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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.18 n.2 Brasília jun. 2009

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742009000200006 

ARTIGO ORIGINAL

 

Índice de massa corporal em pacientes co-infectados pela tuberculose-HIV em hospital de referência da cidade de Recife, estado de Pernambuco, Brasil*

 

Body mass index of patients co-infected with tuberculosis and HIV in a reference hospital for HIV patients in the city of Recife, state of Pernambuco, Brazil

 

 

Marina Diniz Militão de AlbuquerqueI; Ricardo Arraes de Alencar XimenesII; Magda MaruzaIII; Joanna d'Arc Lyra BatistaIV; Maria de Fátima Pessoa Militão de AlbuquerqueV

ICurso de Enfermagem (Aluna do Programa de Iniciação Científica/PIBIC CNPq), Universidade Federal de Pernambuco, Recife-PE, Brasil
IIUniversidade Federal de Pernambuco, Recife-PE, Brasil. Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil
IIIHospital Correia Picanço, Secretaria de Saúde, Governo de Pernambuco, Recife-PE, Brasil
IVAluna do Programa de Doutorado em Saúde Pública, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Instituto Oswaldo Cruz, Recife-PE, Brasil
VCentro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Instituto Oswaldo Cruz, Recife-PE, Brasil Universidade Federal de Pernambuco, Recife-PE, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o índice de massa corporal (IMC) e principais características biológicas, sociais, clínicas e imunológicas de pacientes com tuberculose infectados pelo HIV/aids, comparando-os com aqueles encontrados nos pacientes com HIV/aids sem tuberculose em um hospital de referência para HIV/aids da Cidade de Recife, Estado de Pernambuco, Brasil. Foram selecionados 80 pacientes com HIV/aids, dos quais 40 estavam co-infectados pela tuberculose. Os pacientes foram medidos e pesados, além de responderem a um questionário padronizado elaborado especialmente para a pesquisa. A associação da infecção pelo HIV/aids e tuberculose-doença com IMC inferior a 18,5 kg/m2, indicativo de desnutrição, foi estatisticamente significante. Essa associação poderá ser um sinal sentinela nos serviços de saúde que atendem pacientes infectados pelo HIV, visando proporcionar a eles aporte calórico adequado. Estudos prospectivos dever-se-ão empreender para melhor compreensão da desnutrição como expressão da interação tuberculose-HIV e fator de agravo do quadro clínico de seus pacientes.

Palavras-chave: IMC; tuberculose; HIV/aids; serviços de saúde.


SUMMARY

The objective of this study was to evaluate the body mass index (BMI) and the main biological, social, clinical and immunological characteristics of patients infected with HIV/AIDS and tuberculosis disease, compared to those HIV infected but with no tuberculosis, in a reference hospital for HIV/AIDS patients in the City of Recife, State of Pernambuco, Brazil. The study population consisted of 80 HIV/AIDS patients, of whom 40 were co-infected with tuberculosis. The patients had their weight and height measured, and answered a structured questionnaire designed specifically for the purpose of the study. The association between a BMI below 18.5 kg/m2 (underweight) and tuberculosis disease-HIV co-infection was statistically significant. That association may be a sentinel sign in health services attended by HIV infected patients, aiming to provide them adequate caloric intake. Prospective studies should be carried out to obtain a better understanding of malnutrition as expression of tuberculosis-HIV co-infection, and as an aggravating factor to clinical conditions of their patients.

Key words: BMI; tuberculosis; HIV/Aids; health services.


 

 

Introdução

A coexistência da tuberculose (TB) com a infecção pelo HIV/aids é, atualmente, um dos principais desafios dos serviços de saúde em países em desenvolvimento. Em todo o mundo, estima-se que o número de co-infectados atinja seis milhões de pessoas.1 Em países em desenvolvimento, indivíduos soropositivos para o HIV (human immunodeficiency virus, ou vírus da imunodeficiência humana) apresentam um risco anual de 10% de desenvolver tuberculose.2 Assim, países pobres e cujos sistemas de saúde já eram desafiados pela incapacidade de controlar a TB, lidam, cada vez mais, com a sobrecarga imposta pela associação das duas infecções.

