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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.19 n.1 Brasília mar. 2010

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742010000100005 

ARTIGO ORIGINAL

 

Perfil epidemiológico da tuberculose no Município de Teresina-PI, no período de 1999 a 2005

 

Epidemiological Features of Tuberculosis in the City of Teresina, Piaui State, Brazil, from 1999 to 2005

 

 

Danieli Maria Matias CoêlhoI; Rosângela Lopes VianaI; Clarice Alves MadeiraII; Luiz Oscar Cardoso FerreiraIII; Viriato CampeloIV

IFundação Municipal de Saúde, Teresina-PI, Brasil
IISecretaria de Estado da Saúde do Piauí, Teresina-PI, Brasil
IIIFaculdade de Ciências Médicas, Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil
IVDepartamento de Parasitologia e Microbiologia, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Piauí, Teresina-PI, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O trabalho descreve o perfil epidemiológico da tuberculose no município de Teresina-PI, Brasil, de 1999 a 2005. É um estudo epidemiológico descritivo de série histórica com dados coletados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) e no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Município, sobre casos novos notificados de tuberculose, residentes em Teresina-PI, analisando-se características demográficas, socioeconômicas e clínicas. Foi encontrada uma taxa média de incidência de casos novos de 50,1/100.000 hab. e coeficiente médio de mortalidade de 3,3 por 100.000 hab. Os doentes são predominantemente do sexo masculino (64,0%), com menos de sete anos de escolaridade (70,33%) e de adultos jovens (58,8%), apesar de a maior taxa de incidência ter sido observada na faixa etária de 50 anos e mais. Em 80,23% dos casos, encontrou-se a forma pulmonar e quanto à evolução, 71,07% foram curados e 17,15% tiveram alta por transferência. O trabalho possibilitou conhecer as características da população estudada e as dificuldades, no Sinan, do Programa de Controle da Tuberculose no município de Teresina.

Palavras-chave: tuberculose; perfil epidemiológico; Teresina-PI.


SUMMARY

This work describes the epidemiological features of tuberculosis in the city of Teresina, Piauí State, Brazil, from 1999 to 2005. This is a descriptive epidemiologic study of historical series on newly reported tuberculosis cases among residents of Teresina, State of Piaui, by analyzing their demographic, socioeconomic and clinical characteristics. Data were collected from the Information System for Notifiable Diseases (Sinan) and from the Information System on Mortality in Teresina. The median incidence rate of new cases was 50.1/100,000 population and the mean mortality coefficient was 3.3/100,000 population. The disease has affected mostly males (64.0%), those who had less than 7 years of formal education (70.33%) and in young adults (58.8%), although the highest incidence rate was found in the age group of 50 and over. Pulmonary tuberculosis was found in 80.23% of all cases. As for the course of the disease, 71.07% of patients were cured and 17.15% were transferred from one health service to another. This study has helped understand the characteristics of the population studied and the difficulties of the Tuberculosis Control Program in the city of Teresina as far as Sinan is concerned.

Key words: tuberculosis; epidemiological profile; Teresina, Piauí.


 

 

Introdução

A tuberculose é uma doença infecciosa crônica causada pelo Mycobacterium tuberculosis. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que um terço da humanidade seja infectada pelo bacilo da doença, com mais de oito milhões de casos novos e três milhões de mortes devido à enfermidade por ano.1,2

A tuberculose é hoje a maior causa de morbidade e mortalidade entre as doenças infecto-contagiosas no mundo, sendo responsável por um quarto das mortes evitáveis em adultos. Em março de 1993, a OMS declarou a tuberculose como uma emergência de âmbito mundial.2,3

Existe grande diferença na distribuição da doença nas diversas regiões do mundo: 21% dos infectados estão em países desenvolvidos, ao passo que 79% estão nos países pobres e em desenvolvimento. Outra diferença é que nos países desenvolvidos, a maior parte dos infectados situa-se na faixa etária acima de 50 anos e nos países em desenvolvimento, 80% dos infectados encontram-se entre 15 e 59 anos, portanto, na faixa de maior produtividade social. Do total de oito milhões de casos novos, 5% ocorrem em países desenvolvidos e 95% naqueles em desenvolvimento. Os coeficientes de incidência e de mortalidade nos países em desenvolvimento são de 171 e 60/100.000 hab. e nos desenvolvidos 23 e 2/100.000 hab., respectivamente.2

Portanto, pode-se dizer que a tuberculose é reemergente nos países ricos e permanecente nos países pobres.2 Dentre os fatores relacionados com este fato, destacam-se os sociais como determinantes associados à ocorrência da doença, como baixa renda familiar, educação precária, habitação precária/inexistente, famílias numerosas, adensamentos comunitários, má nutrição, alcoolismo e outras doenças infecciosas associadas.4-7 Outro fator que veio agravar a situação foi o advento da pandemia da síndrome da imunodeficiência adquirida (aids), pois quando comparado a um indivíduo não infectado, o indivíduo com infecção pelo HIV (o vírus da imunodeficiência humana) apresenta risco dez vezes maior de desenvolver a tuberculose.3 Por outro lado, a tuberculose é a terceira infecção oportunista mais frequente no momento do diagnóstico de caso de aids.3

Segundo o Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT), estima-se anualmente para o país uma prevalência de 50 milhões de infectados, com cerca de 111.000 casos novos e 6.000 óbitos, e um coeficiente de incidência de 47,2/100.000 hab., variando de 29,6/100.000 hab. na região Centro-oeste para 53,1/100.000 hab. na região Nordeste.2,8 Oito estados brasileiros apresentam incidências acima da média nacional, sendo os maiores valores para o Rio de Janeiro e Amazonas e os menores para Goiás e Distrito Federal.2 Em 2005, o Piauí apresentava-se abaixo da média nacional, com 43,2 casos /100.000 hab. e Teresina acima da média com 50,2 /100.000 hab. Nas capitais, a doença apresenta as mais altas incidências devido à alta densidade demográfica e aos bolsões de pobreza, propiciando um elevado risco de infecção. Deve-se considerar também que, por haver maior oferta de serviços de saúde nessas cidades, existem melhores condições de notificação, diagnóstico e tratamento.5

O Brasil encontra-se na 15a posição entre os 22 países de maiores cargas de casos de tuberculose no mundo.8 A maior concentração dos casos está entre 20 e 49 anos de idade.2

No Brasil, em 1975, foi criado o PNCT e em 1999, o Ministério da Saúde (MS) definiu a doença como prioridade entre as políticas públicas de saúde, estabelecendo diretrizes para ações descentralizadas entre as três esferas de governo (federal, estadual e municipal) e fixando metas para diagnosticar 70% dos casos esperados e curar pelo menos 85% desses casos.7

Este estudo tem o objetivo de traçar o perfil epidemiológico dos casos novos de tuberculose de residentes no Município de Teresina-PI, notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Pretende-se ainda, identificar os óbitos por tuberculose (A16.9, CID 10, 1997)9 e os óbitos por HIV associados com tuberculose (B20.0, CID 10,1997),9 de residentes em Teresina-PI, registrados no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), com a finalidade de realizar uma avaliação do seu comportamento nessa população, e, assim, contribuir para um melhor conhecimento da doença e melhor atuação dos profissionais de saúde quanto às ações de prevenção e controle.

 

Metodologia

Este trabalho consiste em um estudo epidemiológico descritivo de série histórica realizado no Município de Teresina, no período de 1999 a 2005. Foi escolhida a série histórica a partir de 1999 devido o Município de Teresina ter passado para o sistema de gestão plena em 1996 e os dois anos subsequentes terem sido períodos de ajuste.

