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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.19 n.4 Brasília dez. 2010

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742010000400007 

ARTIGO ORIGINAL

 

Avaliação de indicadores hospitalares antes e após a implantação da gestão plena do sistema municipal em município do sul do Brasil

 

Evaluation of hospitalization indicators, before and after the implementation of integral management in the health system of a municipality in the Southern Region of Brazil

 

 

Leonardo Di ColliI; Luiz Cordoni JuniorII; Tiemi MatsuoII

ISecretaria de Estado da Saúde do Paraná, Curitiba-PR, Brasil
IIDepartamento de Saúde Coletiva, Universidade Estadual de Londrina, Londrina-PR, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: analisar indicadores hospitalares nos períodos antes e após a implantação da Gestão Plena do Sistema Municipal em Apucarana-PR.
METODOLOGIA: examinaram-se os indicadores: taxa de internação, média de permanência hospitalar, proporção de evasão e invasão de internações e proporção de internação por clínica. Para analisar as alterações ocorridas nos indicadores no período utilizou-se a distribuição de Poisson e realizada análise de regressão linear na série histórica.
RESULTADOS: observou-se redução das internações hospitalares da população residente ocorridas no próprio município de 7,72% para 7,54%, da evasão de 1,15% para 1% e aumento da média de permanência hospitalar, 3,90 para 3,97 dias. A invasão aumentou de 26,26% para 26,50%. As internações por tipo de clínica demonstraram tendência decrescente para a clínica obstétrica e crescente para a cirúrgica, consideradas estatisticamente significantes em função do tempo. As clínicas médica e pediátrica não apresentaram tendências significantes.
CONCLUSÃO: as variações dos indicadores sugerem associação com a implantação da Gestão Plena em Apucarana.

Palavras-chave: hospitalização; avaliação em saúde; gestão em saúde.


SUMMARY

OBJECTIVE: to analyze hospital indicators, before and after the implantation of the Integral Health Management in the city of Apucarana, Paraná, Brazil.
METHODOLOGY: the following indicators were examined: hospitalization rates, average hospitalization time, hospitalization evasion/invasion ratio, and hospitalization/clinic. In order to analyze alterations among indicators, Poisson distribution was used and linear regression model analises in historical series, wasperformed.
RESULTS: local hospitalization decreased from 7.72% to 7.54%, whereas evasion went from 1.15% to 1% and average hospitalization time increased from 390 to 3.97 days. The invasion ratio increased from 26.26% to 26.50%. Hospitalization after clinic type tended to decrease in obstetrics, and to increase in surgery. They were considered significant because of the time. Medical clinic andpediatricspresented no significant tendencies.
CONCLUSION: indicators variations are possibly connected with the implantation of Apucarana's Integral Management.

Key words: evaluation; hospitalization; health administration.


 

 

Introdução

As normas operacionais básicas foram instrumentos utilizados para implementar e regulamentar as ações de saúde no Brasil. Foram editadas após a Constituição de 1988 e o advento das leis orgânicas da saúde e possuíam características descentralizadoras, reforçadas pelo repasse automático de recursos financeiros entre as esferas de governo.1

A Norma Operacional Básica (NOB) 01/96, instituída pela Portaria no 1.742/GM, de 30 de agosto de 1996, foi considerada a mais descentralizadora de todas1 e proporcionou aos municípios e estados habilitarem-se nas seguintes formas de gestão: respectivamente, 1) plena da atenção básica e plena do sistema municipal, 2) avançada do sistema estadual e 3) plena do sistema estadual. Embora a referida NOB tenha sido editada em 1996, somente em 1998 se iniciou o processo de habilitação dos municípios, expandindo-se rapidamente. No final de 2001, 5.516 dos 5.560 municípios já se encontravam habilitados. Destes, 4.952 municípios foram enquadrados na gestão plena da atenção básica e 564 na gestão plena do sistema municipal.2

A gestão plena do sistema trouxe avanços à maioria dos municípios que a implantaram devido às exigências requeridas para sua habilitação.2 Proporcionou aos gestores a oportunidade de adquirirem conhecimentos administrativos anteriormente dominados por outros setores da administração ou esferas de governo. Os gestores passaram a participar da elaboração de leis municipais, a exemplo de lei que cria o Sistema Municipal de Controle, Avaliação e Auditoria, das Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), dos orçamentos propriamente ditos, dos Planos Plurianuais (PPA) e outros procedimentos administrativos como os Pactos de Atenção, as Programações Pactuadas e Integradas (PPI), os Planos de Descentralização e Regionalização (PDR). A gestão plena ainda levou gestores a participarem da elaboração de projetos específicos para a saúde, os quais tiveram de incluir em suas agendas reuniões das Comissões Intergestores Bipartites (CIB) regionais e estaduais e da Comissão Intergestores Tripartites (CIT).

