SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.19 número2Prevalência de sintomas de asma em lactentes, pré-escolares e escolares em área coberta pelo Programa Saúde da Família, Pelotas, RS, BrasilCuidados alimentares e fatores associados em Canoas, RS, Brasil índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

  • No hay articulos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.19 n.2 Brasília jun. 2010

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742010000200006 

ARTIGO ORIGINAL

 

Análise de três fontes de informação da atenção básica para o monitoramento da hipertensão arterial*

 

Analysis of three information sources for monitoring hypertension at the primary health care level

 

 

Edmarlon GirottoI; Selma Maffei de AndradeII; Marcos Aparecido Sarriá CabreraII

ICurso de Farmácia, Universidade Norte do Paraná, Londrina-PR, Brasil
IIDepartamento de Saúde Coletiva, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Estadual de Londrina, Londrina-PR, Brasil. Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Estadual de Londrina, Londrina-PR, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Foram estudadas as fontes de informação sobre hipertensos de uma Unidade de Saúde da Família de Londrina, Paraná. As fontes Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (Hiperdia), Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) e fichas de aprazamento foram analisadas quanto ao número de hipertensos, e identificados os motivos do não registro em cada fonte de informação, além de se estimar a subnotificação de casos de hipertensão na área estudada. Dentre os pacientes estudados, 689 (71,5%) não estavam registrados simultaneamente nas três fontes de informação. O principal motivo do não registro dos hipertensos foi não residir mais na área da Unidade de Saúde da Família (52,3%). As estimativas de subnotificação variaram de 5,4% (aprazamento) a 39,5% (Hiperdia). Os resultados mostram um grande número de hipertensos não registrados simultaneamente nas três fontes analisadas, o que pode dificultar a adoção de ações de promoção da saúde e de monitoramento desse agravo.

Palavras-chave: sistemas de informação; hipertensão; atenção primária à saúde; subnotificação; técnicas de estimativa.


SUMMARY

The study was conducted using different sources of information on hypertensive patients in a Family Health Unit in Londrina, Parana State, Brazil. Three sources were analyzed for ascertaining the number of patients: the System of Enrollment and Monitoring of Hypertensive and Diabetic Patients (Hiperdia), the Primary Health Care Information System (SIAB) and schedule cards. The study aimed also to estimate the rates of under-registration of cases of hypertension as well as to check the reasons for under-registration of patients. Among participants, 689 (71.5%) had not been registered simultaneously in the three sources of information. The main reason for not being registered was that he/she did not live in the area of the Family Health Unit any longer (52.3%). Rates of under-registration ranged from 5.4% (schedule cards) to 39.5% (Hiperdia). The results show a great number of hypertensive patients unregistered simultaneously in the three analyzed sources, what may hinder the adoption of health promotion actions and monitoring of the disease.

Key words: information systems; hypertension; primary health care; under-registration; estimation techniques.


 

 

Introdução

As doenças cardiovasculares representam a principal causa de mortalidade na população brasileira, e a hipertensão arterial, com prevalências que variam de 19,2 a 44,4% na população adulta,1 age como principal fator de risco para essas doenças.2,3 Desse modo, o controle dos níveis pressóricos é fundamental para prevenir ou retardar o aparecimento de complicações crônicas, especialmente danos aos órgãos-alvo.4

Para um controle adequado da hipertensão não são suficientes apenas as medidas de orientação, mas também, estratégias que auxiliem os indivíduos na mudança de atitudes, exigindo ações de promoção da saúde e de prevenção.5,6 Assim, é fundamental o acompanhamento sistemático dos indivíduos acometidos por este agravo, especialmente no nível da atenção básica à saúde, mais próximo e acessível a essa população. Para isto, todavia, é essencial conhecer a cobertura das fontes de informação sobre portadores de hipertensão na atenção básica, a completude das informações registradas e a confiabilidade/validade dos dados.7,8

No Brasil, nos últimos anos, observaram-se melhorias significativas no acesso a banco de dados nacionais que dispõem de informações epidemiológicas, contribuindo para a avaliação e monitoramento da situação de saúde nos diversos municípios brasileiros.7,8 Apesar dos avanços observados, as informações apresentadas pelos bancos de dados nacionais podem apresentar distorções, como sub-registro de casos, que comprometem o planejamento e o monitoramento das ações específicas. Além disso, a falta de integração entre essas fontes de dados pode contribuir para reduzir o escopo e a utilidade das informações em saúde.8,9

