SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.25 número2Monitoramento de vírus respiratórios na região metropolitana de Belo Horizonte, 2011 a 2013 índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2337-9622

Epidemiol. Serv. Saúde v.25 n.2 Brasília abr./jun. 2016

http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742016000200001 

EDITORIAL

Pesquisa e desenvolvimento para o enfrentamento da epidemia pelo vírus Zika e suas complicações

Elisete Duarte1  , Leila Posenato Garcia2 

1Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Brasília-DF, Brasil

2Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Diretoria de Estudos e Políticas Sociais, Brasília-DF, Brasil

O Ministério da Saúde do Brasil foi pioneiro ao reconhecer a implicação do vírus Zika na ocorrência do surto de microcefalia, uma associação inédita na literatura científica. A posição do Ministério da Saúde, em novembro de 2015, foi subsidiada por informações da vigilância epidemiológica nacional e pela identificação deste vírus em amostras de bebês com malformações.1 A Organização Mundial da Saúde (OMS), ao declarar o evento como Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), em fevereiro de 2016, foi cautelosa e não assumiu a comprovação dessa relação causal, embora tenha considerado a existência de uma "possível associação".2 Em março de 2016, a existência de um forte consenso científico sobre o envolvimento do vírus Zika na causalidade da microcefalia foi reconhecida pela OMS, com base nos resultados de estudos epidemiológicos, clínicos e biológicos então disponíveis.3

Desde a detecção do evento epidêmico, e diante de uma situação epidemiológica inusitada, o Ministério da Saúde adotou uma postura de transparência na divulgação dos dados e iniciou a investigação de campo em Pernambuco. Por sua vez, pesquisadores de diversas regiões do Brasil se mobilizaram rapidamente para buscar evidências e acelerar o desenvolvimento de tecnologias que pudessem contribuir no enfrentamento da epidemia. Em pouco tempo, muito se avançou. Os estudos epidemiológicos, além dos estudos clínicos e laboratoriais realizados no país, tiveram papel fundamental para a comprovação da relação causal entre a infecção pelo vírus Zika na gestação e a ocorrência de microcefalia em bebês, assim como de outras complicações neurológicas.4 O trabalho dos pesquisadores brasileiros também resultou em importantes desenvolvimentos tecnológicos, a exemplo dos testes diagnósticos.5,6

Apesar dos progressos obtidos e da expressiva expansão da publicação científica sobre o tema em um curto período de tempo, ainda permanecem muitas perguntas não respondidas. Estudos adicionais são, naturalmente, necessários para um melhor conhecimento sobre o vírus Zika e seus mecanismos de infecção, sua relação com o vetor (Aedes aegypti), suas potenciais complicações nas diversas etapas do ciclo de vida, além de outras questões importantes para a prevenção, o controle e o tratamento da doença.7 Estas lacunas demandam investimento em pesquisa e inovação, especialmente no cenário brasileiro, onde a epidemia impõe desafios maiores, em virtude das marcantes desigualdades sociais e das condições precárias de saneamento, em muitas localidades.8

Visando solucionar as questões aludidas, o Ministério da Saúde promoveu, com a participação do então Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), uma reunião com gestores e especialistas convidados, em março de 2016. Discutiu-se a agenda de prioridades de pesquisas relacionadas à emergência de saúde pública em curso, com o objetivo principal de indicar as linhas de pesquisa prioritárias a serem apoiadas. O resultado dessa reunião passou a orientar as estratégias adotadas pelo Ministério da Saúde para contratação e apoio a projetos de pesquisa sobre o tema - por modalidade de contratação direta ou por chamada pública. Está previsto o lançamento de um edital, em articulação com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações - MCTIC) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação do Ministério da Educação e Cultura (Capes/MEC).

É evidente a necessidade da mobilização de recursos de pesquisa de toda ordem, incluindo os grupos de pesquisa, as agências de fomento e as instâncias responsáveis pela apreciação ética dos projetos, tendo em vista a celeridade que o processo de produção científica exige para fazer frente à emergência de saúde pública.

Como recomendações da reunião supracitada, também foram levantadas algumas diretrizes a serem adotadas na condução das pesquisas apoiadas pelo Ministério da Saúde, que incluem: (i) a utilização de protocolos e instrumentos de pesquisa harmonizados; (ii) o compartilhamento de bases de dados; (iii) o armazenamento de amostras, de modo a possibilitar reanálise e realização de pesquisas futuras; (iv) a elaboração de relatórios de pesquisas parciais e a divulgação oportuna de achados que tenham relevância para as políticas de enfrentamento da epidemia, bem como para o desenvolvimento de protocolos de tratamento para os enfermos; (v) a publicação em acesso aberto; e (vi) a tradução para o português das publicações em língua estrangeira, de maneira a torná-las acessíveis a trabalhadores e usuários do Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS), assim como a outros potenciais usuários da informação em nosso país e nos demais países de língua portuguesa.

Essas diretrizes estão alinhadas a iniciativas de movimentos internacionais que incentivam o compartilhamento de dados (open data) e a publicação de resultados de pesquisa em acesso aberto (open access). O compartilhamento de dados pode ampliar grandemente a sua disseminação, a realização de metanálises e a compreensão dos resultados de estudos; ademais, pode ajudar a confirmar ou refutar resultados por meio da replicação, além de permitir uma melhor utilização dos resultados das pesquisas e aumentar a transparência sobre sua qualidade e integridade.9 A finalidade maior dessas iniciativas é permitir a reutilização e reanálise dos dados, de modo a se acelerar a produção e melhorar a qualidade das evidências científicas disponíveis, para apoiar de forma mais robusta a tomada de decisão, tanto na clínica, quanto na saúde pública.

Em face das situações de emergência de saúde pública, como a epidemia pelo vírus Zika, o compartilhamento de dados e a publicação em acesso aberto tornam-se ainda mais relevantes.10A Epidemiologia e Serviços de Saúde: revista do Sistema Único de Saúde do Brasil (RESS) é uma publicação em acesso integralmente aberto que apoia o compartilhamento de dados, conforme pautado em sua Declaração sobre Ética na Publicação.11 Neste número, a RESS publica artigo de revisão sobre as estratégias de controle do Aedes aegypti, que contribui para se refletir sobre a incorporação de inovações tecnológicas promissoras no enfrentamento das arboviroses no Brasil.12

Referências

1. Ministério da Saúde (BR). Agência Saúde. Nota à imprensa: Ministério da Saúde confirma relação entre vírus Zika e microcefalia [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [citado 2016 maio 02]. Disponível em: Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/cidadao/principal/agencia-saude/21014-ministerio-da-saude-confirma-relacao-entre-virus-zika-e-microcefaliaLinks ]

2. World Health Organization. WHO statement on the first meeting of the International Health Regulations (2005) (IHR 2005) Emergency Committee on Zika virus and observed increase in neurological disorders and neonatal malformations [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2016 [cited 2016 May 2]. Available from: Available from: http://www. who.int/mediacentre/news/statements/2016/1st-emergency-committee-zika/en/Links ]

3. World Health Organization. Zika virus microcephaly and Guillain-Barré syndrome: situation report [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2016 [cited 2016 May 2]. Available from: Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/204718/1/zikasitrep_31Mar2016_eng.pdf?ua=1Links ]

4. Rasmussen SA, Jamieson DJ, Honein MA, Petersen LR. Zika virus and birth defects: reviewing the evidence for causality. N Engl J Med. 2016 Apr:1-7. [ Links ]

5. Instituto Evandro Chagas. IEC comprova relação do vírus zika com a microcefalia e diagnostica os primeiros óbitos relacionados ao vírus [Internet]. Belém: Instituto Evandro Chagas, 2015 [citado 2016 maio 17]. Disponível em: Disponível em: http://www.iec.gov.br/index.php/destaque/index/762Links ]

6. Presidência da República (BR). Saúde: novo teste vai permitir diagnóstico simultâneo de zika, dengue e chikungunya [Internet]. Brasília: Portal Brasil; 2016 [citado 2016 maio 02]. Disponível em: Disponível em: http://www.brasil.gov.br/saude/2016/03/novo-teste-vai-permitir-diagnostico-simultaneo-de-zika-dengue-e-chikungunyaLinks ]

7. Haug CJ, Kieny MP, Murgue B. The zika challenge. N Engl J Med. 2016 May;374(19):1801-3. [ Links ]

8. Henriques CMP, Duarte E, Garcia LP. Desafios para o enfrentamento da epidemia de microcefalia. Epidemiol Serv Saude. 2016 jan-mar;25(1):7-10. [ Links ]

9. Groves T, Godlee F. Open science and reproducible research. BMJ. 2012 Jun;344:e4383. [ Links ]

10. Dye C, Bartolomeos K, Moorthy V, Kieny MP. Data sharing in public health emergencies: a call to researchers. Bull World Health Organ. 2016;94:158. [ Links ]

11. Epidemiologia e Serviços de Saúde: revista do Sistema Único de Saúde do Brasil. Ética na publicação: declaração sobre ética na publicação [Internet]. Brasília: Epidemiologia e Serviços de Saúde: revista do Sistema Único de Saúde do Brasil; 2016 [citado 2016 maio 02]. Disponível em: Disponível em: http://ress.iec.gov.br/ress/home/carregarPagina?lang=pt&p=eticaPublicacaoLinks ]

12. Zara ALSA, Santos SM, Fernandes-Oliveira ES, Carvalho RG, Coelho GE. Estratégias de controle do Aedes aegypti: uma revisão. Epidemiol Serv Saude. 2016 abr-jun;25(2):391-404. [ Links ]

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons