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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.19 n.3 Brasília set. 2010

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742010000300002 

ARTIGO ORIGINAL

 

Denominadores para o cálculo de coberturas vacinais: um estudo das bases de dados para estimar a população menor de um ano de idade*

 

Denominators for vaccine coverage estimates: a database study to estimate the population less than one year of age

 

 

Antonia Maria da Silva TeixeiraI; Eduardo Luiz Andrade MotaII

ISecretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília-DF, Brasil
IIInstituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia, Salvador-BA, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: identificar estimativas populacionais que forneçam coberturas vacinais (CV) mais acuradas em menores de um ano de idade.
METODOLOGIA: este estudo ecológico-espacial avaliou CV em 2005 utilizando registros do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc) ou estimativas populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) como denominador. Compôs o numerador as terceiras doses da vacina tetravalente (DTP+Hib) extraídas do Sistema de Informação de Avaliação do Programa de Imunizações (SI-API). Compararam-se CV por estratos e porte populacional calculando-se os coeficientes de correlação de Pearson expressos em R2.
RESULTADOS: observaram-se CV atípicas, mais elevadas utilizando-se Sinasc e nos municípios de pequeno porte (<100 Nascidos Vivos (NV)/ano). Nestes, as estimativas populacionais parecem menos precisas. O R2 entre o número de NV e população estimada para municípios com <100, 100-999 e ≥ 1.000 NV/ano foram, respectivamente, 59,8%, 87,8% e >95%.
CONCLUSÃO: os resultados sugerem que o Sinasc, indica-se como melhor estimador das CV <1 ano. Este achado deve ser interpretado com cautela para municípios de pequeno porte. Incorporação de crítica no SI-API promoverá melhoria na qualidade dos dados.

Palavras-chave: cobertura vacinal; nascidos vivos; estimativa populacional; sistema de informação.


SUMMARY

OBJECTIVE: to identify population estimates to provide more accurate vaccine coverage (VC) in children under one year old.
METHODOLOGY: the spatial-ecological study evaluated VC in 2005 using either data of the Brazilian National Live Births Information System (Sinasc), or the estimate of the population <1 year of age of the Brazilian Institute for Geography and Statistics (IBGE). In the numerator we used the number of 3rd doses of DTP+HIB vaccine administered, provided by the National Immunization Program Information System (SI-API). VC estimates were compared according to population size and Pearson's Correlation Coefficient was estimated (R2).
RESULTS: outlier values were obtained when using any of the population estimates, especially Sinasc, as well as data related to small towns (<100 live births/year). For those towns, estimates seem less precise. Person’s Correlation Coefficient (R2) between the number of live births and IBGE population estimate for municipalities with <100, 100-999 and ≥ 1,000 live births were, respectively, 59.8%, 87.8% and >95%.
CONCLUSION: Sinasc seems to be the best estimate for VC, considering its increasing coverage. Caution is highly recommended when using Sinasc data for small towns VC estimates. The adoption of changes in the SI-API will improve the quality of immunization data.

Key words: vaccine coverage; live births; estimates population; information system.


 

 

Introdução

Ao avaliar um indicador deve-se sempre levar em consideração que este representa uma aproximação daquilo que se pretende medir. Assim, estimar as coberturas vacinais (CV) adequadamente depende de quão próximos da realidade estão os dados necessários ao cálculo deste indicador. Informações precisas e oportunas são importantes para subsidiar a vigilância epidemiológica no planejamento e avaliação das ações com enfoque no risco. Denominadores superestimados ou subestimados promovem distorção nos resultados levando a considerar como adequadas CV insuficientes para obter proteção coletiva e impedir a circulação do agente etiológico.1

A cobertura vacinal pelo método administrativo é obtida pela divisão entre o número de doses aplicadas de determinada vacina e a população alvo multiplicada por 100, que representa a proporção da população alvo vacinada.

No Brasil até 2002 o denominador desse cálculo era a população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A partir de 2003, fundamentando-se em uma análise comparativa da população projetada com base no censo e nos registros do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc) no período de 1997 a 2001, a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) adotou os registros desse sistema como fonte de dados para o denominador nas estimativas das CV em menores de um ano e de um ano de idade em 15 Unidades Federadas (UF) e seus respectivos municípios até 2005.

Nestas UF a captação dos registros de nascimentos pelo Sinasc em relação às estimativas do IBGE para menores de um ano foi ≥ 90%, índice adotado como critério de qualidade do Sinasc pela Rede Interagencial de Informação para Saúde (Ripsa).

Uma terceira alternativa para estimar esse indicador é utilizar no denominador as estimativas de nascimentos obtidas pela metodologia demográfica de Relação de Coortes (RCoortes), considerada mais apropriada para pequenas áreas, assim consideradas microrregiões ou municípios. Proposta por Duchesne em 1987, esta metodologia leva em conta a evolução das coortes no tempo utilizando dados por sexo e faixa etária entre dois censos. Tem como pressuposto que as áreas menores devem manter a mesma estrutura geopolítica entre dois censos. Os nascimentos são obtidos mediante a aplicação de um fator, o Índice Diferencial de Fecundidade (IDF), quociente da relação criança-mulher de cada uma das áreas menores (microrregiões ou municípios) em relação às áreas maiores (estados).2,3

A decisão de usar o Sinasc como denominador para o cálculo das CV deveu-se ao fato de se considerar as estimativas populacionais do IBGE superestimadas, pois baseiam-se em tendências demográficas obtidas de situações passadas e não incorporam na velocidade necessária, fenômenos importantes como a queda da fecundidade, especialmente em populações onde esta declina de modo mais acentuado. Entretanto, admite-se que o Sinasc, embora ampliando progressivamente a capacidade de captar nascimentos, ainda apresenta sub-registro quando comparado às estimativas de nascimentos do IBGE.4 Esses aspectos enviesam as estimativas de CV requerendo uma avaliação criteriosa das bases de dados utilizadas no denominador para o cálculo desse indicador.

Sob o aspecto de gestão, isto se tornou mais importante em função da descentralização das ações de Epidemiologia e Controle de Doenças quando as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde passaram a assumir responsabilidades compartilhadas com o MS, conforme Portaria Ministerial No 1.172/04, estabelecendo responsabilidades nas três esferas de gestão do SUS para a Vigilância em Saúde (VS).5

Com isto foram definidas diretrizes para a União, Estados e Municípios em relação às ações de VS e definiram-se metas pactuadas nos instrumentos de Programação das Ações Prioritárias de Vigilância em Saúde (PAVS), do Projeto Vigisus II e do Pacto pela Saúde, regulamentados pela Portaria Ministerial No 91/2007.6

Metas não cumpridas podem comprometer a transferência de recursos federais da VS para esferas de gestão estadual e municipal. Esse problema é também um dos determinantes da importância com que se reveste a adequada escolha do denominador para o cálculo das CV. Portanto, neste estudo compararam-se CV estimadas utilizando-se diferentes bases populacionais no denominador, na perspectiva de identificar qual a mais adequada para estimar esse indicador e contribuir com o Programa Nacional de Imunização (PNI) na avaliação e planejamento das ações de vacinação no país.

 

Metodologia

Trata-se de um estudo descritivo ecológico-espacial, comparando três bases populacionais como denominadores para estimar a CV em menores de um ano de idade. Foram utilizados dados do ano 2005 em relação à estimativa populacional do IBGE para menores de um ano, para a qual o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus) aplicou a distribuição por faixa etária e sexo com base no Censo 2000, e nesse estudo, denominada Datasus/IBGE; os registros de nascidos vivos captados pelo Sinasc e a estimativa de nascimentos RCoortes. Esta última população foi projetada por meio do software "peqAr" desenvolvido pelo IBGE fornecida ao Departamento de Análise de Situação de Saúde (Dasis)/SVS e disponibilizadas para este estudo.

Compôs o numerador o número de terceiras doses da vacina DTP+Hib registradas no SI-API. Esta vacina compõe o calendário de vacinação da criança e tem efeito protetor contra a difteria, tétano, coqueluche e infecções por hemófilo influenza tipo B. Agrega condições no esquema e via de administração – três doses injetáveis, recomendada simultaneamente com outras vacinas de esquema semelhante – que demanda maior esforço na organização dos serviços para completar o esquema vacinal e por isso, é considerada indicadora da situação das demais CV em menores de um ano.7 Além disso, é a vacina que compõe o elenco de indicadores nos pactos de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), razões da escolha como referência neste estudo.

A população de estudo compreendeu os habitantes (alvo) das 27 UF e dos 5.564 municípios. Destaque-se que as estimativas de nascimentos RCoortes foram disponibilizadas somente para 939 municípios pertencentes aos estados do Amazonas (AM), Rio Grande do Norte (RN), Santa Catarina (SC) e Bahia (BA). No contexto das UF, utilizaram-se taxas de fecundidade e taxas líquidas de migração com o propósito de observar a correlação destas com a cobertura do Sinasc. A primeira representa o número médio de filhos por mulher ao final do seu período reprodutivo e a segunda representa o quociente entre o saldo migratório em determinado período e a população do meio do período vezes mil. Ambas oriundas de estimativas do IBGE.8

Os dados do estudo são de natureza secundária, institucionais, de domínio público (exceto as estimativas RCoortes), disponibilizados no sítio eletrônico http//:www.datasus.gov.br do MS, sem identificação de indivíduos ou instituições, utilizados para fins desse estudo, dispensando desta forma submeter ao conselho de ética em pesquisa. O número de doses da vacina DTP+Hib e de NV compõem a base de dados do Sistema de Informação de Avaliação do Programa de Imunização (SI-API), disponibilizados pela Coordenação Geral do Programa Nacional de Imunizações (CGPNI) e Dasis da SVS/MS.

Para cada denominador utilizou-se no numerador o número de terceiras doses da vacina DTP+Hib e estimou-se a CV por município e UF comparando-se os resultados. Tomando-se como base os registros do Sinasc do ano estudado (2005), definiram-se quatro estratos da população compondo três categorias de porte populacional alvo: <100 e entre 100 a 999 NV - pequeno porte; 1.000 a 9.999 NV - médio porte; ≥ 10.000 NV - grande porte e entre três estratos de coberturas vacinais <90%; 90% e 110% e >110%. Para compor esses estratos de CV estabeleceu-se um intervalo de 10% acima e abaixo da meta de 100% da população alvo definida para a vacinação (<1 ano). Assumiu-se então, que este intervalo contemplaria variações decorrentes de erros de registros de doses, mobilidade populacional, vacinados em serviços privados não cadastrados no SI-API, migração, entre outras condições que alterariam o numerador e/ou o denominador, condições essas não detectadas pelo sistema (SI-API).

Considerou-se como CV adequadas aquelas que calculadas com as tres bases de dados em análise no denominador, compreendessem a intersecção no intervalo de 90% a 110%. As CV <90% e >110% constituíram-se no objeto principal da análise.

Analisou-se CV por estratos de coberturas e de porte populacional dos municípios, considerando a razão de nascidos vivos captados pelo Sinasc (cobertura do Sinasc) calculada para UF e municípios. Para a UF essa razão baseou-se na estimativa de nascimentos feita pelo IBGE adotada pela Ripsa como fonte válida de nascimentos (padrão ouro). Para os municípios, por falta de um padrão-ouro para comparação, utilizou-se a razão (%) entre o número de NV registrados no Sinasc e as estimativas de menores de um ano do Datasus/ IBGE. Da mesma forma, obteve-se a razão entre os nascidos vivos registrados no Sinasc e as estimativas de nascimentos RCoortes denominando-se Razão Sinasc/ Datasus/IBGE e Razão Sinasc/RCoortes nesta ordem. Adotou-se como ideal a razão ≥ 90% dos nascidos vivos captados em relação ao estimado. Procedeu-se a análise descritiva das variáveis utilizando-se os softwares Microsoft Excel® 2003, Tabwin 33.0 (Tabnet/Datasus/MS) e o pacote estatístico STATA versão 9 Intercooled Stata. Para cada porte populacional foram construídos gráficos de dispersão e calculado o Coeficiente de Correlação de Pearson expresso em R2 e equação da linha de tendência linear correspondente.

 

Resultados

No ano de 2005, nas 27 UF o Sinasc captou 3.035.096 nascidos vivos. O IBGE estimou 3.296.890 nascimentos e com base na população total do IBGE, o Datasus estimou 3.500.554 <1 ano de idade. A diferença entre as bases de dados do Datasus/IBGE em relação ao Sinasc foi de 465.458 habitantes a mais para a primeira (Tabela 1).

 

 

Nos estados da BA, RN, SC e AM, foram estimados pela metodologia RCoortes 527.385 nascimentos e 525.358 <1 ano pelo Datasus/IBGE. Nestas UF foram captados 441.467 NV pelo Sinasc correspondendo respectivamente a 83,7% e 84,0% de cada uma das projeções.

A razão Sinasc/IBGE no país foi 92,1%, não homogênea. Variou nas UF entre 76,0% (AL) e 105,9% (AC). Foi superior a 90% em 15 UF (55,5%) e em três UF – RR; AL e BA foi < 80% (Tabela 1). Neste mesmo ano, neste grupo de idade, foram registradas 3.108.250 terceiras doses da vacina DTP + Hib (Tabela 2).

 

 

A Tabela 2 mostra que a CV média nacional da vacina DTP+Hib foi de 102,4% estimada utilizando-se o Sinasc e 88,8% com estimativas populacionais do Datasus/IBGE, representando uma diferença de 13,6% nos resultados. Estimando-a com os registros do Sinasc foram observados valores extremos no Distrito Federal (DF) (86,4%) e no Pará (PA) (115,1%). Em 17 (62,9%) UF essas coberturas vacinais foram superiores a 100% com mediana de 102,0%. Ressalte-se que no AC e no DF ficaram abaixo de 90%. Estimadas com as projeções do Datasus/IBGE ficariam abaixo de 90% em 14 (51,0%) UF com valores extremos de 78,0% no AM a 99,9% no Mato Grosso (MT) e mediana de 89,6%. Calculadas com as estimativas RCoortes nas quatro UF a variação de CV seria de 83,1% na BA a 94,8% em SC e mediana de 87,8%.

Houve diferenças percentuais importantes nas CV das UF comparando-se os resultados obtidos com cada base de dados no denominador. Tratando-se das bases de dados do Datasus/IBGE e Sinasc essas diferenças variaram desde 2,0% no DF a 19,2% no Rio Grande do Sul (RS), ressaltando-se que foi superior a 10% em 19 (70,3%) UF. Ficariam mais baixas se calculadas com as estimativas do Datasus/IBGE. Em relação às projeções RCoortes e Sinasc observou-se uma diferença maior na BA (24,4%), seguindo-se pelo RN (11,8%), SC (7,0%) e AM (5,4%). Nestas duas últimas UF as CV estimadas com RCoortes ficariam mais elevadas quando comparadas com as estimativas do Datasus/ IBGE. Seriam equivalentes no RN, na ordem 85,2% e 85,3% e mais baixas na BA. Nesta UF pelas projeções do Datasus/IBGE em relação à RCoortes a diferença de CV seria de 6,4% (Tabela 2).

Os resultados obtidos aplicando-se cada denominador no cálculo desse indicador (CV) para os municípios refletem a sua heterogeneidade. Observaram-se CV díspares <50% e >110% com máximos de 567,6%; 374,0% e 220,7% e mínimos de 39,33%, 45,5% e 26,0% na sequência com as bases Sinasc, Datasus/ IBGE e RCoortes.

Analisando-se a distribuição do total de municípios nos estratos de CV com as diferentes bases populacionais e porte populacional, observaram-se, divergências importantes de acordo com a base de dados utilizada no denominador. Estimando-as com o Sinasc, no estrato de CV >110% seriam enquadrados 46,7% (n=2.596) dos municípios. Aplicando-se a base populacional do Datasus/IBGE declinaria para 1.075 municípios (19,3%) do total e para 21,6% (n=203) dos 939 municípios com estimativas de nascimentos RCoortes disponíveis.

Observando-se essas CV por porte populacional verificou-se que valores >110% foram mais frequentes nos municípios de pequeno porte populacional (<100NV e ≥ 100 NV a <1.000NV) utilizando-se as estimativas de nascimentos RCoortes e Sinasc no denominador, representariam respectivamente 58,5% e 56,8% dos municípios (Tabela 3).

 

 

Ao se empregar a base de dados do Datasus/IBGE haveria predominância de municípios distribuidos no estrato de CV <90% (n=2.421; 43,5%) e em maior proporção (48,6% e 53,8%) nas categorias de médio e grande porte populacional. E de modo semelhante, se fossem estimadas com a base RCoortes seriam enquadrados nesse estrato de CV (<90%) 428 municípios (45,6%) e destes 365 (57,5%) de pequeno porte populacional antes referidos 16 (26,7%) e dos municípios.

Para os 5.563 municípios, somente 26 (0,46%) são considerados pelos critérios adotados nesse estudo como de grande porte populacional ( ≥ 10.000 NV). Quatro (15,3%) desses municípios ficariam com CV<90% utilizando-se no denominador os registros do Sinasc, elevando-se para quatorze (53,8%) utilizando-se as estimativas populacionais do IBGE/ Datasus. Se estimadas com a base RCoortes somente três dos 939 municípios se enquadrariam neste porte populacional e apenas um ficaria com CV <90%. Isto mostra a variabilidade dos resultados das CV de acordo com a escolha do denominador, ressaltando-se que haveria deslocamento de municípios para outros estratos de CV na medida em que se utilizasse um ou outro denominador.

