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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.21 n.4 Brasília dez. 2012

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742012000400011 

ARTIGO ORIGINAL

 

Detecção de infecção pelo vírus da hepatite B nos municípios brasileiros segundo cobertura dos serviços de hemoterapia, no período de 2001 a 2008*

 

Detection of infection by hepatitis B virus in the brazilian municipalities according to the coverage of hemotherapy services, in the period from 2001 to 2008

 

 

Letícia Gomes CostaI; Regiane Cardoso de PaulaII; Eliane IgnottiIII

IAcadêmica do Curso de Enfermagem, Universidade do Estado de Mato Grosso, Cáceres-MT, Brasil
IIInstituto de Ensino e Pesquisa Educatie, São Paulo-SP, Brasil
IIIPrograma de Mestrado em Ciências Ambientais, Universidade do Estado de Mato Grosso, Cáceres-MT, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: descrever a taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B no Brasil e a razão de taxas de detecção nos municípios segundo cobertura dos serviços de hemoterapia (SH) durante o período 2001-2008.
MÉTODOS: estudo descritivo, compreendeu o cálculo da taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B por sexo, faixa etária, Regiões brasileiras e presença de SH; regressão linear para tendência; teste de qui-quadrado para comparação de proporções da detecção e razão de taxas; os dados foram coletados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan-NET).
RESULTADOS: a taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B apresentou incremento no Brasil, sendo 2,4 vezes mais elevada nos municípios com SH.
CONCLUSÃO: a detecção da infecção pelo vírus da hepatite B apresentou pequeno incremento no período estudado e em todas as Regiões brasileiras foram encontradas taxas mais elevadas em municípios com serviço de hemoterapia.

Palavras-chave: Hepatite B; Incidência; Sexo; Serviço de Hemoterapia; Epidemiologia Descritiva.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to describe the detection rate of infection by hepatitis B virus in Brazil and detection rates ratio in municipalities regarding hemotherapy service (HS) during the period 2001-2008.
METHODS: a descriptive study reached the detection rate of infection by hepatitis Bvirus by gender, age, Brazilian macro-regions and presence of HS; it was applied linear regression for trend, and chi-squared test to compare proportions of detection and ratio rates; datafrom the Reportable Diseases Database (Sinan-NET) was used.
RESULTS: the detection rates of infection by hepatitis B virus showed increase in Brazil, and were 2.4 higherin municipalities with HS.
CONCLUSION: the detection of infection by hepatitis B virus showed small increase during the study period, and all Brazilian regions presented higher rates in municipalities with hemotherapy service.

Key words: Hepatitis B; Incidence; Sex, Hemotherapy Service; Epidemiology, Descriptive.


 

 

Introdução

Hepatite B é uma inflamação do fígado causada por um vírus: VHB, ou vírus da hepatite B. Devido a sua alta especificidade, o VHB infecta um número restrito de espécies de primatas, entre elas a humana, que constitui o reservatório natural da doença. O risco para infecção crônica varia de acordo com a idade.1-5

A transmissão do VHB se faz por via parenteral, vertical, por solução de continuidade, por contato íntimo domiciliar, transfusão de sangue e hemoderivados; e sobretudo, pela via sexual, sendo considerada uma doença sexualmente transmissível.3,4 Concentrações moderadas ocorrem no sêmen e no fluido vaginal; e concentrações menores, na saliva. O vírus da hepatite B é, aproximadamente, 100 vezes mais infectante que o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e dez vezes mais do que o vírus da hepatite C (VHC). O VHB circula em altas concentrações no sangue e em secreções de feridas.4

Nos primeiros anos de vida, a transmissão vertical ou horizontal ocorre, comumente, em regiões de alta endemicidade como a África, o Sudeste Asiático e a China, enquanto em regiões de baixa endemicidade, como a Europa, os Estados Unidos da América (EUA) e a Austrália, a contaminação é predominantemente horizontal.6

No ano de 2008, a prevalência mundial do VHB foi estimada em cerca 350 milhões de infectados cronicamente,3,4 com distribuição variada e prevalências baixas, inferiores a 2,0%, na Europa Ocidental, na América do Norte, na Nova Zelândia e na Austrália, no Japão, até prevalências superiores a 8,0%, estas encontradas na África, no Sudeste Asiático e na China.7,8

