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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.23 n.1 Brasília mar. 2014

 

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742014000100004

ARTIGO ORIGINAL

 

Caracterização das notificações de procedimentos inadequados na administração de imunobiológicos em Ribeirão Preto, São Paulo, 2007-2012

 

Characterization of the notification of inadequate procedures in immunobiological product administration in the city of Ribeirão Preto, São Paulo state, Brazil, 2007-2012

 

 

Maria de Fátima Paiva BritoI; Larissa GerinII; Edimara Caroline Aparecida CoutoI; Isac Santos CunhaI; Maria Carolina Mamede Moreira CorsiniI; Mariane Coimbra GonçalvesI

ICurso de Enfermagem, Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto-SP, Brasil
IIPrograma de Imunização de Ribeirão Preto, Secretaria Municipal de Saúde, Ribeirão Preto-SP, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: descrever as notificações de procedimentos inadequados na administração de imunobiológicos no município de Ribeirão Preto, estado de São Paulo, Brasil.
MÉTODOS: estudo descritivo com dados das fichas de notificação preenchidas pelos profissionais das salas de vacinas, encaminhadas à Vigilância Epidemiológica municipal entre janeiro de 2007 e junho de 2012.
RESULTADOS: administração fora da idade recomendada representou 33,9% dos procedimentos inadequados, enquanto intervalos inadequados entre as doses representaram 24,7%; dos profissionais envolvidos, 80,1% receberam algum treinamento em sala de vacinas; as vacinas que tiveram mais notificações de procedimentos inadequados foram para rotavirus (22,0%) e febre amarela (15,6%).
CONCLUSÃO: administração fora da idade indicada e intervalos inadequados entre doses das vacinas foram os procedimentos inadequados mais frequentes, apesar de a maioria dos profissionais ter recebido treinamento; identificar procedimentos inadequados é importante para subsidiar a capacitação e adoção de medidas preventivas.

Palavras-chave: Esquemas de Imunização; Imunização; Vacinação; Programas de Imunização.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to describe the notification of inadequate procedures in immunobiological product administration in Ribeirão Preto, São Paulo state, Brazil.
METHODS: Descriptive study using data from notification forms filled out by health professionals working in vaccine rooms and sent to the municipal Epidemiological Surveillance service from January 2007 to June 2012.
RESULTS: 33.9% of inadequate procedures related to products administered outside the recommended age range. 24.7% related to inadequate intervals between doses. 80.1% of health professionals involved had received some form of vaccine room training. Vaccines having the highest numbers of notifications were the rotavirus vaccine (22.0%) and the yellow fever vaccine (15.6%).
CONCLUSION: administration outside indicated age and inadequate intervals between doses were the most occurring inadequate procedures, even though most of the professionals had received training. Identifying inadequate procedures is important to support training processes and the adoption of preventive measures.

Key words: Immunization Schedule; Immunization; Vaccination; Immunization Programs.


 

 

Introdução

A imunização tem sido um dos maiores avanços na Saúde Pública nas últimas décadas. O alcance de coberturas vacinais adequadas tem levado a uma queda acentuada na incidência das doenças infecciosas.1 A imunização também está relacionada a outros benefícios, como a redução na mortalidade infantil e melhorias na saúde da população geral, melhorias que incluem a redução de custos com consultas, tratamentos e internações hospitalares, assim como menor absenteísmo escolar e no trabalho.2

Os aspectos operacionais em uma sala de vacinas merecem uma atenção especial. Trata-se de medidas essenciais para a aplicação de imunobiológicos. A equipe de enfermagem monitora todos os aspectos técnicos e operacionais, é responsável por solicitar a quantidade necessária de insumos para suprir a demanda, receber e distribuir produtos vacinais de uso diário entre as câmaras de manuseio, aplicar e avaliar os eventos adversos e convocar clientes faltosos.3

Para gerenciar o serviço de imunização, identifica-se a figura do enfermeiro, igualmente responsável por promover a educação em saúde entre os membros da equipe do serviço, contribuindo para reduzir os possíveis eventos adversos e procedimentos inadequados.4

Os eventos adversos podem ocorrer devido a aspectos determinantes, relacionados aos vacinados ou à própria vacina. Aspectos relacionados aos indivíduos vacinados são aqueles que envolvem as respostas do organismo do cliente e sua condição imunológica. Entre os aspectos relacionados às vacinas, pode-se considerar seus componentes, sua produção e sua relação com a predisposição orgânica dos vacinados. As técnicas de preparo e aplicação das vacinas, se realizadas de forma inadequada, também podem ocasionar eventos adversos.5

Devido à possibilidade da ocorrência de eventos adversos relacionados às vacinas, em 1991, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) investiu na implantação de um Sistema Nacional de Vigilância dos Eventos Adversos Pós-Vacinação. Este sistema possibilita a notificação, investigação, acompanhamento e condutas adequadas e padronizadas diante das ocorrências.6

Após a identificação de qualquer evento adverso ou procedimento inadequado relacionado à vacinação, a investigação deve ser iniciada com o preenchimento da Ficha de Notificação de Procedimentos Inadequados, a qual será analisada pelos níveis local e regional da Vigilância Epidemiológica e encaminhada ao respectivo nível estadual.6

A notificação é um importante instrumento de busca de qualidade do PNI. Uma criteriosa avaliação desse instrumento, ao permitir maior conhecimento dos eventos adversos relacionados a um procedimento inadequado, reúne subsídios aos processos de capacitação ligados à imunização e adoção de medidas preventivas.6,7 Na literatura nacional, observa-se uma escassez de trabalhos relacionados a erros na administração de imunobiológicos, o que torna necessários mais estudos relacionados ao tema. Todavia, não é possível identificar as reais dimensões da questão.

O presente estudo objetiva descrever as notificações de procedimentos inadequados na administração de imunubiológicos no município de Ribeirão Preto, estado de São Paulo, Brasil.

 

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo, com dados da Ficha de Notificação de Procedimentos Inadequados8 desde janeiro de 2007, quando essa ficha começou a ser utilizada no município, até junho de 2012, período de realização do estudo, no município de Ribeirão Preto-SP.

Ribeirão Preto-SP encontra-se na região nordeste do estado de São Paulo, na circunscrição do Departamento Regional de Saúde (DRS) XIII, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Em 2013, contava com uma população estimada de 629.855 habitantes, dos quais 18,52% menores de 15 anos de idade; crianças entre zero e quatro anos somavam uma população estimada de 38.525 habitantes (6,12%)9,10 no município.

Ribeirão Preto-SP se caracteriza como polo regional de saúde, sendo referência para os demais municípios do DRS XIII, outras DRS e também outros estados, em determinados procedimentos, principalmente os de alta complexidade.9 Em março de 2013, o município contava com 48 estabelecimentos de Atenção Básica, distribuídos pelos cinco distritos de saúde. Desses estabelecimentos, um era unidade de pronto atendimento (UPA), cinco eram unidades básicas distritais de saúde, 13 unidades básicas/núcleos de Saúde da Família (com um total de 21 Equipes de Saúde da Família - ESF) e 21 unidades básicas tradicionais, das quais 26 contavam com o Programa de Agentes Comunitários de Saúde.9,11 Das unidades de saúde, 36 dispunham de sala de vacinas e destas, 30 realizavam notificações de procedimentos inadequados. Nas salas de vacina, não havia um número fixo de profissionais de enfermagem escalados; este número variava de acordo com a demanda da sala e com a disponibilidade de funcionários treinados na unidade - um a três funcionários por sala.

As Fichas de Notificação de Procedimentos Inadequados na Administração de Imunobiológicos, padronizadas pelo estado de São Paulo, são preenchidas por funcionários de sala de vacinas a partir da identificação do erro. Seu preenchimento é orientado pela Vigilância Epidemiológica do Distrito ao qual a unidade de saúde pertence. Os enfermeiros da Vigilância do Distrito confirmam o erro e recomendam as condutas a serem seguidas em cada caso. As fichas encerradas (após período de observação, de acordo com cada procedimento inadequado) são encaminhadas à Vigilância Epidemiológica Municipal - Nível Central -, que encaminha cópia de cada uma delas para o Nível Regional, não havendo sistema informatizado para isso. Todas as fichas utilizadas em sala de vacinas são trabalhadas durante treinamentos periódicos e discutidas com as equipes em reuniões pontuais.

As fichas de notificação8 foram analisadas manualmente, pela Vigilância Epidemiológica Municipal, e seus dados categorizados em 11 vertentes.

Uma das vertentes analisada foi o tipo de imunobiológico envolvido no procedimento inadequado:

- antirrábica;

- BCG (bacilo de Calmette e Guérin);

- tetravalente (contra difteria, tétano, coqueluche e infecções causadas por Haemophilus influenzae tipo B);

- DTP (contra difteria, tétano e coqueluche);

- dupla adulto (contra difteria e tétano);

- contra febre amarela;

- contra hepatite B;

- contra influenza;

- contra pneumococo 10-valente;

- contra pneumococo 23-valente;

- contra poliomielite;

- SCR (contra sarampo, caxumba e rubéola);

- H1N1 (vacina contra influenza A H1N1, administrada em campanha contra influenza no ano de 2010);

- contra varicela;

- soro antitetânico; e

- contra meningococo C.

Também foram analisadas outras vertentes:

- dose do imunobiológico (1a dose, 2a dose, 3a dose, 1o reforço, 2o reforço);

- via de administração (oral, subcutânea, intramuscular);

- ocasião do procedimento (rotina, campanha, bloqueio, outros);

- procedimento inadequado notificado (conservação, diluição, fora da idade recomendada, intervalo inadequado entre as doses, intervalo inadequado entre as vacinas, técnica de administração, tipo de imunobiológico utilizado, validade vencida, via de administração, volume da dose aplicada); e

- categoria do profissional (enfermeiro, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem, estagiário de enfermagem).

Outros fatores relacionados aos procedimentos inadequados, igualmente analisados neste trabalho:

- tempo de formação do profissional envolvido (anos);

- tempo de sala de vacinas (mês, ano);

- participação do profissional em capacitação (sim, não);

- evolução (cura, sequela, óbito); e

- classificação final das conseqüências do procedimento inadequado (leve ou grave).

O número de notificações de procedimentos inadequados foi distribuído por sala de vacinas, comparado com o número de doses de imunobiológicos administradas. Essa razão foi multiplicada pela constante 1000, para facilitar a interpretação.

Os dados foram tabulados manualmente e digitados em planilha eletrônica. As fichas de notificação foram analisadas pela Vigilância Epidemiológica de Ribeirão Preto-SP no mês de julho de 2012.

O estudo foi realizado após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Barão de Mauá, por meio da Plataforma Brasil - no 33.967, atendendo à resolução do Conselho Nacional de Saúde - CNS no 466/2012.

 

Resultados

No período do estudo, foram aplicadas 2.109.059 doses de vacinas e notificados 186 procedimentos inadequados, o que corresponde a 9 procedimentos a cada mil doses de vacina aplicadas.

Essa proporção foi mais elevada ns salas N (46/mil doses) e X (77/mil doses) (Tabela 1).

 

 

Em relação à ocasião em que o procedimento foi realizado (Tabela 2), 147 notificações ocorreram durante procedimentos de rotina (79,0%), seguidas pelas campanhas de vacinação, com 21 casos notificados (11%).

 

 

A Tabela 3 aponta que entre os procedimentos inadequados, predominaram aqueles ligados à vacina contra rotavírus, seguida das vacinas contra febre amarela, tetravalente (difteria, tétano, coqueluche e infecções por Haemophilus influenzae B), contra SCR (sarampo, caxumba e rubéola), H1N1 (vacina monovalente contra a influenza A H1N1 pandêmica), DPT (difteria, tétano e coqueluche) e poliomielite (paralisia infantil). As notificações que não apresentavam o imunobiológico envolvido com o erro foram identificadas como 'Branco'.

 

 

O ano com maior frequência de notificações foi 2010, seguido pelos anos de 2008, 2011, 2009 e 2007. Para 2012, as fichas de notificação avaliadas corresponderam apenas ao primeiro semestre desse ano.

Na Tabela 4, observa-se predomínio de procedimento realizado fora da idade recomendada, seguido de intervalo inadequado entre as doses, procedimento não identificado (descrito na ficha de notificação como 'outros'), tipo de imunobiológico utilizado e vacinas não indicadas em gestantes. Quanto às variáveis relacionadas às doses, nota-se que 82 notificações foram sobre a 1a dose e 46 notificações sobre a 2a dose, ficando as demais entre 1 a 23 notificações.

 

 

A Tabela 5 demonstra que nas categorias relacionadas ao profissional que realizou o procedimento, a maioria das notificações envolveram auxiliares de enfermagem, seguidas daquelas referindo técnicos de enfermagem. Notificações envolvendo enfermeiros e estagiários de enfermagem ocorreram em menor número.

 

 

A maioria dos profissionais que realizaram os procedimentos inadequados tinham tempo de formação acima de 15 anos (73 notificações); entre aqueles com 6 a 10 anos de formação, foram 44 notificações; naqueles com referência de 11 a 15 anos de formação, foram 26 notificações; e para os profissionais com 3 a 5 anos de formação, 21 notificações (Tabela 5).

Com relação ao tempo de atuação na sala de vacinas, identificou-se que 42 notificações foram registradas por profissionais com menos de um ano de dedicação ao serviço, seguidas de 30 notificações de profissionais de 11 a 15 anos de atuação e os demais ficaram entre 13 a 27 notificações (Tabela 5).

As variáveis referentes ao tempo de formação e à atuação em sala de vacinas remetem tão somente aos profissionais de enfermagem envolvidos nos procedimentos inadequados, o que constitui um total de 176 profissionais, não incluindo, portanto, as notificações referentes aos estagiários e aquelas com essa informação em branco, em total de 10 (Tabela 5).

A maioria das notificações foram de profissionais capacitados, com tempo de capacitação recente (1 a 3 anos), seguidos de profissionais não capacitados e profissionais com tempo de capacitação registrado em branco (Tabela 5).

 

Discussão

A avaliação das fichas de notificação de procedimentos inadequados mostrou que no período estudado, no município de Ribeirão Preto-SP, a maioria das salas de vacinas realizou alguma notificação, sendo os procedimentos de rotina a ocasião principal de ocorrência desses erros. Os imunobiológicos com maior número de inadequações foram a vacina contra rotavírus e a vacina contra febre amarela, com o erro relacionado - principalmente - à administração fora da idade recomendada ou ao intervalo inadequado entre as doses. Os profissionais envolvidos com os procedimentos inadequados são da área da Enfermagem, a maioria deles com longo tempo de formação e atuação em sala de vacinas e capacitação recente em imunização.

Os erros de medicação, por definição evitáveis, são um sério problema de Saúde Pública. A abordagem sistêmica dos erros de medicação poderá revelar as falhas do processo, sendo possível implementar melhorias e assim diminuir a ocorrência desses eventos.12

Para que se realize uma assistência livre de eventos adversos inesperados, a segurança do paciente em sala de vacinas inicia-se pelas informações a serem colhidas a respeito da pessoa a ser vacinada, acompanhadas da observação do estado físico geral, orientações ao paciente e/ou responsável por todo o processo de vacinação, esclarecimentos sobre a ocorrência de possíveiseventos adversos após a aplicação da vacina, além de todo o manejo e técnica adequada de aplicação.13

No período do estudo, foram notificados 186 procedimentos inadequados, o que representa aproximadamente 8,8%/1.000 do total de imunobiológicos administrados, com potencial de subnotificação a ser considerado. A subnotificação pode ser um indicador de que o erro não está sendo percebido, o que contribui para sua manutenção e perpetuação.

Os imunobiológicos mais frequentes em procedimentos inadequados foram as vacinas contra rotavírus, febre amarela, tetravalente e SCR. Em relação à vacina contra rotavírus, considerando-se o risco aumentado de invaginação intestinal em relação à idade de aplicação, observada com a vacina - suspensa em 1999 -, o Ministério da Saúde orienta não aplicá-la fora do esquema recomendado.

Estudo realizado no Paraná, com o objetivo de identificar os eventos adversos pós-vacina oral contra rotavírus humano (VORH), especialmente focado na prática de enfermagem e com base em dados secundários do Sistema de Informação de Eventos Adversos Pós-Vacinação daquele estado, no período de 2006 a 2010, apontou 153 registros desses eventos, 89 deles (58,2%) relacionados à prática de enfermagem e 64 (41,8%) à atenção médica. Dos 89 eventos com relação à prática de enfermagem, 8 (9%) referiam febre menor que 39,5oC, e 81 (91%), erros programáticos, dos quais: 56 (69,2%) representavam vacinação fora da faixa etária (por inadivertência); 23 (28,4%) correspondiam à administração de vacina com validade vencida; 1 (1,2%) à administração apenas do diluente da vacina; e 1 (1,2%) à reaplicação da vacina após regurgitar/vomitar.14 Em Ribeirão Preto-SP, a vacinação fora da faixa etária também foi o principal fator desencadeante de erro.

Ainda em relação ao estudo realizado no Paraná, 43 (76,8%) casos de vacinação fora da faixa etária ocorreram na primeira dose - 11 (25,6%) em crianças acima de 3 meses de idade -, fator que pode aumentar o risco de intussuscepção intestinal.12 Em Ribeirão Preto-SP, a primeira dose dos imunobiológicos também foi a mais frequente em erros registrados. Como o erro programático - aquele que ocorre em função do não cumprimento das normas e técnicas de vacinação (por exemplo, não atender a idade recomendada e o intervalo mínimo entre as doses de vacina) - não é causado apenas pelo indivíduo, faz-se necessária a avaliação de suas causas e a promoção de intervenções que eliminem ou minimizem os fatores de risco, impedindo sua recorrência.14

No período quando as notificações foram realizadas, a idade mínima para a primeira dose era de um mês e 15 dias, e para a 2a dose, de 3 meses e 7 dias; a idade máxima para a primeira dose era de 3 meses e 7 dias, e para a 2a dose, de 5 meses e 15 dias. A faixa etária específica - e curta - recomendada para a administração dessa vacina facilita a ocorrência de doses aplicadas fora desse intervalo; na ocorrência do erro no procedimento, deve-se preencher a Ficha de Notificação de Procedimentos Inadequados e acompanhar a criança por 42 dias com o intuito de observar alterações gastrointestinais.15

Procedimentos inadequados envolvendo as vacinas contra febre amarela e SCR representaram 44 notificações, 11 delas relacionadas à aplicação dessas vacinas em gestantes (25,0%), o que exige um acompanhamento dessas pacientes durante a gravidez e do recém-nascido no pós-parto. Por princípio, vacinas que contêm vírus ou bactérias vivas são contraindicadas, exceto nas situações em que o risco de adoecimento se sobrepõe ao risco teórico vacinal.

As vacinas realizadas e não recomendadas para gestantes foram as vacinas de vírus vivo (febre amarela e tríplice viral). Todas as gestantes vacinadas inadvertidamente foram acompanhadas durante toda a gravidez e no pós-parto, e não apresentaram qualquer intercorrência. Nos casos notificados, as mulheres foram vacinadas enquanto ainda desconheciam seu estado de gravidez.

O ano de maior incidência de notificações de procedimentos inadequados foi 2010, quando se iniciou a vacinação contra o vírus influenza A/H1N1; porém, a vacina foi oferecida separadamente da vacina contra influenza sazonal, esta também administrada no mesmo período, gerando um aumento no número de procedimentos realizados pela equipe além do esperado para o período da campanha de vacinação. Acredita-se que o maior número de usuários na sala de vacinas e, consequentemente, a sobrecarga dos funcionários provocaram um aumento do número de procedimentos inadequados. Segundo alguns, esse aumento pode estar relacionado ao fato de ser uma vacina nova no cenário da Saúde, produzida cerca de seis meses após a divulgação da pandemia e administrada no mesmo período da campanha contra a influenza sazonal.16

No município-objeto do presente estudo, são analisadas todas as fichas de notificação, sendo essa análise acompanhada e encerrada pela Vigilância Epidemiológica. Todas as notificações de procedimentos inadequados evoluíram sem complicações e foram classificadas como leves.

As várias atividades realizadas pelos profissionais na sala de vacinas potencializam o risco de procedimento inadequado pelo fato de os auxiliares de enfermagem realizarem todas as ações, desde a recepção, triagem e orientação até a administração de imunobiológicos e identificação de eventos adversos. Esses profissionais, além da aplicação de vacinas, realizam o agendamento das próximas doses, não sendo necessária uma prescrição médica. Faz-se necessária a realização de estudos para identificar a existência de sobrecarga no trabalho que venha a favorecer erros nesses procedimentos.

O monitoramento dos processos que envolvem a manipulação dos imunobiológicos por parte dos supervisores das unidades e gestores da Saúde nos municípios é fundamental para garantir a confiança que os imunobiológicos vêm conquistando, nas últimas décadas. Portanto, é imprescindível refletir sobre as falhas com potencial de comprometer essa credibilidade.17

O contexto da sala de vacinas exige maior atenção e discernimento do profissional envolvido. Este deverá conferir a idade da criança, as vacinas a serem aplicadas de acordo com o calendário para a idade, a via de administração e o agendamento da próxima dose, com atenção especial para o intervalo mínimo entre as doses. No estudo realizado em 2000, os autores perceberam que a falta de atenção ou distração são alguns dos fatores a considerar, sobre a ocorrência de erros.18

O trabalho exercido pelos auxiliares de enfermagem de forma mecânica, o aumento do número de imunobiológicos no esquema de rotina e o número reduzido de funcionários treinados em sala de vacinas podem contribuir para as falhas na administração dos imunobiológicos, como também podem explicar o fato de o maior número de erros ocorrerem em vacinas administradas em situação de rotina.

Estudo realizado em município cearense com 30 vacinadores (auxiliares e técnicos de enfermagem)15 relata a preocupação de seus autores ao verificarem pouco conhecimento e pouca habilidade desses profissionais, nas atividades diárias da sala de vacinas. Foram identificadas dificuldades na diluição e preparo das vacinas, ausência de cuidados básicos antes, durante e após a administração dos imunobiológicos, como também falhas na conservação e no descarte das vacinas, além de orientações incorretas.19

Os dados apontaram que os procedimentos inadequados foram realizados principalmente por profissionais com maior tempo de formação e capacitação prévia. De acordo com o estudo de Rodrigues, Paschoalotto e Bruniera,16 há um maior número de erros provocados por profissionais experientes, autoconvencidos de que seu julgamento e decisão são os mais corretos, mesmo quando equivocados.16 Particularmente em Ribeirão Preto-SP, muitas vezes, os serviços encaminham para treinamento e capacitações os funcionários novos. Assim, o funcionário titular e com mais tempo de trabalho não é alvo prioritário de programas de reciclagem e atualização de seus conhecimentos. De fato, os treinamentos no município - realizados anualmente - são de participação livre, não havendo um controle ou exigência de que profissionais há muito tempo treinados sejam encaminhados para a necessária atualização de seus conhecimentos e habilidades.

