Introdução
Nos últimos anos, as coberturas de exames de mamografia e citopatológicos têm se ampliado no Brasil.1,2 Segundo o inquérito da Vigilância de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), a proporção de mulheres na idade de 50 a 69 anos que informaram ter realizado mamografia passou de 71%, em 2007, para 77% em 2019. Já a proporção de mulheres com idade entre 25 e 64 anos que afirmaram ter realizado o exame citopatológico foi superior a 80% durante esse mesmo período de 12 anos.1,2
Apesar de uma alta proporção de mulheres afirmarem realizar exames de rastreamento de câncer de colo uterino e de mama, observa-se menor cobertura entre aquelas com maior vulnerabilidade social, principalmente nas regiões mais pobres do país.3-6 Este problema parece estar relacionado a dificuldades no acesso a esses exames,7-10 além de determinantes sociais, como baixa escolaridade,4,5,11 raça/cor da pele preta e parda11,12 e utilização do setor público de saúde.11
As desigualdades regionais e sociais na cobertura da realização dos exames preventivos de mamografia e citopatológicos tornam-se ainda mais preocupantes diante da constatação de que, no ano de 2020, mais de 80 mil mulheres foram acometidas por câncer de mama ou de colo do útero no Brasil, respectivamente o primeiro e o terceiro tipos de câncer mais frequentes no sexo feminino no país.13 Em 2018, mais de 107 mil mulheres brasileiras morreram devido ao câncer, entre as quais 16% em consequência de câncer de mama e 6% de câncer de colo do útero.13
O diagnóstico e o tratamento precoces aumentam o potencial de cura dessas formas de câncer.14 No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda o rastreamento do câncer de mama por mamografia a cada dois anos, em mulheres com idade entre 50 e 69 anos.15 Quanto ao exame citopatológico para rastreamento do câncer de colo do útero, o Ministério da Saúde recomenda que seja realizado a cada três anos, em mulheres com 25 anos ou mais de idade, com atividade sexual anterior ou atual, e com dois exames de resultados negativos em anos consecutivos.16
Desigualdades na realização da mamografia e do exame citopatológico influenciam, de modo determinante, a progressão e o desfecho dos cânceres de mama e de colo do útero.17 Questões como o nível de desenvolvimento e os serviços de saúde ofertados nas regiões de moradia, além do intervalo de tempo entre o diagnóstico e o tratamento, são imprescindíveis de se abordar, visando à compreensão do processo saúde-doença.11,17,18
A necessidade de ampliação da cobertura de mamografia e manutenção dos níveis de cobertura da oferta de exames citopatológicos no território brasileiro1,2 torna relevante a análise das desigualdades para a realização desses exames, visando identificar grupos com maior dificuldade de acesso a esses serviços, monitorar e determinar a continuidade das ações envolvidas e/ou propor novas intervenções. O uso do índice angular de desigualdade (slope index of inequality [SII]), que permite calcular a desigualdade absoluta levando em consideração o tamanho da amostra em cada subgrupo da variável de estratificação, ainda é incomum em pesquisas sobre o tema no Brasil. Esta pesquisa teve como objetivo analisar as desigualdades regionais e sociais na realização de mamografia e exame citopatológico em mulheres residentes nas capitais brasileiras e no Distrito Federal.
Métodos
Contexto
Desde 2006, o Vigitel estuda a população com 18 anos ou mais de idade, residente nas 26 capitais dos estados brasileiros e no Distrito Federal, com o propósito de identificar o perfil epidemiológico da população, ao monitorar, por inquérito telefônico, a frequência e a composição dos determinantes das doenças crônicas não transmissíveis no país.2
Processo amostral
O processo de amostragem do Vigitel ocorreu em dois estágios, sendo a primeira etapa constituída pelo sorteio das linhas telefônicas, por cidade, utilizando-se do cadastro eletrônico das empresas telefônicas de linhas residenciais fixas: foram sorteadas 197.600 linhas telefônicas. Na segunda etapa, realizou-se o sorteio de um dos adultos residentes no domicílio sorteado. Ao final, a amostra probabilística totalizou 52.443 adultos (18 anos ou mais) residentes nas 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal, sendo cerca de 2 mil entrevistados em cada cidade.2
Para o presente estudo, foram incluídas as mulheres com idade entre 50 e 69 anos, elegíveis para realização da mamografia; e aquelas com idade entre 25 e 64 anos, elegíveis para o exame citopatológico, de acordo com as recomendações do Instituto Nacional do Câncer, órgão auxiliar do Ministério da Saúde19 (Figura 1).
Para controle do viés de seleção e garantia de que todos os indivíduos da população adulta das cidades participantes tivessem igual probabilidade de ser selecionados para participar do estudo, já que os dados da amostra são provenientes dos cadastros de linhas telefônicas fixas de cada cidade, o Vigitel atribuiu pesos para cada participante. Tal peso foi resultante da multiplicação de dois fatores: o inverso do número de linhas telefônicas no domicílio entrevistado, que corrigiu as possibilidades de serem selecionados mais de uma linha telefônica do mesmo domicílio; e o número de adultos no domicílio, que corrigiu a menor chance da seleção de mais de uma pessoa do domicílio.
Variáveis
As variáveis de desfecho foram a realização dos exames de mamografia e citopatológico em algum momento da vida, obtidas por meio do autorrelato das participantes em resposta às perguntas: A Sra. já fez alguma vez mamografia, raio-X das mamas? e A Sra. já fez alguma vez exame de Papanicolau, exame preventivo de câncer de colo do útero?
As opções de resposta eram ‘sim’ e ‘não’.
As variáveis de exposição estudadas foram:
Faixa etária para exame citopatológico (em anos: 25 a 39; 40 a 59; 60 a 64);
Faixa etária para mamografia (em anos: 50 a 59; 60 a 69);
Raça/cor da pele (branca; parda; preta);
Escolaridade (em anos: nenhum; 1 a 4; 5 a 8; 9 a 11; 12 ou mais);
Macrorregião do país (Nordeste; Norte; Centro-Oeste; Sudeste; Sul); e
Plano de saúde (não; sim).
Métodos estatísticos
A atribuição de pesos pós-estratificação para cada participante foi calculada pelo método Rake. Esse método tem por finalidade equiparar, em cada cidade, os dados sociodemográficos estimados da população com linha telefônica à estimativa dos dados sociodemográficos da população total, utilizando a distribuição de frequências simples de cada variável, como ‘faixa etária’, ‘sexo’ e ‘escolaridade’ da população, para cada capital. Este método também permite a utilização de diferentes fontes externas, no período entre censos, para a determinação desses pesos.2
Foram analisadas as associações entre as variáveis de exposição e os desfechos (realização dos exames) utilizando-se o teste qui-quadrado de Pearson, adotando-se nível de significância de 5% e intervalos de confiança de 95% (IC95%).
Para medir as desigualdades, foi utilizado o SII, uma medida absoluta de desigualdade, obtida com base na análise de regressão logística entre a variável dependente (realização dos exames) e as variáveis independentes incluídas no modelo (raça/cor da pele, escolaridade e macrorregião).20-22 O SII permite o cálculo da diferença nas prevalências de realização dos exames entre os grupos extremos da variável independente (mais favorecidos versus menos favorecidos), levando-se em consideração o tamanho da amostra em cada subgrupo dessa variável. Utilizou-se como referência, nas análises deste estudo, a raça/cor da pele branca, nenhum ano de educação formal e a região Nordeste como local de residência. Valores positivos do SII indicam prevalência do desfecho maior no grupo mais favorecido, enquanto valores negativos indicam prevalência do desfecho maior no grupo menos favorecido. Para ilustrar as desigualdades encontradas, equiplots foram elaborados.
O programa estatístico Stata, versão 12.1, foi empregado na realização de todas as análises, utilizando-se o comando svy em função do complexo processo amostral do Vigitel.
Aspectos éticos
O projeto do inquérito Vigitel 2019 foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Ministério da Saúde (CONEP/MS), mediante Parecer nº 4324071, emitido em 6 de junho de 2017 [Certificado de Apresentação para Apreciação Ética no 65610017.1.0000.0008]. Todos os participantes prestaram consentimento livre e esclarecido, de forma oral, no momento da entrevista.2
Resultados
Dos 52.443 indivíduos entrevistados na edição de 2019 do Vigitel, 34.089 eram mulheres. Destas, 10.750 foram excluídas das análises por estarem fora da faixa etária elegível para realização do exame de mamografia ou do citopatológico. Assim, foram incluídas 23.339 mulheres nas análises do presente estudo, sendo 20.361 elegíveis para a realização do exame citopatológico (com idade entre 25 e 64 anos) e 13.423 elegíveis para a realização da mamografia (com idade entre 50 e 69 anos) (Figura 1).
Entre as mulheres na idade de 25 a 64 anos, elegíveis para o exame citopatológico, 87,9% afirmaram já ter realizado o exame alguma vez na vida, ao passo que, das mulheres com idade entre 50 e 69 anos, elegíveis para a realização de mamografia, 93,8% relataram ter realizado esse exame (Tabela 1). O percentual de mulheres que realizaram mamografia foi menor na região Nordeste (91,5%; p=0,052), entre as que não completaram nem um ano de educação formal (86,7%; p<0,001) e que não tinham seguro de saúde (91,3%; p<0,001). Menores percentuais de realização de exame citopatológico foram encontrados entre mulheres que residiam na região Norte do país (82,5%; p<0,001), as mais jovens (com idade entre 25 e 39 anos: 81,7%; p<0,001), de raça/cor da pele parda (86,3%; p=0,003), que não completaram nem um ano de educação formal (82,2%; p=0,027) e que não tinham seguro de saúde (84,7%; p<0,001).
Observou-se que a frequência de realização de exame citopatológico foi, em média, 5,3 pontos percentuais menor nas mulheres de raça/cor da pele preta em relação àquelas de raça/cor da pele branca (IC95% -9,1;-1,5 - p=0,006) (Tabela 2 e Figura 2). A realização de mamografia foi, em média, 5,2 pontos percentuais maior nas mulheres com maior nível de escolaridade quando comparadas àquelas que não completaram nem um ano de educação formal (IC95% 2,3;8,1 - p<0,001). As frequências de realização de mamografia (3,9 pontos percentuais - IC95% 1,6;6,3 - p=0,001) e de exame citopatológico (11,2 pontos percentuais - IC95% 9,0;14,2 - p<0,001) em mulheres residentes na região Sul foram maiores quando comparadas às da região Nordeste (Tabela 2 e Figura 2).
Variáveis | % | Mamografia (n=13.423) | Exame citopatológico (n=20.361) | |||
---|---|---|---|---|---|---|
% (IC95%) | p-valora | % (IC95%) | p-valora | |||
Faixa etária para mamografia (anos) | 0,651 | |||||
50-59 | 58,9 | 94,0 (92,9;95,1) | ||||
60-69 | 41,1 | 93,6 (92,3;94,9) | ||||
Faixa etária para exame citopatológico (anos) | <0,001 | |||||
25-39 | 41,8 | 81,7 (79,8;83,7) | ||||
40-59 | 48,0 | 92,5 (91,6;93,4) | ||||
60-64 | 10,2 | 91,5 (89,6;93,4) | ||||
Raça/cor da pele | 0,392 | 0,003 | ||||
Branca | 45,4 | 94,5 (93,3;95,7) | 89,9 (88,4;91,4) | |||
Parda | 44,7 | 93,7 (92,4;95,1) | 86,3 (84,8;87,8) | |||
Preta | 9,9 | 92,4 (89,2;95,7) | 87,4 (84,3;90,5) | |||
Escolaridade (anos) | 0,001 | 0,027 | ||||
Nenhum | 1,8 | 86,7 (78,4;94,5) | 82,2 (73,6;90,7) | |||
1-4 | 9,4 | 93,6 (91,5;95,7) | 86,7 (83,2;90,2) | |||
5-8 | 16,1 | 92,4 (90,3;94,6) | 89,7 (87,4;91,9) | |||
9-11 | 36,4 | 93,8 (92,5;95,0) | 86,4 (84,9;87,9) | |||
≥12 | 36,3 | 96,4 (95,2;97,6) | 89,2 (87,6;90,8) | |||
Macrorregião | 0,052 | <0,001 | ||||
Nordeste | 26,0 | 91,5 (89,6;93,4) | 87,0 (85,2;88,8) | |||
Norte | 10,1 | 92,7 (91,6;93,9) | 82,5 (81,1;84,0) | |||
Centro-Oeste | 11,7 | 94,3 (92,6;96,0) | 86,9 (84,4;89,4) | |||
Sudeste | 44,5 | 94,3 (92,8;95,8) | 90,7 (88,8;92,5) | |||
Sul | 7,8 | 95,6 (93,8;97,3) | 93,0 (91,2;94,8) | |||
Plano de saúde | <0,001 | <0,001 | ||||
Não | 54,9 | 91,3 (89,9;92,6) | 84,7 (83,3;86,2) | |||
Sim | 45,1 | 96,8 (96,0;97,6) | 91,9 (90,8;93,1) | |||
Total | 93,8 (93,0;94,7) | 87,9 (86,9;88,9) |
a) Teste qui-quadrado de Pearson.
Variáveis | Coeficienteb | IC95% a | p-valorc |
---|---|---|---|
Raça/cor da pele | |||
Mamografia | -2,0 | -5,1;1,2 | 0,220 |
Exame citopatológico | -5,3 | -9,1;-1,5 | 0,006 |
Escolaridade | |||
Mamografia | 5,2 | 2,3;8,1 | <0,001 |
Exame citopatológico | 3,0 | -0,9;6,9 | 0,132 |
Macrorregião | |||
Mamografia | 3,9 | 1,6;6,3 | 0,001 |
Exame citopatológico | 11,2 | 9,0;14,2 | <0,001 |
a) IC95%: intervalo de confiança de 95%; b) Unidade de medida: pontos percentuais; c) Teste de Wald.
Discussão
Mulheres de raça/cor da pele preta apresentaram menor frequência de realização de exame citopatológico, enquanto aquelas com maior escolaridade foram as que apresentaram maior frequência de realização de mamografia. Houve menor frequência de realização desses exames nas regiões Nordeste e Norte do país.
A amostra do Vigitel incluiu somente indivíduos residentes nas capitais dos estados brasileiros e no Distrito Federal, em domicílios com linha telefônica fixa, o que pode diminuir a representatividade da amostra, uma vez que o número de linhas telefônicas fixas nos domicílios brasileiros vem caindo consideravelmente nos últimos anos. O Norte e o Nordeste apresentaram a menor quantidade de linhas de telefonia fixa a cada 100 domicílios,23 justamente as regiões que apresentaram as menores coberturas para os exames de mamografia e citopatológico, conforme os resultados do presente estudo. O fato de as famílias de baixa renda possuírem menor acesso a linhas de telefonia fixa, serem justamente aquelas cujo acesso aos exames em questão também é menor, sugere que a desigualdade regional pode ser ainda maior. O desfecho estudado mede a prevalência de realização de mamografia e exame citopatológico em algum momento da vida, sem avaliar a adequação da periodicidade desses exames em relação às recomendações do Ministério da Saúde.15,16 Isto faz com que os resultados devam ser interpretados com cautela, haja vista a possibilidade de o desempenho real dos dois programas de prevenção do câncer feminino estar superestimado.
Como fortaleza do estudo, destacam-se as análises formais de desigualdade utilizando-se o SII, o que permitiu calcular a diferença, em pontos percentuais, na realização de cada um dos exames entre os grupos extremos da variável de estratificação, levando-se em consideração o tamanho da amostra em cada subgrupo da variável independente.20-22
Mulheres das macrorregiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são mais propensas a obter a confirmação do diagnóstico de câncer de mama mais tardiamente, visto que essas regiões apresentam piores coberturas de assistência médica por clínicos gerais, radiologistas, e menor disponibilidade de aparelhos de mamografia, cenário oposto ao observado nas regiões Sul e Sudeste.7-9 Cenário semelhante foi observado em relação ao câncer de colo do útero, uma vez que, nas regiões com maior índice de desenvolvimento humano, as mulheres eram diagnosticadas majoritariamente no estágio I (tumor limitado ao colo), situação oposta à do Nordeste.18
Estudo transversal realizado com mulheres entre 25 a 64 anos, participantes da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, encontrou menor cobertura de realização de exame citopatológico - teste de Papanicolau - pelo menos uma vez nos últimos três anos, em estados da região Nordeste do país, como Maranhão (68%), Ceará (69%) e Sergipe (70%).6 A frequência de mulheres que nunca realizaram esse exame foi igualmente maior em estados do Nordeste (Alagoas, 15%; Maranhão, 15%; Paraíba, 15%).6 Os resultados do estudo citado mostram as importantes diferenças regionais na frequência de realização de exames de mamografia e citopatológico, e sua representação heterogênea no Brasil.4,6 Os achados deste estudo, por sua vez, mostram que as desigualdades observadas em estudos anteriores persistem, apesar do avanço na cobertura dos exames observada nos últimos anos, o que pode indicar dificuldades no acesso à atenção primária à saúde (APS), já que a APS é, geralmente, a porta de entrada para esses tipos de exames.
Um dos principais problemas associados à segurança do paciente na APS está relacionado ao diagnóstico incorreto de câncer, principalmente ocasionado pela avaliação clínica incorreta ou demora na solicitação de exames.24 As desigualdades sociais e regionais podem ter relação direta com essa situação, que vai além da cobertura de exames, sendo necessário o diagnóstico em tempo adequado, visando ao tratamento oportuno.
Menores frequências de realização de mamografia e de exame citopatológico foram encontradas em mulheres sem plano de saúde, quando comparadas àquelas que relataram possuir contrato com serviços da saúde privada. Apesar da ampla capilaridade dos serviços de APS, com mais de 43 mil equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF), as barreiras que dificultam a realização do exame por usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) são diversas e variam, desde conhecimento insuficiente e falta de acesso à informação, aspectos vinculados aos serviços de saúde, até situações relacionadas ao trabalho.25
Pesquisa transversal com 345 mulheres de mais de 20 anos de idade, realizada em Maringá, Paraná, no ano de 2015, também evidenciou menor prevalência de realização de mamografia em mulheres sem plano de saúde. O exame citopatológico não foi associado a plano de saúde.26 Quanto ao setor público de saúde, a cobertura da ESF é crescente na maior parte do país, embora com tendência estacionária em alguns estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.13
Considerando-se as demais variáveis utilizadas para avaliar desigualdade racial e social, maior realização de exame citopatológico foi evidenciada nas mulheres de raça/cor da pele branca e que tinham maior escolaridade, em comparação às de raça/cor da pele preta e sem escolaridade. Além disso, o percentual de realização de mamografia foi superior entre as mulheres com maior nível de escolaridade. Estudo realizado com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008 mostrou que o nível de escolaridade foi associado à realização de mamografia e exame clínico das mamas, - as mulheres sem escolaridade apresentaram maior risco de não realização de ambos os exames.5 Similarmente, outra pesquisa transversal, com 10.571 mulheres de 40 anos ou mais de idade, mostrou maiores taxas de cobertura de exame citopatológico naquelas com maior escolaridade (89%) e de raça/cor da pele branca (83%).3
O nível de escolaridade é um dos determinantes sociais que impacta o entendimento do processo saúde-doença, acesso a informação, conhecimento em saúde e participação na decisão de tratamento. A baixa frequência de realização de mamografia e exame citopatológico entre mulheres com baixa escolaridade está relacionada à capacidade de entendimento da mulher, o que reforça a necessidade de implementar ações de educação em saúde.27,28 Para além da oferta desses serviços, é preciso fomentar estratégias que permitam à pessoa usuária do serviço de saúde entender a importância de participar das decisões clínicas.
As desigualdades raciais e o racismo institucional dificultam o ingresso de mulheres negras nos serviços preventivos de saúde,29 indicando, em uma perspectiva macro, a necessidade de ampliação do acesso à rede de serviços em saúde para as mulheres afrodescendentes, com ênfase na Atenção Básica do SUS, na melhoria dos processos de educação em saúde e, inclusive, no fortalecimento de práticas que combatam o racismo institucional e estrutural.26
Em conclusão, mesmo com altas frequências de exames de mamografia e citopatológico no Brasil, desigualdades sociais e regionais na realização desses exames persistem, afetando principalmente mulheres de raça/cor da pele preta, com baixa escolaridade e residentes na região Nordeste do país.