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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.21 n.2 Brasília jun. 2012

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742012000200010 

ARTIGO ORIGINAL

 

Internações por condições sensíveis à atenção primária no Espírito Santo: estudo ecológico descritivo no período 2005-2009

 

Hospitalization for primary care sensitive conditions in Espirito Santo: an ecological decriptive study, 2005 - 2009

 

Rosalva Grobério PazóI; Diana de Oliveira FrauchesII; Débora Pereira GalvêasIII; Anelise Venturini StefenoniIII; Elton Luiz Batista CavalcanteIII; Fernando Henrique Pereira-SilvaIII

IUnidade de Saúde Bairro República, Prefeitura Municipal de Vitória, Vitória-ES, Brasil
IIDepartamento de Saúde Coletiva, Escola Superior de Ciências, Santa Casa de Misericórdia, Vitória-ES, Brasil
IIICurso de Medicina, Escola Superior de Ciências, Santa Casa de Misericórdia, Vitória-ES, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: descrever as internações por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) no estado do Espírito Santo, Brasil, no período 2005-2009.
MÉTODOS: estudo ecológico descritivo das internações do Sistema Único de Saúde, classificadas conforme a lista brasileira de internações por CSAP, estudadas por municípios de residência, distribuídas por microrregião, sexo, faixa etária e grupo de causas.
RESULTADOS: registro de 823.343 internações por CSAP no período, representando 28,9% do total de internações por CSAP em 2005 e 23,2% em 2009; coeficiente de internações por CSAP reduzido de 14,1 para 11,4/1000 habitantes, diferentemente segundo microrregiões; internações por CSAP mais frequentes em menores de cinco anos e idosos, 29,3 e 39,1/1000 habitantes respectivamente; gastroenterites, pneumonias, insuficiência cardíaca e infecção no rim e trato urinário somaram 50,3% das causas.
CONCLUSÕES: há indícios de melhoria no quadro das internações por CSAP apesar dos ganhos irregulares.

Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Indicadores de Qualidade em Assistência à Saúde; Hospitalização; Estudos Ecológicos.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to describe hospitalization for ambulatory care sensitive conditions (ACSC) in the state of Espírito Santo, Brazil, in the period 2005-2009.
METHODS: an ecological descriptive study of hospitalizations in the National Health System, based on the Brazilian list of ACSC, by Municipalities of residence, distributed by Micro-region, gender, age group and causes.
RESULTS: were recorded 823,343 hospitalizations for ACSC in the period, representing 28,9% of these admissions in 2005 and 23,2% in 2009; ACSC rates per 1000 population decreasedfrom 14,1 to 11,4 per 1000 inhabitants, differently among micro-regions; children underfive years and elderly were more likely to hospitalization, 29,3 and 39,1/1000 inhabitants respectively; gastroenteritis, bacterial pneumonia, heart failure and infection in urinary tract accountfor 50,3% of cases.
CONCLUSION: there are indications of improvement on hospitalizations for ACSC in the State despite irregular gains.

Key words: Primary Health Care; Quality Indicators, Health Care; Hospitalization; Ecological Studies.


 

 

Introdução

A efetividade da atenção primária à saúde (APS) tem sido avaliada mediante eventos relacionados à atividade hospitalar em vários países. Inicialmente usado nos Estados Unidos da América, no final dos anos 1980, internações por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) atualmente constituem um dos indicadores de acesso à atenção de qualidade propostos para esse país e para aqueles da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.1-3 Em alguns estados do Brasil, estudos das internações por CSAP têm-se mostrado úteis como uma nova ferramenta para monitoramento do desempenho da APS.4-7

Avaliar é fundamental para que se alcance um desempenho de excelência. Fazê-lo, porém, é tarefa bastante complexa, para a qual, na área de Saúde, são utilizados os indicadores, medidas-síntese que contêm informação relevante sobre determinados atributos e dimensões do estado de saúde, bem como do desempenho do sistema de saúde.8

As CSAP representam problemas de saúde para os quais a efetiva ação da APS diminuiria o risco de internação, com atividades centradas no diagnóstico e tratamento precoce das doenças agudas, bem como no controle e acompanhamento das condições crônicas. São exemplos de internações sensíveis as pneumonias bacterianas, as complicações do diabetes mellitus, hipertensão e asma,9,10 entre outros.