No que se refere ao controle e monitoramento da hipertensão arterial, o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) fornece informações que auxiliam as equipes de saúde, as unidades básicas de saúde e os gestores municipais, possibilitando melhorar a qualidade da atenção à saúde.10 Este sistema torna-se, então, um importante meio para o acompanhamento de pacientes portadores de hipertensão arterial, por fornecer dados das famílias cadastradas pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), registro de atividades, marcadores de desempenho e acompanhamento de grupos prioritários.11 Nesse Sistema, a informação sobre pessoas hipertensas é obtida, pelos ACSs, de forma autorreferida pelas famílias.

Paralelamente ao Siab, e com o objetivo de conhecer o perfil demográfico, clínico e epidemiológico da população portadora de hipertensão e diabetes, foi criado, pelo Ministério da Saúde, o Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (Hiperdia). Este é um sistema de informação que registra cada ação prestada aos pacientes com hipertensão e/ou diabetes, criando um banco de dados que permite identificar portadores dessas patologias e planejar ações de controle.6

Em Londrina, Paraná, além do SIAB e Hiperdia, utiliza-se um cartão de aprazamento para o acompanhamento dos pacientes hipertensos nas 53 Unidades de Saúde da Família (USF) do município. O cartão de aprazamento deve ser usado para registrar as visitas e os retornos agendados de todos os hipertensos, permitindo a identificação dos faltosos,12 o que possibilita a busca ativa dos pacientes que não retornaram para as consultas médicas ou de enfermagem programadas, sendo também uma fonte disponível, nesse município, de informações sobre pacientes hipertensos.

A identificação do número real de hipertensos de uma determinada área geográfica é fundamental para o planejamento de ações de promoção e atenção à saúde pela unidade de saúde responsável pelo atendimento dos habitantes dessa área. Assim, tornam-se importantes estudos que visem identificar potencialidades e fragilidades de cada uma das fontes de informação sobre pessoas portadoras de hipertensão arterial na atenção básica. O relacionamento de bases de dados, seja pelo método probabilístico,13 seja pelo determinístico,14 contribui para a avaliação da cobertura das diferentes fontes de dados sobre este agravo, facilitando a identificação da população afetada e o seguimento das pessoas cadastradas.8,15

A integração de determinadas bases de dados pode contribuir para a melhoria da qualidade dos dados registrados e garantir que o seguimento dos indivíduos cadastrados seja facilitado.15 Desta forma, o objetivo deste estudo foi avaliar a situação dessas três fontes de informação (SIAB, Hiperdia e aprazamentos) em relação ao número de hipertensos, identificando os motivos de divergências numéricas entre estas três fontes e estimando a subnotificação de casos de hipertensão arterial na área de abrangência de uma Unidade de Saúde da Família de Londrina-PR.

 

Metodologia

O presente trabalho foi realizado na área de abrangência de uma USF, situada na região leste do Município de Londrina, Norte do Paraná. O município conta, segundo estimativas do IBGE (2008),16 com 505.184 habitantes.

A USF é totalmente coberta pelo Programa Saúde da Família e, conforme dados do SIAB, tem 6.242 pessoas residentes em sua área de abrangência, 63,9% destas com idade igual ou superior a 20 anos. A área é composta, em sua maioria, por famílias de baixa renda.17

A população de estudo foi composta por hipertensos de 20 a 79 anos registrados pelo SIAB, Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (Hiperdia) e/ou nas fichas de aprazamento da USF em agosto de 2006. Os nomes de cada paciente, número do prontuário municipal, data de nascimento, sexo, endereço e telefone foram digitados em uma planilha do Excel para Windows, relacionando cada registro à respectiva fonte de informação (SIAB, Hiperdia e/ou aprazamento).

Em seguida, ordenaram-se os pacientes por nome, identificando aqueles que estavam presentes simultaneamente nas três, duas ou em apenas uma das fontes de informação. Como havia a possibilidade de pessoas com nomes semelhantes, esta ordenação também foi realizada pelo número do prontuário e data de nascimento, visando esclarecer se se tratava do mesmo caso ou não. Em caso positivo, um campo relativo à fonte de informação que continha o registro desse paciente era assinalado, e seu nome, registrado pela segunda ou terceira vez, excluído da lista, para evitar duplicações. Assim, após o relacionamento determinístico destes dados,14 identificaram-se os hipertensos registrados apenas no Hiperdia, SIAB ou Aprazamento; no Hiperida/SIAB; no Hiperdia/Aprazamento; no SIAB/Aprazamento; e no Hiperdia/SIAB/Aprazamento.