Teresina é a capital do Estado do Piauí e encontra-se localizada no Centro-Norte do estado e Meio-Norte do Nordeste brasileiro. Em 2007, sua população era de 815.060 habitantes. Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2000), 94,7% da população reside em área urbana. O município possui uma superfície total de 1.702km2, sendo apenas 228 km2 de área urbana.9,10

A população de Teresina, segundo IBGE, no ano de 1999 era de 691.942 habitantes, sendo que 53,3% era do sexo feminino, 45,9% estava na faixa etária de 0 a 19 anos, 43% na faixa de 20 a 49 anos e 11 % na faixa de 50 anos e mais.10 Em 2005, a população era de 788.770 habitantes, sendo que 53,1% era do sexo feminino, 42,5% encontrava-se na faixa etária de 0 a 19 anos, 45,3% na faixa de 20 a 49 anos e 12,2% na faixa de 50 anos e mais.10 Observou-se nestes sete anos do estudo, que a população de Teresina teve um crescimento de 13,99%, mantendo-se a mesma proporção entre os sexos e crescimento de 5,53% na faixa etária de 0 a 19 anos, de 20,06% na faixa de 20 a 49 anos e 27,10% na faixa de 50 anos e mais.

Foram incluídos no estudo os casos novos de tuberculose de residentes no Município de Teresina, registrados no Sinan, bem como os óbitos por tuberculose de residentes em Teresina registrados no SIM, ambos os sistemas sob gestão municipal da Fundação Municipal de Saúde (FMS) da Prefeitura de Teresina.

Considera-se, segundo o MS, como caso de tuberculose todo indivíduo com diagnóstico confirmado por baciloscopia ou cultura e aquele em que o médico, com base nos dados clínico-epidemiológicos e no resultado de exames complementares, firma o diagnóstico de tuberculose. Como "caso novo" considera-se o doente com tuberculose que nunca se submeteu à quimioterapia antituberculosa, fez uso de tuberculostáticos por menos de 30 dias, ou submeteu-se ao tratamento para tuberculose há cinco anos ou mais.7

Pesquisou-se o Sinan Windows versão 7.0, por meio das seguintes variáveis constantes na ficha de Investigação de tuberculose: faixa etária, escolaridade, sexo, forma clínica, diagnóstico baciloscópico, associação com o agravo aids, tratamento supervisionado e situação de encerramento do caso. Utilizaram-se tabelas do programa Tabwin versão 3.2, do Sinan Windows versão 7.0, onde se observou que parte dos casos nos quais o paciente (caso novo) teve alta por transferência de uma Unidade de Saúde e foi notificado por transferência (modo de entrada) em outra Unidade, não estavam vinculados. Assim, foi realizada a vinculação manual, considerando-se o encerramento após a vinculação. Também foram impressos relatórios (Sinan) dos casos de duplicidade, pesquisando-se as duplicidades verdadeiras dos casos novos, ou seja, o mesmo paciente foi notificado, durante o mesmo tratamento, mais de uma vez pela mesma Unidade de Saúde.11 Nesses casos, um foi excluído dos registros da contagem. No SIM, foram pesquisados os óbitos tendo como causa básica a tuberculose (CID A16.9) e os óbitos por HIV associados com tuberculose (CID B.20.0).

Foram calculadas as taxas de incidência por sexo (masculino, feminino) e por faixa etária (0 a 19 anos, 20 a 49 anos e 50 anos e mais), dividindo-se o número de casos novos de tuberculose pela população e multiplicando-se por 100.000, para cada ano estudado; bem como as taxas médias dos casos novos, do coeficiente de incidência e do coeficiente de mortalidade, que consistem no somatório dos números absolutos, dividindo-se por sete. As tabelas foram construídas utilizando-se o programa Word e os gráficos utilizando-se o programa Excel do software Microsoft Office 2.000.

As bases populacionais por ano, sexo e faixa etária foram obtidas no site do Datasus.10

Considerações éticas

O estudo utiliza dados secundários, respeitando-se a confidencialidade e o anonimato dos sujeitos notificados nos Sistemas de Informação. A pesquisa foi registrada no Sistema Nacional de Ética e Pesquisa (Sisnep) – folha de rosto número 134510 – e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) – número do protocolo 0039.0-07, da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

 

Resultados

No período de 1999 a 2005, foram notificados em Teresina, 2.600 casos novos de tuberculose por todas as formas clínicas, com média de 371 casos/ano (Tabela 1). Em relação aos dados sociodemográficos, foram encontrados 1.664 casos do sexo masculino (64%), e 931 casos do sexo feminino (35,8%) (Figura 1). Isto mostra uma razão de masculinidade de 1,78:1. A idade variou entre menor de um ano e maior de 80 anos. Apesar de 58,8% dos casos situarem-se entre 20 e 49 anos de idade, a maior taxa de incidência foi na faixa etária de 50 anos e mais (124,78/100.000 hab.). A taxa de incidência na faixa etária de 0 a 19 anos foi de 13,08/100.000 hab. e 65,64/100.000 na faixa de 20 a 49 anos (Figura 2). Dos 2.600 casos estudados, 794 casos (30,53%) possuíam até três anos de escolaridade (analfabetos ou semianalfabetos), 1.035 casos (39,80%) possuíam quatro a sete anos de escolaridade (ensino fundamental incompleto), 491 casos (18,88%) de oito a 11 anos de escolaridade (ensino médio incompleto ou completo) e 105 casos (4,03%) com mais de 12 anos de escolaridade (ensino médio completo ou ensino superior).

 

 

 

 

 

Com referência aos dados clínico-epidemiológicos, os casos ficaram distribuídos em 80,23% na forma pulmonar da doença, 17,23 % na forma extrapulmonar e 2,53% na forma pulmonar associada com a extrapulmonar. Em 82,11% dos casos, foi realizada a baciloscopia do escarro para o diagnóstico da tuberculose, sendo 65,05% com resultado positivo e 34,94% negativo. Quando investigada a comorbidade aids, encontrou-se a associação em 1,73 % dos casos (45 casos). Vale salientar que a informação sobre esta variável não estava disponível (ignorado/branco) em 89,57% dos casos. Com relação à administração do tratamento aos pacientes de tuberculose, 28% tiveram seu tratamento autoadministrado, enquanto 12,5% foram supervisionados por profissional de saúde (médico, enfermeiro, dentista, auxiliar ou técnico de enfermagem, atendente de consultório odontológico ou agente comunitário de saúde) ou alguém próximo ao paciente, considerado como responsável por seu tratamento pelo serviço de saúde – tratamento supervisionado (TS) – e em 59,5% a informação não estava disponível (ignorado/branco). Isso pode ser justificado pelo fato dessa variável ter entrado no sistema (Sinan) apenas em 2003 e considerada de preenchimento obrigatório somente no final de 2004, na versão 6.0 do Sinan Windows.12

Quanto à condição de encerramento dos casos novos notificados de residentes em Teresina e constantes no estudo, 71,07% apresentaram cura, 4,34 % abandonaram o tratamento, 17,15% foram transferidos e 4,26 % tiveram óbito (Tabela 2 e Figura 3), 1,92% tiveram mudança de diagnóstico, 0,11 % apresentaram tuberculose multiresistente e 1,11% apresentaram encerramento ignorado.

 

 

 

 

Na Figura 4, encontra-se a distribuição dos óbitos por tuberculose com um total de 171 e dos óbitos por HIV associados com tuberculose, com um total de 18 casos. O coeficiente de mortalidade por tuberculose em Teresina, no período de 1999 a 2005, variou de 2,1 a 5,2 por 100.000 hab., com média de 3,3 óbitos por 100.000 hab. (Tabela 1).

 

 

Discussão

O estudo mostrou que em relação ao número de casos novos notificados/ano, a taxa de incidência apresentou diminuição devido à pequena variação no número de casos, em relação ao aumento da população, nos anos de 1999 a 2005. A tuberculose afetou mais os indivíduos do sexo masculino, na faixa etária de 20 a 49 anos, faixa de maior produtividade, situação semelhante encontrada no Brasil1,2 e em outras capitais, como São Paulo-SP12 e Salvador-BA,5 bem como em Teresina, em outros estudos realizados nos anos de 1981 a 199013 e 1999 a 2004.14

Apesar do maior número de casos na faixa etária de 20 a 49 anos, a maior taxa de incidência foi encontrada na faixa de 50 anos e mais. Este fato constitui um problema de saúde pública, face ao crescimento populacional neste grupo, que foi de 27,1% na cidade, no período estudado, observando-se com isso, que a tuberculose em Teresina e no Brasil vem apresentando maior incidência nos maiores de 50 anos, conforme constatado no estudo de mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias no Município de Teresina, nos anos de 1971 a 2000;15 e no estudo realizado na cidade de Salvador, sobre o perfil da tuberculose na década de 1990.5 Nesta faixa etária a associação está relacionada ao aumento da expectativa de vida e à alta proporção de indivíduos com infecção latente de tuberculose, reativada pela ocorrência de desordens crônicas, evidenciando uma mudança no perfil da doença.5,16

Conforme estudo realizado no Município de Piripiri-PI, no período de 1997 a 2000,4 o percentual de casos de tuberculose encontrado nos menores de 15 anos, foi de 4,8%. Em Teresina, detectou-se 3,0%, o que confirma a discrepância com o pressuposto pelo MS, que é de 15%. Alguns autores5,16 relatam a dificuldade em diagnosticar os casos nesta faixa etária, bem como a não notificação, devido a tratamento, por meio de testes terapêuticos.

Os dados de escolaridade encontrados neste estudo foram concordantes com os da literatura, que relata a inexistência ou baixa escolaridade da maioria dos casos, sendo um fator de risco para a tuberculose, contribuindo inclusive para a não adesão ao tratamento e para o aumento da taxa de abandono. A baixa escolaridade da população é reflexo de todo um conjunto de condições socioeconômicas precárias, que aumentam a vulnerabilidade à tuberculose e são responsáveis pela maior incidência da enfermidade e pela menor aderência ao respectivo tratamento.4 Porém, o percentual de cura encontrado na pesquisa, nos indivíduos com menos de sete anos de escolaridade, foi proporcional ao número de casos nessa população. Jordan e colaboradores, no ano de 2000,17 em revisão de literatura sobre adesão em doenças crônicas, afirmam ser baixo o poder de predição de status econômico, como a escolaridade.

O conhecimento do perfil socioeconômico do agravo tuberculose se faz importante não apenas para nortear as políticas públicas, mas também para direcionar as ações de atenção básica, inclusive através da implementação dessas ações pela Estratégia de Saúde da Família (ESF).

A realização da baciloscopia é prioritária para o diagnóstico da forma pulmonar da doença,18 encontrada em 80,23% dos casos estudados. Outros estudos em Teresina, nos anos de 1981 a 1990 relataram 83,2%,15 em Salvador, na mesma década, 85,3%5 e em Belo Horizonte (2001-2002), 76,4%,19 porém abaixo do percentual estimado para o Brasil pelo Ministério da Saúde (90%).20 A realização da baciloscopia é também de grande interesse para as atividades de controle de saúde pública, buscando a interrupção da cadeia de transmissão da doença. A positividade (65,05%) teve redução comparada ao estudo na década anterior, que foi de 73,8%,15 ficando abaixo do estimado para o país pelo MS (70%).20

Com relação à coinfecção aids/tuberculose, o fato de 89,57% dos casos terem informação "ignorado/branco", próximo ao encontrado no Município de Salvador (84,2%) na década de 90,5 mostra a deficiência do preenchimento da ficha de investigação, como também o fato de que esta informação não está sendo obtida no momento do diagnóstico da tuberculose, sendo a sorologia solicitada após a notificação, apesar da epidemia de aids exercer forte influência na magnitude e na gravidade da situação dos doentes com tuberculose.13 Em Ribeirão Preto-SP, em um estudo realizado nos anos de 1998 a 2006, o percentual de não realizado/ignorado foi de apenas 17,4%.21 A coinfecção foi identificada em apenas 1,73% dos casos, situação parecida com o Município de Salvador, que foi de 1,2%,5 muito inferior ao encontrado no Município Ribeirão Preto (27,1%).21

Com relação ao tratamento supervisionado (TS), houve melhora da informação apenas a partir de 2003, quando da sua implantação, o que explica o alto percentual de ignorado/branco nos anos anteriores. A partir de 2003, com o baixo percentual de ignorado/branco, ainda é alto o percentual de TS não realizado. Espera-se melhora deste quadro nos próximos anos, pois segundo o PNCT, o TS deve ser oferecido a todos os casos identificados, sejam estes casos novos, reingresso, de recidiva ou de retratamento.7

Quanto ao encerramento dos casos, o percentual de cura de 71,07%, abaixo da meta preconizada pelo PNCT,7,20 pode ser explicado pelo alto percentual de transferência (17,15%), que se deve em parte pelo fato de que muitos casos não foram transferidos para outras Unidades de Saúde de Teresina, e, sim, para outras cidades do Piauí e a outros estados. Isto ocorre devido Teresina ser considerada referência do setor da saúde na região.14 Assim, no momento da notificação, o paciente fornece o endereço onde se hospeda na cidade por considerar um local de boa assistência médica, entrando no sistema como caso de Teresina. Posteriormente, o mesmo pede para ser tratado na cidade onde reside, tendo alta por transferência sem que a sua evolução seja acompanhada no município de Teresina e sim no município pra onde foi transferido.

Outro fator que contribui para o alto percentual de transferência, que foi observado na coleta dos dados, é a não vinculação de parte dos casos que receberam alta por transferência e tiveram modo de entrada no Sinan como transferência em outra unidade de saúde, para que o encerramento seja o da evolução do caso, em um único registro.

Quanto ao abandono, a média dos sete anos encontra-se de acordo com a meta do PNCT, que deve ser menor que 5%,20 porém variou entre 2,7% em 2003 e 6,5% em 2001. Em outros estudos encontrou-se taxa média de 12,4% (2001 a 2002) em Belo Horizonte17 e 16,6% (1998 a 2000) em Cuiabá.17

O coeficiente de mortalidade com taxa média de 3,3 óbitos por 100.0000 hab. nos anos de estudo foi próximo ao encontrado em Fortaleza (1999 a 2003)22 e no Brasil (2000), que foi de 3,3 e 3,0 óbitos por 100.000 hab. respectivamente,14 e inferior à Salvador (1990 A 2000), com coeficiente de 8,5/100.000 hab.5

Durante os anos de estudo, foram encontrados 18 óbitos por HIV associados com tuberculose (CID B20.0),9 com uma proporção de 9,5 óbitos por tuberculose (CID A16.9)9 para 1 óbito por HIV associado com tuberculose, dado que não é suficiente para uma análise mais detalhada dessa associação, não sugerindo uma importância significativa da infecção pelo HIV no padrão da tuberculose na cidade de Teresina.

A pesquisa possibilitou conhecer o perfil da tuberculose em Teresina, nos anos de estudo, porém não foi possível avaliar a qualidade do Programa Nacional de Controle da Tuberculose no município devido ao elevado percentual de alta por transferência para outros municípios do Piauí e de outros estados. Observou-se que no Sinan de Teresina, as informações sobre tuberculose têm melhorado ao longo dos anos, mas ainda apresentam falhas no preenchimento da ficha de investigação pelos profissionais de saúde e na vinculação dos casos na própria coordenação do programa.

Constatou-se que a tuberculose em Teresina, no período estudado, apresentou um maior número de casos na faixa etária de 20 a 49 anos, mas a maior taxa de incidência ocorreu na faixa etária de 50 anos e mais, mais especificamente no sexo masculino. Vale ressaltar a importância de realização, pelo município, de estratégias para ações preventivas e de diagnóstico precoce nessa faixa etária, como a busca ativa de casos através da atenção básica – Estratégia de Saúde da Família.

Ainda como sugestão, este trabalho destaca a necessidade de, nas capacitações dos profissionais envolvidos no programa sobre tuberculose, reforçar o preenchimento correto da ficha de investigação, bem como ressaltar a importância do tratamento supervisionado. Faz-se necessário também melhorar a vinculação dos casos no Sinan, no nível municipal, e definir estratégias para reduzir o alto percentual de transferência.

 

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Endereço para correspondência:
Universidade Federal do Piauí,
Centro de Ciências da Saúde,
Departamento de Parasitologia e Microbiologia,
Campus Ministro Petrônio Portella,
Ininga, Teresina-PI, Brasil.
CEP:64049-550
E-mail:vcampelo@ufpi.br; viriato.campelo@bol.com.br

Recebido em 24/11/2008
Aprovado em 02/09/2009