Há necessidade de programas de treinamento objetivando atualização de conhecimentos e adaptação dos profissionais da Saúde aos procedimentos oferecidos pelo Programa Nacional de Imunizações. Tais programas devem ter uma conotação motivadora, instigando o indivíduo ao autodesenvolvimento e busca pelo crescimento profissional.16

Em Recife-PE, estudo realizado com 39 profissionais de saúde de salas de vacinas evidenciou que a maioria deles trabalha no local há mais de um ano (89,7%) e 97,4% dos pesquisados receberam treinamentos específicos, o que sugere profissionais mais capacitados. Contudo, o mesmo estudo também revelou a existência de profissionais que não haviam recebido qualquer treinamento no último ano. Ressalta-se a importância da educação continuada em sala de vacinas, uma vez que novas vacinas são incorporadas e novos conhecimentos adicionados, tornando imprescindível a capacitação na prática cotidiana dessas unidades.17

O presente estudo apresenta algumas limitações. Uma delas está relacionada à possibilidade de subnotificação dos procedimentos inadequados. Ademais, a ficha de notificação de procedimento inadequado contempla muitas informações; porém, trata-se de um questionário fechado, o que limita a análise dos dados registrados. Este estudo não permitiu que as informações identificadas fossem analisadas de forma mais abrangente, inclusive porque espaços destinados a algumas informações, impossíveis de serem resgatadas por estes pesquisadores, encontravam-se em branco.

É fundamental a manutenção das orientações aos profissionais e o monitoramento, pelos supervisores das unidades, dos processos que envolvem a manipulação dos imunibiológicos. A equipe de enfermagem é promotora da ação de imunização, sendo o enfermeiro o responsável técnico pelas salas de vacinas. Todavia, é necessária uma atuação mais efetiva de supervisão diária, uma vez que o manejo dos imunobiológicos (indicação, contraindicação e monitoramento das reações adversas) constitui ação complexa.

Os processos de capacitação devem utilizar o suporte teórico e metodológico disponibilizado pelo Programa Nacional de Imunizações - PNI - do Ministério da Saúde. Esses processos, orientados e executados com a devida competência técnica, são capazes de operar uma transformação das atividades realizadas nas salas de vacinas, de maneira a atingir a qualidade desejada na prestação do serviço, contribuindo para o controle das doenças imunopreveníves.17

A partir dos resultados deste estudo, evidenciou-se a importância de garantir a segurança dos pacientes nos procedimentos, na administração de medicamentos e na aplicação de imunobiológicos. As vacinas utilizadas pelo PNI são extremamente seguras e eficazes, embora nenhuma vacina seja totalmente segura e eventos adversos possam ocorrer após a imunização.

As diferentes ações sob responsabilidade dos profissionais de enfermagem envolvidos com as atividades de imunização, associadas à ausência de estudos no município sobre dimensionamento de pessoal em sala de vacinas, podem gerar uma sobrecarga de trabalho. Ademais, períodos de campanhas concomitantes com atividades de rotina exigem ainda mais esforço desses profissionais sob grande pressão. Além disso, modificações no calendário vacinal são frequentes, com introdução de novos imunobiológicos e modernização dos equipamentos utilizados na sala de vacinas, o que obriga os profissionais a obterem cada vez mais conhecimentos inéditos e específicos.

É mister um trabalho de promoção dos profissionais com vistas a evitar o aparecimento de erros, promover capacitações e treinamentos frequentes de todos os envolvidos com a imunização e assegurar a disponibilidade de material instrucional atualizado e de fácil consulta pelos profissionais nas salas de vacinas, para evitar que incorram nos erros mais comuns a esses procedimentos.

Investigações sobre a segurança do paciente devem subsidiar as tomadas de decisão e as intervenções da gestão, com o objetivo de aprimorar a prática do cuidado. As ações adotadas, como práticas confiáveis, devem gerar resultados capazes de fazer diferença na minimização dos riscos. A identificação e o conhecimento dos procedimentos inadequados na administração de imunobiológicos são essenciais para compreender os motivos desencadeantes dos erros, e com isso, criar subsídios para o assessoramento dos processos de capacitação e a adoção de medidas preventivas, por uma imunização mais segura.18,19

 

Contribuição dos autores

Todos os autores contribuiram no desenvolvimento do presente estudo - como busca na literatura, levantamento dos dados, análise dos resultados e redação do artigo - e aprovaram a versão final do manuscrito, sendo, responsáveis por todos os aspectos do trabalho, incluindo a garantia de sua precisão e integridade.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Maria de Fátima Paiva Brito
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Recebido em 02/07/2013
Aprovado em 27/11/2013