Prezados Editores,
Os resultados do artigo de Borges et al.,1 intitulado ‘Câncer de tireoide no Brasil: estudo descritivo dos casos informados pelos registros hospitalares de câncer, 2000-2016’, publicado no fascículo 4 do volume 29 da RESS, mostram as potencialidades dos registros hospitalares de câncer (RHC) no delineamento de perfis de diagnóstico e tratamento do paciente com neoplasia de tireoide no Brasil; e também deixam transparecer as fragilidades desse sistema, implantado na rede de atenção ao paciente oncológico habilitada pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Em consonância com a literatura nacional e internacional,2,3,4o referido estudo evidenciou aumento nos casos de câncer de tireoide no país, ainda que 3.482 casos (6,2%) tenham sido excluídos dos 56.394 potencialmente elegíveis por ausência da informação sobre tipo histológico. Os baixos percentuais de incompletude (<5%) das variáveis ‘sexo’, ‘idade’, ‘diagnóstico e tratamento anteriores’ e ‘Unidade da Federação’ de residência e de tratamento permitiram observar: (i) a maior razão de sexos; (ii) a distribuição etária e o tipo de tumor (45 a 55, 50 e 60 anos, para carcinoma diferenciado, medular e anaplásico, respectivamente); e (iii) a migração dos indivíduos em busca de atendimento como causa do atraso de seu tratamento.
No estudo, a elevada incompletude do estadiamento do tumor foi reduzida a 39,6%, utilizando-se a correlação entre o estadiamento e a TNM (em inglês, Classification of Malignant Tumors, ou Classificação de Tumores Malignos). O estadiamento do tumor é, reconhecidamente, a variável definidora do tratamento mais adequado e do prognóstico; entretanto, o método para redução utilizado no trabalho não é descrito com suficiente clareza, de maneira a permitir sua replicação.
Destaca-se, outrossim, que não há descrição, nos métodos do estudo, de como foi obtida a informação do tratamento de radioiodoterapia, uma vez que essa opção terapêutica não está disponível no RHC. Apenas a radioterapia é contemplada. Ao se considerarem as duas modalidades equivalentes, há o risco de interpretações inadequadas, por se tratar de terapias diversas, tanto no que se refere à indicação quanto às finalidades terapêuticas, ambas dependentes de variáveis e especificidades que diferem nos três grupos de tumores analisados.
Os autores do manuscrito ressaltam a necessidade do preenchimento adequado dos prontuários assistenciais, fontes de dados para planejamento, controle e avaliação da rede de atenção ao paciente oncológico, a que acrescentaríamos o fato de algumas das limitações observadas decorrerem de problemas nos RHCs. Poder-se-ia apontar, por exemplo, a necessidade de revisão da Ficha de Registro de Tumor, especialmente no que se refere a modalidades terapêuticas - no caso, das neoplasias de tireoide - e atualizações da classificação TNM, à medida de sua publicação.