infection. Previous non-injectable use of the same drug (basically cocaine) was reported by 92.0% of IDUs, who currently inject it on a weekly/daily basis (86.2%). In 51.7% of subjects, the first injector was a friend, and use of a dirty syringe/needle was reported by 51.5%. Drug was obtained as a "gift" in 40.0% of cases. More experienced IDUs (68.0%) introduced others to injections: 88.1% reported initiation of from 1 to 5 persons. HCV infection was significantly less prevalent among subjects who started injecting after 1980. To effectively curb HCV spread in this population, prevention strategies need to be tailored to distinct scenarios, including social networks and generations of IDUs beginning with the very first injection

Key words: hepatitis C; injection drug use; first shot.


 

Delineamento do problema

O uso de drogas injetáveis é reconhecido, internacionalmente, como um dos principais fatores de risco para a hepatite C, apesar da reduzida disponibilidade de informações sobre os comportamentos associados à primeira injeção, de fundamental importância para a implementação de medidas de prevenção dirigidas aos usuários que ainda não iniciaram o uso injetável. O objetivo deste estudo foi investigar o contexto da primeira injeção de drogas e sua possível associação com infecções subseqüentes pelo HCV.

 

Metodologia

Em um estudo seccional, multicêntrico (1999- 2001), uma amostra de conveniência composta por 606 usuários de drogas injetáveis (UDI) foi recrutada em "cenas de uso" (locais públicos, casas noturnas e bares) no Rio de Janeiro, Brasil. Após consentimento, foram coletadas informações sobre o padrão do uso de drogas, como compartilhamento de equipamentos, drogas injetadas, local e ano da primeira injeção (dicotomizado em antes/após 1980). A variável-resposta (infecção pelo HCV) foi definida como a presença de anti-HCV. As possíveis associações entre as covariáveis e a infecção pelo HCV foram analisadas a partir de tabelas de contingência e respectivas estatísticas. Os resultados foram considerados significativos quando p<0,05. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação Instituto Oswaldo Cruz.

 

Resultados

A prevalência de anti-HCV foi de 16,8%. Os entrevistados eram, majoritariamente, homens (91,4%), com média de idade de 32,1 (±9,7) anos. A média de idade da primeira injeção foi de 19,6 (±5,4) anos. Dos 606 entrevistados, 92,0% relataram uso anterior, não injetável, da mesma droga (basicamente, cocaína) no último mês, semanal/diariamente administrada por 86,2%. Em 51,7% dos UDI, o primeiro injetador foi um amigo próximo, com 51,5% referindo reutilizar seringas usadas. Locais públicos constituíram o contexto mais comum da primeira injeção (33,3%), "presenteada" em 40,0% dos casos. De forma complementar, 68,3% dos UDI que injetavam há mais de cinco anos relataram haver introduzido outros indivíduos no uso injetável: 88,1% iniciaram um a cinco indivíduos. A prevalência da infecção pelo HCV foi mais baixa, significativamente, entre indivíduos que iniciaram o uso injetável após 1980 [odds ratio (7OR)=0,16; IC95% 0,1-0,2]. UDI jovens (<20 anos) relataram, mais freqüentemente, compartilhar equipamentos de injeção, embora com freqüências globais de injeção menores, substancialmente.

 

Conclusão

A prevalência da infecção pelo HCV foi significativamente inferior àquela descrita anteriormente, em estudo prévio com a mesma população e contexto.1 A redução das freqüências de injeção constituiria a principal razão desse declínio. Visando controlar infecções nessa população, as estratégias voltadas à prevenção/redução de danos deveriam considerar as redes sociais de IDU, os distintos cenários e gerações de usuários, desde a primeira injeção.

 


 

Background

Although injection drug use is considered one of the major risk factors for Hepatitis C Virus (HCV) infection worldwide, little is known about circumstances surrounding the first injection. The identification of behaviors accompanying the first intravenous shot is of fundamental importance to implement prevention measures directed at young drug users who have not yet started to inject. The objective of this study was to investigate the context of the first injection of drugs and its possible association with subsequent HCV infection.

 

Metodology

In a multicity cross-sectional study (1999-2001), a convenience sample of 606 injection drug users (IDUs) was recruited in "drug scenes" (public places, nightclubs and bars) in Rio de Janeiro, Brazil. After informed consent, individuals were interviewed about injecting drug use behaviors, equipment-sharing, type of drugs used, place and year of first injection (dichotomized into before/ after 1980). The response-variable – HCV infection – was defined as the presence of anti-HCV antibody. Contingency table statistics were employed to investigate possible associations between HCV infection and behavioral covariates. Results were considered significant when the p value was <0.05. This study was approved by the Institutional Review Board from Oswaldo Cruz Institute Foundation.

 

Results

HCV prevalence was 16.8% (102/606). The majority of IDUs were male (91.4%), the mean age was 32.1 years (±9.7) and a mean age at first injection was 19.6 years (±5.4). Non-injectable use of the same drug (basically cocaine) was reported by 92.0% of interviewed IDUs, who later injected it on a weekly/daily basis (86.2%). In 51.7% of IDUs the first injector was a friend and the use of a dirty syringe/needle was reported by 51.5%. Public places (33.3%) were the most common setting where the first injection took place and the drug was taken as a "gift" in 40.0% of cases. More experienced injectors (68.3%) introduced others to injections: 88.1% reported initiation of from 1 to 5 persons. HCV infection was significantly less prevalent among those who began injecting after 1980 [odds ratio (OR)=0.16; 95%CI 0.1-0.2] compared to those initiating earlier. IDUs aged less than 20 years were more likely to engage in needlesharing, but reported substantially lower injection frequencies compared to older IDUs.

 

Conclusion

A pronounced decline in HCV prevalence was observed, compared to a previous study targeting the same population/setting.1 The underlying reason for this decline may be a reduction in overall injection frequency. To effectively curb HCV spread in this population, prevention strategies need to be tailored to distinct scenarios, including social networks and generations of IDUs beginning with the very first injection.

 

Referência bibliográfica

1. Oliveira ML et al. Prevalence and risk factors for HBV, HCV and HDV infections among injecting drug users from Rio de Janeiro, Brazil. Brazilian Journal of Medical Biological Research 1999; 32:1107-1114.

 

Reference

1. Oliveira ML et al. Prevalence and risk factors for HBV, HCV and HDV infections among injecting drug users from Rio de Janeiro, Brazil. Brazilian Journal of Medical Biological Research 1999; 32:1107-1114.

 

Endereço para correspondência:
Laboratório de Referência Nacional para Hepatites Virais,
Departamento de Virologia,
s Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz
Av. Brasil, 4365,
Manguinhos, Rio de Janeiro-RJ.
CEP: 21040-360
E-mail:mlaoliveira@fiocruz.br

 

 

*O estudo contou com o apoio do antigo Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi) da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) – atual Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde –, e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do Ministério da Ciência e Tecnologia.