A principal explicação para o impacto altamente negativo da co-infecção é dada pela interação dos mecanismos de resposta imunológica ao Mycobacterium tuberculosis e ao HIV, intimamente relacionados e tidos como responsáveis pelas mudanças observadas na evolução das duas infecções e na resposta a seu tratamento.3 Como resultado, observa-se tanto o aumento da prevalência de infecção pelo HIV como das taxas de mortalidade entre os co-infectados.4 Torna-se necessário, portanto, estudar as diversas expressões da interação TB-HIV que agravam o quadro de morbimortalidade de seus pacientes.

A subnutrição protéico-energética é freqüente em indivíduos infectados pelo HIV, o que agrava seu comprometimento imunológico.5,6 Historicamente, a tuberculose tem sido associada a má-nutrição, per se um fator associado à reativação da tuberculose latente.7 Sabe-se que doenças crônicas cursam com anorexia e ingestão insuficiente de alimentos, levam a um balanço energético negativo e conseqüente diminuição das reservas corporais de gordura e de massa muscular, resultando em emagrecimento acentuado.6

Estudo realizado em 1996,8 na Região Norte do Brasil, observou que 77,8% dos pacientes recém-internados por tuberculose apresentavam desnutrição, com um IMC médio de 18,7 kg/m2. Entre os pacientes estudados, houve predominância de tuberculose pulmonar, embora também fossem encontrados casos de tuberculose ganglionar e óssea associados à aids. Outro estudo, realizado em Uganda, comparou o estado nutricional dos pacientes com tuberculose pulmonar, infectados e não infectados pelo HIV, e não encontrou diferença estatisticamente significativa para o índice de massa corporal (IMC) entre os grupos.7

Necropsias realizadas em indivíduos HIV-positivos que apresentaram caquexia antes de morrer demonstraram um aumento de freqüência de tuberculose disseminada. Além disso, a severidade da depleção de linfócitos T CD4+ esteve associada ao grau de caquexia e à prevalência de TB.9

Peso e altura são as medidas mais utilizadas na avaliação nutricional dos indivíduos, dada a disponibilidade de equipamentos, determinação simples e precisa e boa aceitação pelos pacientes. As mensurações desses parâmetros permitem obter o índice de Quelelet ou índice de massa corporal.10

Este estudo objetivou (i) avaliar o índice de massa corporal – IMC – em pacientes com tuberculose-doença e infectados pelo HIV/aids; e (ii) identificar as principais características biológicas sociais e clínicas desses pacientes, comparando-as com aquelas encontradas em pacientes sem tuberculose e infectados pelo vírus. Analisou-se a associação da tuberculose com o estado nutricional dos pacientes com o HIV/aids mediante comparação do IMC em pacientes com TB-doença e infectados pelo HIV e pacientes com HIV/aids e sem tuberculose.

 

Metodologia

Realizou-se uma análise tipo caso-controle, a partir de um estudo seccional em pacientes maiores de 18 anos de idade infectados pelo HIV/aids, que tiveram peso e altura aferidos na consulta de enfermagem anterior ao início do tratamento e foram acompanhados no Hospital Correia Picanço, Recife-PE, de agosto de 2006 a julho 2007. Em relação à coleta de dados, aplicou-se um questionário especialmente elaborado para a pesquisa, que permitiu obter informações sobre as variáveis biológicas, sociais e clínicas de cada paciente. Os totais de cada variável divergiram em razão da ausência de informação para alguns indivíduos, conforme explicitado na Tabela 1.

 

 

Foram considerados casos os pacientes com HIV/aids que iniciaram tratamento para tuberculose no período de estudo; e controles, os pacientes com HIV/aids sem tuberculose, selecionados a partir da mesma coorte e no mesmo período. Os pacientes com tuberculose-doença e infectados pelo HIV/aids foram identificados a partir da notificação de caso de tuberculose encaminhada pelo médico assistente ao Núcleo de Epidemiologia do Hospital Correia Picanço, uma vez que faz parte da rotina do serviço a liberação do tratamento da tuberculose mediante a ficha de notificação compulsória do Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan.

Os controles – pacientes com HIV/aids e sem tuberculose- doença – foram selecionados na razão de 2:1, na mesma semana de captação dos casos, entre os que tiveram seu peso obtido no mesmo mês. Todos os indivíduos do estudo tiveram seu peso mensurado com o mesmo instrumento, uma balança antropométrica periodicamente calibrada durante o período do estudo. A medida da altura foi obtida com o paciente em pé, descalço, encostado em uma haste vertical inextensível tocada por sua nuca, nádegas e calcanhares. Para aferição do peso, o paciente estava descalço e vestia roupas leves.

