Introdução
A importância da participação e do engajamento do paciente em todas as etapas do cuidado, para garantia da qualidade e segurança do cidadão usuário dos serviços de saúde, é cada vez mais reconhecida, sobretudo no cenário internacional.1 A percepção do paciente e seu lugar central no cuidado aporta a esse ator um papel mais amplo, frequentemente um olhar distinto ou complementar à visão do profissional de saúde.2 Notificações de incidentes relacionados ao cuidado em saúde, realizadas por pacientes, familiares e cuidadores, fornecem informações úteis para a melhoria da qualidade e da segurança desse cuidado. Essas notificações podem contemplar incidentes não reconhecidos ou registrados pelos profissionais de saúde nos sistemas de notificação.3 A análise desses incidentes também revelou que sua ocorrência pode estar relacionada com o acúmulo de falhas ao longo de todo o cuidado, desde o hospital até o ambiente domiciliar e a comunidade onde o paciente está inserido.2 Em estudo realizado na Inglaterra, no ano de 2018, os pacientes identificaram incidentes relacionados a comunicação (21,7%), atendimento fornecido pelos profissionais (13,2%), ambiente (12,2%) e medicamentos (9,9%).4 Segundo outro estudo, realizado com 80 pacientes de uma clínica cirúrgica no Brasil, 17,5% deles identificaram algum tipo de incidente durante sua internação, sendo o mais comum relacionado ao processo de medicamentos (78,5%).5
Buscando dar voz e incorporar a percepção dos pacientes em todos os níveis de cuidado, a Organização Mundial da Saúde lançou o programa Patients for Patient Safety, com o propósito de fomentar a participação ativa de pacientes, familiares e cuidadores em todas as etapas do cuidado em saúde.6 Para aderir a essa iniciativa, diversas organizações elaboraram estratégias visando fortalecer a participação e o engajamento do paciente, apoiadas em diferentes ações, contando não só com os pacientes, mas também com seus familiares, como parceiros.7,8 Entre essas estratégias de fomento e participação dos cidadãos, foram disponibilizados sistemas de notificação de incidentes no cuidado em saúde, construídos e adotados em diversos países.9-12
No contexto brasileiro, preocupações com a segurança do paciente desdobraram-se no Programa Nacional de Segurança do Paciente13 e, no bojo deste, um sistema de notificação voluntária de incidentes foi desenvolvido. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) criou o Sistema de Notificações de Vigilância Sanitária (Notivisa) com a finalidade de receber notificações de incidentes, eventos adversos e queixas técnicas. Reconhecendo a importância de profissionais e pacientes na prestação do cuidado, o Notivisa oferece dois módulos de notificação, para distintos públicos-alvo: (i) os profissionais atuantes nos Núcleos de Segurança do Paciente dos serviços de saúde e (ii) os cidadãos - pacientes, familiares, cuidadores, amigos e outros.14 O módulo ‘cidadão’, assim denominado, registra as notificações voluntárias de incidentes e eventos adversos pelos pacientes, familiares, cuidadores, amigos e outros. Nos últimos anos, foram publicados estudos pautados em informações oriundas do Notivisa; contudo, não foram encontradas análises baseadas no módulo ‘cidadão’.15,16
Haja vista o desafio de garantir a segurança do cuidado em saúde, tais iniciativas de fomento à participação ativa de pacientes necessitam ser examinadas; entre elas, a magnitude e as características dos incidentes nos serviços, sob a perspectiva de pacientes e familiares, registradas nos sistemas de notificação. O objetivo deste estudo foi descrever os incidentes em serviços de saúde notificados pelos cidadãos brasileiros no Notivisa.
Métodos
Delineamento
Estudo descritivo seccional, com base nas notificações registradas no Notivisa - módulo ‘cidadão’.12
Participantes
Foram analisadas todas as notificações realizadas no módulo ‘cidadão’ do Notivisa entre janeiro de 2014, ano de sua implantação, e dezembro de 2018.
Variáveis
Considerando-se as variáveis do sistema e as categorias predefinidas e imutáveis, as variáveis analisadas foram:
Ano de notificação;
Unidade da Federação de notificação;
Responsável pela notificação (amigo; cuidador; familiar; paciente; outros);
Faixa etária (em anos: ≤1; 2-4; 5-11; 12-17; 18-25; 26-35; 36-45; 46-55; 56-65; ≥66);
Sexo (masculino; feminino);
Raça/cor da pele (branca; parda; preta; amarela; indígena; não informada);
Tipo de incidente (uso de medicamentos; queda do paciente; infecções relacionadas à assistência à saúde; atividades administrativas; produtos para a saúde; lesão por pressão; uso de sangue e derivados; identificação do paciente; cirurgia; falhas no cuidado e proteção do paciente; laboratórios clínicos ou de patologia; acidentes do paciente; assistência radiológica; doação de sangue ou hemocomponentes; transplante, enxerto ou fertilização; administração de dietas; outros);
etapa do cuidado (durante a prestação dos cuidados, tratamento ou cirurgia; não estava internado; durante o diagnóstico; na admissão ou no acesso ao serviço de saúde; no acompanhamento após alta; na alta; na transferência para outra instituição ou serviço; prestação de cuidados ou cirurgia; durante ou após a doação de sangue);
local do incidente (hospital; fora do serviço de saúde; ambulatório; farmácia ou drogaria; centro de saúde ou unidade básica de saúde [UBS]; serviço de urgência e emergência; medicina nuclear; serviço de radiologia; serviço de hemodiálise; laboratório de análises clínicas e anatomia patológica; serviço de hemoterapia; serviço ou instituição de saúde mental e psiquiátrica);
período do dia (durante o dia; durante a noite ou madrugada; não informado); e
grau do dano (nenhum; leve; moderado; grave; óbito).
Fontes de dados e mensuração
Os dados analisados, oriundos do módulo ‘cidadão’ do Notivisa, foram solicitados via Lei de Acesso à Informação e encaminhados à pesquisadora principal em 12 de dezembro de 2019, via correio eletrônico. Os dados foram disponibilizados conforme a estrutura do sistema. Além das variáveis pré-categorizadas, o sistema dispõe de um campo para resposta aberta denominado ‘outros’, utilizado com alguma frequência, para notificar incidentes já previstos nas categorias fechadas, em particular aqueles relacionados a medicamentos, cirurgias, produtos para a saúde, infecções relacionadas à saúde e quedas. Na variável ‘tipo de incidente’, há mais uma categoria denominada ‘outros’; esta foi reclassificada mediante a leitura das informações registradas, com base na International Classification for Patient Safety.17 Primeiramente, buscou-se reclassificar a categoria ‘outros’ nos campos previamente definidos. Nas notificações cuja reclassificação do tipo de incidente não se adequou às categorias definidas, optou-se por agrupá-las e nomeá-las em função de atividades ou características. Para ilustrar esse agrupamento, foram selecionados exemplos de notificações mais frequentes e graves registrados como ‘outros’, apresentados nos resultados.
Resultados
No Brasil, os cidadãos notificaram 935 incidentes em serviços de saúde, entre 2014 e 2018. Das 197 notificações cujo tipo de incidente foi categorizado como ‘outros’, 92 foram reclassificadas (Tabela 1). Os incidentes e eventos adversos notificados mais frequentes foram relacionados ao uso de medicamentos (50,8%), queda do paciente (7,5%) e infecções relacionadas à assistência à saúde (7,2%) (Tabela 1). Das 105 notificações reclassificadas, 70 descreviam tipos de incidentes não previstos no sistema Notivisa - módulo ‘cidadão’. Essa descrição possibilitou alocar os incidentes em novos agrupamentos, como, por exemplo, os relacionados ao processo ou procedimento clínico, comportamento e estrutura (Tabela 2). Contudo, 35 notificações restaram não reclassificadas ou agrupadas, devido a imprecisão ou incompletude das respostas.
Tipo de incidente | n | % |
---|---|---|
Uso de medicamentos | 475 | 50,8 |
Queda do paciente | 70 | 7,5 |
Infecções relacionadas à assistência à saúde | 67 | 7,2 |
Atividades administrativas | 56 | 6,0 |
Produtos para a saúde | 40 | 4,3 |
Lesão por pressão | 36 | 3,9 |
Uso de sangue e derivados | 24 | 2,6 |
Identificação do paciente | 18 | 1,9 |
Cirurgia | 17 | 1,8 |
Falhas no cuidado e proteção do paciente | 7 | 0,8 |
Laboratórios clínicos ou de patologia | 6 | 0,6 |
Acidentes do paciente | 5 | 0,5 |
Assistência radiológica | 4 | 0,4 |
Doação de sangue ou hemocomponente | 2 | 0,2 |
Transplante, enxerto ou fertilização | 2 | 0,2 |
Administração de dietas | 1 | 0,1 |
Outros | 105 | 11,2 |
Total | 935 | 100,0 |
Tipo de incidente notificado e reclassificado | n | Exemplos de incidente notificado |
---|---|---|
Processo clínico/procedimento clínico | 29 | Acesso venoso central mal fixado, levando a perda do mesmo. Flebite na punção venosa |
Comportamento | 9 | Acompanhante agressiva Agressão ao colaborador |
Recursos e gestão organizacional | 8 | Ausência de atendimento médico na pediatria. Funcionários não qualificados para o exercício da função ou desvio de função. |
Estrutura | 6 | Descarte de lixo hospitalar de forma indevida. Enfermaria feminina sem banheiro para uso e cuidados das pacientes, devido a reforma necessária, por ordem da gerente. Falta de insumos (lençol, sabão, álcool; profissionais). |
Problemas neurológicos | 5 | Apresenta agitação e confusão, querendo evadir-se do setor. Convulsão |
Vacinas | 5 | Erro em procedimento vacinal Reação a vacina com febre acima de 40º C. |
Alergia | 4 | Alergia devido a gel aplicado no procedimento de ultrassonografia. |
Problemas do aparelho circulatório | 2 | Choque cardiogênico |
Problemas gastrointestinais | 1 | Diarreia com sangue |
Falhas na adesão a protocolos | 1 | Não higienização das mãos |
Total | 70 |
Variável | n | % | |
---|---|---|---|
Responsável pela notificação | |||
Outros | 462 | 49,4 | |
Pessoa afetada | 239 | 25,6 | |
Familiar | 146 | 15,6 | |
Amigo | 48 | 5,1 | |
Cuidador | 40 | 4,3 | |
Sexo | |||
Feminino | 569 | 60,9 | |
Masculino | 366 | 39,1 | |
Faixa etária (anos) | |||
≤1 | 58 | 6,2 | |
2-4 | 17 | 1,8 | |
5-11 | 14 | 1,5 | |
12-17 | 20 | 2,1 | |
18-25 | 116 | 12,4 | |
26-35 | 167 | 17,9 | |
36-45 | 115 | 12,3 | |
46-55 | 94 | 10,1 | |
56-65 | 146 | 15,6 | |
≥66 | 188 | 20,1 | |
Raça/cor da pele | |||
Branca | 477 | 51,0 | |
Parda | 245 | 26,2 | |
Preta | 46 | 4,9 | |
Amarela | 22 | 2,4 | |
Indígena | 4 | 0,4 | |
Não informada | 141 | 15,1 | |
Total | 935 | 100,0 |
Variável | n | % | |
---|---|---|---|
Etapa do cuidado | |||
Durante a prestação dos cuidados, tratamento ou cirurgia | 349 | 37,3 | |
Não estava internado | 346 | 37,0 | |
Durante o diagnóstico | 107 | 11,5 | |
Na admissão ou no acesso ao serviço de saúde | 88 | 9,4 | |
No acompanhamento após alta | 22 | 2,4 | |
Na alta | 14 | 1,5 | |
Na transferência para outra instituição ou serviço | 5 | 0,5 | |
Durante ou após a doação de sangue | 4 | 0,4 | |
Local do incidente | |||
Hospital | 350 | 37,4 | |
Fora do serviço de saúde | 279 | 29,8 | |
Ambulatório | 85 | 9,1 | |
Farmácia ou drogaria | 61 | 6,5 | |
Centro de saúde ou unidade básica de saúde | 49 | 5,3 | |
Serviço de urgência e emergência | 39 | 4,2 | |
Medicina nuclear | 35 | 3,7 | |
Serviço de radiologia | 12 | 1,3 | |
Serviço de hemodiálise | 11 | 1,2 | |
Laboratório de análises clínicas e anatomia patológica | 10 | 1,1 | |
Serviço ou instituição de saúde mental e psiquiátrica | 4 | 0,4 | |
Período do dia | |||
Durante o dia | 545 | 58,3 | |
Durante a noite ou madrugada | 166 | 17,7 | |
Não informado | 224 | 24,0 | |
Grau do dano | |||
Leve | 308 | 32,9 | |
Moderado | 247 | 26,4 | |
Grave | 225 | 24,1 | |
Nenhum | 133 | 14,2 | |
Óbito | 22 | 2,4 | |
Total | 935 | 100,0 |
Houve maior frequência de notificações no ano de 2018 (44,9%), seguido por 2016 (23,3%), 2015 (11,8%), 2017 (11,0%) e 2014 (9,0%). Maiores frequências de notificações foram provenientes da região Sudeste (37,5%), seguida por Nordeste (24,2%), Sul (16,5%), Centro-Oeste (15,8%) e Norte (6,0%). Em relação à Unidade da Federação, observou-se maior frequência de notificações dos estados de São Paulo (15,5%), Minas Gerais (15,4%) e Maranhão (10,9%), e menor frequência de notificações da Paraíba e de Roraima.
