SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 número4Caracterização das vítimas de acidentes de trânsito atendidas pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) no Município de João Pessoa, Estado da Paraíba, Brasil, em 2010Prevalência de marcadores sorológicos do vírus da hepatite B em profissionais de saúde de um laboratório de pesquisa na Amazônia oriental, Estado do Pará, Brasil, 2007 a 2009 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.21 n.4 Brasília dez. 2012

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742012000400009 

ARTIGO ORIGINAL

 

Linha de base da leucemia linfocítica aguda para a vigilância da saúde ambiental no território de abrangência da refinaria de petróleo do Estado de Pernambuco, Brasil, 2004 a 2008*

 

Baseline of acute lymphocytic leukemia for surveillance of environmental health on the oil refinery area of the State of Pernambuco, Brazil, 2004 to 2008

 

 

Silvia Natália Serafim CabralI; Solange Laurentino dos SantosII; Alexandre Barbosa BeltrãoI; Lia Giraldo da Silva AugustoI

IFaculdade de Ciências Médicas, Universidade de Pernambuco, Recife-PE, Brasil
IIDepartamento de Medicina Social, Universidade Federal de Pernambuco, Recife-PE, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: descrever a ocorrência de leucemia linfocítica aguda (LLA) na região onde será instalada refinaria de petróleo, no estado de Pernambuco, Brasil.
MÉTODOS: estudo descritivo da LLA em menores de 15 anos atendidos em dois centros de referência para câncer infantil - Centro de Oncohematologia Pediátrico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz; e Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira [Instituto Materno-Infantil de Pernambuco (IMIP)] - no período de 2004 a 2008, provenientes dos municípios de Cabo de Santo Agostinho, Escada, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes e Moreno.
RESULTADOS: foram identificados 18 casos de LLA em menores de 15 anos provenientes desses municípios, nos dois centros de referência; a maior frequência de casos ocorreu no grupo de menores de 4 anos, com predomínio do sexo masculino.
CONCLUSÃO: faz-se necessário organizar o sistema de vigilância da saúde ambiental infantil na região, com a participação da Atenção Básica em Saúde.

Palavras-chave: Leucemia Linfocítica Aguda; Neoplasias; Vigilância Sanitária Ambiental; Petróleo.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to describe the occurrence of Acute Lymphocytic Leukemia (ALL) in the state of Pernambuco, Brazil, where a petroleum refinery will be installed.
METHODS: descriptive study of ALL in minors under age 15 assisted at two referral centers for childhood cancer - Centro de Oncohematologia Pediátrico/Hospital Oswaldo Cruz; and Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira [Instituto Materno-Infantil de Pernambuco (IMIP)] - in the period 2004-2008, from the municipalities of Cabo de Santo Agostinho, Escada, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes and Moreno.
RESULTS: the authors identified, in both referral centers, 18 cases of ALL in minors under 15 living in these municipalities; the highest frequency occurred in the group with children under 4, with male predominance.
CONCLUSION: it is necessary to organize the surveillance system on children's environmental health in the region, with the participation of the Primary Health Care.

Key words: Precursor Cell Lymphoblastic Leukemia; Neoplasms; Environmental Health Surveillance; Petroleum.


 

 

Introdução

No Brasil, o câncer representa a segunda causa de morte na população, atrás apenas das doenças do aparelho circulatório. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), órgão ligado ao Ministério da Saúde, estimam-se 489.270 novos casos de câncer no Brasil para o ano de 2010.1 Com o aumento dos registros do número de casos novos nas últimas décadas, ressalta-se a importância da doença e sua relação com a urbanização e industrialização, visto que 70,0% da população concentram-se em grandes centros urbanos, um motivo que favorece a exposição aos fatores de risco ambientais, aos quais é atribuída relação direta ou indireta com 80,0% das ocorrências de câncer.2