Calculou-se o IMC a partir da fórmula IMC = peso/altura2, 11 considerando-se a seguinte classificação: desnutrição: IMC = <18,5kg/m2; peso adequado: IMC = 18,5-24,9kg/m2; sobrepeso: IMC = 25-29,9kg/m2; obesidade: IMC = ≥30,0kg/m2. 10 Para efeito da análise da associação entre IMC e a co-infecção TB-HIV/aids, as categorias foram agregadas em: 'Com desnutrição' (IMC = <18,5kg/m2); e 'Sem desnutrição' (IMC = = 18,5kg/m2). As medidas para a estimativa do IMC dos casos foram obtidas após o diagnostico de tuberculose e antes do inicio do tratamento especifico.

Informações sobre variáveis clínicas foram obtidas com a aplicação do questionário ou resgatadas do prontuário médico. Considerou-se o valor da contagem de linfócitos T CD4+ cuja data de coleta não se distanciasse mais de três meses da data de admissão no estudo. Também foram analisadas as variáveis biológicas (sexo e idade), sociais (escolaridade) clínicas (uso de anti-retroviral, contagem de células T CD4+, tempo de sorologia positiva, história de perda de peso recente, doença oportunista).

Os dados foram armazenados pelo software Epi Info versão 6.04, recomendado pelo CDC/USA (Centers for Disease Control and Prevention dos Estados Unidos da América, localizado em Atlanta-GA, USA), utilizando-se o modo VALIDATE de dupla entrada para conferência dos dados. A análise foi feita pelo software STATA versão 9.0 (Statistical Software for Professionals, StataCorp LP, UK) para as análises uni e multivariada.

Analisaram-se as associações entre as características dos pacientes e ser caso de co-infecção tuberculose-HIV/aids. A significância das associações foi verificada pelo teste qui-quadrado: variáveis que apresentaram associações com a co-infecção TB-HIV/aids de valor p≤0,20 foram incluídas na análise de regressão logística multivariada. Foram calculados odds ratios (OR) brutos e ajustados e intervalos de confiança de 95%. Calculou-se o risco atribuível populacional percentual (PAR %=Pex (OR-1/OR) x 100) ou fração etiológica para cada fator de risco independente mantido no modelo final.

Considerações éticas

O presente estudo faz parte do projeto intitulado 'Estudo clínico epidemiológico da co-infecção tuberculose- HIV', aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Pernambuco (Registro CEP/CCS/UFPE no 254/05). Foram incluídos no estudo os pacientes maiores de 18 anos de idade que concordaram em participar da pesquisa mediante assinatura de um 'Termo de Consentimento Livre e Esclarecido'.

 

Resultados

Dos 120 pacientes estudados, 62,5% eram do sexo masculino. A idade média encontrada foi de 39,2 anos: 42 anos para os casos; e 38 anos para os controles (p=0,0514). Dos 120 pacientes, 40 encontravam-se infectados pelo HIV e tinham tuberculose-doença (casos); e 80 eram infectados pelo HIV e não tinham tuberculose-doença (controles). Os casos caracterizaram-se por serem predominantemente do sexo masculino (72,5%) e se encontrarem em idade produtiva (59% tinham de 35 a 49 anos).

Observou-se que o grupo de pacientes com HIV e tuberculose-doença apresentou um peso médio de 56,0kg, enquanto para os pacientes com HIV e sem tuberculose doença, o peso médio foi de 62,5kg/m2, diferença esta estatisticamente significativa (p=0,0034). A Tabela 1 apresenta a distribuição dos IMC calculados no momento da entrada no estudo, entre casos e controles, e evidencia diferença estatisticamente significante entre os valores de IMC dos dois grupos estudados.

Quanto às variáveis analisadas, o baixo peso mensurado pelo IMC, a idade entre 35 a 49 anos, a baixa escolaridade do indivíduo, a contagem de linfócitos T CD4+ inferior a 200 células/mm3 e a história de perda de peso foram as características mais fortemente associadas à co-infecção tuberculose-HIV (Tabela 2).