Em 2008, o Ministério da Saúde brasileiro, com base em estudo epidemiológico,2 lançou a Lista Brasileira de Condições Sensíveis à Atenção Primária, que inclui 120 categorias da CID-10 (com três dígitos) e 15 subcategorias (com quatro dígitos), agrupadas de acordo com a possibilidade de intervenções e a magnitude dos agravos, no total de 19 grupos diagnósticos.10

As evidências demonstram que a atenção primária tem capacidade de resposta para 75,0 a 85,0% das necessidades em saúde de uma comunidade.11 A atenção primária representa o nível de um sistema de serviços de saúde que oferece a entrada para todas as novas necessidades e problemas, fornece atenção sobre a pessoa (não direcionada para a enfermidade) no decorrer do tempo, contempla todas as condições, exceto as muito incomuns ou raras, e coordena ou integra a atenção fornecida em outros pontos da rede.12

No Brasil, o Ministério da Saúde especifica que esse nível de atenção constitui a porta de entrada do sistema de saúde e tem a Saúde da Família como estratégia prioritária para sua organização.13

Quando se pensa em avaliação da APS por meio de indicadores, deve-se levar em conta as características regionais da implantação do sistema de saúde. No Estado do Espírito Santo, a assistência encontra-se organizada em três macrorregiões, formadas por aglomerados com população superior a 500 mil habitantes, e oito microrregiões administrativas. A macrorregião Norte é formada pelas microrregiões Colatina, São Mateus e Linhares, com 32 municípios. A macrorregião Centro é composta pelas microrregiões Vitória, Serra e Vila Velha, com 22 municípios. Por fim, a macrorregião Sul abrange as microrregiões Cachoeiro e Guaçuí, que incluem 24 municípios.14

Dados do Sistema de Informação de Atenção Básica (SIAB), administrado pelo Departamento de Informática do SUS (Datasus),15 mostram que houve grande aumento da cobertura da APS no estado. A proporção populacional de pessoas cadastradas, por 100 habitantes, passou de 20,5%, em 1999, para 68,2%, em 2009, principalmente devido à expansão da Estratégia Saúde da família (ESF), em um crescimento verificado em todas as microrregiões de saúde.

Em 2009, apresentaram cobertura superior à média estadual as microrregiões de Linhares (99,5%), Guaçuí (96,5%), Colatina (94,7%), São Mateus (81,3%) e Cachoeiro de Itapemirim (77,9%). As microrregiões de Vitória (61,0%), Vila Velha/Venda Nova (49,5%) e Serra/Santa Teresa (42,6%) tiveram valores inferiores.15

O objetivo deste estudo é descrever a série temporal das internações por CSAP no Estado do Espírito Santo, Brasil, entre 2005 e 2009, considerando a Lista Brasileira de Condições Sensíveis à Atenção Primária - CSAP -, e discutir fatores relacionados que possam explicar a distribuição existente, de modo a subsidiar o planejamento de ações de saúde voltadas para a organização do sistema de atenção.

 

Métodos

Trata-se de estudo ecológico descritivo das internações hospitalares registradas no Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), em residentes no Espírito Santo, no período 2005-2009.

Na página na internet do Datasus, foram obtidos dados individuais de internações do SIH/SUS que têm como fonte a Autorização de Internação Hospitalar (AIH-SUS).1616 Os procedimentos de estatística descritiva foram realizados por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 11.5.

Foi definido como causa da internação o diagnóstico principal que seencontrava discriminado em código da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - Décima Revisão (CID-10).16 Excluídos os partos (CID-10: O80 a O84), as demais foram classificadas como internações por CSAP, de acordo com a Portaria no 221/2008 do Ministério da Saúde,10 e não CSAP.

Considerou-se o ano de competência da AIH-SUS para definir a temporalidade do evento. Dados referentes a sexo foram assumidos sem modificações. As idades foram categorizadas em faixas etárias, analisando-se os ciclos de vida (0 a 4, 5 a 9, 10 a 14 e 15 a 19 anos para crianças e adolescentes, 20 a 49 e 50 a 59 para os adultos e 60 e mais anos de idade para os idosos). Os municípios de residência foram classificados segundo as microrregiões de saúde estabelecidas no Plano Diretor de Regionalização (PDR) do Espírito Santo.14

Foi calculada a proporção das internações por CSAP no total de internações (excluídos os partos) e o indicador representado pela relação entre o número de internações de acordo com as variáveis de interesse (ano, sexo, faixa etária e microrregião de residência) e a população correspondente a cada categoria das citadas variáveis.

O coeficiente de internação por CSAP, calculado como medida de ocorrência por 1000 habitantes, tomou como denominador as estimativas populacionais também acessíveis na página do Datasus. Calculou-se a variação percentual anual do indicador e sua média no período. Foi verificada, ainda, a proporção de cada grupo de causa no total das internações por CSAP.

O projeto dessa pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Infantil Nossa Senhora da Glória, sob protocolo no 57/2010. A instituição, responsável pela avaliação de todos os projetos de pesquisas desenvolvidos na rede estadual de saúde, declarou não haver necessidade de aprovação para o estudo, uma vez que empregou dados secundários de domínio público.

 

Resultados

No período 2005-2009, o SIH/SUS registrou 823.343 hospitalizações de residentes no Espírito Santo. Desse total, as internações por CSAP representaram 210.894 e sua participação veio caindo progressivamente, de 28,9% para 23,3%, entre o primeiro e o último ano do período (Tabela 1).

 

 

O coeficiente de internação por CSAP por 1000 habitantes, no Estado, mostrou declínio de 14,1 para 11,4 entre 2005 e 2009, notando-se quedas sucessivas ao longo dos anos, com aumento ao final do período. A ocorrência anual e segundo algumas características sociodemográficas está apresentada na Tabela 2.

 

 

A ocorrência de internações por CSAP foi semelhante entre homens e mulheres, embora um pouco superior entre as últimas. Quanto à distribuição por idade, as internações foram mais frequentes entre idosos, seguidos pelas faixas de zero a quatro anos e de 50 a 59 anos.

Todas as microrregiões apresentaram queda das internações por CSAP no período estudado. As maiores reduções foram observadas nas microrregiões de Serra/Santa Teresa (10,6%), Vila Velha/Venda Nova (7,4%), Linhares (6,7%) e Vitória (5,2%).

Entre as internações por CSAP no período, os dez grupos de causas mais frequentes ocasionaram 85,0% das ocorrências (50,3% nos quatro primeiros). Como apresentado na Tabela 3, foram registrados, em ordem decrescente, gastroenterites infecciosas (17,8%), pneumonias bacterianas (11,7%), insuficiência cardíaca (10,9%), infecção no rim e trato urinário (10,0%), doenças cerebrovasculares (6,9%), asma (6,3%), hipertensão (6,1%), doenças pulmonares (5,6%), angina (5,2%) e diabetes mellitus (4,5%). Os outros nove grupos de diagnóstico representaram menos de 4,0% cada um.

 

 

Em relação à alteração da frequência proporcional dos grupos de diagnóstico CSAP entre os anos estudados (Tabela 4), notou-se aumento da participação das seguintes causas, no Estado: infecções de ouvido, nariz e garganta; doenças relacionadas ao pré-natal e parto; doenças preveníveis por imunização e condições sensíveis; infecção no rim e trato urinário; diabetes mellitus; angina; deficiências nutricionais; infecção da pele e tecido subcutâneo; pneumonias bacterianas; e insuficiência cardíaca. Por sua vez, houve redução da participação das seguintes causas: anemia; gastroenterites infecciosas e complicações; doenças pulmonares; doença inflamatória dos órgãos pélvicos femininos; epilepsias; hipertensão; doenças cerebrovasculares; asma; e úlcera gastrointestinal.

 

 

Em todas as microrregiões, com destaque para São Mateus, foi observado aumento da participação dos seguintes grupos: infecções de ouvido, nariz e garganta; doenças preveníveis por imunização e condições sensíveis; e infecção no rim e trato urinário.

Também foi verificado aumento da proporção de internações relacionadas ao pré-natal e parto, diabetes mellitus e angina, em quase todas as microrregiões – com exceção para cada grupo de CSAP –, respectivamente em Linhares, Vitória e Guaçuí.

A participação das internações por hipertensão em relação ao total de internações por CSAP apresentou redução em metade das microrregiões, sendo que a maior queda foi em Vitória e o maior crescimento em São Mateus. Para doenças cerebrovasculares, a participação se reduziu em cinco microrregiões, com maior queda em Vitória, seguida por Colatina.

Para asma, houve redução da participação percentual em seis microrregiões, mais ressaltada em Serra/ Santa Teresa. Em todas as microrregiões, verificou-se redução da participação das internações por úlcera gastrointestinal em relação ao total de internações por CSAP, exceto em Guaçuí.

 

Discussão

Essa pesquisa permitiu conhecer o cenário existente no estado do Espírito Santo em relação às internações por CSAP. Notou-se sua diminuição no período 2005-2009 e foram identificadas as faixas etárias e as microrregiões mais afetadas, bem como os principais grupos de CSAP envolvidos.

Registra-se que a análise dos resultados obtidos sofre limitações decorrentes da fonte de dados utilizada, o SIH/ SUS, que toma como unidade de observação a internação, podendo a mesma pessoa ser internada mais de uma vez. Além disso, esse sistema de informações em saúde tem abrangência restrita às ocorrências no SUS, excluindo a parcela da população coberta por planos de saúde.16

Estudos inseridos em recente revisão de literatura sobre qualidade dos dados e métodos aplicados na avaliação dos sistemas de informações em saúde documentam a ocorrência de problemas de consistência nos bancos de dados secundários do SIH/SUS.17 Acredita-se, porém, que a continuidade do viés ao longo do tempo reduza o efeito desses erros na estimativa de tendências.18

Ao se estudar as internações por CSAP, procura-se medir indiretamente o acesso oportuno, o funcionamento e a capacidade de resolução da Atenção Básica.1,9,19 A literatura nacional tem enfatizado a existência de estreita relação entre cobertura da APS e a magnitude do indicador,5,7 de modo que a redução da ocorrência de internações por CSAP observada no Espírito Santo pode ter sido influenciada pela grande expansão da APS ocorrida no estado.

Porém, a análise da ampliação contempla apenas a cobertura populacional da ESF e não considera a adequação da composição das equipes, a qualificação profissional, os vínculos trabalhistas, tampouco outros aspectos estruturais.

Estudo realizado por Alfradique e colaboradores,2 com base na lista de CSAP definida pelo Ministério da Saúde, também utilizada na presente pesquisa, encontrou valores de 28,5% de internações por CSAP sobre o total de internações e 149,6 por 10 mil habitantes, para o Brasil, no ano de 2006. Outro estudo, que considerou a população do Estado de São Paulo no período de 2000 a 2007, encontrou queda de 12,0 para 10,8 por 1000 habitantes por ano.5 No Espírito Santo, observaram-se valores menores que no Brasil e maiores que em São Paulo.

Todas as microrregiões de saúde do Espírito Santo registraram tendência de redução da ocorrência das internações por CSAP; o tamanho dessa redução, porém, variou. Isso não pode ser explicado apenas pela expansão da APS, uma vez que as microrregiões com maior coeficiente de internação, como Guaçuí e São Mateus, apresentam altas coberturas desse nível de atenção (96,5 e 81,3%, respectivamente), maiores inclusive que a média do estado.

Baixa escolaridade, maior taxa de desemprego e menor renda da população,20,21 bem como o menor contingente populacional do município,22 têm sido descritos como outros fatores associados a uma maior proporção de internações por CSAP. A revisão do PDR permitiu verificar que os municípios das microrregiões de Guaçuí e São Mateus estão entre os que têm os piores índices de desenvolvimento humano (IDH), as maiores taxas de analfabetismo e de mortalidade infantil do estado.14

Ainda segundo o PDR, essas microrregiões estão entre as que mais ofertam leitos/SUS de internação por 1000 habitantes, cuja distribuição no estado é: Cachoeiro de Itapemirim (3,1); Guaçuí (2,3); Vitória (2,0); São Mateus (1,8); Colatina (1,6); Serra/Santa Teresa (1,1); Vila Velha/Venda Nova (1,1); e Linhares (1,0). São dados que podem indicar ocorrência da indução da demanda pela oferta, conforme postulado por Dias-da-Costa e colaboradores.22

Em relação às internações por CSAP por grupos de causas, a maioria decorreu de gastrenterites, pneumonias bacterianas, insuficiência cardíaca e infecção no rim e trato urinário. Destes, apenas o primeiro grupo apresentou variação negativa da proporção ao longo dos anos, na maioria das microrregiões, enquanto os demais sofreram crescimento percentual, com distribuição discrepante entre as regiões.

Surpreende o aumento verificado, em todas as microrregiões, da participação das internações por doenças preveníveis por imunização e condições sensíveis em relação ao total das internações por CSAP (variação de 11,9%), uma vez que essas doenças não deveriam ocorrer na presença de uma APS de qualidade.2,9 Esse comportamento também foi verificado quanto às doenças relacionadas ao pré-natal e parto (17,5%) e ao diabetes mellitus (9,8%).

Portanto, neste estudo, destaca-se a alta prevalência e o crescimento, em relação ao total de internações por CSAP, da participação percentual de grupos de doenças cujo diagnóstico precoce e tratamento ambulatorial são efetivos para evitar hospitalização,1,2,9 ao lado de outros grupos que constituem alvo de programas da Atenção Básica há muitos anos. Ao mesmo tempo, o ganho obtido sobre as condições crônicas foi irregular: houve redução das internações por hipertensão, asma e úlcera gástrica, e aumento daquelas por diabete. Nesses grupos, os efeitos esperados da APS seriam a redução das agudizações e das reinternações.2,9

Essas observações, acrescidas à irregularidade da distribuição geográfica dos grupos de CSAP nas microrregiões administrativas de saúde, sugerem falta de padronização das ações da APS, o que poderia ser minimizado, por exemplo, com a implantação efetiva de protocolos clínicos e planejamento sistêmico da assistência no Estado.

Deve ser ponderado que, para alguns autores, os aumentos observados poderiam ser efeito da ampliação da oferta de serviços de saúde, dando vazão à demanda até então reprimida.2,5,22

Outras informações contidas nos resultados desta pesquisa possibilitaram apontar os grupos populacionais para os quais deve ser implementado o acesso e potencializadas as ações da APS.

Considerando sexo, há estudos que indicam maior número de internações de mulheres por CSAP, quando considerada a faixa etária de 20 a 59 anos, e predomínio de homens internados por CSAP entre os idosos. As justificativas para isso estariam nas diferenças entre as doenças que acometem cada grupo e na maior utilização dos serviços da APS pelas mulheres.4,23,24 Na presente pesquisa, porém, não se fez comparações entre os sexos por faixa etária.

Quanto aos grupos etários, o padrão de distribuição encontrado coincide com o descrições em outros estudos,6,18,20 sendo as crianças menores de quatro anos e os idosos os mais afetados. Neste último grupo etário, o coeficiente de internação por CSAP chegou a ser até dez vezes maior que em adultos.

Ao refletir sobre o envelhecimento populacional ora em curso, é provável que nos próximos anos ocorram cada vez mais hospitalizações por causas sensíveis à APS caso não sejam efetivadas intervenções em nível de prevenção primária e secundária. Alguns autores têm se aprofundado no estudo da morbidade existente entre idosos, na busca por medidas mais eficazes para reduzir o acometimento desse grupo.23,25

Embora futuros estudos, com desenhos mais complexos, sejam necessários para avaliar as relações de causalidade aqui levantadas, a presente pesquisa aponta para uma melhoria no quadro das internações por CSAP no Estado, apesar dos ganhos irregulares, e indicam que as políticas de saúde no Espírito Santo devem se voltar, principalmente, para o fortalecimento qualitativo das ações da atenção primária à saúde.

 

Contribuição dos autores

Pazó RG e Frauches DO colaboraram na concepção da pesquisa, coleta e análise de dados, elaboração, redação e revisão final do artigo.

Galvêas DP, Stefenoni AS, Cavalcante ELB e Pereira-Silva FH contribuíram na coleta e análise de dados e na elaboração do artigo.

 

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Endereço para correspondência:
Unidade de Saúde Bairro República,
Rua Rosendo Serapião Souza Filho, s/no,
República, Vitória-ES, Brasil.
CEP: 29070-170
E-mail: rosalvapazo@gmail.com

Recebido em 26/08/2011
Aprovado em 22/06/2012