Para os não registrados simultaneamente nas três fontes de informação, foram buscados os motivos para não constarem nas demais. Este processo seguiu as seguintes etapas: 1) consulta ao sistema informatizado da Secretaria Municipal de Saúde, para identificar se o paciente ainda residia na área de abrangência da USF; 2) análise do prontuário médico, buscando determinar se o paciente realmente era hipertenso ou se utilizava a USF para tratamento ou verificação da pressão arterial; 3) coleta de informações nos registros dos agentes comunitários de saúde, com o intuito de verificar a situação atual do hipertenso (morte, serviço que fazia acompanhamento, local de residência); 4) entrevista com o paciente, cuidador e/ou acompanhante ou vizinho, por telefone ou na residência, para os casos em que os três passos anteriores não foram esclarecedores.

Em seguida, foram excluídos os registros que não deveriam mais constar nos sistemas da USF, ou seja, aqueles relativos às pessoas que haviam morrido, que não residiam mais na área da USF ou que não eram portadores de hipertensão. Este novo conjunto de dados foi avaliado quanto ao seu grau de concordância, determinado pela estatística Kappa,18 tendo como padrão-ouro o Hiperdia, considerando que esta é a fonte específica de informações sobre portadores de hipertensão. Para análise dessa concordância, foi usada a classificação proposta por Landis e Kock (1977),19 que apresentam as seguintes categorias conforme a força da concordância: 0,81 a 1,00 (quase perfeita); 0,61 a 0,80 (substancial); 0,41 a 0,60 (moderada); 0,21 a 0,40 (aceitável); 0,00 a 0,20 (fraca) e <0,00 (pobre). Estimou-se, ainda, o tamanho da população por meio da fórmula de Chapman para identificar o nível de subnotificação.20

As estimativas da população (fórmula de Chapman) foram calculadas em planilhas do programa Excel 2003 para Windows, com os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). As estimativas de subnotificação foram calculadas para cada fonte de informação, representando a proporção de casos não registrados em relação ao total de casos estimados para cada dupla de fontes de dados. Os dados relacionados aos motivos de não registro do hipertenso em cada fonte de informação foram digitados no Epi Info, versão 3.3.2 para Windows,21 para serem analisadas as frequências de cada motivo identificado. O cálculo do grau de concordância foi realizado pelo aplicativo Epitable do programa Epi Info versão 6.04d.22

Considerações éticas

A coleta de dados foi realizada no período de novembro de 2006 a junho de 2007. Este estudo faz parte de um projeto de pesquisa autorizado pela Secretaria Municipal de Saúde de Londrina e Direção da Unidade Saúde da Família da área estudada, e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (UEL), sob o parecer 286/06.

 

Resultados

A distribuição dos 964 hipertensos identificados nas fontes de informação, antes da pesquisa sobre os motivos para não registro, está representada na Figura 1-A. Somente 275 (28,5%) hipertensos constavam nas três fontes de informação simultaneamente. Observou-se que o SIAB foi a fonte que mais apresentou não registro de hipertensos (460), seguido do Hiperdia (326) e das fichas de aprazamento (315).

 

 

Os motivos identificados para o não registro dos hipertensos nas fontes de informação são apresentados na Tabela 1. Foram excluídos dessa análise os casos para os quais não foram obtidas informações. Percebe-se que os principais motivos para não registro foram não residir mais na área da USF (52,3%), e não ser cadastrado na respectiva fonte (15,2%).

 

 

Foram importantes motivos para o não registro no Hiperdia: não residir mais na área da USF (36,7%), não ser cadastrado na respectiva fonte (29,3%) e fazer controle da pressão arterial em outro serviço (24,0%). Quanto ao aprazamento, não residir mais na área da USF (62,9%) e fazer controle da pressão arterial em outro serviço (16,4%) mostraram-se como os principais motivos. Não residir mais na área da USF (53,1%), não receber visita das equipes da USF e/ou ACS (25,3%) e não ser cadastrado na respectiva fonte (15,9%) foram as razões mais frequentes para não registro no SIAB. Outros motivos identificados são apresentados na Tabela 1.

