Introdução
O câncer é uma das principais causas de morte em crianças, em todo o mundo.1,2 Ele corresponde à segunda causa de morte em crianças e adolescentes no Brasil, superado apenas pelos óbitos por causas externas, pelo que se apresenta como um problema de Saúde Pública.3 As taxas de mortalidade por câncer pediátrico, entretanto, estão mudando dramaticamente à medida que aumenta a sobrevida dos doentes. O que pode ser verificado pela - bem documentada - tendência de declínio substancial dessas taxas, desde o início da década de 1960, em países de alta renda. Nos países de média e baixa renda, incluindo os da América Latina, as tendências de declínio começaram mais tarde e foram menos pronunciadas.4
As leucemias pediátricas são cânceres do sistema hematopoiético, na maior parte dos casos envolvendo a transformação maligna de células progenitoras linfoides e, menos comumente, de células progenitoras mieloides.5 Na faixa etária de 0 a 19 anos, elas correspondem a 25,6% dos casos de câncer, representando o tipo mais comum de câncer infantil (de 0 a 14 anos: 33,2%) e principal causa de mortalidade relacionada ao câncer em pediatria.1-4
A mortalidade por leucemia pediátrica, particularmente a leucemia linfoblástica aguda (LLA), tem apresentado declínio nos países europeus, nos Estados Unidos e no Japão, decorrente de avanços terapêuticos contínuos e progressivos.1,6 Na América Latina, as tendências de mortalidade por leucemia pediátrica indicam uma diminuição na maioria dos países, comparável às tendências observadas em áreas de maior renda.4 Entretanto, poucos estudos retratam esse cenário no Brasil.
É importante conhecer a distribuição da mortalidade por leucemias na população pediátrica do Brasil e isso é possível, graças à existência de dados disponíveis no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), gerenciado pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS).
O objetivo deste trabalho foi analisar a tendência de mortalidade por leucemias em menores de 20 anos de idade, nas capitais dos estados brasileiros, durante o período de 1980 a 2015, com o propósito de traçar um panorama da situação epidemiológica dessa doença e fornecer subsídios para políticas públicas.
Métodos
Foi realizado um estudo descritivo de série temporal, utilizando dados de óbitos por leucemia em crianças e adolescentes (0 a 19 anos) de ambos os sexos, residentes nas 26 capitais dos estados brasileiros e no Distrito Federal, no período de 1980 a 2015.
Os óbitos por leucemia foram obtidos diretamente do SIM. Foram analisados os dados de mortalidade referentes às capitais dos estados e ao Distrito Federal por serem mais robustos quando comparados ao conjunto de dados dos estados; isto porque alguns destes estados apresentam baixa cobertura, elevado sub-registro de óbitos e grande número de mortes por causas mal definidas, ademais de um alto percentual de causas externas de tipo ignorado.
Foram considerados os óbitos codificados como 204 (Leucemia linfoide), 205 (Leucemia mieloide), 206 (Leucemia monocítica), 207 (Outras leucemias especificadas) ou 208 (Leucemias tipo celular não especificadas), segundo a 9ª Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-9), vigente no período de 1980 a 1995; em 1996 entrou em vigor a 10ª Revisão da CID, cujos respectivos (novos) códigos C91 (Leucemia linfoide), C92 (Leucemia mieloide), C93 (Leucemia monocítica), C94 (Outras leucemias de células de tipo específicas) e C95 (Leucemia de tipo celular não especificado) foram considerados no período de 1996 a 2015. Para o conjunto das capitais, também foram realizadas análises conforme os tipos de leucemia: linfoide, mieloide e outras (206, 207 e 208 da CID-9; C93, C94 e C95 da CID-10). Para cada capital, foram realizadas apenas análises do somatório das leucemias, visando minimizar as oscilações das taxas de mortalidade decorrentes de se trabalhar com um número de desfechos reduzido.
Utilizou-se o tamanho da população de crianças e adolescentes residentes nas capitais em cada ano, calculado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e disponível no sítio eletrônico do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus). Para os anos de 1980 a 2012, os dados se basearam nos censos demográficos de 1980, 1991, 2000 e 2010, na contagem populacional de 1996 e nas estimativas populacionais intercensitárias (1981-2012). As populações dos anos de 2013 a 2015 provieram de estimativas preliminares, efetuadas em estudo patrocinado pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde (Ripsa). As projeções de população e suas revisões foram produzidas com base em diferentes fontes e metodologias; eventuais divergências com outras projeções e estimativas são possíveis, podendo até mesmo afetar os cálculos das taxas de mortalidade. Seguindo a recomendação do IBGE, foram utilizadas as revisões de projeção de população mais recentes, no sentido de maximizar a comparabilidade entre os anos analisados.
Foram calculadas taxas de mortalidade por leucemia (por 100 mil habitantes) específicas por idade (em anos: 0 a 4, 5 a 9, 10 a 14, 15 a 19)7,8 e por capital, segundo sexo. Para a faixa etária <20 anos, as taxas foram padronizadas pelo método direto, utilizando-se a população mundial proposta por Segi e modificada por Doll et al.,9 referente à faixa etária do estudo, com a intenção de controlar o efeito da mudança da distribuição etária ao longo do tempo.
Os dados populacionais e dos óbitos de residentes em Palmas foram considerados a partir de 1992: a cidade foi criada em 1989 e instituída como capital do Tocantins em 1990, permitindo que os registros fossem realizados após esse período.
Para a análise de tendência, foi realizada uma regressão linear pelo método de Prais-Winsten, tendo como variável independente X o ano de ocorrência dos óbitos e como variável dependente Y a taxa de mortalidade anual de cada capital. O método de Prais-Winsten é indicado para corrigir a autocorrelação serial em séries temporais. O teste de Durbin-Watson foi utilizado para verificar a existência de autocorrelação da série.10 O modelo de regressão de Prais-Winsten permitiu a estimação dos valores de beta 1 (b1) das taxas de mortalidade padronizadas, também por sexo e faixa etária. Posteriormente, os valores de b1 correspondentes a cada uma das taxas foram aplicados à seguinte fórmula, com o objetivo de identificar as taxas de variação anual, ou anual percent chance (APC):
Pela análise da APC, pode-se dizer que uma tendência é crescente quando a taxa de variação é positiva, decrescente quando é negativa, e estacionária quando não existe diferença significativa entre seu valor e zero. O cálculo do intervalo de confiança (IC) foi realizado com a aplicação da seguinte fórmula:
Os valores de b1 mínimo e b1 máximo foram obtidos no IC gerado após as análises da regressão pelo programa de análise estatística Stata versão 10.0. Foi considerado o nível de significância de 0,05.
O estudo não foi submetido à apreciação de Comitê de Ética em Pesquisa por tratar de dados secundários, de domínio público, sem a utilização de dados nominais que possibilitassem a identificação dos indivíduos, em conformidade com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 510, de 7 de abril de 2016.
Resultados
No período de 1980 a 2015, ocorreram 10.135 óbitos por leucemia em crianças e adolescentes (0 a 19 anos) residentes nas 26 capitais dos estados brasileiros e no Distrito Federal, sendo 5.854 óbitos do sexo masculino e 4.276 do sexo feminino; cinco óbitos não apresentaram informação quanto ao sexo e foram excluídos das análises por essa variável. As taxas de mortalidade por leucemia padronizadas por idade, em menores de 20 anos de ambos os sexos, reduziram-se de 2,73 para 1,58/100 mil habitantes no período estudado. A análise por tipo de leucemia mostrou redução de 1,21 para 0,98/100 mil hab. para a leucemia linfoide, de 0,83 para 0,45/100 mil hab. para a leucemia mieloide, e de 0,68 para 0,16/100 mil hab. para as demais leucemias (Figura 1).
Houve maiores taxas de mortalidade no sexo masculino em quase todos os anos estudados (Figura 1), nas diferentes faixais etárias, e em todos os anos para o grupo etário de 15 a 19 anos (Figura 2).
Observou-se, ao longo do período estudado, redução na magnitude das taxas de mortalidade por capitais do Brasil em todas as faixas etárias, com variação de -7,06% (IC95% -8,61;-5,49) para o menores de 20 anos. A análise de tendência temporal por sexo e faixa etária evidenciou redução na mortalidade para ambos os sexos; porém, meninas de 15 a 19 anos apresentaram a menor APC no período analisado (-2,80%: IC95% -3,90;-1,68). A análise por tipo de leucemia mostrou tendência decrescente da mortalidade por leucemia linfoide de -2,92% (IC95% -4,29;-1,53), por leucemia mieloide de -1,27% (IC95% -1,77;-0,77), e por outras leucemias de -2,94% (IC95% -3,46;-2,42). Entretanto, para as leucemias linfoide e mieloide, essa tendência decrescente não foi observada em todas as faixas etárias (Tabela 1).