Na gestão plena do sistema, os fundos municipais de saúde passaram a ser gerenciados pelos secretários municipais de saúde, os quais assumiram o compromisso dos pagamentos aos prestadores de serviços (tanto privados como filantrópicos), quer hospitalares, quer ambulatoriais. Os secretários tiveram de aprender a administrar os recursos repassados e exercer maior controle sobre eles. Esse conhecimento foi fundamental para ampliar os setores municipais de controle, avaliação e auditoria, e efetivamente controlar os gastos, principalmente com vistas a evitar situações em que os recursos pudessem ser insuficientes para pagamento aos prestadores.

Posteriormente à implantação das NOBs, a partir de 2006, gestores das três esferas de governo, pactuaram no campo da gestão e da atenção à saúde o Pacto pela Saúde, por meio da assinatura do termo de compromisso em que cada assume suas responsabilidades nas ações e nos serviços de saúde.3 A implantação do Pacto pela Saúde não foi contraditório às NOBs, pelo contrário, agregou as pactuações estabelecidas nas normas anteriores e procurou dar maior autonomia de gestão aos gestores do SUS.

A avaliação de gestão é escassa na literatura. Não há cultura de avaliação no Brasil. As análises encontradas são, em geral, descritivas, pouco avaliativas e se referem ao panorama nacional.4 Só recentemente, a partir da segunda metade da década de 1990 é que as avaliações de programas e serviços começaram a figurar na literatura.5

No Brasil, apesar de existir um grande número de iniciativas voltadas para o aperfeiçoamento do SUS e de projetos para a avaliação das inovações, não existe nenhuma iniciativa governamental no sentido de avaliar o seu impacto no desempenho do sistema em seu conjunto, sendo que a maioria das avaliações se situa no plano da avaliação de processo de descentralização ou de implantação de programas específicos para o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e o Programa Saúde da Família (PSF).6

Nesta conjuntura, merece destaque o Projeto Desenvolvimento de Metodologia de Avaliação do Desempenho do Sistema de Saúde Brasileiro (PRO-ADESS) que se constitui num projeto multicêntrico com objetivo de desenvolver uma metodologia para avaliar o desempenho dos serviços de saúde no âmbito nacional, bem como, de uma proposta de implementar indicadores para monitorar o acesso e utilização desses serviços e de alocação de recursos financeiros para os mesmos.6

Novaes7 reforça a importância de intensificar pesquisas em serviços de saúde no Brasil devido ao grande interesse no desenvolvimento e utilização de indicadores para o monitoramento de desempenho do SUS, a fim de apoiar decisões sobre a distribuição dos recursos financeiros para os municípios. É importante a construção de consensos para conduzir o processo de avaliação a fim de se encontrar o método mais adequado de aferir o que se quer avaliar assim como da possibilidade de validar critérios/indicadores e conferir maior legitimidade aos processos avaliativos.8

Visando a contribuir com o desenvolvimento da avaliação em saúde, este estudo teve por objetivo analisar e comparar indicadores hospitalares nos períodos antes e após a implantação da Gestão Plena em Apucarana-PR e sua possível influência no desenvolvimento local dos serviços de saúde.

 

Metodologia

Trata-se de pesquisa avaliativa, do tipo antes e depois, e de tendência. O Município estudado situa-se na região norte do Paraná e possui uma população de 107.827 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de geografia e Estatística (IBGE).9 É município-pólo do Vale do Ivaí, região que compreende 28 municípios. É também sede da 16a Regional de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná, que abrange 17 municípios.10

Foram estudados os anos de 1996 e 1997, período em que o Município se encontrava na gestão parcial, conforme NOB 01/93, e 2000 e 2001, após a entrada do município na Gestão Plena do Sistema Municipal, que ocorreu em 1998. Estudou-se também a série histórica, de 1995 a 2004 (10 anos).

A avaliação teve como fonte dados quantitativos dos Sistemas de Informação do Ministério da Saúde obtidos em CD-ROM e fornecidos pelo Departamento de Informática do SUS (Datasus). Foram utilizados o Sistema de Informação Hospitalar (SIH/SUS)11 e o Sistema de Informação de Nascidos Vivos (Sinasc). Este último, para avaliar resultados de alguns indicadores que requeriam interpretações relacionadas aos nascimentos, disponíveis também em CD-ROM.12 Os dados foram processados e tabulados pelo programa TabWin, versão 3.3 também do Ministério da Saúde.13

Para análise da evolução da série histórica dos indicadores, foi utilizada a análise de regressão linear simples, na qual estimou-se o modelo de regressão linear, e a sua significância foi avaliada com o teste F de análise de variância. Esta análise foi realizada no programa SAS versão 8.2.14 A comparação dos indicadores nos períodos, dois anos antes da implantação da gestão plena e dois anos posteriores, foi realizada utilizando-se a distribuição de Poisson.15 As variáveis analisadas foram: taxas de internações hospitalares segundo local de residência e local de ocorrência, tempo médio de permanência hospitalar, evolução das proporções anuais de internações por clínicas, todas expressas em porcentagens. Os cálculos foram efetuados na planilha eletrônica Excel.

Todos os testes estatísticos foram realizados ao nível de probabilidade de significância de 5% com p<0,05.

Considerações éticas

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (Parecer 203/04), o qual se fundamentou na Resolução no 196/96.16

 

Resultados

A Tabela 1 apresenta a evolução das internações hospitalares da população residente por local de ocorrência no período de 1995 a 2004. A distribuição percentual de internações em relação à população não foi uniforme, pois no ano de 1995 a taxa foi de 9,08%, reduzindo-se progressivamente para 8,27% no ano de 1999, a menor taxa. Esta volta a crescer a partir de 2000, atingindo o índice de 8,36% em 2004.

 

 

Em relação ao local de ocorrência, no ano de 1995 houve 89,74% de internações de residentes no Município de Apucarana, diminuindo para 86,59% em 1996 e aumentando para 90,35% em 2004. Da mesma forma, houve variação das internações de residentes ocorridas fora do município (evasão). Estas foram de 10,26% em 1995, ascendendo para 13,41% em 1996 e diminuindo para 9,65% no último ano, em 2004, o menor percentual no período analisado.

Quando se comparam os dados dos biênios 1996­1997 e 2000-2001, verifica-se que os percentuais de internações em relação à população local internada no próprio município foram de 7,72% no primeiro biênio e de 7,54% no segundo. A diferença entre as duas proporções não foi considerada estatisticamente significante (p=0,126) (Tabela 2). Observa-se que 1,15% da população local internou-se em outros municípios no biênio 1996-1997 e 1% no biênio 2000-2001. A diferença entre as duas proporções foi considerada estatisticamente significante (p=0,001). As taxas médias de internação nos períodos pré e pós-implantação da gestão plena correspondem a 8,87% no primeiro biênio e 8,53% no segundo. Esta diferença também foi estatisticamente significante (p=0,009).

 

 

Verifica-se na Tabela 3 que as internações ocorridas no município estudado, compreendendo as de residentes e não-residentes, somaram 10.965 no ano de 1995. Deste total, 74,43% correspondem à população residente em Apucarana e 25,57% a residentes em outros municípios (invasão). Nos anos seguintes, o aumento foi gradativo até o ano de 2002, com um total de 12.041 internações. Este foi o maior número encontrado dentro do período estudado.

 

 

Em relação às internações da população de outros municípios que aconteceram no município estudado, observa-se que estas tiveram redução no ano de 1996, quando atingiram 2.624 internações, ou seja, 25,14% do total de internações. A partir de 1999 o aumento foi crescente, havendo no ano de 2003, 3.509 internações correspondendo a 29,21% do total de internações, sendo este o maior número observado dentro do período estudado.

As proporções das internações da população residente em outros municípios nos biênios pré e pós-implantação do sistema de gestão em análise correspondem respectivamente a 26,26 e 26,50%. A diferença existente entre os dois períodos não foi considerada estatisticamente significante (p=0,740) (Tabela 4).

 

 

Verifica-se que o tempo médio de permanência das internações oscilou de 4,22 a 3,78 dias no período de 1995 a 2004, não tendo havido grande variação neste interregno.

