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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.17 n.4 Brasília dic. 2008

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742008000400008 

ENTREVISTA

 

@.PALAVRA.COM

 

 

Sob o marco dos princípios do SUS e da agenda do desenvolvimento sustentável, da qual o país é signatário, o Ministério da Saúde do Brasil, progressivamente, vem estruturando políticas, serviços e redes capazes de coordenar ações para o enfrentamento dos determinantes ambientais à saúde dos brasileiros.

Nesse contexto, o Ministério da Saúde está na linha de frente da resposta do Estado à questão, cujos resultados, ainda que modestos, já podem ser observados.

Com o objetivo de destacar seus fundamentos, elementos centrais e tendências, a Epidemiologia e Serviços de Saúde convidou o Dr. GUILHERME FRANCO NETTO, responsável pela Coordenação-Geral de Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (CGVAM/SVS/MS), para esta entrevista.

 

Por que a relação entre saúde, ambiente e desenvolvimento é um tema contemporâneo da Saúde Pública?

- Dr. Guilherme Franco Netto: Desde as primeiras civilizações, as diversas formas de organização do homem nos territórios e ambientes de trabalho sempre consideraram parâmetros de qualidade ambiental como referência para a saúde de suas comunidades. A importância do tema, visitado desde a antiguidade, nos escritos de Hipócrates sobre água, ares e lugares, e, durante a revolução industrial, nos achados de John Snow sobre a transmissão da cólera pela água em Londres, é inequívoca, e demonstra que o ambiente integra o conjunto dos determinantes da saúde.

Abordagens contemporâneas têm agrupado os determinantes ambientais da saúde em três vertentes. A primeira, vinculada ao subdesenvolvimento, ou seja, ao deficit do saneamento ambiental básico, está relacionada, ainda nos dias de hoje, a estados mórbidos prevalentes e a uma forte perda de qualidade de vida, notadamente a infantil relacionada à diarréia. A segunda vertente é a do contato humano, direto ou indireto, com o desenvolvimento industrial, dos serviços urbanos e das fronteiras agrícolas, cujos produtos e subprodutos tóxicos e poluentes resultam em múltiplas conseqüências à saúde das comunidades e dos trabalhadores. E a terceira, ainda emergente, embora seus resultados certamente incidam sobre a saúde, resulta do macrofenômeno da globalização e da crise ambiental global, vivamente expressos na intensa urbanização, degradação dos ecossistemas e mudança do clima.

 

Qual a situação atual e as tendências dessas relações no Brasil?

- Dr. Guilherme Franco Netto: Por suas características econômicas, sociais, demográficas, geográficas e ambientais, o Brasil é um país fortemente vulnerável ao conjunto dos cenários que acabo de mencionar. Integrante do bloco dos chamados países de economia emergente, no contexto da globalização, nosso país vive intensas e rápidas transformações. Entre elas, ressalta-se o novo perfil de urbanização, com cerca de 80% da população vivendo nas cidades, em sua maioria sob péssimas condições de infra-estrutura e limitado acesso a serviços básicos. Ao tempo que somos uma nação privilegiada, do ponto de vista do acesso a ambientes naturais, nossa vastíssima biodiversidade e múltiplos ecossistemas sofrem enormes conseqüências negativas das atividades humanas. O Brasil é o país que mais produz químicos na América Latina, oscila entre a segunda e a terceira posição no consumo global de agrotóxicos. A interação dessas pressões exerce fortíssima influência na exposição de nossa população a riscos a elas relacionados. Estudo recente da Organização Mundial da Saúde, a OMS, evidencia que cerca de 18% da carga de doenças em nosso país são explicados por alguns desses fatores. Entretanto, para conhecer melhor as relações entre saúde, ambiente e desenvolvimento, é necessária a construção de modelos que investiguem como as três vertentes de que falei, abordadas na resposta à primeira pergunta, manifestam-se na saúde dos brasileiros.

Qual é a contribuição da vigilância em saúde ambiental para a Saúde Pública?

- Dr. Guilherme Franco Netto: A vigilância em saúde ambiental integra o Sistema Nacional de Vigilância em Saúde e a rede de vigilâncias que o compõe, juntamente com a epidemiológica, a sanitária e a de saúde do trabalhador. A contribuição genuína da vigilância em saúde ambiental à Saúde Pública está na possibilidade de conhecer, monitorar e avaliar, sistemicamente, os fatores de risco à saúde humana relacionados ao ambiente, integrando e compatibilizando essas informações, nas três esferas de poder, às informações da vigilância em saúde.

 

Qual a articulação da vigilância em saúde ambiental com a promoção da saúde e o desenvolvimento sustentável?

- Dr. Guilherme Franco Netto: Originalmente, a estruturação da vigilância em saúde ambiental no Brasil desenvolveu-se como um conceito de 'Saúde Ambiental', de estratégia do setor Saúde para trabalhar com o desenvolvimento sustentável e os determinantes sócio-ambientais da saúde. O que vem se consolidando progressivamente, em uma agenda sinérgica com a da promoção da saúde, anuncia outra importante contribuição à Saúde Pública: a de possibilitar à sociedade compreender e agir sobre os determinantes ambientais da saúde.

 

Quais os resultados práticos já alcançados pela vigilância em saúde ambiental nestes dez anos?

- Dr. Guilherme Franco Netto: A partir de 1998, a estratégia de implantação da vigilância em saúde ambiental implicou a estruturação do Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental – Sinvsa – nas esferas federal, estadual e municipal do SUS. Durante os cinco primeiros anos, até 2003, foram desenvolvidas ações cujos cumprimentos são mensurados por metas de infra-estrutura, especialmente na formalização da vigilância em saúde ambiental, na organização e constituição das equipes técnicas das respectivas esferas de gestão. A partir de 2004, foram introduzidos objetivos prioritários relacionados à implantação do Programa Nacional de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Vigiágua), do Programa Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Solos Contaminados (Vigisolo) e, posteriormente, do Programa de Vigilância em Saúde Relacionado à Qualidade do Ar (Vigiar). O monitoramento desses programas e suas ações acompanha seu cumprimento pela verificação de suas metas de processo.

 

Existem evidências já estabelecidas sobre a relação entre saúde e ambiente com base nas ações da vigilância em saúde ambiental?

- Dr. Guilherme Franco Netto: No capítulo 'Saúde e Ambiente', cuja elaboração foi encarregada à equipe técnica da CGVAM para divulgação na edição de 2007 do Saúde Brasil, publicação seriada da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, estará disponível todo um conjunto de informações sobre a relação entre os dados da Vigiágua e as taxas de internação por doenças diarréicas no país, a estimativa e a distribuição de populações expostas a áreas de solos contaminados e a identificação das áreas de atenção ambiental atmosférica de interesse para a saúde no contexto do desmatamento. Essas informações serão úteis para apoiar a tomada de decisão do setor Saúde.

 

Quais os principais desafios e perspectivas da vigilância em saúde ambiental no Brasil?

- Dr. Guilherme Franco Netto: A crise ambiental global, cientificamente evidenciada no "4o Relatório do Painel Intergovernamental sobre a Mudança do Clima", é o fato mais relevante do Século XXI. Seus reflexos, inquestionavelmente, serão sentidos na Saúde Pública. Cabe, portanto "forçar" o leme no sentido de que a agenda da saúde ambiental migre para o centro da tomada de decisões da Saúde Pública. Uma avaliação criteriosa e independente do que foi realizado nesses primeiros dez anos auxiliará, em muito, na identificação das fortalezas e debilidades do desenvolvimento da área no Brasil.

A estruturação de um departamento voltado à saúde ambiental e à saúde do trabalhador, no âmbito da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, associada à necessária identificação de novos recursos, cria possibilidades de fortalecimento das ações de saúde ambiental no SUS. Ainda, de acordo com as deliberações das últimas Conferências Nacionais de Saúde, das Cidades e do Meio Ambiente, tendo como base as teses do documento "Subsídios para a Política Nacional de Saúde Ambiental", a realização da "I Conferência Nacional de Saúde Ambiental" em 2009 deverá fortalecer a organização e mobilização da sociedade em torno dessa temática.

 

Edição

Marta Helena Paiva Dantas
Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília-DF, Brasil

Tatiana Marques Portela
Núcleo de Comunicação, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília-DF, Brasil