A Figura 1-B mostra a distribuição dos pacientes hipertensos segundo as fontes de informação após pesquisa sobre os motivos e exclusão daqueles que não deveriam mais constar dos sistemas, ou seja, pelos motivos: não reside mais na área da USF, óbito e não ser portador de hipertensão. No total, houve redução de 964 hipertensos para 667, uma diminuição de 30,8%. Considerando a população com idade igual ou superior a 20 anos da área, a prevalência de hipertensão arterial passaria de 24,2% para 16,7%.

Percebem-se diferenças também no total de hipertensos registrados apenas no Hiperdia ou nas três fontes de informação, na comparação dos dados antes e após a pesquisa. Inicialmente, 18,7% dos hipertensos estavam, isoladamente, presentes apenas no Hiperdia e, após a exclusão, estes representaram somente 2,4%. A proporção de hipertensos presentes simultaneamente nas três fontes passou de 28,5% para 41,2%.

As estimativas da população de hipertensos, por meio da fórmula de Chapman, considerando o Hiperdia/Aprazamento, Hiperdia/SIAB e o Aprazamento/SIAB foram, respectivamente, de 590, 681 e 702 casos (Tabela 2). Desta forma, estimaram-se subnotificações que variaram de 5,4% (Aprazamento) a 39,5% (Hiperdia) (Tabela 2).

 

 

Em relação ao Hiperdia (padrão-ouro), o aprazamento apresentou uma concordância "aceitável" (entre fraca e moderada) (Kappa=0,34) e o SIAB uma concordância "fraca" (Kappa=0,04), conforme pode ser verificado na Tabela 3.

 

 

Discussão

Os sistemas de informação em saúde têm como objetivo identificar problemas individuais e coletivos, quanto à situação demográfica e epidemiológica de uma população, gerando subsídios para a análise desta situação e permitindo a implementação de estratégias diversas no combate destes problemas.23 Segundo Carvalho e Eduardo (1998),24 esses sistemas são ferramentas de apoio à decisão e essenciais para a construção do conhecimento sobre o processo saúde-doença, além de serem meios para a avaliação dos serviços. No entanto, é necessário que a informação disponível apresente boa cobertura e qualidade25 e que esteja disponível em momento oportuno, visando direcionar tomadas de decisões apropriadas.26

Neste contexto, os resultados apresentados por este estudo mostram algumas fragilidades nas informações sobre hipertensos disponíveis em uma USF, pois 71,5% dos hipertensos não estavam registrados simultaneamente nas três fontes de informação (Hiperdia, SIAB e aprazamento). Tal fato evidencia a necessidade de avaliação prévia das fontes de informações sobre este agravo ao se pretender pesquisar a totalidade de hipertensos cadastrados em um serviço.

Deve-se salientar que o SIAB trabalha com informações autorreferidas, o que pode subestimar os hipertensos registrados nesta fonte.27 Além disso, durante o processo de pesquisa, notou-se que a ficha de aprazamento, idealizada para controlar visitas e agendamentos de retornos de todos os hipertensos, era utilizada, nessa USF, apenas para registro dos que utilizavam medicamentos, fato que também levou à subestimação nessa fonte, uma vez que alguns pacientes fazem uso de outros serviços para a obtenção de medicamentos ou se submetem apenas à terapia não-medicamentosa. Esta situação poderia justificar o fato de a fonte Hiperdia apresentar uma maior proporção de hipertensos isolados (18,7%). Outro fator a explicar a maior proporção de registros isolados nesta fonte foi o de que, no período de realização desta pesquisa, o programa não permitia a exclusão de pacientes, uma vez registrados, impedindo retiradas por óbito ou por mudança de endereço.

Sabe-se que o SIAB possibilita a identificação de hipertensos não cadastrados na USF, pois englobaria pessoas que fazem o acompanhamento em outros serviços. Porém, esta fonte fica sujeita a erros, devidos à memória do informante ou à possibilidade de desconhecimento sobre a situação de saúde de todos os familiares, bem como à própria qualidade da visita realizada pelo agente de saúde, o qual pode não estar capacitado para a obtenção destas informações.