Variáveis | Variação anual percentual (APCa %) | Intervalo de confiança de 95% (IC95%) | Valor de pb | Tendência |
---|---|---|---|---|
Idade (em anos) | ||||
0-4 | -9,17 | (-11,58;-6,69) | <0,001 | Decrescente |
5-9 | -9,27 | (-11,90;-6,56) | <0,001 | Decrescente |
10-14 | -4,86 | (-6,69;-3,00) | <0,001 | Decrescente |
15-19 | -3,77 | (-5,22;-2,31) | <0,001 | Decrescente |
<20c | -7,06 | (-8,61;-5,49) | <0,001 | Decrescente |
Sexo | ||||
Masculino (por idade, em anos) | ||||
0-4 | -10,23 | (-14,18;-6,09) | <0,001 | Decrescente |
5-9 | -8,39 | (-11,95;-4,68) | <0,001 | Decrescente |
10-14 | -5,74 | (-7,62;-3,82) | <0,001 | Decrescente |
15-19 | -5,14 | (-7,57;-2,64) | <0,001 | Decrescente |
<20c | -7,67 | (-9,91;-5,37) | <0,001 | Decrescente |
Feminino (por idade, em anos) | ||||
0-4 | -8,33 | (-9,58;-7,05) | <0,001 | Decrescente |
5-9 | -10,12 | (-12,85;-7,30) | <0,001 | Decrescente |
10-14 | -4,00 | (-6,66;-1,27) | 0,006 | Decrescente |
15-19 | -2,80 | (-3,90;-1,68) | <0,001 | Decrescente |
<20c | -6,56 | (-7,69;-5,42) | <0,001 | Decrescente |
Tipo de leucemia (por idade, em anos) | ||||
Linfoide | ||||
0-4 | -4,75 | (-7,06;-2,38) | <0,001 | Decrescente |
5-9 | -5,19 | (-7,63;-2,69) | <0,001 | Decrescente |
10-14 | -1,31 | (-2,64;0,03) | 0,056 | Estacionária |
15-19 | 0,37 | (-0,79;1,54) | 0,521 | Estacionária |
<20c | -2,92 | (-4,29;-1,53) | <0,001 | Decrescente |
Mieloide | ||||
0-4 | -0,57 | (-1,29;0,17) | 0,125 | Estacionária |
5-9 | -1,42 | (-2,27;-0,55) | 0,002 | Decrescente |
10-14 | -1,46 | (-2,43;-0,47) | 0,005 | Decrescente |
15-19 | -1,84 | (-2,86;-0,81) | 0,001 | Decrescente |
<20c | -1,27 | (-1,77;-0,77) | <0,001 | Decrescente |
Outras leucemias | ||||
0-4 | -4,11 | (-4,80;-3,41) | <0,001 | Decrescente |
5-9 | -2,76 | (-3,53;-1,98) | <0,001 | Decrescente |
10-14 | -2,17 | (-2,78;-1,54) | <0,001 | Decrescente |
15-19 | -2,38 | (-3,20;-1,56) | <0,001 | Decrescente |
<20c | -2,94 | (-3,46;-2,42) | <0,001 | Decrescente |
a) APC: annual percent change ou variação percentual anual.
b) Regressão de Prais-Winsten.
c) Tendência das taxas padronizadas por idade.
As médias trienais das taxas de mortalidade por capitais do Brasil são apresentadas na Tabela 2. Todas as capitais da região Sudeste apresentaram declínio nessas taxas, tendo como ponto de comparação o primeiro triênio do período. Por exemplo, a capital Vitória apresentou a segunda menor taxa de mortalidade por triênio do Brasil (0,35/100 mil hab.), em 2007-2009. Na região Sul, Porto Alegre e Curitiba apresentaram diminuição nas taxas de mortalidade, embora essa tendência tenha-se mostrado mais contínua a partir de 1998-2000. Em Florianópolis, foi verificada redução na magnitude de mortalidade por leucemias entre 1995-1997 e 2007-2009, passando de 3,48 para 0,29/100 mil hab., a menor entre as capitais estudadas. A maior taxa de mortalidade da região Nordeste correspondeu à capital Natal (3,69/100 mil hab.), em 1983-1985; a propósito, as taxas de mortalidade das capitais nordestinas apresentaram grandes oscilações, entre aumentos e decréscimos, durante a série histórica observada. A região Norte registrou a segunda maior taxa de mortalidade entre as capitais: 4,15/100 mil hab. <20 anos, em Belém (1983-1985). Na região Centro-Oeste encontrou-se a capital com a maior taxa de mortalidade, Goiânia (4,53/100 mil hab. em 1980-1982), porém com oscilações na magnitude: seu menor registro correspondeu a 2004-2006, com 1,99/100 mil hab. <20 anos.
Capitais, por região | 1980/82 | 1983/85 | 1986/88 | 1989/91 | 1992/94 | 1995/97 | 1998/00 | 2001/03 | 2004/06 | 2007/09 | 2010/12 | 2013/15 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Sudeste | ||||||||||||
Rio de Janeiro | 3,01 | 2,82 | 2,50 | 2,34 | 2,07 | 2,42 | 2,27 | 1,46 | 1,68 | 1,52 | 1,60 | 1,29 |
São Paulo | 2,27 | 2,36 | 1,95 | 1,93 | 1,76 | 1,81 | 1,61 | 1,83 | 1,51 | 1,66 | 1,49 | 1,14 |
Belo Horizonte | 2,61 | 3,27 | 2,73 | 3,16 | 2,47 | 2,10 | 1,59 | 1,75 | 1,33 | 1,48 | 1,74 | 1,68 |
Vitória | 3,27 | 1,65 | 2,67 | 3,37 | 1,98 | 2,40 | 2,25 | 2,13 | 1,87 | 0,35 | 0,80 | 1,43 |
Sul | ||||||||||||
Porto Alegre | 2,86 | 3,68 | 2,88 | 2,33 | 2,46 | 2,04 | 2,49 | 1,47 | 1,29 | 1,76 | 1,18 | 1,84 |
Florianópolis | 1,19 | 2,41 | 2,57 | 2,31 | 3,33 | 3,48 | 1,90 | 1,56 | 0,68 | 0,29 | 2,06 | 0,84 |
Curitiba | 2,70 | 2,91 | 2,42 | 3,11 | 2,25 | 1,73 | 2,13 | 2,05 | 1,71 | 1,70 | 1,05 | 1,46 |
Nordeste | ||||||||||||
Maceió | 2,18 | 1,84 | 1,79 | 1,25 | 2,69 | 1,02 | 2,41 | 1,47 | 1,81 | 1,91 | 1,54 | 1,35 |
Fortaleza | 2,84 | 2,33 | 1,95 | 2,30 | 1,79 | 1,66 | 2,59 | 1,91 | 1,20 | 1,47 | 1,97 | 1,34 |
João Pessoa | 1,46 | 2,52 | 2,82 | 2,51 | 3,36 | 1,99 | 1,03 | 2,58 | 0,45 | 1,62 | 1,60 | 0,76 |
Natal | 1,66 | 3,69 | 1,37 | 1,29 | 1,91 | 2,78 | 2,47 | 2,10 | 1,44 | 1,51 | 2,19 | 1,48 |
Aracaju | 2,66 | 1,28 | 1,20 | 2,41 | 2,79 | 1,46 | 1,32 | 1,08 | 1,83 | 1,84 | 2,06 | 1,65 |
Recife | 2,83 | 1,96 | 2,24 | 1,95 | 2,29 | 1,28 | 1,47 | 1,01 | 1,06 | 1,47 | 1,03 | 1,01 |
Salvador | 2,58 | 2,85 | 2,36 | 1,65 | 2,32 | 1,98 | 0,88 | 1,51 | 1,24 | 1,21 | 1,01 | 1,33 |
Teresina | 1,43 | 1,82 | 1,75 | 1,92 | 2,86 | 1,21 | 2,47 | 2,31 | 1,81 | 2,17 | 2,96 | 1,59 |
São Luís | 1,37 | 2,19 | 1,52 | 1,43 | 1,33 | 1,86 | 2,70 | 2,00 | 1,77 | 1,94 | 2,69 | 1,75 |
Norte | ||||||||||||
Belém | 2,78 | 4,15 | 2,14 | 2,30 | 2,43 | 2,93 | 2,93 | 3,59 | 2,75 | 2,09 | 2,70 | 2,71 |
Boa Vista | 1,94 | 2,37 | 2,52 | 1,56 | 0,00 | 0,40 | 1,08 | 1,67 | 0,86 | 0,30 | 0,60 | 2,64 |
Macapá | 3,19 | 0,84 | 1,93 | 2,19 | 2,39 | 3,05 | 2,46 | 1,34 | 2,33 | 2,15 | 2,03 | 1,68 |
Manaus | 2,83 | 2,29 | 2,13 | 1,93 | 2,54 | 1,90 | 2,51 | 3,33 | 2,24 | 2,60 | 2,88 | 3,07 |
Palmasa | - | - | - | - | 0,00 | 0,00 | 1,06 | 1,33 | 2,00 | 2,47 | 1,51 | 2,73 |
Porto Velho | 1,31 | 1,39 | 1,41 | 1,44 | 1,30 | 0,48 | 2,36 | 2,87 | 1,18 | 1,73 | 1,90 | 1,31 |
Rio Branco | 2,41 | 2,64 | 2,32 | 1,40 | 3,35 | 1,41 | 2,69 | 1,96 | 1,23 | 1,98 | 2,70 | 3,13 |
Centro-Oeste | ||||||||||||
Brasília (DF) | 2,84 | 2,25 | 2,04 | 2,04 | 1,76 | 1,84 | 1,34 | 1,38 | 1,01 | 1,18 | 1,23 | 1,54 |
Campo Grande | 2,82 | 3,67 | 3,16 | 2,39 | 2,67 | 2,42 | 1,92 | 2,57 | 1,20 | 1,88 | 2,64 | 1,40 |
Cuiabá | 2,59 | 2,99 | 3,94 | 2,86 | 2,47 | 2,39 | 2,36 | 1,93 | 2,20 | 2,36 | 2,18 | 1,36 |
Goiânia | 4,53 | 2,99 | 2,52 | 2,43 | 3,03 | 2,34 | 2,27 | 2,08 | 1,99 | 3,29 | 2,38 | 1,96 |
Brasil | 2,59 | 2,63 | 2,21 | 2,15 | 2,13 | 1,95 | 1,94 | 1,87 | 1,53 | 1,68 | 1,74 | 1,53 |
a) Os dados de Palmas compreendem o período de 1992 a 2015.