O câncer infantil, ou seja, as neoplasias que acometem menores de 15 anos de idade,3 deve ser estudado separadamente do câncer do adulto por apresentar diferentes comportamentos clínicos. Os tumores infantis tendem a apresentar menores períodos de latência, em geral crescem rapidamente e são mais invasivos; porém, respondem melhor ao tratamento, sendo a leucemia o tipo mais comum nessa população.4

Os tumores infantis correspondem a um grupo altamente específico, geralmente são tumores embrionários, do sistema reticuloendotelial, do sistema nervoso central, do tecido conectivo e de vísceras, ao passo que tumores epiteliais são extremamente raros nessa faixa etária.5 Representam de 0,5 a 3,0% de todos os tumores na maioria das populações, sendo os tumores pediátricos mais comuns as leucemias, os linfomas e os tumores do sistema nervoso central. Estes estão definidos pela Classificação Internacional do Câncer na Infância (CICI-3) com base na sua morfologia, ao invés do local primário de origem do tumor como é nos adultos.6

A leucemia leufocítica aguda (LLA) é uma neoplasia maligna, caracterizada pelo acúmulo de células linfoides imaturas na medula óssea, sendo os sinais e sinto - mas apresentados pelos pacientes resultantes de graus variáveis de anemia, neutropenia, trombocitopenia e infiltração dos tecidos por células leucêmicas.7 O pico de incidência da LLA ocorre entre 2 e 5 anos de idade, o que corresponde a 25,0% de todos os cânceres em crianças nessa faixa etária.8

Existe uma maior frequência em países industrializados e em áreas urbanas.9 A etiologia é complexa e ainda não está bem definida, embora sejam enfatizados como possíveis condicionantes: radiação ionizante e não ionizante; exposição a drogas antineoplásicas; fatores genéticos associados; fatores imunológicos; e exposição a alguns vírus e produtos químicos.10

A radiação ionizante é um dos poucos fatores ambientais comprovados que está relacionado com a ocorrência de leucemia na infância. A magnitude do risco depende da dose da radiação, duração da exposição e idade do indivíduo no momento da exposição. Os efeitos potenciais de exposição a radiações ionizantes em crianças podem ocorrer durante a preconcepção, gravidez ou no período pós-natal.11

Os produtos químicos também podem estar relacionados à leucemia na infância, merecendo destaque os hidrocarbonetos e os pesticidas.11 O hidrocarboneto mais conhecido é o benzeno, agente cancerígeno humano que mantém uma forte relação de exposição-resposta positiva com leucemia.12 A associação de leucemias com exposição ao benzeno está muito bem estudada na literatura, como foi apresentada por Augusto,13 desde os primeiros casos relatados nas primeiras décadas do século XX até clássicos estudos epidemiológicos das décadas de 1970 e 1980.

Áreas urbano-industriais oferecem impactos crescentes na qualidade do ar, da água, do solo e, consequentemente, na saúde da população. Contraditoriamente, os padrões de consumo da sociedade moderna demandam um aumento na produção industrial com base na intensificação da exploração da natureza. Neste cenário, a indústria petroquímica ampliou sua produção mediante a revolução tecnológica da síntese química, dando ao petróleo um papel central como fornecedor de energia e matéria-prima para a manufatura de inúmeros bens de consumo.14 As refinarias de petróleo passam a constituir uma das atividades humanas de maior potencial poluidor, podendo afetar o ar, a água, o solo e, consequentemente, todo o meio biótico em seu entorno.14

Na expectativa de aumentar a produção de petróleo no Brasil, uma nova refinaria está sendo instalada no Complexo Industrial Portuário de Suape (CIPS).15 Assim, torna-se importante a criação de uma linha de base para conhecer a ocorrência da LLA em menores de 15 anos, no Território Estratégico de Suape, que abrange cinco municípios: Cabo de Santo Agostinho; Escada; Ipojuca; Jaboatão dos Guararapes; e Moreno. A LLA foi escolhida para este estudo por ser o câncer mais prevalente entre as crianças, ter um período de latência curto e por haver evidências científicas suficientes de sua relação com poluentes, especialmente os hidrocarbonetos aromáticos.16

O objetivo deste trabalho foi descrever a ocorrência de leucemia linfocítica aguda - LLA - em crianças menores de 15 anos de idade, no Território Estratégico de Suape, visando à criação de uma linha de base para o estudo da doença.

 

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo sobre a ocorrência de LLA nos centros de referência de câncer infantil, na Região Metropolitana e Litoral Sul de Pernambuco. A área de estudo foi composta por cinco municípios do Território Estratégico de Suape (TES) - Cabo de Santo Agostinho, Escada, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes e Moreno -, de acordo com a definição da Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco. Esses municípios fazem parte da I Gerência Regional de Saúde (GERES) de Pernambuco, à exceção do município de Escada que pertence à III GERES.

O Complexo Industrial Portuário de Suape, localizado entre os municípios do Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca, dista cerca de 40 quilômetros de Recife-PE.15 A definição dessa área para o presente estudo aconteceu por conta da proximidade desses municípios com a refinaria e em virtude destes serem seus principais fornecedores de mão de obra.

A população do estudo foi constituída por crianças e adolescentes menores de 15 anos de idade atendidos nos dois principais centros de referência para câncer infantil no estado de Pernambuco - Centro de Oncohematologia Pediátrico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (CEONHPE); e o setor de oncologia pediátrica do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira [Instituto Materno-Infantil de Pernambuco (IMIP)] - no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2008, cujo diagnóstico foi a leucemia linfocítica aguda e que eram provenientes da TES. Salienta-se que o IMIP representa o maior centro de pediatria do Estado, servindo de Hospital de Referência para o encaminhamento de casos pediátricos de LLA por outros centros de oncologia.

Os dados secundários referentes aos casos de LLA das crianças menores de 5 anos de idade foram coletados dos prontuários provenientes do CEONHPE e do IMIP, cujas variáveis elencadas foram: idade (faixas etárias: menor de 1 ano; 1 a 4 anos; 5 a 9 anos; e 10 a 14 anos); sexo (masculino e feminino); ano de diagnóstico (2004, 2005, 2006 2007 e 2008); raça/cor; e procedência (Cabo de Santo Agostinho, Escada, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes e Moreno). Foi considerada a idade do caso na data do diagnóstico que constava no prontuário. Os dados relacionados à caracterização da região do estudo foram coletados na Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)17 e no documento do Plano Estratégico de Suape.18

No período de 2004 a 2008, o tamanho médio anual da população total do Território Estratégico de Suape era de 1.004.677 habitantes, sendo Jaboatão dos Guararapes o município mais populoso, com uma média de 650.433 habitantes, seguido do Cabo de Santo Agostinho, com uma média de 169.982, o que representa 64,7 e 16,9% da população da área respectivamente. A população de menores de 5 anos nos cinco municípios da região correspondia a 1.440.448 habitantes, sendo o grupo na faixa etária de 10 a 14 anos o de maior população: 495.672 crianças.

Os dados de morbidade foram obtidos do Departamento de Informática do SUS (Datasus), pelo Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS). Para a caracterização das causas de internação, foram considerados os seguintes capítulos da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - Décima Revisão (CID-10): I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX e XX. Os casos de LLA foram classificados segundo os códigos C91 e C91-0 do capítulo II - Neoplasias da CID-10.

A análise dos dados foi feita mediante a organização em tabelas de frequências absolutas e relativas, com uso do Programa Office Excel 2007. A média foi a medida empregada para apresentação dos dados populacionais dos municípios do estudo. A prevalência foi a medida adotada para os dados de morbidade utilizando-se no denominador a população na faixa etária, segundo cada um dos municípios.

Este estudo, que corresponde a uma das partes do projeto 'Saúde Ambiental Infantil e Atenção Primária à Saúde', uma parceria entre a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco e o Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães/Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (HUOC), registrado com o no 083/2008, em conformidade com as normas previstas na Resolução CNS no 196/06, do Conselho Nacional de Saúde.

 

Resultados

No que se refere à morbidade hospitalar em menores de 15 anos de idade na TES, de acordo com a CID-10, o grupo das doenças do ouvido e apófise mastoide (capítulo VIII) foi responsável pelo maior número de internações, seguido pelo grupo das doenças do aparelho geniturinário (capítulo XIV). O grupo das neoplasias (capítulo II) ocupou a oitava posição, com 1,84% do total da morbidade hospitalar (Tabela 1).

 

 

Na caracterização dos casos de LLA em menores de 15 anos, na área de abrangência de Suape, foram identificados nos dois centros de referência, IMIP e CEONHPE, 18 casos de leucemia linfocítica aguda, sendo 17 casos no IMIP e apenas 1 no CEONHPE.

Em relação à distribuição dos casos segundo município de residência, pôde-se verificar que o município de Jaboatão dos Guararapes referiu o maior número de casos (n=11), apresentando coeficiente de prevalência de 1,22 por 100 mil habitantes; porém, o município com maior coeficiente de prevalência para o período total foi Ipojuca (1,76 casos/100 mil hab.), seguido do município de Moreno (1,25 casos/100 mil hab.) (Tabela 2).

 

 

Na análise dos dados segundo o sexo, observa-se a maior ocorrência de leucemia linfocítica aguda em pacientes do sexo masculino (78,0%), quando com - parada à ocorrência em pacientes do sexo feminino (22,0%): uma razão de 3,5:1.

Em relação à distribuição por faixa etária, foi encontrado um maior número de casos entre 1 e 4 anos, seguida da faixa etária de 5 a 9 anos, totalizando 83,3% do total dos casos do Território Estratégico de Suape (Tabela 3).

 

 

Discussão

Os resultados demonstraram a ocorrência de casos de LLA em menores de 15 anos de idade distribuída de forma diferenciada entre os municípios estudados que compõem o Território. Os 17 casos registrados no Hospital de Referência/IMIP podem ser indício desta unidade servir como referência no atendimento de casos de LLA, pela resposta positiva que a instituição de saúde tem dado na atenção ao paciente, como também pela reorganização institucional por que esta vem passando nos últimos anos. O IMIP é uma instituiçao que, atualmente, passa por uma expansão de atendimento e ampliaçao de sua rede de atençao à saúde no estado de Pernambuco. Por outro lado, o número reduzido de casos de LLA no CEONHPE pode ser devido à ser referência no atendimento dos tumores sólidos, em relaçao aos casos de LLA.

Este estudo apresentou limitações importantes, relacionadas ao viés de registro e de diagnóstico que não foi possível de ser controlado, uma vez que os dados utilizados foram secundários. O tempo de residência na área dos casos identificados de LLA, os casos tratados e diagnosticados em outras instituições, além do subregistro, podem constituir limitações adicionais.

Outra limitação observada por estes autores foi relacionada às variáveis 'raça' e 'ocupação dos pais'. Em relação à raça, o registro foi observado em apenas um prontuário, enquanto no que diz respeito à ocupação e antecedentes dos pais, não se verificou esse registro em qualquer dos prontuários das crianças atendidas no IMIP e no CEONHPE. Dados relativos a tais características merecem especial atenção, no contexto de uma região como o Nordeste do Brasil, marcada por forte desigualdade socioambiental, além de contribuir para uma melhoria na investigação de morbidades, entre elas as leucemias.19

A existência de incompletudes de variáveis importantes para a vigilância, como também foi observado no estudo realizado por Cazarin e colaboradores20 em um centro de referência de hematologia em Pernambuco, demonstra que ainda não está internalizada entre os profissionais de saúde a preocupação com as situações de riscos ambientais e ocupacionais para a saúde, mesmo quando estes já são bem conhecidos e pertencentes a uma cadeia de causalidade de determinados agravos, incluindo patologias graves. Isso pode ser comprovado pela ausência do registro de dados relativos à atividade ocupacional dos pais das crianças portadoras de leucemia linfocítica aguda. Recente estudo demonstrou uma correlação positiva entre pesticida e prematuridade, baixo peso ao nascer e anomalia congênita, sendo a ocupação dos pais uma informação importante e necessária para a compreensão dessa questão.21

Na análise das morbidades, observou-se que a população infantil dessa região sofre com as doenças respiratórias (23,4%) e também com as doenças relacionadas às condições do saneamento ambiental inadequado, como as infecciosas e parasitárias (19,0%).22 Programas específicos de intervenção têm dado prioridade ao grupo das doenças infecciosas e parasitárias mediante ações como o Projeto Sanar - Programa de Enfrentamento às Doenças Negligenciadas -,23 cujas ações pretendem atuar na causalidade socioambiental dos grupos mais vulneráveis.

Entre os fatores relacionados à saúde da criança e do adolescente, as condições ambientais são bastante relevantes. Além da dificuldade de acesso a água, saneamento e habitação nos países em desenvolvimento,24 outras questões, como a contaminação do meio ambiente por agentes químicos, têm sido associadas ao aumento da prevalência de agravos em crianças, como malformações congênitas, asma, câncer, distúrbios neurológicos, hepáticos, dermatológicos, gástricos, endócrinos, alérgicos e comportamentais.25

Estudos epidemiológicos sobre as leucemias agudas em crianças têm examinado uma série de fatores de risco, no esforço para determinar a etiologia da doença. O conhecimento a respeito dos fatores ambientais de risco para as leucemias pode ser usado para subsidiar medidas que visem à redução de riscos e, consequentemente, do risco da doença.26

Em relação aos problemas de registro observados no CEONHPE, não foi possível esclarecer suas razões. É recomendável um estudo descritivo com base na análise de prontuários, semelhante ao estudo realizado por Cazarin e colaboradores,20 que confirmaria se há ocorrência de casos com diagnóstico de LLA no CEONHPE ou se ocorreu falha no registro de base hospitalar.

O predomínio de LLA no sexo masculino também foi observado por Silva,27 em estudo realizado no período de 1994 a 1998, em um centro de referência para tratamento do câncer pediátrico no estado de Santa Catarina, porém com uma diferença menor; e por Reis e colaboradores,28 quando analisaram os casos de câncer pediátrico em vários Estados do país, a partir dos Registros de Câncer de Base Populacional.

A implantação da refinaria de petróleo no Polo Industrial de Suape poderá trazer impactos negativos, não só para o meio ambiente como também para a saúde da população que vive ao seu redor.29 O segmento infantil apresenta-se como bastante vulnerável a alterações ambientais e, portanto, pode servir como um grupo sentinela na vigilância à saúde da população como um todo.

Outro aspecto a ser considerado refere-se à alta densidade populacional apresentada nos cinco municípios da região. O fato de haver mais de um milhão de habitantes residindo nessa área servirá, ainda, como uma linha de base de migração populacional, considerando-se que o processo de desenvolvimento a ser instalado é um fator de aumento da densidade populacional para a região. Esse crescimento e adensamento da população demandará do poder público uma organização política e estrutural de extrema importância para a manutenção de serviços que deem proteção social a esses moradores.