Como 25,3% dos hipertensos não cadastrados no Siab tiveram como motivo não receber visitas das equipes da USF e/ou ACS, pode-se sugerir que esta é uma fragilidade da atenção à saúde nesse serviço, cujas causas precisam ser investigadas. A utilização do SIAB é importante como instrumento de avaliação e planejamento das ações às famílias acompanhadas; no entanto, a desatualização de seus cadastros pode sugerir que ele está sendo subutilizado,28 ou seja, perde seu potencial de ser usado como norteador das ações da unidade.

Esta análise se torna mais concreta ao observarmos os motivos de não registro dos pacientes nas três fontes de informação verificadas. Entre todos os motivos analisados, não residir mais na área da USF foi o mais observado. Cerca de um ano antes do início da coleta de dados foi inaugurada uma nova Unidade de Saúde na região, que passou a abranger parte da área pertencente à USF estudada. O adequado seria que estas fontes fossem revistas, para a exclusão dos hipertensos que passariam a ser atendidos na outra USF, o que, neste estudo, parece não ter sido observado, devido à alta proporção identificada para este motivo.

Percebeu-se redução significativa do número total de hipertensos (30,8%) após exclusão daqueles que já deveriam ter sido retirados das respectivas fontes. A partir da prevalência de hipertensão calculada após essas exclusões (16,7%), inferior às detectadas em estudo de revisão,1 é possível presumir que há hipertensos ainda não cadastrados em quaisquer das fontes, o que reforça a necessidade de se investir na qualificação desses sistemas de informação. A atualização dos dados deve ser constante, pelos ACS ou pela equipe da USF, no caso dos aprazamentos e do SIAB, ou por correção de algumas deficiências no software do Hiperdia, que não permitia, à época, a retirada dos pacientes que deveriam ser excluídos.

A percepção de profissionais de saúde a respeito da importância da informação para a organização do processo de trabalho é fundamental para a maior utilização da informação na atenção básica e, consequentemente, para o seu aprimoramento. Estudo qualitativo, realizado no Município de Franca-SP, mostrou que é positiva a percepção dos profissionais de saúde quanto à importância do SIAB para a organização do serviço; entretanto, citam-se várias limitações, como a baixa qualidade no preenchimento e na alimentação das fichas no SIAB, a alta rotatividade dos agentes comunitários de saúde, além da falta de investimento na educação permanente, necessária para o enfrentamento das dificuldades na operacionalização do sistema.28

Cabe enfatizar que as fontes de informações discutidas são instrumentos importantes para a adoção de estratégias no controle e acompanhamento de pacientes hipertensos na atenção básica. Devido às suas especificidades, estas se complementam, pois o SIAB permite conhecer os hipertensos que não fazem o acompanhamento na USF, o Hiperdia proporciona o conhecimento da demanda à Unidade, e a ficha de aprazamento, o controle de não comparecimento para ações programadas, quando utilizada de forma adequada.

Todavia, as análises de concordância realizadas mostraram discrepâncias entre as fontes de informações, reforçando a necessidade de se criar mecanismos que as integrem e, periodicamente, permitam sua atualização, para que estas expressem mais fielmente o número de hipertensos na área desta unidade.

A atualização do SIAB, especialmente por meio de visitas mais frequentes por parte dos agentes de saúde, o preenchimento de fichas de aprazamento de todos os hipertensos, independentemente se fazem ou não o tratamento medicamentoso, e mudanças operacionais no Hiperdia poderiam colaborar positivamente na maior fidedignidade destas fontes de informação, de forma a contribuir efetivamente no monitoramento desse agravo à saúde e na avaliação da própria atenção básica.

Embora o Hiperdia tenha sido utilizado como padrão-ouro nas análises de concordância, este apresentou a maior redução de hipertensos após a exclusão daqueles que não deveriam constar nas fontes de informação. Este episódio não desqualifica o Hiperdia como padrão-ouro, pois esta análise foi realizada após as exclusões, além de esta fonte ser específica para o acompanhamento dos hipertensos cadastrados.

Quanto às estimativas dos casos de hipertensos, os percentuais de subnotificação no Hiperdia e SIAB foram mais elevados, e mostraram-se similares aos observados em outros estudos,9,29 que trabalharam com doenças de notificação obrigatória, além de utilizarem outros sistemas de informação. Já a subnotificação estimada do aprazamento foi inferior às das demais fontes, e se assemelha à verificada em estudo realizado por Gonçalves e colaboradores, em estudo sobre aids.30 Talvez, o menor percentual de subnotificação apresentado pelo aprazamento se deva ao fato de esta fonte, apesar de não compor um sistema nacional, ser mais importante para a unidade no acompanhamento dos hipertensos, por se tratar da fonte utilizada para controle dos que retiram seus medicamentos na USF.

A análise das fontes de dados do presente estudo aponta uma cobertura deficiente de hipertensos, de forma que esta limitação pode ter prejudicado a estimação da população e, consequentemente, interferido no grau de subnotificação. Ademais, uma das premissas da metodologia utilizada é que a população seja fechada, ou seja, sem mortes e migrações durante o processo,20 o que possivelmente foi obtido, visto que o período de estudo foi razoavelmente curto (sete meses).

O presente estudo apresenta metodologia relativamente simples, que pode ser replicada em qualquer unidade de atenção básica à saúde, contribuindo, assim, para a avaliação e maior uso das informações produzidas pelas equipes de saúde, visando a uma atenção de melhor qualidade. Merece destaque que já existem softwares que otimizam o processo de cruzamento de dados, como o Reclink, que, segundo estudo, mostra-se semelhante a técnicas manuais quanto à sua performance, porém utilizando um tempo menor para o processamento dos registros.13 Assim, talvez o processo de relacionamento dos sistemas de informações se tornasse menos complexo e, consequentemente, mais factível aos profissionais e serviços locais de saúde.

De modo geral, independente da forma de obtenção das informações, estas fornecem meio para o processo de tomada de decisão, aumentando a eficiência dos serviços prestados e, inclusive, aprimorando a gestão do trabalho em saúde.31 Os sistemas locais de informação são, então, uma ferramenta imprescindível de apoio às atividades das unidades de saúde, auxiliando na aquisição de conhecimento e contribuindo na gestão do cuidado, com vistas a intervenções mais aproximadas do quadro de necessidades de cada localidade.

 

Referências

1. Passos VMA, Assis TD, Barreto SM. Hipertensão arterial no Brasil: estimativa de prevalência a partir de estudos de base populacional. Epidemiologia e Serviços de Saúde 2006;15(1):35-45.

2. Conceição TV, Gomes FA, Tauil PL, Rosa TT. Valores de pressão arterial e suas associações com fatores de risco cardiovasculares em servidores da Universidade de Brasília. Arquivos Brasileiros de Cardiologia 2006;86(1):26-31.

3. Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas Públicas. Plano de reorganização da Atenção à Hipertensão Arterial e ao Diabetes Mellitus. Revista de Saúde Pública 2001;35(6):585-588.

4. Pozzan R, Brandão AA, Magalhães ME, Freitas EV, Brandão AP. O controle da pressão arterial como questão central no tratamento da hipertensão arterial. Revista Brasileira de Hipertensão 2003;10(4):253-259.

5. Lima MT, Bucher JSNF, Lima JWO. A hipertensão arterial sob o olhar de uma população carente: estudo exploratório a partir dos conhecimentos, atitudes e práticas. Cadernos de Saúde Pública 2004;20(4):1079-1087.

6. Ximenes Neto FR, Melo JR. Controle da hipertensão arterial na atenção primária em saúde - uma análise das práticas do enfermeiro. Enfermería Global [Internet]. 2005 [acesso em 3 dez 2008];(6). Disponível em:. http://www.um.es/eglobal/6/06c06p.html

7. Ministério da Saúde. A experiência brasileira em sistemas de informação em saúde: produção e disseminação de informações sobre saúde no Brasil. Brasília: MS; 2009.

8. Coeli CM, Camargo Júnior KR, Sanches KRB, Cascão AM. Sistemas de informação em saúde. In: Medronho RA, Bloch KV, Luiz RR, Werneck GL. Epidemiologia. 2a ed. São Paulo: Atheneu; 2009. p. 525-534.

9. Maia-Elkhoury ANS, Carmo EH, Sousa-Gomes ML, Mota E. Análise dos registros de leishmaniose visceral pelo método de captura-recaptura. Revista de Saúde Pública 2007;41(6):931-937.

10. Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde. SIAB: manual do sistema de informação de atenção básica. Brasília: MS; 1998.

11. Conill EM. Políticas de atenção primária e reformas sanitárias: discutindo a avaliação a partir da análise do Programa Saúde da Família em Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 1994-2000. Cadernos de Saúde Pública 2002;18 Suppl:191-202.