Na América Latina, a hepatite B é considerada endêmica e estima-se que 400 mil casos novos da doença ocorram a cada ano.9,10 O aumento na prevalência da doença ocorre a partir dos 16 anos de idade, sugerindo a transmissão sexual como a principal via de infecção.11

Os registros de doenças transmissíveis são influenciados por características da doença, que incluem tanto os mecanismos de transmissão como a capacidade dos serviços de saúde em captar os casos. No Brasil, o serviço de hemoterapia, componente da Hemorrede Nacional, foi regulamentado em 2001,12 quando os casos de hepatite B passaram a ser identificados com maior frequência.

No ano de 2009, as regiões Sudeste e Sul concentraram, respectivamente, 36,6 e 31,6% dos casos notificados. Quanto à taxa de detecção por 100 mil habitantes, a região Sul apresenta as maiores taxas, seguida pela região Norte.13

A hepatite B é um problema de saúde importante em todo o mundo. Quando a infecção pelo VHB cursa de forma assintomática, a doença pode cronificar, causando complicações tardias. A cirrose e o câncer hepático são as principais complicações da hepatite B.5

Considerando-se a natureza contagiosa da doença, mantida mesmo quando o indivíduo não apresenta qualquer sintoma, e a possibilidade de as infecções serem insuficientemente notificadas, a prevalência de hepatite B pode ser subestimada em localidades com menor acesso aos serviços de hemoterapia;1,14 ao contrário, ela pode ser mais frequentemente notificada em localidades com serviços de hemoterapia instalados. Comparar áreas com e sem tais serviços possibilita uma abordagem aproximada da carga da doença no país.

Este estudo tem por objetivo descrever a taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B no Brasil e a razão das taxas de detecção nos municípios segundo a existência de serviço de hemoterapia, no período de 2001 a 2008.

 

Métodos

Estudo descritivo da detecção da infecção pelo vírus da hepatite B no Brasil no período de 2001 a 2008. O indicador em estudo foi a taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B: (casos confirmados residentes em um determinado local e período/população do mesmo local e período) X 100 mil habitantes. Foram utilizados os dados de hepatite B do Brasil por estados, municípios e região geográfica, por faixa etária e sexo e por municípios com e sem rede de serviço de hemoterapia, para o cálculo das taxas. Como casos detectados, foram selecionados todos os casos notificados, considerando-se o município de notificação, independentemente do tipo de manifestação clínica da doença.

Os dados sobre hepatite B são provenientes do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan-NET), captados pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus: www.datasus.gov.br). Considera-se caso de hepatite B o indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente um ou mais marcadores sorológicos reagentes ou exame de biologia molecular para hepatite B.13 No presente estudo, as taxas de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B referem-se ao conjunto de doentes com hepatite B crônica e aguda, além de indivíduos assintomáticos portadores do marcador HBsAg.

As estimativas populacionais para os anos de 2001 a 2008 foram disponibilizadas pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os dados sobre a rede física dos serviços de hemoterapia que integram a Hemorrede Nacional foram obtidos do 'Caderno de informação: sangue e hemoderivados', do Ministério da Saúde.14 Este estudo utilizou-se dos dados dos hemocentros coordenadores, hemocentros regionais, núcleos de hemoterapia, unidades de coleta e transfusão e unidades de coleta, considerados serviços de hemoterapia que integram a Hemorrede Nacional.

De acordo com a Resolução RDC/Anvisa no 151, de 21 de agosto de 2001,12 a Hemorrede Nacional é coordenada, no nível federal, pela Gerência Geral de Sangue, outros Tecidos e Órgãos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do Ministério da Saúde, enquanto nos estados e Distrito Federal, pelo gestor do Sistema Único de Saúde - SUS.