No biênio 1996-1997, houve uma média de 10.666 internações compreendendo-se 41.579 diárias, resultando em 3,90 dias a média do tempo de permanência hospitalar. Nos anos de 2000-2001, houve uma média de 11.139 internações com 44.210 diárias, correspondendo a 3,97 dias a média do tempo de permanência hospitalar. A diferença entre os tempos médios de permanência dos períodos considerados apresentou resultado estatisticamente significativo (p=0,009) (Tabela 5).

 

 

Analisando-se as internações por tipo de clínica no período estudado, constata-se que houve variação estatisticamente significativa das proporções de internações por clínica cirúrgica e obstétrica, com aumento no primeiro caso e diminuição no segundo. Nas clínicas pediátrica e médica não houve variação estatisticamente significativa.

Observa-se na Figura 1 que a evolução das proporções anuais das internações por clínicas é crescente para clínica cirúrgica (p=0,0043). A análise de regressão das proporções anuais das internações por clínica obstétrica evidencia uma tendência decrescente em função do tempo (p=0,0124). Já para as clínicas médica e pediátrica a análise de tendência não foi estatisticamente significativa (p=0,9080 e p=0,3678, respectivamente).

 

 

A análise do número de nascimentos no município demonstrou que no ano de 1995 houve uma taxa de natalidade de 20,63 nascidos vivos por mil habitantes, reduzindo-se para 18,68%o em 1997 chegando a 14,88%, em 2002. Ao estudar a reta de regressão, conforme Figura 2, observou-se uma reta descendente cuja análise demonstrou que o modelo estimado foi estatisticamente significativo (p<0,001) em função do tempo.

 

 

Discussão

As taxas de internações pelo Sistema Único de Saúde (SUS) da população residente em Apucarana oscilaram entre 9,08 e 8,27% no decênio estudado, havendo uma redução de 6,28% no período. Em todo o período, as taxas foram superiores aos valores estabelecidos no Paraná, equivalentes a 8% da população/ano, índice consignado na Resolução no 074, de 31 de agosto de 2001, da CIB-PR.24 No Paraná, esses percentuais tiveram um comportamento semelhante aos de Apucarana, tendo-se, no ano de 1995, atingido internações de 9,52% da população do Estado, reduzindo-se para 8,42% em 2001, com uma queda de 11,6%.25

A relação entre número de AIHs e a população, no Brasil, também teve redução nesse período, passando de 8,52% das AIHs em 1995 para 7,09% em 2001, uma diminuição de 16,7%.25

A título de comparação, citem-se os exemplos de Londrina-PR e Maringá-PR, municípios em Gestão Plena do Sistema Municipal e próximos a Apucarana, onde foram observadas taxas bem menores que as da cidade em estudo. Em Maringá foram observadas taxas de internação de 6,90% em 1999 e de 6,26% em 2001. Sapata justificou as baixas taxas de internação neste município pelo déficit de leitos disponibilizado ao SUS, compensado pela oferta do sistema suplementar.26

Estudo de todas as internações pagas pelo SUS em 2.000 mostrou que municípios que internam a maior parte de sua população no próprio local (80%) têm facilidade no acesso e uso de serviços hospitalares.27 Apucarana apresentou índices superiores ao citado.

Conforme comparação das médias de internações ocorridas nos períodos pré e pós-implantação da gestão plena, observa-se que houve uma redução estatisticamente significante das internações em relação à população. Essa diminuição pode estar relacionada ao melhor controle e avaliação executados pelo Município e também ao aumento da resolutividade da atenção básica com a implantação de equipes do PSF e o consequente aumento da cobertura populacional. O PSF foi implantado em Apucarana no ano de 1999, após habilitação na Gestão Plena do Sistema Municipal.28 Semelhantemente ao que ocorreu em Apucarana, um estudo comparativo de internações hospitalares evitáveis, realizado em Pelotas-RS, mostrou uma diminuição dessas internações.29

Em Pelotas as reduções de internações hospitalares estariam relacionadas a dois fatores: 1) à exigência de que os municípios em Gestão Plena do Sistema Municipal apresentassem órgão de controle, avaliação e auditoria, implicando melhor controle e consequentemente diminuição das internações evitáveis; 2) mudanças estruturais da rede básica, pelo aumento da incorporação de recursos humanos.29

Cerca de 90% das internações da população residente em Apucarana ocorreram no próprio Município, com uma discreta diminuição entre os dois biênios estudados, porém considerada estatisticamente não significante. Por sua vez, houve diminuição da evasão de pacientes residentes para outros municípios. Essa diminuição merece atenção por ser considerada estatisticamente significante, tendo em vista que os encaminhamentos para outros municípios se deviam principalmente a serviços que não eram disponíveis no local, ou seja, aqueles de maior complexidade.

A gestão plena possibilitou ao Município implantar serviços de alta complexidade em neurologia, em ortopedia e de urgência e emergência, cujos pacientes eram referenciados anteriormente a outros municípios.30 Há de se ressaltar que não houve incremento financeiro especificamente para implantação desses serviços.

Os percentuais de internações de não-residentes de Apucarana (invasão), quando comparados aos de Londrina e Maringá, apresentam-se menores. Londrina, em 1998, registrava um índice de 29,9%31 e Apucarana, de 27,04%. Maringá, no ano de 2002, apresentou o índice de 34,89%26 enquanto em Apucarana este indicador foi de 26,86%.

Trata-se de três municípios que são sedes de regionais de saúde. Entretanto, o que pode justificar a grande invasão nos Municípios de Maringá e Londrina é o fato de serem municípios de grande porte, em que a oferta de serviços de alta complexidade é bem maior do que a existente em Apucarana.

Constata-se assim, com os dados referidos, que em Apucarana houve manutenção da taxa de internação da população residente no próprio local e também diminuição da evasão dessa população por serviços em outras localidades, possivelmente relacionados à carência de serviços de maior complexidade que não eram anteriormente ofertados. Esta diminuição, portanto, pode ser atribuída à implantação de serviços de maior complexidade com a habilitação do município em Gestão Plena do Sistema Municipal. Observa-se que mesmo com a diminuição da evasão, as taxas de internação da população residente no próprio local não aumentaram. Contudo, observou-se um aumento da taxa de invasão, também relacionada á implantação de novos serviços, demandada pela população local e referenciada.

A garantia do acesso da população de outros municípios aos serviços de saúde locais pode ser interpretada como cumprimento da pactuação das referências intermunicipais quando da implantação da gestão plena, consoante observado pelo aumento significativo das AIHs correspondentes à população de outros municípios (invasão).

A redução de AIHs pode significar maior racionalidade nos gastos com assistência hospitalar, a qual pode ser atribuída ao melhor desempenho do Sistema Municipal de Controle Avaliação e Auditoria, devido à adoção de critérios mais rigorosos na liberação das AIHs.

No Brasil, há uma predominância de internações por clínica médica em todas as regiões. Em 1999 a proporção de internação nesse tipo de clínica foi de 34,9% e no ano de 2000 de 34,3%. A clínica cirúrgica apresentou uma proporção de 21,7% em 1999 e de 23,0% em 2000. Para os mesmos anos, a clínica obstétrica apresentou um percentual de 25,1% e 24,1% e a pediátrica de 14,4 e 14,8%.32

Em Apucarana, como no Brasil, a clínica médica é a que predomina nas internações por clínicas. Em 2000, apresentou uma proporção de 40,39% do total das internações, seguida da clínica cirúrgica com 26,61%, da pediátrica com 17,95% e da obstétrica com 15,05%. Observa-se que em Apucarana há uma inversão entre as clínicas pediátrica e a obstétrica em relação ao Brasil, e seus percentuais estão muito aquém do que é observado nacionalmente.

A análise dos dados referentes à frequência de internações por clínicas demonstra que houve alterações significativas quando se compara os períodos pré e pós-implantação da gestão plena do sistema. Verifica-se aumento importante das internações na clínica cirúrgica (17,86%) e médica (10,06%), menor na clínica pediátrica (3,83%) e acentuada redução das internações na clínica obstétrica (19,08%).

Quando comparados os dois períodos em estudo, verifica-se que a clínica cirúrgica passou de 23,06% de internações para 26,02%. Esse aumento foi considerado estatisticamente significante. Da mesma forma, o aumento de internações por clínica médica, que passou de 37,69% para 40,59%, foi considerado estatisticamente significante. A clínica pediátrica não apresentou aumento significativo entre os dois períodos.

A diminuição da clínica obstétrica foi considerada estatisticamente significante quando comparados o antes e o depois da intervenção, passando de 21,55% para 15,79% das internações.

Ao estudar a frequência dos números de partos realizados pelo SUS, verifica-se queda acentuada em Apucarana, uma redução de 38,34% no período de 1995 a 2000. A reta de regressão do número de nascidos vivos entre os períodos de 1995 a 2002 no Município foi considerada estatisticamente significante, observando-se, portanto, redução significativa dos nascimentos.

No Brasil, essa queda também foi acentuada, na ordem de 18%, sendo as maiores reduções principalmente nos estados da Região Sul. O Estado do Paraná, nesse mesmo período, apresentou uma queda de 26,82%.33

Acredita-se que a implantação da Portaria Ministerial, 2.816 de 29 de maio de 1998, que estabeleceu um limite máximo e um cronograma de redução de taxas de cesarianas tenha contribuído para essa diminuição significativa dos números de partos pagos pelo SUS.33 A Rede Interagencial de Informações para a Saúde (Ripsa) chama atenção quanto a alta taxa de partos cesarianos realizados no Brasil, 43% em 2005, em sua maior proporção nos hospitais privados, e que 97% do total de partos realizados são hospitalares.34

Dados do Sinasc12 demonstram que realmente houve uma queda do número de partos no Brasil, acontecendo o mesmo em Apucarana. A queda da fecundidade dos casais, o aumento do controle e avaliação, a possível migração dos partos cesáreos para atendimentos particulares e de convênios somam-se à justificativa anterior e contribuem para explicar as reduções anteriormente referidas.

O tempo médio de permanência por internações, ao final do período em estudo, apresentou variação negativa se comparado ao ano de 1995, cujo resultado foi de 4,22 dias. Apucarana não possui serviços que exijam longos tempos de permanência, como os serviços de cirurgia cardíaca, transplantes e serviços psiquiátricos. Os procedimentos que podem prorrogar o tempo da internação nos serviços municipais se devem às unidades de terapia intensiva (UTI) adulta, pediátrica e neonatal que o Município possui. Contudo, conforme observado, o aumento do tempo médio de permanência hospitalar no período pós implantação da gestão plena, pode ser atribuído à ampliação da oferta dos serviços de alta complexidade, como neurologia, ortopedia e urgência e emergência com consequente implementação da tecnologia médica.

As médias municipais de tempo de permanência de internações hospitalares se apresentaram inferiores às do Estado do Paraná, onde em 1995 foram de 6,6 dias diminuindo para 6,1 em 2001; e às do Brasil, cuja variação foi de 6,6 em 1995 e 6,2 em 2001, respectivamente.12

Segundo estudo realizado em Ribeirão Preto-SP, no período de janeiro de 1996 a dezembro de 1998, o tempo médio de permanência dos pacientes internados naquele município foi de 5,63 dias, sendo de 6,7 nos hospitais públicos e 5,34 dias nos hospitais privados. Tal estudo define o tempo médio de permanência como um indicador de desempenho clínico, tendo em vista que quanto melhor a estrutura hospitalar, melhor o desempenho do serviço e menor o período de internação.35

Outras avaliações do desempenho de serviço devem ser realizadas. Segundo Mendes,36 a avaliação tecnológica torna-se indispensável como instrumento de racionalização econômica e da melhoria da qualidade da atenção.

Diante do observado, a habilitação em gestão plena apresentou um saldo favorável, podendo impactar positivamente os serviços e reverter tendências do modelo assistencial tradicional.

Em termos metodológicos, acredita-se que os indicadores utilizados foram pertinentes embora exista a possibilidade de utilização de outras categorias e variáveis, assim como de análise comparativa, que venham a contribuir para trabalhos avaliativos em gestão de saúde.

A municipalização plena teve grandes avanços com a NOB 01/96, o que contribuiu para o processo de descentralização. Com o Pacto pela Saúde e as inovações nas formas de gestão, a avaliação deve ser ferramenta para que os impactos sejam mensurados e assim, contribuir para a qualificação do processo bem como verificar os resultados de parâmetros estabelecidos para o sistema de saúde.

Para que o SUS seja economicamente viável, estudos devem ser realizados em parceria, gestores e pesquisadores, a fim de que se definam melhor os recursos a ele destinados e que haja mais autonomia para sua administração, assim como competência e seriedade para que o sistema de saúde descrito na Constituição Federal se consolide.

 

Referências

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4. Cordoni Junior L. Elaboração e avaliação de Projetos em Saúde Coletiva. Londrina: Eduel; 2005.

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Endereço para correspondência:
Hemonúcleo de Apucarana,
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Recebido em 25/11/2009
Aprovado em 13/10/2010