12. Jardim PCBV, Sousa ALL, Monego ET. Atendimento multiprofissional ao paciente hipertenso. Medicina 1996;29(2/3):232-238.

13. Camargo Júnior KR, Coeli CM. Reclink: aplicativo para o relacionamento de bases de dados, implementando o método probabilistic record linkage. Cadernos de Saúde Pública 2000;16(2):439-447.

14. Silva JPL, Travassos C, Vasconcellos MM, Campos LM. Revisão sistemática sobre encadeamento ou linkage de base de dados secundários para uso em pesquisa em saúde no Brasil. Cadernos de Saúde Coletiva 2006;14(2):197-224.

15. Pinheiro RS, Camargo Júnior KR, Coeli CM. Relacionamento de bases de dados em saúde. Cadernos de Saúde Coletiva 2006;14(2):195-196.

16. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE [acesso em 30 nov 2008]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br

17. Prefeitura do Município de Londrina, Autarquia Municipal de Saúde. Sistema de Informação da Atenção Básica. Indicadores/dados básicos para avaliação do nível de saúde entre unidades básicas: região leste. Londrina: Prefeitura; 2007.

18. Cohen J. A coefficient of agreement for nominal scales. Educational and Psychological Measurement 1960;20(1):37-46.

19. Landis JR, Koch GG. The measurement of observer agreement for categorical data. Biometrics 1977;33(1):159-177.

20. Coeli CM, Veras RP, Coutinho ESF. Metodologia de captura-recaptura: uma opção para a vigilância das doenças não transmissíveis na população idosa. Cadernos de Saúde Pública 2000;16(4):1071-1082.

21. Centers for Disease Control and Prevention. Epi Info, Version 3.3.2 - Database and statistics software for public health professionals. Atlanta: CDC; 2004.

22. Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burten AH, et al. Epi Info, version 6: a word-processing, database, and statistics program for public health on IBM-compatible microcomputers. Atlanta: CDC; 1995.

23. Branco MAF. Sistemas de informação em saúde no nível local. Cadernos de Saúde Pública 1996;12(2):267-270.

24. Carvalho AO, Eduardo MBPE. Sistemas de Informação em Saúde para Municípios. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 1998.

25. Laurenti R, Jorge MHPM, Gotlieb SLD. A confiabilidade dos dados de mortalidade e morbidade por doenças crônicas não transmissíveis. Ciência e Saúde Coletiva 2004;9(4):909-920.

26. Souza MFM. Dos dados a política: a importância da informação em saúde. Epidemiologia e Serviços de Saúde 2008;17(1):5-6.

27. Almeida MF, Barata RB, Montero CV, Silva ZP. Prevalência de doenças crônicas auto-referidas e utilização de serviços de saúde, PNPD/1998, Brasil. Ciência e Saúde Coletiva 2002;7(4):743-756.

28. Freitas FP, Pinto IC. Percepção da equipe de saúde da família sobre a utilização do sistema de informação da atenção básica - SIAB. Revista Latino-Americana de Enfermagem 2005;13(4):547-554.

29. Oliveira MTC. A subnotificação de casos de Aids em Belo Horizonte, Minas Gerais: uma aplicação da técnica de captura-recaptura [dissertação de mestrado]. Belo Horizonte (MG): Faculdade de Medicina da UFMG; 2000.

30. Gonçalves VF, Kerr LRFS, Mota RMS, Mota JMA. Estimation of underreporting of AIDS cases in a Brazilian Northeast metropolis. Revista Brasileira de Epidemiologia 2008;11(3):356-364.

31. Benito GAV, Licheski AP. Sistemas de informação apoiando a gestão do trabalho em saúde. Revista Brasileira de Enfermagem 2009;62(3):447-450.

 

 

Endereço para correspondência:
Rua Armando Tonelli, 189,
Jardim Vila Romana I,
Ibiporã-PR, Brasil.
CEP:86200-000
E-mail:eddieuel@yahoo.com.br

Recebido em 07/04/2009
Aprovado em 05/10/2009

 

 

*Este artigo baseou-se na dissertação de mestrado intitulada: Adesão ao tratamento anti-hipertensivo e fatores associados em área de abrangência de uma Unidade de Saúde da Família, Londrina, PR, do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Londrina (UEL).