Definiu-se, como período deste estudo, os anos de 2001 a 2008. Considerando-se que o Sinan foi implantado em 1998, o período de 1998 a 2000 (três anos) foi compreendido como o tempo necessário para a implantação do programa e do fluxo de informações em todos os níveis hierárquicos do SUS. Para a análise de dados, as agregações etárias foram definidas de acordo com a forma disponibilizada pelo Sinan até a faixa etária de 39 anos, categorizadas em: menores de 1 ano; 1 a 4; 5 a 9; 10 a 14; 15 a 19; e 20 a 39 anos de idade. Para facilitar a comparação dos resultados com a maioria dos estudos, as faixas etárias de 40 a 59, 60 a 64 e 65 a 69 anos foram agrupadas em um único estrato: 40 a 69. Realizou-se (i) o cálculo da taxa de detecção de infecção pelo VHB segundo sexo, faixa etária e regiões brasileiras, para o ano de 2008; e (ii) a análise da série histórica e da taxa média da detecção de 2001 a 2008, segundo presença de serviço de hemoterapia. Calculou-se a razão das taxas de detecção médias dos municípios que apresentam serviços de hemoterapia e daqueles que não apresentam tais serviços, para o ano de 2008, segundo unidades da Federação. Optou-se pelo maior detalhamento das análises para o último ano de estudo: 2008.

Foi utilizada regressão linear simples, para avaliar a tendência da taxa de detecção de infecção pelo vírus da hepatite B no Brasil. O teste qui-quadrado foi utilizado para comparar as proporções da ocorrência da doença entre os sexos, para cada grupo etário e região geográfica do país, e a razão das taxas de detecção foi utilizada para comparar a diferença na detecção da doença nos municípios com e sem serviço de hemoterapia, estratificados por regiões geográficas. Os testes estatísticos foram realizados pelo programa computacional Epi Info versão 3.5.2.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT - em agosto de 2011, sob o Protocolo no 97/2011.

 

Resultados

Na Tabela 1, observa-se a detecção de infecção pelo vírus da hepatite B por 100 mil habitantes, segundo sexo e faixa etária nas regiões geográficas brasileiras, para o ano de 2008. Nas regiões Sudeste e Sul, a detecção de infecção pelo VHB foi significativamente mais elevada entre o sexo masculino, enquanto nas regiões Norte e Centro-Oeste, prevaleceu o sexo feminino. Para a região Nordeste, não foi verificada diferença estatisticamente significante entre os sexos.

 

 

Em relação à faixa etária, a ocorrência de hepatite B foi mais elevada a partir dos 15 anos de idade, em todas as regiões estudadas. Igualmente em todas as cinco macrorregiões brasileiras, a detecção do VHB na faixa etária dos 40 aos 69 anos foi mais elevada para o sexo masculino, exceto na região Norte. Para o sexo feminino entre 15 e 39 anos de idade, a detecção de infecção pelo vírus da hepatite B foi significativamente maior nas regiões Centro-Oeste, Sul e Norte; na região Sudeste, a detecção no sexo feminino foi mais elevada entre os 15 e os 19 anos de idade.

A detecção de hepatite B entre menores de 1 ano mostrou-se mais elevada na região Centro-Oeste, com 4,2 casos por 100 mil habitantes desse grupo etário. Nenhuma região apresentou diferença significante na detecção de hepatite B entre os sexos, na primeira faixa etária.

A Tabela 2 apresenta as taxas médias de detecção de infecção pelo VHB por 100 mil habitantes, segundo presença de serviço de hemoterapia, número de municípios (n) e razão de taxas para o Brasil, regiões e unidade da federação no ano de 2008. Para todas as macrorregiões brasileiras, a taxa média de detecção de hepatite B foi mais elevada nas localidades providas de serviço de hemoterapia, resultando em uma razão de taxas de detecção de 2,4 casos a mais. As razões de taxas de detecção de hepatite B em locais com e sem serviço de hemoterapia mostraram maiores diferenças nas regiões Norte, Sudeste e Nordeste - respectivamente 2,7, 2,9 e 1,8 vezes mais elevadas que nas localidades sem o serviço. O estado do Pará apresentou razão de taxas de detecção de hepatite B 8,7 vezes mais elevada em municípios com serviço de hemoterapia, seguido pelo estado do Maranhão com 7,4.

 

 

A Figura 1 mostra a detecção de hepatite B por 100 mil habitantes segundo presença de serviço de hemoterapia no Brasil, no período de 2001 a 2008. Nos municípios em que não há esse serviço, a detecção de hepatite B é menor ao longo de toda a série estudada, comparativamente a detecção da doença nos municípios que dispõem do serviço. Tanto para o Brasil quanto para os locais com e sem serviço de hemoterapia, a detecção de hepatite B apresentou-se crescente de 2001 a 2005, com flutuação no período de 2006 a 2008. A linha de tendência para o Brasil mostra um incremento médio de 30,0% ao ano na detecção de infecção pelo vírus da hepatite B.