O principal responsável pela notificação identificou-se como ‘outros’ (49,4%), seguido pela ‘pessoa afetada' (25,6%). A maior parte dos registros de incidentes foi com pacientes do sexo feminino (60,9%), de ≥66 anos (20,1%) e de raça/cor da pele branca (51,0%); 15,1% dos notificantes não informaram a raça/cor da pele do paciente (Tabela 3). Excluídos estes casos sem a informação da variável, os pacientes de raça/cor da pele branca representaram quase o dobro (60,1%) daqueles de raça/cor da pele parda (30,9%), e os de raça/cor da pele parda e preta, agregados, contabilizaram 36,6%.
A maior parte dos incidentes e eventos adversos ocorreu durante a prestação do cuidado, tratamento ou cirurgia (37,3%), e no período diurno (58,3%). O hospital foi o local do incidente com mais registros (37,4%); 32,9% dos incidentes foram considerados leves e 2,4% resultaram em óbitos (Tabela 4).
Discussão
A maior parte dos incidentes notificados foi relacionada ao uso de medicamentos, seguido por queda do paciente e infecções relacionadas à assistência à saúde. Esses incidentes atingiram, preponderantemente, mulheres, idosos e cidadãos de raça/cor da pele branca, e ocorreram, com maior frequência, durante a prestação do cuidado, tratamento ou cirurgia, no hospital e no período diurno. Quanto ao grau do dano, um terço das notificações considerou o dano leve, menos frequentes foram os danos graves, e a proporção de óbitos foi inferior a 2,5%. Considerou-se baixa adesão geral ao sistema de notificação, passados cinco anos de sua implantação.
A elevada proporção de incidentes categorizados como ‘outros’ e a imprecisão ou carência de informações nos campos abertos dificultaram a análise e, portanto, limitaram o estudo. Após a reclassificação dos incidentes originalmente notificados na categoria ‘outros’, observou-se que grande parte dessas notificações poderia ter sido registrada nos campos específicos predefinidos no sistema.
Verificou-se uma baixa adesão geral ao sistema de notificação, mesmo cinco anos após sua implantação. No período de estudo (2014 a 2018), foram realizadas, somente no Sistema Único de Saúde, 57.281.573 internações.18 Tendo em vista a incidência de eventos adversos, que varia entre 7,6% e 10,0%, cerca de 4 milhões de eventos adversos com dano poderiam ter ocorrido.19,20 À luz desse volume de internações, haver 935 notificações de incidentes em cinco anos parece aquém do esperado. Concorre para isso a percepção e letramento em saúde dos pacientes e familiares, o desconhecimento da existência do sistema e a não obrigatoriedade de registro desses incidentes. Entre os fatores que podem afetar o envolvimento dos pacientes e familiares nas notificações, estão questões relacionadas às características do sistema de notificação, como facilidade de notificar, uso de terminologia compreensível, com perguntas claras e bem elaboradas,9 e o conhecimento dos pacientes, que devem perceber algum tipo de benefício na notificação.10 Estudos que utilizaram sistemas de notificação voltados para os pacientes como fonte de informação analisaram um volume inferior ao aqui tratado, porém com recortes temporais circunscritos.9-11 Repensar a concepção do sistema em parceria com os usuários, além de campanhas de divulgação do Notivisa, podem ser estratégias capazes de aumentar sua participação na notificação de incidentes nos serviços de saúde prestados. De modo semelhante, o desenvolvimento de novas abordagens metodológicas, na captura dos relatos dos pacientes, facilitaria seu engajamento e de seus familiares na notificação de incidentes.2
Além do volume reduzido de notificações, estas foram geograficamente circunscritas. A região Sudeste concentrou a maior parte delas, comparativamente, em especial os estados de São Paulo e Minas Gerais. Este achado é importante, pois o Sudeste é a região mais populosa, economicamente mais desenvolvida e com grande oferta de estabelecimentos de saúde, frente às demais regiões do país, e, consequentemente, conta com maior volume de consultas e internações.21 Em contrapartida, com o menor número de notificações de incidentes, a região Norte apresenta um cenário geográfico, demográfico, econômico e de oferta de serviços diametralmente oposto ao do Sudeste. Essa diferença deve ser considerada ao se analisarem os resultados encontrados, uma vez que estes podem refletir, majoritariamente, a perspectiva dos usuários do Sudeste, ainda que a abrangência do estudo tenha sido nacional.
Os incidentes notificados com maior frequência no módulo ‘cidadão’ do Notivisa foram problemas com medicamentos, quedas e infecções relacionadas à assistência à saúde de baixa gravidade, achados semelhantes aos de duas outras pesquisas, realizadas nos Estados Unidos9,10 e na Finlândia,11 publicadas entre 2017 e 2018, que utilizaram sistemas de notificação voltados para pacientes e familiares e elencaram problemas relacionados a medicamentos,9,10 quedas11 e infecções,10 e sem danos reportados.9,11
Os cidadãos notificaram incidentes perceptíveis no cuidado, representativos dos desafios à qualidade e segurança do paciente em sistemas de saúde ao redor do mundo. Problemas decorrentes do uso de medicamentos são reconhecidos como os mais comuns, por pacientes e familiares, dentro e fora das organizações de saúde.1,22
A queda, segundo tipo de incidente mais frequente, pode levar ao aumento no tempo de permanência hospitalar, nos custos do tratamento, além de gerar graves sequelas para os pacientes.23 De modo semelhante, a terceira categoria mais notificada - as infecções relacionadas à assistência à saúde - consiste dos incidentes mais frequentes no cuidado hospitalar24 e também representa um grande desafio para a segurança do cuidado em países de baixa e média renda,25 capaz de gerar danos a todos os envolvidos, gastos excessivos para o sistema de saúde e as famílias, e até mesmo óbitos.25-27
A maior parte dos incidentes notificados ocorreu com idosos, achado semelhante ao de estudo com base em revisão de prontuários, realizado no Brasil em 2019,21 parcialmente explicável pelo maior número de comorbidades, maior tempo de permanência hospitalar e uso de múltiplos medicamentos.28-30 Quanto ao grau do dano, majoritariamente leve, o resultado foi semelhante ao de outros estudos que se utilizaram dos registros de sistemas de notificação voltados para os pacientes, familiares e cuidadores.9,11 Contudo, os cidadãos também foram capazes de notificar incidentes graves que levaram a óbitos. Em linhas gerais, os relatos dos pacientes parecem mais detalhados e explícitos que os dos profissionais de saúde, constituindo valiosa fonte de informação para a análise e aprimoramento dos serviços de saúde.30
Observou-se baixo número de notificações no período de estudo. Houve maior frequência de incidentes relacionados ao uso de medicamentos, seguidos de quedas de pacientes e infecções relacionadas à assistência à saúde. Estes achados evidenciam a capacidade dos cidadãos de reconhecer esses incidentes como problemas de segurança do paciente, e reportá-los como tal. Para melhor se compreender a dinâmica de utilização de plataformas desse tipo pelo cidadão e, consequentemente, melhorar a adesão dos pacientes e familiares, novos estudos sobre o Notivisa deverão ser realizados na perspectiva do cuidado centrado no paciente.