Selecionando-se os municípios com coberturas vacinais adequadas, assim definidas aquelas entre ( ≥ 90% ≤ 110%) para o conjunto de denominadores estudados foram enquadrados nesta interseção apenas 841 (15%) municípios aplicando-se Sinasc e IBGE/ Datasus. Estimadas com a base do Datasus/IBGE neste mesmo intervalo de CV e com razão Sinasc inadequada <90%), estariam 20% (n=1.100) dos municípios. Naqueles 939 municípios para os quais foi disponibilizada a estimativa de nascimentos RCoortes só houve intersecção de coberturas vacinais nesse intervalo em 66 (7%) municípios.

Destacamos o percentual de municípios com razão Sinasc/Datasus/IBGE abaixo 90% nos estados do RS (74,2%) e SC (73,7%), considerando que no contexto destas UF a captação de NV pelo Sinasc vem ao longo dos anos atingindo valores próximos dos 100% do estimado pelo IBGE. Nos 2.040 municípios onde a razão Sinasc/IBGE foi ≥ 90%, em 314 (15,4%) as CV foram <90% e em 759 (37,2%) >110% (Tabela 4).

 

 

Considerando-se somente as quatro UF com estimativas de nascimentos RCoortes observou-se que estas coberturas ficariam muito próximas quando comparadas com as estimativas do Datasus/IBGE. Utilizando-se as estimativas do Datasus/IBGE a CV média ficaria em 86,2% e com a base RCoortes ficaria em 85,9% e seria 102,6% quando estimada com o Sinasc. A diferença em relação às estimativas do Datasus/IBGE ficaria em 12%.

Para cada uma das quatro UF constatou-se que as CV são mais elevadas utilizando-se os registros do Sinasc. Em relação às estimativas RCoortes foi superior em cerca de 7% em SC e 5% no AM. Foi para a BA onde se verificou a maior diferença, o equivalente a 14%. Nesta UF, o Sinasc teve baixa captação de nascimentos (77,3%) e isto se refletiu nas CV estimadas com essa base de dados. Ficariam acima de 110% em 216 (51,79%) dos 417 municípios <90% em 41 municípios. Estimadas com a base RCoortes ficariam >110% em 19 municípios e <90% em 263 municípios, o equivalente a 63,06% dos municípios daquela UF. Ressalte-se que o total de nascimentos estimados RCoortes na Bahia foi superior em 7,7% da população de menores de um ano de idade estimada pelo Datasus/IBGE.

O Sinasc, base de referência para definição do porte populacional de municípios neste estudo, reflete a predominância de municípios de pequeno porte populacional no país. O maior percentual de municípios (n=3.203, 57,6%) registrou entre 100 e 999 nascimentos. Estas bases de dados se aproximaram no total de crianças nas categorias de municípios entre 1.000 e 9.999 ≥ ≥ 10.000 crianças, medidas através do Coeficiente de Correlação de Pearson (R2)=99,5%. Constatou-se diferença importante em municípios com <100 NV (R2=59,8%) (Figura 1).

 

 

Para o total dos 5.564 municípios a correlação de Person encontrada entre as bases de dados do Sinasc e Datasus/IBGE foi elevado (R2= 99,5%), bem como para o total dos 939 municípios com estimativas RCoortes. Nestes municípios, calculado em relação às bases do Sinasc e Datasus/IBGE e Sinasc e RCoortes o R2 foi respectivamente 99,2% e 96,7%.

Entretanto, esta medida não apresentou o mesmo comportamento quando calculada considerando-se o porte populacional. Naqueles municípios com <100 NV e 100 a 999 NV os cálculos de R2 foram da ordem 59,8% e 87,7% em relação ao total de municípios (5.564). Para os mesmos portes populacionais nos municípios da BA, AM, RN e SC com as estimativas Rcoortes, os R2 foram respectivamente 47,4 e 85,3%. É importante ressaltar que nos municípios de porte populacional ≥ 1.000 NV estes coeficientes foram superiores a 95% utilizando-se qualquer das bases de dados, mostrando que as estimativas populacionais têm correlação mais forte quanto maior o porte populacional dos muncipios (Figura 1).

Destaque-se que calculados os Coeficientes de Correlação de Pearson para UF levando-se em conta as taxas líquidas de migração e as taxas de fecundidades em relação aos registros do Sinasc, encontrou-se uma baixa correlação R2=2,0% e R2=24,8% respectivamente, demonstrando ausência de correlação entre esses fenômenos demográficos no contexto das UF.

A razão de nascimentos Sinasc em relação às estimativas populacionais Datasus/IBGE ficou abaixo de <90% em 3.524 municípios (63,3%), ressaltando-se que foi <80% em 2.181 (39,2%) municípios detalhados por UF mais adiante. Mostrou-se heterogênea e com valores extremos aberrantes com variações de 17,1 a 624,4%. Em 1.026 (18,4%) municípios distribuídos nas 26 UF, o Sinasc captou mais nascimentos do que foi estimado para <1 ano pelo Datasus/IBGE. Estes resultados, conforme foi visto, se refletem nas coberturas vacinais calculadas com as diferentes bases populacionais.

Tomando-se como exemplo os 3.524 municípios antes referidos verificou-se que as CV estimadas com a base de dados Datasus/ IBGE seriam <90% em 2.108 (59,8%) municípios e somente em 316 (8,96%) municípios ficariam >110%. A situação se inverteria se essas CV fossem estimadas com o Sinasc. Seriam <90% em 280 municípios (7,90%) e >110% em 1.845 (52,35%) municípios. Destacar-se-iam com baixas CV em seus municípios as UF do Amazonas com 62,9% (n=39 municípios); RS (60,3%, n= 299 municípios), SC (52,6% n=154 municípios), SP (43,5%, n=280 municípios) e MG (43,4% n=371 municípios) quando estimadas com dados do Datasus/IBGE. Ressalte-se que nestas UF, exceto em MG, o Sinasc teve captação de nascimentos ≥ 90% no ano de 2005, exceto MG que captou 85% do estimado (Tabela 4).

Nas UF do AM, RN, SC e BA a razão Sinasc/RCoortes foi igual a 83,6% para o conjunto dos 939 municípios, sendo ideal (≥ 90%) em somente 30% (n=281) destes. Em relação ao Datasus/IBGE foi igual a 84,0% e inadequada (<90%) em 637 (67,8%). Registre-se que no conjunto dos 939 municípios foram estimadas pouco mais de 525 mil crianças por cada metodologia de estimativas - Datasus/IBGE e de nascimentos RCoortes – o segundo representou 100,4% do primeiro enquanto o Sinasc captou somente 441.467 nascimentos.

No AM, o Sinasc registrou 95,7% dos NV estimados pelo IBGE e adotados como fonte válida de nascimentos pela Ripsa. Isso equivale a 94,1% dos nascimentos estimados pela metodologia RCoortes e 84,6% dos menores de um ano de idade estimados pelo Datasus/ IBGE. O Sinasc captou menos de 90% de NV em 45 (72,5%) municípios quando comparado com as projeções de nascimentos RCoortes e em 48 municípios (77,4%) se comparado pelas estimativas de menores de um ano de idade do Datasus/IBGE.

Na BA o Sinasc captou somente 77,3% dos nascimentos em relação às projeções RCoortes; 78,3% em relação as estimativas de nascimentos do IBGE e 83,2% em relação às estimativas de menores de um ano de idade Datasus/IBGE. Cerca de 82,0% dos municípios (341) captaram menos de 90% dos nascimentos estimados pela metodologia RCoortes ficando abaixo de 80% em 260 municípios (62,0%). Calculando-se essa razão com as estimativas de menores de um ano de idade do Datasus/IBGE verificou-se que foi <90% em 279 municípios (66,9%).

No Estado de SC encontrou-se a razão Sinasc/RCoortes e Sinasc/IBGE de 93,1% e Sinasc/IBGE de 97,4% demonstrando um bom desempenho na captação dos nascimentos. Já em relação às estimativas do Datasus/ IBGE a razão foi de 84,6%. No RN ficaram abaixo de 90%, destacando-se a consistência nos resultados. Na mesma ordem, obtiveram-se as razões de nascimentos de 87,9% (Sinasc/Rcoortes), 88% (Sinasc/IBGE) e 87,8% (Sinasc/Datasus/IBGE).

 

Discussão

Na medida em que avançam os programas de eliminação e controle de doenças imunopreveníveis e novas vacinas e grupos populacionais são acrescidos ao PNI, aumenta a necessidade de se dispor de indicadores de CV precisos para subsidiar o planejamento das ações de imunizações. Neste estudo foram comparadas CV utilizando três bases de dados no denominador observando-se variações importantes nessas estimativas. Essas variações foram mais acentuadas em municípios pequenos. Admite-se que nestes, as estimativas populacionais, em especial para projeção de menores de um ano de idade são menos precisas, e, possivelmente a capacidade de captação dos registros de nascimentos é menor em função das limitações do acesso aos serviços de saúde.

Uma parcela importante de municípios apresentou resultados discrepantes de CV quando comparadas com os diferentes denominadores, o que reflete que este não é um problema exclusivo da escolha adequada do denominador. Observou-se que estimadas com o Sinasc as CV foram mais elevadas e onde este sistema de informação teve baixa cobertura, as taxas de fecundidade foram mais altas e as taxas de migração negativas. Estimadas com a base do Datasus/ IBGE mostraram-se mais baixas comparando-se com as outras bases. As taxas líquidas de migração foram negativas em 12 UF, sendo oito da região Nordeste. Entretanto os Coeficientes de Correlação de Pearson em relação a essas variáveis mostraram-se fracamente associados (<3,0%). Possivelmente os resultados dessas CV devem-se às condições de acesso ao serviço e qualidade da informação.

Considera-se que o número de nascimentos registrado no Sinasc, onde este sistema tem uma boa captação dos nascimentos (≥ 90%), é um bom estimador da população de menores de um ano de idade,4 sendo um sistema de informação de grande utilidade na construção de indicadores de saúde infantil. Considera-se ainda que desde a sua implantação no início da década de 1990, o Sinasc teve uma boa adesão por parte dos profissionais de saúde, percebido pela sensibilidade em captar nascimentos quando comparado ao sistema dos registros civis do IBGE.9

O registro de nascidos vivos nos últimos anos nesse sistema (Sinasc) vem declinando progressivamente. Dados disponíveis no sitio eletrônico do Datasus mostram uma queda de aproximadamente 200 mil nascimentos nesse período, declinando de 3,2 milhões NV (2000) para cerca de 3,0 milhões NV (2005). Se comparado com as estimativas populacionais pode sugerir queda nas coberturas do Sinasc.

Estudo recente que avaliou coberturas desse sistema (captação dos nascidos vivos em relação às estimativas) em dois municípios do Pernambuco no nordeste brasileiro, os autores chamam a atenção para a necessidade de se buscar outros parâmetros de avaliação dessa cobertura, e para a possibilidade de avaliação incorreta dessa cobertura tomando como base as estimativas demográficas.10

O Registro Civil, embora com descenso no sub-registro nos últimos anos, deixou de captar 16,4% dos nascimentos em 2004. As UF do AM, PA e Maranhão (MA) apresentaram os maiores percentuais de sub-registro, enquanto o DF, São Paulo (SP) e Mato Grosso do Sul apresentaram os menores percentuais. Este sistema é alimentado pelos registros produzidos nos cartórios, documento legal para o exercício da cidadania.11 Tem como objetivo principal a contagem do número de nascimentos obtido por informação verbal, sem obrigatoriedade de apresentação de nenhum documento comprobatório para que este se efetue.

Uma das diferenças do registro civil em relação ao Sinasc é que este último se propõe a fornecer dados para a vigilância epidemiológica sobre as condições de saúde da mãe e da criança permitindo avaliação detalhada e espacialmente desagregada no nível municipal.12

No ano de 2005 a base de dados do Sinasc, de um modo geral, foi inferior à base das estimativas populacionais para menores de um ano de idade do Datasus/IBGE e de nascimentos RCoortes. Isto justifica as CV mais aproximadas utilizando essas estimativas populacionais no denominador e mais elevadas quando calculadas com o Sinasc.

Destaque-se que em 1.026 municípios o número de NV captados pelo Sinasc foi maior do que as estimativas apontaram para esse grupo populacional. Com efeito, não se esperaria igualdade com as projeções populacionais, tão pouco grandes discrepâncias. O Sinasc é uma base de dados constituída por eventos reais. Nos últimos anos avançou na capacidade de captar os nascimentos, é considerado um sistema mais sensível em detectar mais precocemente as mudanças ocorridas em alguns fenômenos demográficos como a queda da natalidade e fecundidade.4,9

Estudos levados acerca desse tema (coberturas vacinais versus denominadores) ainda que escassos demonstram as discrepâncias entre essas bases populacionais.

Uma análise comparativa entre CV estimadas com dados do IBGE e Sinasc feita para o município de Alegrete- RS, mostrou uma diferença superior a 20% nas coberturas para cada vacina do esquema da criança, sendo mais elevadas quando estimadas com o Sinasc. Os autores atribuem esse resultado a uma acentuada queda da natalidade naquele município. Justificam que o rigor na avaliação e a importância dada ao sistema pelas secretarias de saúde do município e do estado, a elevada captação dos nascimentos no estado (próximo de 100% do estimado pelo IBGE), reforçado pelo fato de ser um dado real e não uma estimativa, levou-os a considerar o Sinasc como denominador mais fidedigno para estimar as CV do município.13

Ressalte-se que o Sinasc registra os NV do ano calendário, excluindo da sua base crianças que nasceram no ano anterior e que ainda são alvos da vacinação porque são menores de um ano de idade. A cobertura do sistema é influenciada pelo nível de organização dos serviços e não incorpora um fenômeno demográfico importante para o cálculo da cobertura vacinal como o da mortalidade infantil, fatos significativos especialmente nos pequenos municípios.

As estimativas populacionais do IBGE e aquelas projetadas pelo Datasus com dados preliminares do IBGE, são feitas tomando como ponto de referência a população do dia 1 de julho.14 São elaboradas com metodologias baseadas em tendências demográficas passadas e acredita-se que a precisão diminua quanto mais se distancia do ano censitário e que isto resulta em sobrenumeração nas estimativas, particularmente dos menores de um ano de idade, enquanto o Sinasc é um sistema mais sensível para detectar as transformações demográficas em curso na população brasileira, como a queda da natalidade e fecundidade.4,9

A projeção de nascimentos RCoortes segue a lógica demográfica de projeções e resulta de metodologia que se propõe mais adequada para pequenas áreas (microrregiões ou municípios). A diferença básica em relação às estimativas do Datasus/IBGE é que aquela trata de estimativas de nascimentos e esta de estimativas de menores de um ano de idade. Provavelmente, esta é uma razão para a maior aproximação dos nascimentos projetados em relação ao total de menores de um ano de idade estimado pelo Datasus/IBGE.

Outro fato que deve ser considerado é que as taxas de crescimento anual se comportam diferentes nos estados e municípios. Para o país, no período de 1991 a 2000, foi igual a 1,6%, enquanto nos estados do Amapá (AP), Roraima (RR) e Mato Grosso (MT) foram superiores a 3%. Houve perda populacional em municípios da região sul, no extremo norte do RS, oeste de SC e parte central do Paraná (PR) e nos estados de Minas Gerais (MG), Bahia (BA), Paraíba (PB) e Piauí (PI).15

No Rio Grande do Norte, levando-se em conta os dados do Censo do ano 2000, constatou-se uma subenumeração de nascimentos em pelo menos 54,2% (90) dos municípios dos 166 municípios existentes à época. Naqueles foram captados menos de 80% dos nascimentos, enquanto para outros a cobertura chegou a 112%.16 Isto ocorreu possivelmente pela estrutura dos serviços de saúde para a atenção ao parto.

Em MG, análise equivalente para o mesmo ano, revelou uma cobertura do Sinasc no estado de 88%.17 Este último trabalho não faz referência às coberturas municipais, mas ressalta que o sistema de um modo geral oferece indicadores valiosos sobre a saúde materna e infantil, e do ponto de vista da cobertura estaria próximo do ideal (≥ 90%) o que possibilitaria a construção de indicadores fidedignos para este grupo. No que tange ao desempenho em registrar os nascimentos estimados (cobertura), pode-se considerar que tem uma boa cobertura no contexto das UF, levando-se em conta o parâmetro ≥ 90%, pois somente três UF no ano estudado captaram menos de 80% dos nascimentos estimados pelo IBGE - Roraima, Alagoas e Bahia - no entanto, ainda carece de melhorias.

Sabe-se que existem diferenciais importantes na cobertura dos sistemas de informação em saúde no país, em parte atribuídos à qualidade e capacidade dos serviços de saúde em captar esses registros. Sobre o Sinasc, em que pese ainda ocorrer sub-registro, é um sistema que amplia progressivamente o seu desempenho em captar nascimentos. A maioria dos estados das regiões sul e sudeste tem boa cobertura segundo o critério de qualidade recomendado pela Ripsa para a fonte válida do número de nascimentos.

Particularmente na região sul, identificou-se uma importante queda no número de nascimentos notificados em relação ao período de 1995 a 2001, atingindo um decréscimo de 12%.4 Esse fenômeno possivelmente se intensificou nos últimos anos e se reflete nas baixas coberturas vacinais observadas em parte dos municípios dessa região, em especial no Rio Grande do Sul. Considerando que a base de dados do Sinasc tem uma defasagem média de dois anos, pode não refletir fielmente a queda da fecundidade naquele estado.

É importante registrar que o crescimento relativo da população brasileira demonstra desacelerações desde a década de 1970 do século passado tendo como uma das causas a queda da natalidade, que declinou de 23,4 em 1991 para 20,6 por mil habitantes em 2004, com diferenciais nas regiões geográficas.18

Na região Nordeste, encontrou-se uma cobertura do Sinasc de 79,1% em relação aos nascimentos do Censo 2000. O Rio Grande do Norte, Pernambuco e Sergipe formaram o grupo de UF com maior nível de cobertura, próximo de 90%, e valores abaixo da média regional foram encontrados no MA, 60%, AL 72%, e BA 78,4%.19 Comparadas com a cobertura do ano de 2005, verificou-se crescimento no MA (90,6%) e AL (76,0%), na BA notou-se uma discreta queda (77,5%).

A avaliação que a SVS/MS faz acerca do desempenho na captação de nascimentos pelo Sistema de Informação Sinasc (cobertura do Sinasc) no país é que este é crescente. A referida avaliação baseia-se em estimativas demográficas com metodologias diferentes, sendo uma de natureza longitudinal, com base em tendências passadas da fecundidade, gerando estimativas de nascimentos a partir de 1991 até 2030, e outra de natureza transversal, verificando as coortes de nascimentos em cada momento. A média de crescimento nacional em relação ao período de 2000 a 2004 foi de 87,4% pela estimativa longitudinal e 90,5% pela estimativa transversal.20 Para o ano de 2005 avalia-se que o Sinasc captou 92% dos nascimentos estimados pelo IBGE.21

No que se refere às CV, a literatura registra uma ampla variedade de estudos, grande parte comparando dados administrativos com inquéritos (coberturas reais). Sobre denominadores adequados para o cálculo, os estudos são escassos, em que pese a importância dessa problemática no país.

A propósito, estudo realizado no RS sobre metodologia de avaliação de CV diferente da clássica adotada pelo PNI, os autores, ao abordarem sobre o uso do Sinasc, apontam o fato de a base ser formada pelos nascidos vivos que sobrevivem aos primeiros meses de vida. Destacam o fato dos esquemas de vacinação para a maioria das vacinas se iniciarem no segundo mês de vida e crianças nascidas nos últimos meses do ano serão vacinadas no ano seguinte, e nos primeiros meses, se chegarem aos serviços na época indicada para vacinar. Assim, os menores de três meses de idade que se vacinam no início do ano calendário pertencem, em sua maioria, à coorte de recém-nascidos do ano anterior. Com base neste fato, os autores alertam para a necessidade de precisão sobre a coorte de nascidos vivos e seu seguimento.22

Nesse mesmo estado (RS), uma análise comparativa dos dados administrativos e de um inquérito de cobertura vacinal feita para uma unidade de saúde da periferia da zona norte no município de Porto Alegre mostrou diferenças de CV nas duas fontes. Essas diferenças foram atribuídas em parte, ao denominador que se baseava em estimativas irreais e, em outra parte, pela mobilidade da população no próprio município. Constataram que 12% das crianças iniciaram o esquema vacinal em um serviço e concluíram em outros e 16% foram vacinadas em outros serviços, o que para os autores estes percentuais podem representar a migração.23

Além de erros próprios das estimativas populacionais subestimando ou superestimando a população alvo que compõe o denominador, outros são acrescidos e comprometem o conhecimento da real cobertura vacinal e que estão relacionados ao numerador. Ressalte-se a forma como ele é constituído: número de doses aplicadas e não criança vacinada, registro por local de ocorrência da vacinação e não da procedência do vacinado. A qualidade deste componente se constitui de fundamental importância na composição desse indicador.

Dentre as limitações do SI-API para o cálculo das CV citam-se, entre outros: a contagem dos frascos utilizados como total de doses aplicadas, incorreção nos registros de doses, desconhecimento da parcela da população que utiliza serviços privados não cadastrados no SI-API.24 Somam-se a estes problemas, o desconhecimento sobre a magnitude da mobilidade da população e migração entre municípios, estados, país e até entre fronteiras internacionais, fornecer relatório que permita conhecer a evasão do usuário do Programa de Imunizações mas não o identifica, impedindo a busca ativa do mesmo, contar doses utilizadas, não necessariamente pessoas vacinadas, fatos que levam a inconsistências nos dados registrados que são de difícil detecção no sistema, no modo como atualmente captam os dados sobre vacinação no país. Tudo isso influencia nos resultados das CV tornando-as pouco confiáveis.

O SI-API é um sistema com abrangência nacional, descentralizado para 100% das salas de vacinas e informatizado em cerca de 5.300 municípios. Integra o elenco de sistemas de informações com fluxo e prazo definidos pela Portaria MS No 1.172/04 revogada recentemente pela Portaria 3.252/2009. É alimentado compulsoriamente tendo como instrumento de coleta de dados o Boletim Diário de Doses Aplicadas. Este é um instrumento sujeito a uma série de erros que levam a superestimar ou subestimar as coberturas vacinais pela forma como o registro é feito: de modo manual em um formulário contendo campos numerados. No caso específico da vacina DTP+Hib são 140 campos que, uma vez marcados, seja com um X ou um traço, ou equivalente, cada campo corresponde a uma dose do imunobiológico aplicada na faixa etária e dose correspondente do esquema (primeira; segunda ou terceira dose).

Por outro lado, o fato da informação ser amplamente descentralizada permite facilmente identificar a tendência dos registros; realizar estudos para subsidiar uma análise qualitativa e o direcionamento das ações; comparar a população alvo com populações de outros sistemas de informações, como por exemplo o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) em áreas cobertas com as estratégias do Programa Agentes Comunitários e de Saúde da Família e, indiretamente, avaliar o desempenho na captação do Sinasc, especialmente no município.

A queda de fecundidade amplamente divulgada, observada com mais intensidade nos estados do sul e sudeste do país, captada no Sinasc mais precocemente, comparando-se às projeções de nascimentos e estimativas de menores de um ano de idade pelo IBGE, além de baixa captação de NV (<90%) no Sinasc em relação às estimativas populacionais em parcela significativa dos municípios, indicam a necessidade de se refletir sobre quais estimativas de CV estão sendo disponibilizadas. E ainda, quanto essas estimativas estão aproximadas da realidade.