Diante disso, ressalta-se a importância do registro, nos prontuários dos serviços que atendem crianças, de informações que possam estar relacionadas a questões ambientais, como local de residência, ocupação dos pais e antecedentes familiares. É fundamental que, além do diagnóstico, faça-se a correlação com o aspecto epidemiológico e socioambiental, o que permitirá uma ação preventiva mais abrangente.20

Nos territórios de atuação da Atenção Básica, é necessário selecionar indicadores para a vigilância da saúde das crianças no contexto onde vivem e trabalham os pais. E que essas ações de vigilância da saúde - epidemiológica, ambiental e do trabalhador - sejam congruentes com os contextos de nocividade e de exposição da população a agentes tóxicos, requerendo, portanto, ações prioritárias na organização do sistema de informações em saúde.20

A observação da ocorrência de leucemia linfocítica aguda em menores de 15 anos de idade residentes em municípios que compõem o Território Estratégico de Suape no período de 2004 a 2008, a verificação da maior prevalência da doença no município de Ipojuca, do grupo de crianças do sexo masculino como o de maior percentual de ocorrências e da faixa etária de 1 a 4 anos como a de maior concentração de casos são indicadores importantes na caracterização da Linha de Base para as vigilâncias dos municípios que compõem o Território, assim como para os demais municípios do estado de Pernambuco.

 

Agradecimentos

Ao Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, da Secretaria de Vigilância da Saúde do Ministério da Saúde - DSAST/SVS/MS -, pelo financiamento.

À Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco.

À Secretaria Municipal de Saúde da Cidade de Recife-PE.

Ao Instituto Materno-Infantil de Pernambuco - IMIP - e ao Centro de Oncohematologia Pediátrico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz - CEONHPE -, pelo fornecimento de dados.

 

Contribuição dos autores

Cabral SNS e Santos SL foram responsáveis pela concepção e delineamento do estudo, análise e interpretação dos dados. Beltrão AB colaborou na redação. Augusto LGS foi responsável pela revisão crítica e revisão da versão final.

Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito.

 

Referências

1. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Câncer na criança e no adolescente no Brasil: dados dos registros de base populacional e de mortalidade. Rio de Janeiro: INCA; 2008 [acessado 13 abr. 2010]. Disponível em: http://www.inca.gov.br/tumores_infantis/

2. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. A situação do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INC; 2006. p.119.

3. Teixeira RAP, Bruniera P, Cusato MP, Borsato ML. Câncer infantil. In: Bacarat FF, Fernandes HJJ, Silva MJ. Cancerologia atual: um enfoque multidisciplinar. São Paulo: Rocca; 2000. p. 426-451.

4. Latorre MRDO. Epidemiologia dos tumores da infância. In: Camargo B. Lopes LF. Pediatria oncológica: noções fundamentais para pediatria. São Paulo: Lemar; 2000. p.7-27.

5. Fundação Antônio Prudente. Tumores pediátricos. Registro hospitalar de câncer; 1997 [acessado 26 nov. 2009]. Disponível em http://www.hcanc.org.br

6. Kramarová E, Stiller CA, Ferlay J, Parkin DM, Draper GJ, Michaelis J, et al. Classificação internacional do câncer na infância 1996. Relatório técnico n° 29. Rio de Janeiro: INCA; 1999.

7. Kebriae P, Anastasi J, Larson RA. Acute lymphoblastic leukemia: diagnosis and classification. Best Practice Research Clinical Haematology. 2003; 15(4):597-621.

8. Mauer AM. Acute lymphocytic leukemia. In: WILLIAM WJ. Hematology. 5a ed. New York: McGraw-Hil; 1995. p.1004-101.

9. Farhi DC, Rosenthal NS. Acute lymphoblastic leukemia. Clinics Laboratory Medicine. 2000; 20(1):17-28.

10. Lopes LF, Mendes WL. Leucemias na infância. In: Camargo B, Lopes LF. Pediatria oncológica: noções fundamentais para pediatria. São Paulo: Lemar; 2000. p.109-18,

11. Belson M, Kingsley B, Holmes A. Risk for acute leukemia in children: the leukemia in children: a review. Environ Health Perspect. 2007; 115(1):138-145.

12. Ruiz M, Vassalo J, Souza CA. Alterações hematológicas em pacientes expostos cronicamente ao benzeno. Revista de Saúde Pública. 1993; 27(2):145-141.

13. Augusto LGS. Estudo longitudinal e morfológico (medula óssea) em pacientes com neutropenia secundária à exposição ocupacional crônica ao benzeno [Dissertação de Mestrado]. Campinas (SP): Universidade estadual de Campinas; 1991.

14. Mariano JB. Impactos ambientais do refino de petróleo [Dissertação de Mestrado]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2001.

15. Pires Advogados & Consultores. Estudo de impacto ambiental (EIA) de SUAPE/CIPS. Recife: CPRH; 2000.

16. Blumer JL, Dunn R, Esterhay MD, Yamashita TS, Gross S. Lymphocyte aromatic hydrocarbon responsiveness in acute leukemia of childhood. Blood. 1981; 58(6):1081-1088.

17. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico e contagem da população [acessado em 2008]. Disponível em http://www.ibge.gov.br/home.

18. Governo do Estado de Pernambuco. Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco. Plano território estratégico de Suape: diretrizes para uma ocupação sustentável. Pernambuco: Secretaria Estadual de Saúde; 2011 [acessado em 2008]. Disponível em http://200.238.107.83/web/condepe-fidem/apresentacao10

19. Vieira ACS. Redução da pobreza e da desigualdade de renda no Nordeste. Subsídios para aprofundar a discussão. No prelo 2012.

20. Cazarin G, Augusto LGS, Melo RAM. Doenças hematológicas e situações de risco ambiental: a importância do registro para a vigilância epidemiológica. Revista Brasileira de Epidemiologia. 2007; 10(3):380-390.

21. Siqueira MT, Braga C, Cabral-Filho JE, Augusto LG, Figueiroa JN, Souza AL. Correlation between pesticide use in agriculture and adverse birth outcomes in Brasil: an ecological study. Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology. 2010; 84(6):647-651.

22. Amorin L, Kuhn M, Blank VLG, Gouveia N. Saúde ambiental nas cidades. Tempus Actas em Saúde Coletiva. 2009; 3(4):111-120.

23. Governo do Estado de Pernambuco. Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco. Secretaria Executiva de Vigilância em Saúde. Plano para redução e eliminação das doenças negligenciadas no Estado de Pernambuco 2011-2014: versão preliminar. Pernambuco: Secretaria Estadual de Saúde; 2011.

24. Bellamy C. Healthy environments for children. Bulletin of the World Health Organization. 2003; 81(3):157

25. Landrigan PJ, Garg A. Chronic effects of toxic environmental exposures on children.s health. Journal of Toxicology Clinical toxicology. 2002; 40(4):449-456.

26. Lopes ER, Mendonça GAS, Goldfarb LMCS, Aguinaga S, Costa-E-SILVA VL, Mattos IE, et al. Câncer e meio ambiente. Revista Brasileira de Cancerologia. 1992; 38(1):35-64.

27. Silva DB, Povaluk P. Epidemiologia das leucemias em crianças de um Centro de Referência Estadual. Arquivos Catarinense de Medicina. 2000; 29(1/4):3-9.

28. Reis RS, Santos MO, Thuler LCS. Incidência de tumores pediátricos no Brasil. Revista Brasileira de Cancerologia. 2007;1(53):5-15.

29. Gouveia N. Saúde e meio ambiente nas cidades: os desafios da saúde ambiental. Saúde e Sociedade. 1999; 8(1):49-61.

 

 

Endereço para correspondência:
Faculdade de Ciências Médicas,
Universidade de Pernambuco,
Rua Padre Nestor de Alencar, 6268, apto. 302,
Candeias, Jaboatão dos Guararapes-PE, Brasil.
CEP: 54450-220
E-mail: silvianscabral@hotmail.com

Recebido em 29/05/2012
Aprovado em 14/11/2012

 

 

*Pesquisa financiada pelo Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde - DSAST/SVS/MS.