Na região Sudeste, quase todas as capitais apresentaram tendência decrescente para mortalidade por leucemias em indivíduos <20 anos, de ambos os sexos; a exceção coube a Vitória, que apresentou tendência estacionária no sexo feminino. A região Sul também apresentou tendência decrescente em Porto Alegre e para as meninas de Florianópolis, enquanto os meninos desta cidade e as meninas de Curitiba referiram taxas com comportamento estacionário. Na região Nordeste, somente Fortaleza, João Pessoa, Recife e Salvador apresentaram tendência decrescente. Em São Luís, a tendência foi crescente apenas para o sexo feminino (APC=8,28%: IC95% 2,57;14,30). Palmas foi a única capital da região Norte a apresentar uma tendência crescente, inclusive na segmentação por sexo (APC=33,54%: IC95% 16,36;53,26), enquanto Manaus apresentou tendência crescente somente no sexo feminino (APC=5,38%: IC95% 0,42;10,58). Na região Centro-Oeste houve predominância de tendência decrescente; entretanto, Brasília (Distrito Federal) e Campo Grande apresentaram tendência estacionária para o sexo feminino, e Goiânia para o sexo masculino (Tabela 3).
Capitais, por região | Variação percentual anual (APCa %) | Intervalo de confiança de 95% (IC95%) | Valor de pb | Tendência |
---|---|---|---|---|
Sudeste | ||||
Rio de Janeiro | -10,78 | -13,63;-7,85 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -11,46 | -15,23;-7,53 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -10,04 | -13,13;-6,85 | <0,001 | Decrescente |
São Paulo | -6,42 | -8,17;-4,63 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -6,82 | -9,34;-4,24 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -6,06 | -8,00;-4,07 | <0,001 | Decrescente |
Belo Horizonte | -11,31 | -14,87;-7,60 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -9,67 | -15,74;-3,15 | 0,005 | Decrescente |
Feminino | -12,60 | -16,65;-8,34 | <0,001 | Decrescente |
Vitória | -12,79 | -19,25;-5,81 | 0,001 | Decrescente |
Masculino | -17,96 | -32,26;-0,64 | 0,043 | Decrescente |
Feminino | -6,94 | -18,58;6,37 | 0,282 | Estacionária |
Sul | ||||
Porto Alegre | -12,26 | -15,94;-8,42 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -14,74 | -19,82;-9,34 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -9,79 | -14,61;-4,69 | 0,001 | Decrescente |
Florianópolis | -9,31 | -19,64;2,34 | 0,110 | Estacionária |
Masculino | 3,16 | -15,59;26,07 | 0,755 | Estacionária |
Feminino | -19,86 | -26,19;-12,99 | <0,001 | Decrescente |
Curitiba | -10,80 | -13,72;-7,78 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -15,92 | -20,66;-10,89 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -5,48 | -10,88;0,24 | 0,059 | Estacionária |
Nordeste | ||||
Maceió | -2,96 | -8,30;2,68 | 0,287 | Estacionária |
Masculino | -1,98 | -10,15;6,93 | 0,643 | Estacionária |
Feminino | -4,54 | -10,68;2,03 | 0,165 | Estacionária |
Fortaleza | -7,27 | -11,57;-2,76 | 0,003 | Decrescente |
Masculino | -4,28 | -10,29;2,14 | 0,180 | Estacionária |
Feminino | -10,31 | -14,61;-5,79 | <0,001 | Decrescente |
João Pessoa | -9,67 | -17,63;-0,95 | 0,032 | Decrescente |
Masculino | -13,66 | -23,86;-2,09 | 0,023 | Decrescente |
Feminino | -5,21 | -16,86;8,07 | 0,413 | Estacionária |
Natal | -3,30 | -11,36;5,49 | 0,438 | Estacionária |
Masculino | -4,00 | -14,93;8,34 | 0,498 | Estacionária |
Feminino | -3,13 | -11,71;6,28 | 0,491 | Estacionária |
Aracaju | -2,36 | -10,70;6,76 | 0,590 | Estacionária |
Masculino | -2,58 | -12,30;8,22 | 0,617 | Estacionária |
Feminino | -3,22 | -13,24;7,96 | 0,547 | Estacionária |
Recife | -10,69 | -13,87;-7,38 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -15,46 | -20,70;-9,88 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -5,96 | -9,97;-1,77 | 0,007 | Decrescente |
Salvador | -11,25 | -15,24;-7,07 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -10,48 | -16,72;-3,77 | 0,004 | Decrescente |
Feminino | -11,96 | -15,30;-8,49 | <0,001 | Decrescente |
Teresina | 4,27 | -1,56;10,44 | 0,149 | Estacionária |
Masculino | 4,34 | -7,06;17,13 | 0,461 | Estacionária |
Feminino | 4,12 | -5,52;14,75 | 0,404 | Estacionária |
São Luís | 5,44 | -0,11;11,30 | 0,055 | Estacionária |
Masculino | 1,60 | -6,04;9,87 | 0,682 | Estacionária |
Feminino | 8,28 | 2,57;14,30 | 0,005 | Crescente |
Norte | ||||
Belém | -1,77 | -9,20;6,25 | 0,646 | Estacionária |
Masculino | -0,30 | -8,78;8,96 | 0,945 | Estacionária |
Feminino | -4,43 | -11,57;3,29 | 0,244 | Estacionária |
Boa Vista | -4,01 | -16,61;10,49 | 0,558 | Estacionária |
Masculino | -6,21 | -21,61;12,21 | 0,472 | Estacionária |
Feminino | -4,51 | -18,22;11,51 | 0,550 | Estacionária |
Macapá | -1,47 | -10,83;8,87 | 0,765 | Estacionária |
Masculino | -5,73 | -15,91;5,68 | 0,301 | Estacionária |
Feminino | 2,09 | -8,96;14,48 | 0,716 | Estacionária |
Manaus | 4,25 | -0,25;8,94 | 0,063 | Estacionária |
Masculino | 3,54 | -4,13;11,83 | 0,365 | Estacionária |
Feminino | 5,38 | 0,42;10,58 | 0,034 | Crescente |
Palmasc | 33,54 | 16,36;53,26 | <0,001 | Crescente |
Masculino | 47,84 | 15,90;88,60 | 0,003 | Crescente |
Feminino | 21,30 | 7,51;36,85 | 0,003 | Crescente |
Porto Velho | 3,19 | -4,62;11,64 | 0,423 | Estacionária |
Masculino | 1,67 | -7,49;11,73 | 0,724 | Estacionária |
Feminino | 3,67 | -10,16;19,63 | 0,612 | Estacionária |
Rio Branco | 0,80 | -9,05;11,72 | 0,876 | Estacionária |
Masculino | 11,57 | -5,00;31,03 | 0,176 | Estacionária |
Feminino | -9,59 | -21,48;4,10 | 0,155 | Estacionária |
Centro-Oeste | ||||
Brasília (DF) | -8,27 | -12,05;-4,32 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -10,45 | -14,59;-6,11 | <0,001 | Decrescente |
Feminino | -5,63 | -11,30;0,41 | 0,066 | Estacionária |
Campo Grande | -10,32 | -16,59;-3,57 | 0,004 | Decrescente |
Masculino | -14,95 | -24,35;-4,38 | 0,008 | Decrescente |
Feminino | -5,91 | -15,83;5,18 | 0,274 | Estacionária |
Cuiabá | -10,36 | -14,81;-5,68 | <0,001 | Decrescente |
Masculino | -8,89 | -16,66;-0,40 | 0,041 | Decrescente |
Feminino | -12,08 | -19,98;-3,40 | 0,009 | Decrescente |
Goiânia | -8,44 | -14,22;-2,27 | 0,009 | Decrescente |
Masculino | -9,14 | -19,15; 2,12 | 0,105 | Estacionária |
Feminino | -8,31 | -12,08;-4,38 | <0,001 | Decrescente |
a) APC: annual percent change ou variação percentual anual.
b) Regressão de Prais-Winsten.
c) Palmas compreende o período de 1992 a 2015.
Discussão
De 1980 a 2015, a taxa de mortalidade para leucemias em crianças e adolescentes apresentou tendência decrescente no conjunto das capitais estudadas, em ambos os sexos, em concordância com outros estudos realizados no país.7,11 Entretanto, um estudo que avaliou a taxa de mortalidade por leucemia em <20 anos encontrou tendência de declínio estatisticamente significativa somente nas cidades de São Paulo e Porto Alegre, possivelmente pelo curto período de tempo avaliado (1996 a 2008).8
Observando-as por faixa etária, verificou-se o predomínio de maiores taxas de mortalidade no sexo masculino. A literatura também aponta que, na maioria dos países, as mais elevadas taxas de mortalidade por leucemia ocorrem no sexo masculino,7,12,13 provavelmente devido a possíveis recaídas testiculares e a uma depuração do quimioterápico metotrexato mais rápida em meninos.14 Nos Estados Unidos, de 1975 a 2013, as taxas de mortalidade foram de 0,7 e 0,6/100 mil hab. para meninos e meninas, respectivamente,15 bem abaixo dos valores encontrados no presente estudo (1,53 e 2,63/100 mil hab.), inferiores, principalmente, aos demais países da América Latina,4 como Cuba (4,34 e 2,96/100 mil hab.), Equador (4,38 e 3,93/100 mil hab.) e México (5,28 e 4,44/100 mil hab.), respectivamente nos sexos masculino e feminino.
Nas últimas décadas, observou-se redução da mortalidade em crianças e adolescentes com câncer, principalmente em países de alta renda, como os Estados Unidos e alguns da Europa. Contudo, os dados são escassos quando se trata de países de baixa renda.1,6 Estudo publicado em 2013 observou tendências decrescentes significativas de mortalidade por leucemia na faixa de 0-14 anos, em 11 países europeus (Bulgária, República Tcheca, França, Alemanha, Hungria, Itália, Holanda, Romênia, Rússia, Espanha, Reino Unido), Estados Unidos e Japão, no período 1970-2009, para ambos os sexos.6
Avaliando-se as tendências de mortalidade por leucemia pediátrica na América, Ásia e Oceania, Chatenoud et al.1 observaram quedas significativas no Canadá, Estados Unidos, Argentina, Brasil, Chile, Cuba, Venezuela, Japão, Coreia e Austrália, para ambos os sexos, entre 1970 e 2007. No México, essa tendência foi crescente. É importante ressaltar que, apesar de países da América Latina apresentarem tendências decrescentes, suas taxas de mortalidade por leucemia pediátrica ainda são bem maiores quando comparadas às de países como Canadá, Estados Unidos e Japão.
Os resultados do presente estudo são corroborados com outros dados da América Latina. Curado et al.4 apresentaram os dados de tendência de mortalidade por leucemia em pediatria: Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica e Uruguai apresentaram tendência decrescente, em ambos os sexos, e o México apresentou tendência crescente. Observando-se a mortalidade pela doença na população mais jovem dos distintos países latino-americanos, não obstante as desigualdades apresentadas pelos diferentes sistemas de saúde, destaca-se a necessidade comum de centros oncológicos especializados para otimizar a assistência, principalmente em regiões onde as taxas de mortalidade mostram crescimento.
No presente estudo, apenas três capitais apresentaram tendência crescente: São Luís e Manaus, no sexo feminino; e Palmas (em ambos os sexos). Tendência crescente em São Luís também foi observada por Ribeiro et al.7 e em Palmas por Silva et al.,8 que, adicionalmente, detectaram crescimento em Belém e João Pessoa, divergindo do presente trabalho quanto aos achados para as últimas capitais. Estudos sugerem que a falta de acesso ao tratamento oncológico em pediatria pode gerar as diferenças observadas na taxa de mortalidade no Brasil.7,16,17 Segundo Grabois et al.,16 as regiões Sul e Sudeste contam com maior quantitativo de Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon) financiados pelo SUS, uma possível explicação para as tendências decrescentes encontradas em todas as capitais dessas regiões, para as oscilações nas demais capitais, ou mesmo para o crescimento observado em São Luís, Natal e Palmas. Ribeiro et al.7 corroboram esses dados ao relatarem, em seu estudo, uma correlação entre o chamado “índice de exclusão social” (índice que engloba pobreza, emprego, alfabetização, educação, presença de jovens e violência) e as taxas de mortalidade por leucemia infantil; ou seja, a redução na mortalidade foi mais proeminente em estados brasileiros de melhores condições socioeconômicas.
O abandono do tratamento também é um importante fator, capaz de gerar o aumento nas taxas de mortalidade, e vários estudos procuram discutir o tema e elucidar suas prováveis causas.18-21 A leucemia impõe tratamento longo e oneroso, dependente de recursos para deslocamentos até os centros oncológicos e refeições fora do domicílio, e muitos pacientes - e seus familiares - não dispõem de apoio social e econômico para manter essa rotina:19,20 16 a 50% deles abandonam o tratamento.18 A proporção desse abandono difere, a depender da condição de país de baixa ou de média-alta renda: 29% versus 2% (p<0,0001), respectivamente.19 Salienta-se que, após a implantação de um programa de assistência social no México, intitulado ‘Seguro Popular’, houve um decréscimo no percentual de abandono do tratamento pelos pacientes pediátricos com leucemia, aproximando-o do de países economicamente desenvolvidos (de 21,4% para 13,3%; p=0,001).20
Mundo afora, a sobrevida global de pacientes pediátricos com leucemia revela diferenças significativas entre indivíduos com baixa renda (49,8%) e com renda satisfatória (62,9%).21 Na Indonésia, verificou-se uma sobrevida livre de doença de 45% em condições financeiras satisfatórias, significativamente superior à de 11% entre crianças e adolescentes com baixa renda familiar (p=0,01), referindo-se à renda como um determinante mais importante do que a própria educação formal. Para melhorar a sobrevivência, todavia, é necessária uma atenção especial ao diagnóstico precoce, controle de infecções e educação dos pais/cuidadores.22
A mesma tendência decrescente na mortalidade por leucemia observada aqui, ao se analisar todas as capitais brasileiras, ambos os sexos e diversas faixas etárias, foi encontrada em estudo realizado nos Estados Unidos; seus autores atribuíram essa tendência à evolução no tratamento das leucemias ocorrido nos últimos 10-15 anos, inclusive com a otimização de protocolos quimioterápicos específicos para a população pediátrica.23 Outras pesquisas destacam, como justificativa para essa queda na mortalidade, os protocolos quimioterápicos que apresentam redução da quimiotoxicidade e melhores técnicas de diagnóstico, permitindo um tratamento direcionado e, por conseguinte, o forte aprimoramento do prognóstico das leucemias.4,6