Além disso, aponta os desafios a superar para o alcance da homogeneidade de CV, sobretudo considerando os pequenos municípios. No entanto, as incertezas sobre a real cobertura e qualidade do Sinasc, mais uma vez reforçando o papel que tem os municípios com pequenas populações no contexto geral, aparentemente não conferem inferioridade ao sistema quando comparadas às estimativas populacionais, uma vez que nestes as estimativas parecem menos precisas.

A investigação realizada indicou que, para municípios de grande porte populacional, a partir de 1.000 NV/ano, qualquer das bases estudadas seria igualmente adequada para estimar as CV neste grupo de idade. Nestes municípios está concentrada a proporção de 62,5% dos nascidos vivos em 2005. As estimativas de nascimentos RCoortes são equivalentes, ou próximas às estimativas de menores de um ano de idade IBGE no contexto das UF. Entretanto, não são igualmente comparáveis quando se utiliza as estimativas de menores de um ano de idade feitas pelo Datasus a partir da população geral estimada IBGE para os municípios. É possível que as diferenças encontradas nessas estimativas reflitam uma margem de erro (não mensurada neste estudo) ao estimar a razão do Sinasc (cobertura) nos municípios tendo como referência as estimativas populacionais do Datasus/IBGE e estimativas de nascimentos RCoortes.

A implantação do Sinasc no país ampliou as oportunidades de pesquisa com base populacional sobre nascimentos vivos, no entanto, deve-se ter como um ponto prioritário buscar cobertura e fidedignidade das informações como meio de fornecer indicadores confiáveis quando se utilizam estes dados no denominador. Os estudos realizados acerca da cobertura do Sinasc apontam para a ocorrência de sub-registro desse sistema de informação, mas reconhecem o seu aperfeiçoamento e importância para vigilância epidemiológica na construção de indicadores de saúde infantil.

É salutar, com base nessas observações e recomendações de outros estudos que, para melhor gestão do SI-API, incorporem-se mudanças na forma de coleta da informação sobre doses aplicadas e da pessoa vacinada: um sistema com registro nominal e por procedência;25,26 desencadear uma avaliação qualitativa da situação integrada com a Atenção Básica, iniciando-se pelos municípios menos populosos e cobertos pela estratégia de Saúde da Família; buscar maior integração das áreas de informação e imunizações em todas as esferas de gestão do SUS, para promover o monitoramento dos dados de coberturas vacinais e do Sinasc nos municípios, particularmente naqueles onde os resultados são atípicos. Coberturas vacinais abaixo de 50% e acima de 110% devem se constituir "eventos sentinelas" para avaliar erro de registro de doses aplicadas, subcobertura ou sobrenumeração de nascimentos nos estados e municípios.

Enquanto não for modificada a forma de registro da vacinação no SI-API, devem ser incorporadas críticas sobre a qualidade dos dados e, sobretudo em relação ao numerador, que permitam chegar ao registro das doses efetivamente aplicadas, mas que estabeleçam mecanismos de controle, especialmente um "alerta" que permita uma avaliação prévia, pelo menos no momento da digitação dos dados, em relação aos valores atípicos já citados.

Conclui-se que o Sinasc representa, com base no exposto, a melhor fonte disponível para estimar as coberturas vacinais nos menores de um ano, e certamente, nos menores de cinco anos de idade. Ressalte-se a necessidade de monitoramento da sua cobertura para a melhoria na construção desse e de outros indicadores que o utilizem como denominador no cálculo. Recomenda-se cautela nos municípios com população alvo <1.000 crianças e mais especificamente <100 crianças, onde a vulnerabilidade na captação dos nascimentos pareceu mais acentuada.

As estimativas de nascimentos RCoortes podem ser utilizadas nesses casos como população alternativa para estimar as coberturas vacinais nessa faixa etária, mas, sobretudo devem ser base de monitoramento do desempenho do Sinasc em captar os nascimentos no âmbito dos municípios para sua validação (ou não) como projeção de nascimentos. Por serem baseadas em metodologias aplicáveis neste contexto geográfico (município) devem ser dotadas de maior precisão quando comparadas às estimativas populacionais do Datasus/IBGE.

Além do mais, as projeções RCoortes são feitas tomando como base dois censos quinquenais adaptando-se para tempos anuais. Isto certamente reduz o erro nas estimativas pelo encurtamento no tempo, uma vez que utiliza indicadores demográficos mais atualizados e adequados à dinâmica populacional, como por exemplo, a fecundidade.

A Figura 2 apresenta o algoritmo de passos e decisões metodológicas conduzidos e que aportam as conclusões deste estudo.

 

 

Finalmente, deve-se considerar que a dinâmica dos serviços de saúde, por conseguinte a cobertura e qualidade das informações dos distintos sistemas de informações em saúde, estão intrinsecamente ligadas à gestão, o que requer monitoramento e avaliação contínua dessas informações na perspectiva de fornecer indicadores de saúde mais confiáveis.

 

Agradecimentos

Agradecimentos à Secretaria de Vigilância em Saúde pela oportunidade e ao apoio dados pelos colegas da CGPNI, por João Gregório Junior e Expedito Luna.

 

Referências

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26. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Homogeneidade de coberturas vacinais. In: Anais da 2a Expoepi: Mostra de Experiências Bemsucedidas em Epidemiologia, Prevenção e Controle de Doenças; 2003; Brasília, Brasil. Brasília; 2003.

 

 

Endereço para correspondência:
Ministério da Saúde
Secretária de Vigilância em Saúde,
Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações,
Setor Comercial, Quadra 4, Bloco A,
Edifício Principal, 4 andar,
Brasília-DF, Brasil.
CEP:70304-000
E-mail:antonia.teixeira@saude.go.br

Recebido em 29/09/2009
Aprovado em 20/04/2010

 

 

*Este estudo é parte integrante da dissertação de mestrado profissionalizante realizado pelo ISC/UFBA com apoio da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS.