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Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2337-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.25 n.1 Brasília ene./mar. 2016

 

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742016000100005

ARTIGO ORIGINAL

Análise dos eventos adversos após aplicação de vacinas em Minas Gerais, 2011: um estudo transversal*

 

Analysis of adverse events following immunization in Minas Gerais, Brazil, 2011: a cross-sectional study

 

Análisis de eventos adversos post-vacunación en Minas Gerais, Brasil, 2011: un estudio transversal

 

 

Suelem Santos Silva1; Valéria Conceição de Oliveira2; Helen Cristiny Teodoro Couto Ribeiro2; Tamara Gabriela Silva Alves2; Ricardo Bezerra Cavalcante2; Eliete Albano de Azevedo Guimarães2

1Governo do Estado de Minas Gerais, Secretaria de Estado de Saúde, Divinópolis-MG, Brasil
2Universidade Federal de São João Del Rei, Faculdade de Enfermagem, Divinópolis-MG, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: analisar os principais eventos adversos pós-vacinação ocorridos no estado de Minas Gerais, Brasil, em 2011.
MÉTODOS: estudo transversal, a partir de dados secundários do Sistema de Informação de Eventos Adversos Pós-Vacinação.
RESULTADOS: foram observados 1.449 eventos no estado; mais da metade deles acometeu crianças menores de 1 ano (56,1%; OR=1,39; IC95% 1,08;1,78); os maiores coeficientes de incidência por 100 mil doses aplicadas foram observados nas regiões Triângulo do Sul (36,3), Noroeste (25,7) e Sul (22,7); a vacina tetravalente apresentou a maior reatogenicidade (46,1%); o evento mais frequente foi o episódio hipotônico hiporresponsivo (15,9%); os eventos foram significativamente associados às vacinas inativadas (OR=4,08; IC95% 3,51;4,75); a maioria dos eventos notificados foi encerrada como 'indefinido' (58,9%).
CONCLUSÃO: foram observados eventos em todas as regiões do estado, mais frequentes após a administração de vacinas inativadas e entre crianças menores de 1 ano.

Palavras-chave: Vacinação/efeitos adversos; Sistemas de Informação em Saúde; Avaliação em Saúde.


ABSTRACT

OBJECTIVE: to analyze the main adverse events occurring following immunization in Minas Gerais State, Brazil, in 2011.
METHODS: this is a cross-sectional study using secondary data from the Brazilian Information System on Adverse Events Following Immunization.
RESULTS: 1,449 adverse events were found; more than half occurred in children under one year of age (56.1%; OR=1.39; 95%C1:1.08;1.78); the highest rates per 100,000 doses administered were found in the Southern Triangle (36.3), Northwest (25.7) and Southern (22.7) areas of the state; tetravalent vaccine had the highest reactogenicity (46.1%) and hypotonic-hyporesponsive episodes were the most frequent event (15.9%); events were significantly associated with inactivated vaccines (OR=4.08; 95%C1:3.51;4.75); most of the reported events were closed as 'undefined' (58.9%).
CONCLUSION: events were found in all regions of Minas Gerais state and were most frequent following administration of inactivated vaccines and among children under one year old.

Key words: Vaccination/adverse effects; Health Information Systems; Health Evaluation.


RESUMEN

OBJETIVO: analizar los principales eventos adversos post-vacunación ocurridos en Minas Gerais, Brasil, en 2011.
MÉTODOS: estudio transversal realizado a partir de datos secundarios obtenidos del Sistema de Información de Eventos Adversos Post-Vacunación.
RESULTADOS: observamos 1.449 eventos en el estado; más de la mitad de ellos ocurrió en niños menores de un año (56,1%; OR=1,39; IC95% 1,08;1,78); las tasas de incidencia más altas por 100.000 dosis aplicadas se observaron en las regiones Triángulo del Sur (36,3), Noroeste (25,7) y Sur (22,7); la vacuna tetravalente presento la mayor reactogenicidad (46,1%) y el evento más frecuente fue el episodio de hipo respuesta hipotónica (15,9%), los eventos estuvieron significativamente asociados con las vacunas inactivadas (OR=4,08; IC95% 3,51;4,75); la mayor parte de los hechos denunciados se cerró como ‘indefinido’ (58,9%).
CONCLUSIÓN: fueron observados eventos en todas las regiones del estado, fueron más frecuentes después de la administración de vacunas inactivadas y entre niños menores de 1 año.

Palabras-clave: Vacunación/efectos adversos; Sistemas de Información en Salud; Evaluación en Salud.


 

 

Introdução

Os eventos adversos pós-vacinação (EAPV) são situações clínicas indesejáveis, ocorridas em indivíduos que receberam algum tipo de imunobiológico.1 Embora a maior parte dos EAPV sejam considerados leves, como por exemplo, reação local e febre, eles também podem-se apresentar moderados e graves, levando à hospitalização e a incapacidades, e até à morte.2 O óbito em decorrência da vacinação é um evento muito raro, motivo porque as ações de vigilância dos EAPV têm seu foco principal na ocorrência de eventos classificados como moderados e graves.2

Em 2009, pesquisa realizada no Brasil evidenciou que os eventos de intensidade leve representaram a maioria dos EAPV em crianças vacinadas contra influenza H1N1, não necessitando de tratamento de saúde e desaparecendo no prazo máximo de dois dias.3 Estudo desenvolvido em Cuba, no período entre 2006 e 2007, também detectou predomínio dos eventos leves, com sinais e sintomas nas primeiras 48 horas pós-vacinação e cedendo espontaneamente.4

A maioria dos EAPV raros - convulsões, tromboci-topenia, episódio hipotônico hiporresponsivo - é autolimitada e não conduz a problemas no longo prazo;5 eles também podem resultar de erros programáticos, durante a preparação ou administração de uma vacina, causados por algum equívoco de procedimento dos profissionais encarregados.5

Não obstante passarem por inúmeros testes, como os de eficácia clínica e soroconversão, e serem submetidos a diversos processos de controle de qualidade antes de serem comercializados, os imunobiológicos podem causar eventos adversos.6 Muitos dos EAPV constituem meramente associações temporais, não sendo relacionados à aplicação das vacinas; porém, quando ocorrem, deve-se investigar os fatores a eles associados e possivelmente atrelados à vacina, aos vacinados ou mesmo à técnica de administração dessas ocorrências.1

Gestores e profissionais de saúde, além da atenção dispensada à prevenção de doenças imunopreveníveis, devem-se ater à segurança das vacinas e possíveis EAPV. Imunobiológicos são uma área do campo da Saúde necessitada de constante avaliação, monitoramento e pesquisa sobre os eventuais riscos implicados em seu uso.1

O monitoramento da segurança dos imunobiológicos é a principal ação para alcançar níveis de confiabilidade dos produtos vacinais e adesão da população, contínua manutenção e redução das doenças já controladas. Nesse sentido, são necessários sistemas de vigilância de eventos adversos pós-vacinação que produzam informações de qualidade sobre EAPV e subgrupos populacionais de maior vulnerabilidade.7 Reconhecendo tal necessidade, em 2000, o Ministério da Saúde implantou o Sistema de Informação de Eventos Adversos Pós-Vacinação (SI-EAPV) com o objetivo de potencializar as análises dos casos de EAPV e, principalmente, promover a consolidação dos dados de forma mais abrangente e consistente no país. O SI-EAPV é alimentado pelas informações presentes no formulário de notificação de eventos adversos, padronizado pelo Ministério.1

Diante da importância do conhecimento sobre EAPV e sua ocorrência, para a tomada de decisões nos serviços e práticas de saúde a eles relacionados, este estudo teve como objetivo analisar os principais eventos adversos pós-vacinação notificados no estado de Minas Gerais em 2011.

 

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, realizado em Minas Gerais, a partir da base de dados do SI-EAPV referente ao ano de 2011, que incluiu todos os casos notificados no estado. Também foi utilizada a base de dados do Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), para identificar o número de doses aplicadas de imunobiológicos no período estudado.

O estado de Minas Gerais é constituído por 853 municípios, distribuídos sobre um território de 586.520,368 km2, com população estimada de 20.734.097 habitantes para o ano de 2014.8 O estado foi dividido em 13 regiões ampliadas de saúde, ma-crorregiões consideradas como base territorial para o planejamento da atenção à saúde, em função de suas características demográficas, socioeconómicas, geográficas, sanitárias, epidemiológicas, oferta de serviços e relações entre municípios. São elas: Sul; Centro-Sul; Centro; Jequitinhonha; Oeste; Leste; Sudeste; Norte; Noroeste; Leste do Sul; Nordeste; Triângulo do Sul; e Triângulo do Norte.9

O fluxo da vigilância dos eventos adversos compreendeu a notificação e a investigação dos eventos nos locais de ocorrência, por meio do preenchimento obrigatório dos formulários preconizados pela Portaria do Ministério da Saúde GM/MS n° 104, de 25 de janeiro de 2011.10 Os municípios encaminharam os formulários às gerências/superintendências regionais de saúde, que consolidaram os dados e os repassaram à Coordenação de Imunização da Secretaria de Estado de Saúde (SES/MG), responsável pela análise das notificações dos eventos, liberação de imunobiológicos e processamento e análise dos dados do SI-EAPV. Após a consolidação dos dados, a Coordenação de Imunização da SES/MG encarregou-se de transferir as informações para o nível federal.

A variável-resposta foi a presença do EAPV. As variáveis estudadas foram:

a) sexo (masculino; feminino);

b) idade (em anos: <1; 1 a <2; 2 a <10; 10 a <20; 20 a <60; e ≥60);

c) região de ocorrência do EAPV (classificada por regiões ampliadas de saúde: Sul; Centro-Sul; Centro; Jequitinhonha; Oeste; Leste; Sudeste; Norte; Noroeste; Leste do Sul; Nordeste; Triângulo do Sul; e Triângulo do Norte);

d) tipos de imunobiológicos (Bacilo de Calmette-Guérin [BCG]; vacina dupla adulto [DT]; vacina para febre amarela [FA]; vacina para hepatite B [HB]; vacina meningocócica C conjugada [MncC]; vacina pneumocócica conjugada 10-valente [Pn10]; vacina pneumocócica 23-valente [Pn23]; vacina para influenza; vacina para sarampo, caxumba e rubéola [SCR]; vacina adsorvida para difteria, tétano, pertussis e Haemophilus influenzae b [tetravalente]; vacina oral contra poliomielite [VOP]; e vacina para rotavírus humano [VORH]);

e) tipos de EAPV (úlcera maior que 1 cm após BCG; abscesso local frio; abscesso local quente; artral-gia; cefaleia; cefaleia e vómito; choro persistente; convulsão afebril; convulsão febril; dificuldade de deambular; dor, rubor e calor; encefalopatia aguda; enduração; episódio hipotónico hiporresponsivo; exantema generalizado; febre maior ou igual a 39,5°C; febre menor que 39,5°C; invaginação intestinal; linfadenite não supurada maior que 3 cm; linfadenite supurada; linfadenomegalia maior que 3 cm supurada; linfadenomegalia não supurada; mialgia; mielite; nódulo; outras reações locais; outros eventos graves e/ou inusitados; púrpura trombocitopênica única; parestesia; po-lirradiculite (Síndrome de Guillain-Barré - SGB); queloide; reação de hipersensibilidade após 2 horas; reação de hipersensibilidade até 2 horas; e urticaria generalizada);

f) evolução clínica dos casos notificados (cura sem sequela; cura com sequela; óbito; ignorado; sem evolução); e

g) encerramento dos casos notificados (confirmado; indefinido; descartado);

h) tipo de conduta (contraindicação de dose subsequente da vacina que provocou o EAPV; manutenção do esquema vacinal do imunobiológico que provocou o EAPV; contraindicação de doses subsequentes; e manutenção do esquema vacinal com supervisão).

As variáveis 'presença de evento adverso em dose anterior', 'doenças pré-existentes', 'antecedentes familiares' e 'hospitalização', cujos campos apresentaram incompletudes maiores de 20%, foram consideradas como de qualidade ruim,11 razão porque não foram incluídas neste estudo.

Para a caracterização da população estudada, foi realizada a distribuição de frequências das variáveis e calculado o coeficiente de incidência (CI) de EAPV (CI = número de eventos ocasionados por um imu-nobiológico em um local e período de tempo / total de doses aplicadas no mesmo local e período X 100 mil), segundo regiões ampliadas de saúde do estado e tipo de imunobiológico.

A magnitude da associação entre a presença do EAPV e as co-variáveis 'faixa etária' e 'tipo de imunobiológico' foi estimada pela razão de chances (OR: odds ratio) e intervalos de confiança de 95% (IC95%). Os softwares BioEstat 5.0 e Microsoft Office Excel® foram utilizados para tabulação e análise dos dados.

Este estudo foi realizado com a observância da Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) n° 466/2012, e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital São João de Deus - Registro n° 141/2011 - em 22 de junho de 2012.

 

Resultados

No período do estudo, foram notificados 1.458 eventos adversos ocorridos após administração de vacinas preconizadas pelo PNI. Foram identificados 9 eventos com inconsistência na variável 'idade', excluídos das análises. Dessa forma, foram incluídos neste estudo 1.449 EAPV. Foram identificadas 10.590.033 doses aplicadas de imunobiológicos no PNI; entre essas, 1.964.955 apresentavam inconsistência na variável 'idade' e 818.650 na variável 'tipo de imunobiológico', sendo excluídas das análises.

Do total de indivíduos que tiveram EAPV, 544 (53,5%) eram do sexo feminino (dados não apresentados em tabela). Mais da metade dos EAPV ocorreu na população menor de 1 ano de idade (56,1%), seguida pelos indivíduos adultos (16,8%). A partir da análise univariável, identificou-se que, quando comparadas aos idosos, crianças menores de 1 ano (OR=1,39; IC95% 1,08;1,78) e adultos entre 20 e menos de 60 anos (OR=1,99; IC95% 1,52;2,61) tiveram mais chances de apresentar eventos adversos. A ocorrência de EAPV foi menor em adolescentes (OR=0,38; IC95% 0,23;0,62) (Tabela 1).

 

 

Ao avaliar o número de EAPV segundo as regiões ampliadas de saúde, verificou-se maiores coeficientes de incidência nas regiões Triângulo do Sul (CI= 36,3/100 mil doses aplicadas), Noroeste (CI = 25,7/100 mil doses aplicadas) e Sul (CI = 22,7/100 mil doses aplicadas) do estado (Tabela 2).

 

 

Quanto à distribuição das doses aplicadas por imunobiológico (Tabela 3), observou-se que a vacina tetravalente teve maior reatogenicidade (46,1%), seguida da vacina para influenza (14,3%). Estas e a pneumocócica 23-valente foram os imunobiológicos com maior risco de ocasionar eventos adversos entre os vacinados no período. Ao analisar-se a associação entre a presença de EAPV segundo o tipo de imuno-biológico (vacinas inativadas ou vacinas atenuadas), verificou-se que as vacinas inativadas (OR=4,08; IC95% 3,51;4,75) apresentaram mais chances de causar eventos adversos quando comparadas com as vacinas atenuadas (Tabela 4).

 

 

 

 

Quanto à dose referente ao EAPV, 38,1% dos casos foram relacionados com a primeira dose de administração, 20,8% com a segunda dose e 11,8% com a terceira dose. Houve menor frequência de EAPV relacionada às últimas doses dos esquemas vacinais e aos reforços: primeiro reforço (11,3%) e segundo reforço (4,7%) (dados não apresentados em tabela).

A Tabela 5 apresenta os tipos de EAPV segundo presença de eventos sistêmicos e locais. Os eventos mais frequentes foram: episódio hipotônico hipor-responsivo (EHH) (15,9%); enduração (11,7%); presença de febre menor que 39,0°C (11,7%); e dor, rubor e calor (8,6%).

 

 

Entre os 230 casos notificados como episodio hipotônico hiporresponsivo (EHH), 44,1% foram confirmados, 55,5% foram classificados como indefinidos e 0,4% descartados. Em relação à conduta frente aos EAPV notificados como EHH, houve contraindicação da vacina DTP de células inteiras em favor da indicação da DPT acelular em 94,8% dos casos. Em 2,2% dos eventos, foi contraindicada a vacina DPT, em 0,9% foi mantido o esquema, e 1,2% dos casos apresentaram informação ignorada (dados não apresentados em tabela). Constatou-se dois casos do evento de invaginação intestinal associados ao imunobiológico rotavírus: um deles foi notificado na segunda dose, não associado com a vacina; o outro caso foi confirmado na primeira dose, aplicada em uma criança com 5 meses e 23 dias (dados não apresentados em tabela).

Em relação à evolução clínica dos indivíduos notificados com EAPV, 99,3% deles evoluíram para cura sem sequelas, 1 indivíduo evoluiu para cura com sequela relacionada à invaginação intestinal, houve 1 óbito por convulsão febril e 5 casos foram classificados como 'ignorado' e/ou 'sem evolução'. Dos EAPV notificados, 40,2% foram encerrados como confirmados, 58,9% foram classificados como indefinidos e 0,9% como descartados (dados não apresentados em tabela).

Frente aos EAPV, foram adotadas as seguintes condutas: em 36,1% dos casos, houve contraindicação de doses subsequentes das vacinas que provocaram o EAPV, sendo substituídas por vacinas menos reato-gênicas; 48,0% dos casos mantiveram os esquemas das vacinas que provocaram o EAPV; em 4,0% dos casos, foram contraindicadas doses subsequentes; 8,8% foram de ignorados; e em 3,1% dos casos foram mantidos os esquemas vacinais sob supervisão (dados não apresentados em tabela).

 

Discussão

No presente estudo, não foram observadas diferenças quanto à ocorrência de EAPV segundo sexo. Destaca-se a ocorrência de EAPV em todas as regiões ampliadas de saúde Minas Gerais, com variações nos valores dos coeficientes de incidência entre elas. Houve associação com as vacinas inativadas e com a faixa etária dos indivíduos, predominantemente com os menores de 1 ano de idade. O imunobiológico com maior ocorrência de EAPV foi a tetravalente e o evento mais frequente foi o episódio hipotônico hiporresponsivo. Contudo, em sua maior parte, os eventos notificados foram encerrados como indefinidos.

A maioria dos EAPV ocorreu em crianças menores de 1 ano. Tais resultados corroboram os de outros estudos nacionais;12,13 e de uma investigação realizada em Cuba, onde se encontrou 46,8% dos eventos adversos pós-vacinação em lactentes.4 Atualmente, são disponibilizadas na rotina dos serviços públicos de saúde 11 vacinas para menores de 1 ano, com potencial impacto - além da natural imaturidade imunológica dessas crianças - na maior frequência de eventos adversos, contribuindo para o aumento significativo de casos de EAPV nessa faixa etária.13

Quanto ao coeficiente de incidência de EAPV, todas as regiões ampliadas de saúde apresentaram risco de eventos adversos após aplicação de imunobiológicos.

Entretanto, esse risco distribuiu-se de forma desigual entre as regiões. Pesquisas realizadas no Brasil também constataram distribuição heterogênea dos EAPV, com maiores incidências em regiões mais desenvolvidas.14,15

O imunobiológico com maior incidência de eventos adversos foi a tetravalente - combinação da vacina tríplice bacteriana (DPT) e Haemophilus influenzae b -, administrada aos 2, 4 e 6 meses de idade para prevenir a morbidade e mortalidade por difteria, tétano, coqueluche e meningite por H. influenzae b. Os resultados dessa investigação corroboram estudo realizado no ano de 2006, no município de Teresina, estado do Piauí, onde se observou que 63,0% dos eventos notificados foram relacionados à vacina tetravalente.12 No estado de São Paulo, entre 1984 a 2001, foram administradas 54.204.325 doses de vacina DPT, com a notificação de 10.051 eventos adversos relacionados à vacina tríplice bacteriana, correspondentes a 6.266 casos, resultando em uma média de 1,6 EAPV-DPT por caso notificado.16

Foi detectada a ocorrência de EAPV relacionados à vacina pneumocócica 23-valente e à vacina para influenza. Pressupõe-se que esse fato foi influenciado pelo aumento de doses aplicadas nas campanhas anuais de vacinação contra influenza nos meses de abril e maio, quando a vacina antipneumocócica é oferecida. Campanhas de imunização em massa visam imunizar grande parte da população em um curto período de tempo, representando desafios à segurança e aumento das taxas de EAPV.5

As vacinas inativadas foram associadas a um maior número de eventos adversos, quando comparadas às vacinas atenuadas. A presença do alumínio como adjuvante nas vacinas inativadas predispõe o indivíduo imunizado a eventos adversos locais mais significativos, como hiperemia, edema e dor no local da aplicação, além de aumentar o risco dessas manifestações com a aplicação de doses subsequentes17 relacionadas à deposição de imunocomplexos.1 Destaca-se, também, que falhas na conservação das vacinas, como a exposição a baixas temperaturas, podem resultar na inativação do adjuvante alumínio por congelamento.18 Neste caso, a eficácia da vacina pode diminuir, e o risco de eventos adversos pós-imunização, tais como abcessos estéreis, aumentar.19

No que se refere à maior frequência do episódio hipotônico hiporresponsivo (EHH), resultados semelhantes também foram observados por estudos já citados, realizados no estado de São Paulo16 e no município de Teresina, Piauí.12 O EHH é um evento grave e de difícil caracterização clínica, entre outras razões, por sua ocorrência fugaz, dificultando a avaliação do profissional de saúde, muitas vezes sem suficiente capacitação para definir o evento, acarretando possível confundimento das manifestações clínicas com outras enfermidades.20

O EHH pode se associar a várias vacinas, porém, quase sempre está relacionado ao componente pertussis da vacina tríplice bacteriana.20 Uma investigação realizada com dados do Vaccine Adverse Event Reporting System (VAERS), o sistema de notificação de EAPV do Canadá, identificou que, entre 215 casos avaliados, a idade média de início do episódio de EHH foi de quatro meses, mais da metade dos casos eram de crianças do sexo feminino, com intervalo médio entre a vacinação e o EHH de 210 minutos, sendo que 93% das crianças que tiveram o episódio haviam recebido uma vacina contendo pertussis.21 Segundo o mesmo estudo, durante o EHH, 90,1% das crianças tiveram palidez e 49% cianose. Os autores relataram, ademais, ausência de conclusões relevantes sobre a história familiar ou história gestacional da mãe.21

Os resultados do presente estudo sobre a evolução clínica dos EAPV mostraram que a maioria dos eventos evoluiu para cura, sem sequelas ou maiores danos aos pacientes, confirmando achados da literatura demonstrativos de que os benefícios de se receber vacinas e prevenir doenças superam os riscos de possíveis efeitos adversos,13 não implicando, portanto, contraindicação para doses posteriores.12 Em relação às condutas frente aos EAPV, observou-se que a manutenção do esquema vacinal foi a mais adotada, reafirmando que na maioria das vezes, EAPV são benignos e fugazes.13

Mais da metade dos eventos notificados foi encerrada como indefinida, o que leva a inferir problemas na qualidade da informação do SI-EAPV, como erros na digitação de dados, incompletude dos campos e falhas no fluxo de informações. Isso, de certa forma dificulta uma tomada de conduta adequada diante dos casos, além de favorecer o descrédito da vacinação por parte dos imunizados e dos próprios profissionais de saúde, que podem atribuir às vacinas eventos que não lhes são devidos ou que significam apenas uma associação temporal.2,12

Destacam-se como limitações deste estudo, portanto, a subnotificação de eventos adversos e a qualidade da informação disponibilizada pelo SI-EAPV. Foram verificadas incompletudes em alguns campos do formulário preconizado, além de erros no preenchimento do campo 'encerramento' dos casos notificados, gerando grande proporção de casos indefinidos e comprometimento da compreensão da real situação dos EAPV, resultante da dificuldade de distingui-los daqueles não associados às vacinas. Seria importante que pesquisas futuras abordassem o conhecimento da equipe de saúde sobre a notificação de EAPV e avaliassem a implantação do SI-EAPV.

Com esse propósito, mais além da avaliação do sistema de informação em sua capacidade de monitorar e avaliar os casos notificados de EAPV, é preciso também verificar a qualidade do formulário utilizado na investigação do evento e a insuficiência de profissionais capacitados para a realização dessa atividade, uma vez incorporada à rotina dos serviços de saúde. A notificação dos EAPV como uma prática adquirida e a educação permanente em saúde das equipes responsáveis são fundamentais para garantir a qualidade e a segurança dos imunobiológicos administrados.13 Nesse aspecto, entraves como insuficiência de profissionais de saúde capacitados em vigilância de EAPV e problemas na qualidade das informações podem influenciar o atendimento dos casos. O processo contínuo e sistemático de monitoramento dos EAPV constitui o principal instrumento de controle da segurança das vacinas.12

O conhecimento sobre eventos adversos pós-vacinação - todavia objeto de uma limitada produção científica nacional - pode ser aplicado na prática dos serviços de vigilância em saúde e no planejamento e execução de ações com foco na segurança da utilização dos imunobiológicos. Intervenções na organização e na atividade prática dos serviços de saúde para notificação dos EAPV, em nível estadual e municipal, devem ser estimuladas.

 

Contribuição dos autores

Guimarães EAA, Silva SS e Oliveira VC foram responsáveis pela concepção, análise dos dados e redação do artigo.

Ribeiro HCTC, Alves TGS e Cavalcante RB colaboraram na análise dos dados e revisão do artigo.

Todos os autores assumem responsabilidade por todos os aspectos do trabalho, incluindo a garantia de sua precisão e integridade.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Eliete Albano de Azevedo Guimarães -
Rua Sebastião Gonçalves Coelho, no 400,
Bairro Chanadour, Divinópolis-MG, Brasil.
CEP: 35501-296
E-mail: elietealbano@ufsj.edu.br

Recebido em 10/07/2014
Aprovado em 28/10/2015

 

 

*Pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)/Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI): Edital n° 004/2012/PROPE - bolsa de iniciação científica de Tamara Gabriela Silva Alves.