 

 

Após a análise de regressão logística multivariada, mantiveram-se, no modelo final de associação com a co-infecção, (i) IMC inferior a 18,5kg/m2 (OR = 5,57; IC95%: 1,73-17,96), (ii) história de perda de peso recente (OR = 5,11; IC95%: 1,61-16,17), (iii) contagem de células T CD4+ inferior a 200 (OR = 3,87; IC95%: 1,27-11,78) e (iv) idade igual ou superior a 35 anos (OR = 5,75; IC95%: 1,71-19,31, para idade entre 35 e 49 anos; e OR = 6,51; IC95%: 1,48-28,60, para idade entre 50 e 67 anos) (Tabela 3).

 

 

Discussão

Este estudo observou associação entre co-infecção pelo HIV e tuberculose-doença com IMC<18,5kg/m2, idade acima de 34 anos, contagem de células T CD4+ <200 celulas/mm3 e história recente de perda de peso.

Por se tratar de doenças infecciosas crônicas, tanto a tuberculose como a infecção causada pelo HIV levam a distúrbios metabólicos que interferem na utilização e mobilização de nutrientes corporais, afetam o estado nutricional e, conseqüentemente, podem estar associadas a um baixo índice de massa corporal em adultos. A perda de peso é uma característica clínica proeminente da tuberculose e pode ser o sintoma associado à procura precoce por atendimento médico. 12 Esse sintoma pode ser ainda mais severo entre os co-infectados: além do consumo protéico-calórico ser mais elevado, devido à conjunção de duas infecções crônicas, outros fatores, como anorexia e diminuição da ingestão, contribuem para o emagrecimento.

Os pacientes com tuberculose-doença e infectados pelo HIV abordados neste trabalho apresentaram freqüência de IMC baixa (<18,5kg/m2) significativamente maior (63,6%), quando comparada à dos pacientes infectados pelo HIV que não tinham tuberculose. O peso médio foi 9,6kg mais baixo nos pacientes co-infectados. De maneira similar, Panton e colaboradores, 13 ao utilizarem um ponto de corte superior ao deste estudo (20kg/m2), encontraram uma diferença de 12kg entre os dois grupos. Os autores descreveram IMC significativamente mais baixos nos pacientes com tuberculose isoladamente ou com tuberculose-doença e infecção pelo HIV, comparativamente àqueles pacientes com ou sem HIV mas sem tuberculose, sugerindo que a TB, mais que o HIV, implicaria baixo índice de massa corporal nos pacientes co-infectados.

Estudo realizado no Brasil8 encontrou um elevado percentual de desnutrição: IMC médio de 18,66 ± ; 3,86kg/m2 em pacientes recém-internados por tuberculose. A má nutrição também é uma característica de pacientes internados com tuberculose na África,14 onde a soroprevalência para o HIV chega a 70%. Nesse trabalho, os autores salientam, ainda, que no grupo de pacientes internados, os sinais e sintomas de desnutrição foram mais severos que os encontrados no grupo dos pacientes não internados.14

Estudo de abordagem diferente, realizado por Shah e colaboradores,7 comparou o IMC de pacientes com tuberculose separando-os em dois grupos, casos (com HIV) e controles (sem HIV), e não encontrou diferença estatisticamente significativa entre os dois. Outro estudo de desenho seccional, realizado na Tanzânia, observou associação de IMC baixo e coexistência tuberculose-doença e infecção pelo HIV entre mulheres, tão-somente.

No presente estudo, a contagem de células T CD4+ inferior a 200 células/mm3 esteve associada à co-infecção pelo HIV/tuberculose-doença, demonstrando impacto da tuberculose nos pacientes HIV-positivos. Lucas e colaboradores,9 ao necropsiarem pacientes HIV-positivos com síndrome de perda de peso acentuada (caquetismo), evidenciaram que a severidade da depleção de células T CD4+ estava relacionada grau de perda de peso e à prevalência da TB. A importância do número de células T CD4+ para o bom estado nutricional do paciente pôde ser comprovada por estudo realizado em Uganda,7 que evidencia IMC significativamente mais baixos em indivíduos com contagem de linfócitos T CD4+ ≤200 células/mm3, quando comparados aos IMC de indivíduos com número de T CD4+ superior a 200 células/mm3.

A idade média dos pacientes com tuberculose-doença e HIV/aids (acima dos 34 anos) foi mais elevada quando comparada à dos pacientes infectados pelo HIV e sem tuberculose. Muito possivelmente, esse achado está relacionado à alta taxa de incidência da tuberculose na população com idade entre 20 e 39. No Estado de Pernambuco, em 2005, essa taxa foi de 84,6 casos por 100.000 habitantes.16 Por sua vez, em ambos os sexos, a maior parte dos casos de aids concentra-se na faixa etária de 25 a 49 anos.17

Embora a literatura aponte resultados significativos, deve-se salientar que estudos prospectivos longitudinais precisam ser realizados, visando precisar se a má condição nutricional é preexistente e causadora do desenvolvimento da tuberculose.

O estudo ora apresentado encontrou maior percentual de pacientes em uso de terapia anti-retroviral nos indivíduos infectados pelo HIV e com tuberculose-doença, comparativamente àqueles infectados pelo HIV e sem tuberculose-doença. A diferença encontrada, contudo, não foi estatisticamente significativa. Apesar de a terapia anti-retroviral altamente potente (HAART) ter revolucionado o tratamento da infecção pelo HIV/aids, alguns autores divergem quanto ao melhor momento para seu início em pacientes que utilizam esquema terapêutico para tuberculose. Estudo realizado por Dean e colaboradores18 sugere que o uso de HAART deve ser mais precoce em pacientes com baixa contagem de linfócitos, uma vez que, nessas circunstâncias, o atraso no tratamento da tuberculose pode levar a uma maior redução da carga viral desses pacientes e, por conseguinte, de sua taxa de mortalidade.

Também foi verificado maior percentual de pacientes com menor tempo de soropositividade para HIV entre os casos, quando comparados aos controles, embora sem significância estatística. Muito possivelmente, isso reflete o fato de o risco de adoecer por tuberculose aumentar relativamente cedo, no curso da infecção pelo HIV.19 Estudo realizado na Região Nordeste,20 entretanto, apontou que cerca da metade dos pacientes com HIV/aids já chegou aos serviços especializados com algum sinal ou sintoma de imunocomprometimento, sugerindo que tanto o diagnóstico como o tratamento da infecção pelo HIV são feitos tardiamente.

Os resultados aqui apresentados indicaram que o estado nutricional, avaliado pela obtenção do IMC, foi significativamente pior nos pacientes com tuberculose-doença e infectados pelo HIV/aids, quando comparados àqueles com HIV/aids e sem tuberculose.

É evidente a necessidade de avaliação do índice de massa corporal nos pacientes atendidos com infecção pelo HIV/aids, uma vez que o encontro de IMC inferior a 18,5kg/m2 sugere a presença de tuberculose. Esse poderá ser um sinal sentinela para os serviços de saúde que atendem pacientes infectados pelo HIV, visando proporcionar a eles aporte calórico adequado. Recomenda-se que uma avaliação do perfil nutricional seja realizada para todo paciente com tuberculose-doença e infectado pelo HIV; uma vez identificado IMC baixo, o paciente deve ser devidamente orientado, se possível encaminhado ao nutricionista, para que se consiga reverter ou amenizar o processo de consumo de massa corporal.

Uma vez demonstrada a associação entre o emagrecimento e a mortalidade dos pacientes com tuberculose- doença infectados pelo HIV/aids,1,9 medidas no sentido de atender a essa recomendação poderiam contribuir para a diminuição da mortalidade dessas pessoas. Outrossim, dever-se-ão realizar estudos prospectivos longitudinais, para uma melhor compreensão dos mecanismos envolvidos nessa associação.

 

Agradecimentos

Os autores agradecem à diretora do Hospital Corrêa Picanço, Dra. Miriam Silveira, pelo incentivo à pesquisa no serviço e pelo aprimoramento da assistência aos pacientes portadores de HIV/aids.

 

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Endereço para correspondência:
Pós-Graduação em Medicina Tropical,
Hospital das Clínicas, Bloco A,
Av. Professor Moraes Rego S/N,
Cidade Universitária,
Recife-PE, Brasil.
CEP: 50670-420
E-mail:militao@cpqam.fiocruz.br

Recebido em 03/07/2008
Aprovado em 28/11/2008

*Estudo financiado pelo Ministério da Saúde e Organização das Naçoes Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) CSV 182/06.