No Brasil, houve mudanças no tratamento das leucemias ao longo dos anos. Até a década de 1980, a leucemia mielocítica aguda (LMA) em crianças era considerada incurável. Entretanto, com a organização de grupos cooperativos para o tratamento e a introdução de novos fármacos, ocorreu uma redução da mortalidade.24 Segundo um estudo realizado com 86 crianças com LMA em Minas Gerais, no período 1986-2000, a taxa de remissão completa da doença foi de 40% até 1990 e de 64% após a introdução do protocolo quimioterápico alemão (1991-2002), com mudança na sobrevida de 6,7% para 39,4%.25
Para o tratamento da LLA em crianças, o Grupo Cooperativo Brasileiro de Tratamento de Leucemia Linfocítica Aguda na Infância (GBTLI) desenvolve ensaios clínicos desde 1980. Com o passar dos anos e a atualização dos protocolos GBTLI, a sobrevida global e a sobrevida livre de eventos em cinco anos atingiu valores de 92,5% (±1,5%) e 83,6% (±2,1%), respectivamente. Embora os esquemas terapêuticos possam variar entre os diversos centros especializados em hematologia pediátrica, o que se observa é a efetividade do tratamento ao longo dos anos, com probabilidade de cura superior a 80% para a LLA.26
Neste estudo, a análise por tipo de leucemia mostrou tendência decrescente na mortalidade para linfoide, mieloide e outros tipos, e estabilidade para algumas faixas etárias, para leucemia linfoide e mieloide. O presente estudo corrobora outro27 sobre a tendência de mortalidade por tipos de leucemia no Brasil, focado no período de 1980 a 2010: tendência decrescente em todas as faixas etárias para outros tipos de leucemia. Para a leucemia linfoide, entretanto, seus autores verificaram tendência linear crescente na faixa etária de 15 a 19 anos, e estabilidade para as demais idades. Já para a leucemia mieloide, mostrou-se tendência crescente nas faixas etárias mais jovens (0 a 14 anos) e estabilidade nas demais. Os presentes achados também sugerem um comportamento diferente da tendência nas idades de 10 a 19 anos, no caso da leucemia linfoide, e nas de 0 a 4 anos, no caso da mieloide. Porém, diferentemente do estudo recém-citado, as faixas etárias mais jovens (0-4 anos) apresentaram estabilidade, enquanto as demais (10-19 anos), tendência crescente.
A decisão metodológica do presente estudo, de se trabalhar apenas com os dados das capitais e não com os do Brasil como um todo, deve-se ao fato de essas localidades possuírem registros de melhor qualidade e cobertura, reduzindo as subnotificações, principalmente para anos mais antigos. Essa diferença metodológica pode, ao menos em parte, explicar as diferenças encontradas entre o presente estudo e o de Silva et al.27
Entre as limitações encontradas por estes pesquisadores, salienta-se que o objeto do estudo foi o conjunto dos óbitos por leucemia, não sendo possível discriminar entre precoces e tardios, evitáveis ou não. Outrossim, por se tratar de um estudo com dados secundários, cumpre lembrar que esses dados são vulneráveis a restrições de qualidade e cobertura. Segundo publicação da Organização Mundial da Saúde (OMS), os dados de mortalidade do Brasil apresentam qualidade intermediária, comparável às de países como Bélgica, França, Alemanha, Itália, Holanda, Espanha, Dinamarca, Suíça e Suécia.28 No Brasil, o Ministério da Saúde tem tomado diversas iniciativas no sentido de aprimorar a qualidade da informação e da cobertura do SIM, como por exemplo, (i) a redução na proporção de óbitos por causas mal definidas, (ii) a diminuição na proporção de registros com campos ignorados ou em branco e (iii) a redução no intervalo de tempo entre a ocorrência de eventos, sua captação pelo sistema e transferência para o Datasus. Os dados de mortalidade das capitais também referem maior cobertura e melhor qualidade dos registros de óbitos, superiores às do conjunto do país.29
A utilização dos dados do SIM apresenta como vantagens, além de permitir a análise da série histórica, dimensionar a magnitude das taxas de mortalidade como problema de Saúde Pública. O SIM também expressa as condições de diagnóstico e da assistência médica à população. O alto grau de confiabilidade e a validade das Declarações de Óbito cuja causa básica de morte é uma neoplasia têm sido demonstrados por estudos nacionais.29,30
Poucas investigações abordam a tendência de mortalidade por leucemia em pediatria no Brasil. Esta pesquisa fornece taxas de mortalidade por leucemia e suas tendências para a população pediátrica nas capitais brasileiras, entre 1980 e 2015. Além de apresentar importantes indicadores de qualidade do sistema de saúde, seus achados servirão a futuros estudos epidemiológicos. A avaliação da tendência de mortalidade é uma ferramenta útil para o monitoramento do perfil epidemiológico, medindo o impacto do tratamento e do sistema de saúde de uma população, e auxiliando nas medidas de gestão em Saúde Pública.