 

 

Discussão

Em todas as regiões brasileiras, a taxa média de detecção de hepatite B foi mais elevada em localidades com serviços de hemoterapia instalados. Tais achados decorrem, possivelmente, da introdução da pesquisa de marcadores sorológicos, ou seja, do acesso ao diagnóstico laboratorial.

A pesquisa do HBsAg, primeiro marcador a aparecer no curso da infecção pelo vírus da hepatite B, tem sido realizada desde 1989 nos pré-doadores de sangue, para evitar a transmissão parenteral do VHB.15,16 Desde1993, a pesquisa do anti-HBc total, marcador das infecções agudas - pela presença de IgM - e das infecções crônicas - pela presença da IgG -, vem aumentando a sensibilidade da triagem.17,18

Ao analisar a detecção de hepatite B segundo a presença de serviços de hemoterapia instalados, devem ser considerados elementos como: heterogeneidade socioeconômica; distribuição irregular dos serviços de saúde; incorporação desigual de tecnologia avançada para diagnóstico e tratamento da enfermidade;1 e descolamento de pessoas dos municípios de menor porte para municípios maiores e melhor servidos de aparato diagnóstico. Outros aspectos relevantes são as fontes de notificação compulsória dos casos, constituídas principalmente por serviços de assistência médica, hemocentros e bancos de sangue, clínicas de hemodiálise e laboratórios.19

Ainda que o presente estudo tenha utilizado todos os casos notificados da base de dados do Sinan, independentemente do tipo de manifestação clínica da doença, a presença de serviços de hemoterapia pode estar relacionada à maior demanda, devido às doações de sangue, e consequentemente, à maior detecção da infecção pelo VHB. No entanto, os resultados das pesquisas de marcadores sorológicos em doadores de sangue não devem ser considerados indicadores de infecção para o VHB em nível populacional, visto que o doador deve ter entre 18 e 60 anos de idade, além de cumprir outros critérios - os quais podem excluir o candidato à doação por um período temporário ou definitivo.17 Características do perfil do doador, como sexo e faixa etária, também são relevantes. Pesquisa a respeito do perfil de doadores e não doadores mostra que entre os não doadores, destaca-se o sexo feminino e a faixa etária de 20 a 24 anos, enquanto entre os doadores, prevalece o sexo masculino e a faixa etária de 30 a 39 anos.18

As elevadas razões de taxas de detecção de infecção pelo VHB segundo cobertura de serviço de hemoterapia, verificadas nas regiões Norte e Nordeste, podem indicar subnotificação dos casos de hepatite B nos municípios de menor porte, provavelmente por deficiência no diagnóstico, devida a dificuldades de acesso aos serviços hemoterápicos. Nos municípios de menor porte, baixas coberturas vacinais são verificadas,20 não obstante saiba-se que a cobertura vacinal não é adequada, inclusive em localidades do Sudeste brasileiro.21

A elevada razão de taxas de detecção de hepatite B da região Sudeste deve-se, possivelmente, à presença de serviços mais estruturados de hemoterapia, em oposição àqueles - implantados mais recentemente - nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Neste estudo, entretanto, a comparação das razões de taxas não se refere à comparação de endemicidade entre regiões ou unidades federadas. Observam-se razões de taxas elevadas em áreas de baixa e alta endemicidade. Trata-se portanto, da comparação de carga de doença nos municípios dentro da unidade da federação, reveladora de deficiências no acesso aos serviços de diagnóstico da hepatite B.

De acordo com o Ministério da Saúde,14 a coleta de sangue no Brasil, no âmbito do SUS, apresentou um acréscimo de 12,7% entre os anos de 2004 e 2005, passando de 2.747.519 em 2004 para 3.096.181 procedimentos em 2005. Entre os anos de 2005 e 2006, houve um decréscimo de 3.096.181 para 3.065.352 procedimentos; ou seja, em 2005, foram realizadas 1,0% coletas de sangue a mais que em 2006.14 Estes dados podem explicar a diminuição da detecção de hepatite B em 2006. Já em 2007, ressalta-se que, a partir da compilação dos dados do setor privado, houve acréscimo de aproximadamente 529 mil coletas,3 fato possivelmente relacionado com o aumento da detecção de hepatite B naquele ano.

No Brasil, a detecção de hepatite B foi significativamente mais elevada para o sexo feminino na faixa etária de 15 a 39 anos, e para o sexo masculino entre os 40 e os 69 anos. A detecção de hepatite B torna-se mais elevada a partir dos 15 anos de idade, para todas as regiões estudadas e independentemente do sexo. Este fato se deve, provavelmente, ao estilo de vida, transmissão sexual, transfusional, e a comportamentos que oferecem maior risco, a exemplo do uso de drogas injetáveis e de relações sexuais sem preservativos e com vários parceiros.11,22

É provável que a maior detecção no sexo feminino com idade entre 15 e 39 anos esteja relacionada a fatores de risco, como a multiplicidade de parceiros sexuais, relações sem preservativos e práticas da comercialização da atividade sexual.23 Situações de desigualdade nas relações de gênero, em que prevalece a dominação masculina, principalmente nas parceiras fixas, podem estar associadas à maior vulnerabilidade das mulheres ao VHB nessa faixa etária, dada sua dificuldade, na negociação do uso do preservativo com os homens.24

Para o sexo masculino na faixa dos 40 aos 69 anos, é possível que os achados deste estudo estejam relacionados a fatores que incluem atividades sexuais extraconjugais sem o uso de preservativos.25 No que se refere ao perfil sorológico, a taxa de desaparecimento do HBsAg no plasma é menor no sexo masculino,26 o que justifica maior detecção da doença entre homens; além disso, a idade acima de 40 anos constitui fator de risco para a redução da imunogenicidade da vacina contra hepatite B.1,27,28 Outro aspecto a ser considerado reside nas doações de sangue, em que o sexo masculino representa a maioria dos doadores.19,29,30

A detecção de hepatite B entre menores de 1 ano foi mais elevada do que para as idades de 1 a 14 anos. Esta situação pode indicar a importância da rota de transmissão vertical, assim como uma qualidade insatisfatória do atendimento pré-natal. A maior detecção entre os menores de 1 ano foi encontrada na região Centro-Oeste; porém, a região Sudeste apresentou o maior número de casos registrados. No Brasil, a redução na ocorrência de hepatite B em crianças de 1 a 14 anos pode estar relacionada à inclusão da vacina contra hepatite B no calendário do Programa Nacional de Imunização (PNI), implementada em 1997.

Este estudo tem como limitações (i) a utilização de uma única fonte de dados (Sinan), sem a complementação de outras, bem como de fontes inerentes aos estudos realizados a partir de bases de dados secundárias, com a possibilidade de subnotificações de casos diagnosticados; e (ii) da inclusão de registros de casos falsos positivos, ainda que esta segunda hipótese seja menos provável que a primeira. No entanto, a implantação dos serviços de hemoterapia e a disponibilização dos dados possibilitam maior acesso aos números de ocorrência da infecção no país, ainda que se refiram a casos anti-HBsAg. Trata-se de importante avanço no que diz respeito à vigilância da hepatite B, facilitando a realização dos estudos epidemiológicos.

A detecção de hepatite B apresentou aumento no período de 2001 a 2004 e flutuações no período de 2005 a 2008. Em todas as regiões brasileiras, alcançou-se taxas médias de detecção mais elevadas nos municípios onde há serviço de hemoterapia, o que caracteriza dificuldade de acesso ao diagnóstico da hepatite B e importante subnotificação de casos onde não se dispõe desse serviço.

 

Contribuição dos autores

Costa LG participou da elaboração do manuscrito e análise de dados.

Paula RC participou da revisão do texto e das referências bibliográficas.

Ignotti E participou da revisão do texto e da análise de dados.

 

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Endereço para correspondência:
Universidade do Estado de Mato Grosso,
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Cáceres-MT, Brasil.
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E-mail: eliane.ignotti@pq.cnpq.br

Recebido em 09/04/2012
Aprovado em 27/11/2012

 

 

*Este manuscrito baseia-se no trabalho de conclusão do curso de bacharelado em enfermagem de Letícia Gomes Costa, da Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT.