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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.23 n.4 Brasília dic. 2014

 

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742014000400007

ARTIGO ORIGINAL

 

Hospitalizações por diabetes em adultos e idosos no Ceará, 2001-2012

 

Hospitalization for diabetes among adults and the elderly in Ceará State, Brazil, 2001-2012

 

Hospitalizaciones por diabetes en adultos y ancianos en Ceará, 2001-2012

 

 

Francisca Alana de Lima SantosI; Wenderson Pinheiro de LimaII; Aliny de Lima SantosIII; Elen Ferraz TestonIII; Sonia Silva MarconIII

IDepartamento de Fisioterapia, Faculdade Leão Sampaio, Juazeiro do Norte-CE, Brasil
IIDepartamento de Biomedicina, Faculdade Leão Sampaio, Juazeiro do Norte-CE, Brasil
IIIPrograma de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: investigar as tendências das hospitalizações por diabetes mellitus entre adultos e idosos residentes no estado do Ceará, Brasil, no período 2001-2012.
MÉTODOS: estudo ecológico de séries temporais, utilizando dados do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS) referentes às taxas de hospitalizações anuais por diabetes, segundo sexo e idade, entre indivíduos com 20 ou mais anos de idade; para a análise de tendência temporal, foram utilizados modelos de regressão polinomial.
RESULTADOS: no período estudado, foram registradas 51.317 hospitalizações por diabetes, a maioria do sexo feminino (58,4%); as hospitalizações gerais por diabetes mostraram tendência crescente (p=0,013; r2=0,560) e, quando estratificadas por sexo, apresentaram tendência crescente para homens (p=0,002; r2=0,734) e decrescente para mulheres (p<0,001; r2=0,957).
CONCLUSÃO: a tendência geral da hospitalização por diabetes no período estudado apresentou crescimento, mesmo resultado encontrado no sexo masculino; no sexo feminino, todavia, observou-se tendência decrescente.

Palavras-chave: Hospitalização; Avaliação em Saúde; Diabetes Mellitus; Distribuição Temporal.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to investigate diabetes mellitus hospitalization trends among adults and the elderly in the state of Ceará, Brazil, 2001-2012.
METHODS: this was a study of time series derived using secondary data from the Unified Health System's Hospital Information System regarding the rate of annual hospitalizations for diabetes by age and sex of adults and seniors (20 or older). Polynomial regression models were used to analyze the temporal trend.
RESULTS: during the study period 51,317 diabetes hospitalizations were recorded. The majority were females (58.41%). Overall hospitalizations for diabetes showed increasing trend during the study period (p=0.013; r2=0.560), and when analyzed separately showed significant increase among males (p=0.002; r2=0.734) and a decrease among females (p<0.001; r2=0.957).
CONCLUSION: the growing overall trend of hospitalizations for diabetes reveals the need for joint efforts in promoting self-care in order to achieve a reduction in subsequent complications.

Key words: Hospitalization; Health Evaluation; Diabetes Mellitus; Temporal Distribution.


RESUMEN

OBJETIVO: investigar las tendencias de las hospitalizaciones por diabetes mellitus entre adultos y ancianos residentes en el estado de Ceará, Brasil, en el período de 2001-2012.
MÉTODOS: estudio ecológico de series temporales, utilizando datos del Sistema de Informaciones Hospitalarias del Sistema Único de Salud (SIH/SUS) referentes a las tasas de hospitalizaciones anuales por diabetes, según el sexo y la edad, entre individuos con 20 o más años de edad; para el análisis de tendencia temporal, se utilizaron modelos de regresión polinomial.

RESULTADOS: en el período estudiado, se registraron 51.317 hospitalizaciones por diabetes, la mayoría del sexo femenino (58,4%); las hospitalizaciones generales por diabetes mostraron una tendencia creciente (p=0,013; r2=0,560) y, cuando estratificadas por sexo, presentaron tendencia creciente para hombres (p=0,002; r2=0,734) y decreciente para mujeres (p<0,001; r2=0,957).
CONCLUSIÓN: la tendencia general de hospitalización por diabetes en el período estudiado presentó un crecimiento, el mismo resultado encontrado en el sexo masculino; en el sexo femenino, sin embargo, se observó una tendencia decreciente.

Palabras clave: Hospitalización; Evaluación en Salud; Diabetes Mellitus; Distribución Temporal.


 

 

Introdução

As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) são responsáveis por 66% da carga de doenças no Brasil, e por anos de vida perdidos por morte prematura e por incapacitação.1 Entre essas doenças, o diabetes mellitus (DM) se destaca por seus elevados índices de morbimortalidade e pelas incapacidades oriundas das complicações dele decorrentes.2

No Brasil, sua prevalência corresponde a 7,6% em indivíduos de 30 a 69 anos de idade,3 estimando-se que entre 2000 e 2030, o número de indivíduos com diabetes passará de 4,5 milhões para 11 milhões, sendo que a metade dessa população desconhecerá o respectivo diagnóstico.4 Este dado aponta para a magnitude e incremento desse agravo na morbidade da população, sinalizando a necessidade de reorganização e qualificação do cuidado aos usuários acometidos pelo diabetes.

O controle do diabetes requer cuidado e atenção contínua, voltada para o controle glicêmico, e adesão adequada ao tratamento farmacológico e não farmacológico. Tais procedimentos visam evitar quadros agudos e reduzir o risco de complicações ao longo do tempo, repercutindo na redução da hospitalização por diabetes.5

A análise das hospitalizações decorrentes de diabetes mellitus, por sua vez, consiste em uma das formas de monitorar a efetividade das ações na Atenção Primária à Saúde (APS), capaz de refletir-se em uma melhor adesão ao tratamento, adoção e cultivo de hábitos de vida saudáveis, de maneira a reduzir a necessidade de hospitalização. A qualificação das ações desenvolvidas na APS é um dos alicerces para o bom funcionamento do sistema de saúde e consequentemente, a efetividade de suas ações.6

Parte-se do pressuposto de que a qualidade do cuidado às pessoas com diabetes depende de ações equitativas e integrais de tratamento pela APS, culminando na redução da morbimortalidade por essa causa.7 Espera-se que a maior adequação do funcionamento da APS esteja associada a uma menor proporção de internações por condições sensíveis a ela.7,8 Assim, as hospitalizações configuram-se como um indicador de qualidade da assistência prestada pela APS, visto tratar-se, junto com outros agravos crônicos, de condições consideradas próprias desse nível de atenção à saúde. A hospitalização à causa de diabetes é um componente essencial para o monitoramento, análise e intervenções sobre a doença por parte de gestores e profissionais de saúde atuantes na APS.8

Até o momento da realização deste estudo, não haviam sido encontradas publicações sobre a tendência das hospitalizações por diabetes no estado do Ceará, apesar de sua relevância para a orientação da APS no planejamento de ações assistenciais e preventivas de complicações causadas pelo diabetes.

O presente estudo teve como objetivo investigar as tendências das hospitalizações por diabetes mellitus entre adultos e idosos residentes no estado do Ceará, Brasil, no período de 2001 a 2012.

 

Métodos

Trata-se de estudo ecológico, de séries temporais, que analisou as internações hospitalares com diagnóstico principal de diabetes mellitus no estado do Ceará, entre os anos de 2001 e 2012. Para tanto, utilizou-se o Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), que reúne, aproximadamente, 80% das hospitalizações do país e constitui fonte para cálculo de diversos indicadores na APS, especialmente do acesso e qualidade dos serviços prestados, tornando-se componente essencial para sua vigilância.9 A seleção das internações deu-se pela observação das autorizações de internação hospitalar (AIH) de tipo 1, correspondentes ao internamento inicial, pelo SIH/SUS.10

As taxas de internação foram calculadas pela razão entre o número total de internações por diabetes mellitus de residentes do Ceará nas faixas etárias de 20 ou mais anos, pela população total residente dessas mesmas faixas etárias, por ano estudado, estimadas pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, multiplicando-se esse quociente por 100 mil habitantes.

A padronização das taxas por faixa etária aconteceu pelo método direto, adotando-se os seguintes grupos etários: 20-29, 30-39, 40-49, 50-59, 60-69, 70-79 e 80 anos e mais. Tomou-se como referência a distribuição etária da população do Ceará em 2001, não sendo, contudo, encontradas diferenças em relação aos dados não padronizados. Diante de tal constatação, demonstrativa de que as alterações nos indicadores ocorriam independentemente de mudanças da estrutura etária da população, optou-se por apresentar seus valores não padronizados por idade, na elaboração da tendência temporal.

O diagnóstico principal de internação relacionado ao DM analisado consta da Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10),11 capítulo IV, categorias E10 a E14.

As variáveis investigadas foram as seguintes: idade; sexo; e taxa de internação por diabetes mellitus. Para a idade, foi utilizada a categorização adotada pelo Datasus: 20-29, 30-39, 40-49, 50-59, 60-69, 70-79 e 80 ou mais anos.

Para a análise de tendência temporal, aplicou-se o modelo de regressão polinomial, no qual as taxas, segundo sexo e faixa etária, foram consideradas como variável dependente (Y), e os anos (de 2001 a 2012), como variável independente (X). Esse tipo de análise permite modelar o fenômeno estudado para, a partir daí, descrever o comportamento da série, realizar estimativas e avaliar quais fatores influenciaram seu comportamento, buscando definir relações de causa e efeito. A vantagem em se utilizar essa classe de modelo estatístico para análise de séries temporais é a facilidade de sua elaboração e interpretação, além de seu grande poder estatístico.12

Para se evitar a colinearidade entre os termos da equação de regressão, utilizou-se a variável centralizada; ou seja, ao invés de se trabalhar com X, utilizou-se o termo 'X-2006', onde 2006 é o ponto médio da série histórica. Foram construídos diagramas de dispersão das taxas de hospitalização e anos-calendário de estudo, a fim de identificar a função que expressasse a relação entre eles e, dessa forma, escolher a ordem do polinômio para a análise e estimativa, a partir dessa relação funcional, do modelo de regressão polinomial. Como medida de precisão do modelo, utilizou-se o coeficiente de determinação (r2). Salienta-se que os dados apresentaram distribuição normal, verificada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov, e que a análise dos resíduos confirmou a suposição de homocedasticidade do modelo.13

Inicialmente, testou-se o modelo de regressão linear simples (Y = β0 + β1X) e, posteriormente, os modelos de ordem maior, de segundo (Y = β0 + β1X + β2X2) ou de terceiro grau (Y = β0 + β1X + β2X2 +β3X3). Considerou-se como melhor modelo aquele que apresentou maior significância estatística (menor valor de p) e resíduos sem vícios. Quando dois modelos foram semelhantes - do ponto de vista estatístico - para a mesma variável, optou-se pelo modelo mais simples, em atendimento ao princípio de parcimônia.12

A organização dos dados foi realizada com o auxilio do software Microsoft Excel 2010. As análises de dados foram realizadas pelo software Statistical Packagefor the Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Considerou-se tendência significativa aquela cujo modelo estimado obteve p<0,05.

O estudo foi realizado exclusivamente com dados secundários, sem informações que pudessem identificar os indivíduos, respeitando-se os princípios éticos constantes na Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) no 466, de 12 de dezembro de 2012.

 

Resultados

Foram registradas 51.317 hospitalizações por DM em pessoas de 20 ou mais anos de idade, a maioria do sexo feminino (58,4%). Na Figura 1, observa-se que as taxas de hospitalização mantiveram-se superiores no sexo feminino, durante todo o período. Para ambos os sexos, as internações apresentaram pequenas oscilações, entre 2001 e 2012 (Figura 1).

 

Figura 1 - Taxa de internação hospitalar por diabetes mellitus (por 100 mil habitantes de 20 ou mais anos de idade) segundo sexo e ano de ocorrência no Ceará, 2001 a 2012

 

Os coeficientes de hospitalizações segundo a faixa etária apresentaram pequenas oscilações para cada uma delas, sendo essas oscilações mais acentuadas entre os maiores de 70 anos. Evidenciou-se, na medida em que aumentava a idade, taxas maiores de hospitalização por diabetes. Apesar da pequena queda identificada no primeiro triénio do período estudado, observou-se que as taxas relativas às faixas etárias mais elevadas mantiveram-se crescentes até o ultimo triênio, quando voltaram a sofrer queda (Figura 2).

 

Figura 2 - Taxa de internação hospitalar por diabetes mellitus (por 100 mil habitantes de 20 ou mais anos de idade) segundo faixa etária e ano de ocorrência no Ceará, 2001 a 2012

 

As taxas de hospitalizações gerais por diabetes mostraram tendência crescente, no período em estudo (p=0,013; r2=0,560). Entre os homens, as hospitalizações apresentaram tendência crescente (p=0,002; r2=0,734), principalmente nas idades de 50 a 59 anos, cujas taxas de hospitalização, mesmo declinando inicialmente, sofreram crescimento no final do período; e nos maiores de 60 anos, nos quais observa-se que quanto maior a idade, maior o coeficiente médio de hospitalização, com aumento de quase três vezes mais casos de internação em homens de 70 a 79 anos, quando comparados aos da faixa etária de 60 a 69 anos (p=0,001; r2=0,780) (Tabela 1).

 

Tabela 1 - Tendência de internação hospitalar por diabetes mellitus (por 100 mil habitantes de 20 ou mais anos de idade) segundo sexo e faixa etária no Ceará, 2001 a 2012

 

Para as mulheres, observa-se crescimento no início do período estudado, e declínio de 3,5 casos ao ano no final do período, na taxa de hospitalização geral (p<0,001; r2=0,957). Entre as faixas etárias correspondentes à idade adulta (20 a 59 anos), de maneira geral, observa-se comportamento crescente do coeficiente médio de hospitalização no período apenas para as idades de 40 a 49 anos (p=0,005; r2=0,759). Nas mulheres idosas, essa tendência foi crescente em todas as faixas analisadas, sendo o crescimento maior conforme o avançar da idade, chegando a triplicar entre os 70 e os 79 anos (p=0,032; r2=0,625) (Tabela 1).

 

Discussão

Durante o período de 2001 a 2012, a maior parte das hospitalizações por diabetes ocorreu no sexo feminino. Quando analisadas de forma geral, essas hospitalizações mostraram tendência crescente; porém, quando estratificadas por sexo, apresentaram tendência crescente para homens e decrescente para mulheres. Para ambos os sexos, as taxas de hospitalizações foram maiores entre indivíduos com idades mais avançadas.

Diversos países sofrem com o diabetes devido à carga de prejuízos que a doença acarreta, como sofrimento para os pacientes, surgimento de incapacidades, perda de produtividade e morte prematura.14 Ademais, o número de indivíduos diagnosticados com diabetes é crescente, assim como o número de internações por complicações inerentes à doença, com implicações diretas para a qualidade de vida, produtividade e tempo de sobrevida do indivíduo.15

O impacto econômico do diabetes é expressivo, e as hospitalizações consomem parcela importante dos recursos da Saúde Pública. Um estudo cujo objetivo foi verificar as internações por diabetes custeadas pelo SUS, em um período de três anos (1999-2001), observou, por exemplo, que apenas na região Nordeste, a rede pública de saúde registrou 28.349 internações, das quais 2.016 resultaram em óbito.16 O mesmo estudo revelou que não houve diferença no tempo de permanência das internações com (6,5 dias) ou sem óbito (6,4 dias), apesar de o gasto por internação ser superior para o primeiro caso (US$ 275,27 versus 143,45) e o gasto anual/104 hab. equivaler a US$ 969,09.16

O padrão epidemiológico da doença no mundo, especialmente do diabetes de tipo 2, tem-se modificado nas últimas décadas. Uma doença que, no passado, acometia majoritariamente pessoas com mais idade, hoje, vê seu diagnóstico proporcional crescer entre pessoas mais jovens, uma mudança atribuída a alterações nos hábitos de vida, à urbanização e ao envelhecimento da população.17 O número crescente de indivíduos diagnosticados com diabetes e a frequência das complicações associadas a essa doença têm resultado no aumento do número de internações hospitalares.

Verificou-se que a taxa anual das hospitalizações por diabetes tende a se elevar conforme o aumento da idade, resultado que coaduna com os achados de estudo investigativo das tendências de hospitalização observadas em todas as regiões do Brasil.16 Ainda que todos os grupos etários sejam atingidos pelo diabetes, são as pessoas de maior idade a exigir maiores investimentos em serviços de saúde para seu tratamento, haja vista a elevada prevalência da doença nesse grupo etário.18 O comportamento crescente das taxas de hospitalização entre idosos e mulheres, também constatado aqui, corrobora estudo realizado em cidades da América Latina e Caribe.19

Características das hospitalizações por diabetes na rede pública do Brasil, entre 1999 e 2001, assemelham-se às dos países desenvolvidos, onde, embora o número de internações na faixa etária entre 45-64 anos (41%) seja maior, os coeficientes populacionais a partir dos 65 anos mostram-se duas vezes maiores que os da faixa imediatamente anterior.16

Os resultados do presente estudo ainda revelam que, no decorrer dos 12 anos estudados, as taxas de internação foram superiores no sexo feminino, possivelmente relacionadas à maior prevalência da doença entre as mulheres,20 como também à maior procura destas pelos serviços de saúde.21 Estudo de análise da evolução do perfil de utilização desses serviços, focado no Brasil dos anos de 2003 a 2008, mostrou que a procura de serviços de saúde por mulheres manteve-se maior em todo o período analisado (17% contra 10% dos homens), além de haver observado um aumento geral da procura pelos serviços de saúde em função da idade: 12% na faixa de 0 a 14 anos; 14% nos 15 aos 59 anos; e 23% entre os acima dos 60 anos.21

A maior procura das mulheres por serviços de saúde, também demonstrada em outros estudos, faz com que elas apresentem 2,2 vezes mais chances de serem diagnosticadas com diabetes, na comparação com os homens.22 Este fato pode estar associado à demanda pelos serviços de saúde, com ênfase para a atenção primária, composta de programas que, ao beneficiarem o cuidado à saúde da mulher nos diferentes ciclos da vida, favorecem - e repercutem - na maior procura e utilização desses serviços, especialmente por mulheres com mais idade.20,21

A taxa anual de internação entre mulheres apresentou um crescimento de mais de 250% entre as faixas etárias de 40 a 49 e 50 a 59 anos, configurando-se como o maior aumento registrado entre as faixas analisadas. Este resultado corrobora os achados de outro estudo, cujo objetivo foi estimar a magnitude das hospitalizações por diabetes mellitus na rede pública de saúde brasileira, cuja prevalência de hospitalização foi maior para o sexo feminino, e a idade média de mulheres hospitalizadas, 57 anos.16 Tamanho aumento na taxa de hospitalização feminina também pode estar relacionado à maior frequência de diagnóstico de diabetes em mulheres nas faixas etárias supracitadas, conforme observado em outros estudos.23,24

Assim como acontece na tendência geral de hospitalização por diabetes, quando essas internações são analisadas segundo o sexo, a tendência crescente de hospitalização entre os homens pode estar relacionada com a resistência à procura dos serviços de saúde precocemente. De acordo com um estudo sobre a reduzida procura dos homens pelos serviços de saúde, realizado no Rio de Janeiro, destacam-se, como seus principais motivos, questões relacionadas ao trabalho e ausência de tempo, dificuldade de acesso aos serviços e desconhecimento de programas especialmente voltados para a saúde do homem.25

Outro estudo, ao analisar o comportamento de auto-cuidado em homens com diabetes de tipo 2 na cidade de Montes Claros-MG, mostrou desconhecimento por parte da maioria deles sobre os sintomas de descompensação e complicações da doença, adesão inadequada ao tratamento e falta de acompanhamento frequente dos níveis glicêmicos, além de haver detectado índice de massa corporal, relação cintura-quadril e glicemia com médias acima do preconizado para indivíduos saudáveis.26

A reduzida busca dos homens pelos cuidados a sua saúde tem repercutido no aumento das hospitalizações devidas a diversas morbidades crônicas, todavia passíveis de tratamento e acompanhamento manutensivo pela Atenção Primária à Saúde.27 Este aspecto gerou a necessidade e a oportunidade do estabelecimento da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem, de modo alinhado com a Política Nacional de Atenção Básica, reconhecendo-lhe a rede básica como a porta de entrada aos serviços e cuidados com sua saúde, fortalecendo ações em rede e, mais que tudo, desenvolvendo ações de promoção da saúde e proteção de agravos entre a população masculina.28

A necessidade de implantação de tal política deve-se aos índices crescentes de morbimortalidade em homens - quando muitas de suas causas são consideradas preveníveis e evitáveis -, como também ao fato de eles buscarem por serviços de saúde apenas quando da ocorrência de quadros graves.29

Estudo com o objetivo de analisar os diferenciais de mortalidade por causas evitáveis (excluindo-se várias causas evitáveis por prevenção primária e causas externas - critérios do estudo) entre as populações masculina e feminina no Brasil, no período de 1983 a 2005, verificou maior risco de morte para os homens em todos os grupos de causas evitáveis, e aumento desse risco, em comparação às mulheres, com o avanço da idade, especialmente nos indivíduos maiores de 45 anos. Os homens demonstraram risco maior que as mulheres, da ordem de 14%, em se tratando de mortes por causas evitáveis mediante diagnóstico e tratamento precoce.30

A análise de tendência apontou que tanto maior a faixa etária, maior o incremento anual de hospitalização por diabetes. Possivelmente, essa constatação justifica-se pelas alterações fisiológicas, inerentes ao processo de envelhecimento, à presença de outras comorbidades, assim como de outras doenças crônicas degenerativas, ou ainda, ao tempo de diagnóstico do diabetes.

Entre as limitações apresentadas por este estudo, destacam-se possíveis erros de classificação e utilização da CID-10. A adoção das categorias E10 a E14, como procedimento de seleção dos dados para filtro de diagnóstico principal, apesar de adequada, desconsidera as internações a consequência de outro diagnóstico principal combinado. Outras limitações encontram-se na fonte de coleta de dados, que não permite identificar variações na oferta de leitos durante o período em estudo, e no fato de o SIH/SUS registrar apenas as hospitalizações financiadas pelo Sistema Único de Saúde. Ademais, em decorrência da indisponibilidade de séries históricas de incidência/prevalência da doença no estado do Ceará que possibilitem a realização de comparações, não foi possível verificar se os achados deste estudo refletem, de maneira fidedigna, as tendências reais da incidência de diabetes no Brasil.

Entretanto, há que se considerar a importância deste estudo. Apesar de o diabetes apresentar-se como um importante problema de Saúde Publica, as informações sistemáticas sobre sua prevalência e incidência ainda são escassas no Brasil, sendo os estudos de tendência, baseados em dados secundários, um importante indicador do comportamento da doença na população.

Destarte, os resultados do presente estudo podem auxiliar gestores e diferentes profissionais de saúde atuantes, no planejamento e implementação de ações que visem à prevenção das complicações e consequentes hospitalizações associadas ao diabetes, visto tratar-se de uma condição altamente sensível à Atenção Primária à Saúde.

 

Contribuição dos autores

Todos os autores participaram de todas as fases da construção deste manuscrito, da concepção e delineamento do estudo, análise e interpretação dos dados, redação e revisão crítica do conteúdo intelectual do manuscrito, sendo responsáveis por todos seus aspectos, incluindo a garantia de sua precisão e integridade.

 

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Endereço para correspondência:
Aliny de Lima Santos
- Rua Mário Clapier Urbinatti, no 724,
Bloco N, Apto. 36, Jardim Universitário,
Maringá-PR, Brasil. CEP: 87020-260

E-mail: aliny.lima.santos@gmail.com

Recebido em 26/03/2014
Aprovado em 27/08/2014