Introdução
Anomalias congênitas são alterações estruturais ou funcionais que ocorrem durante a vida intrauterina.1 Além de importantes causas de óbito perinatal e neonatal, elas podem levar a incapacidades crônicas, impactando significativamente a vida dos indivíduos afetados, suas famílias e os sistemas de saúde.1,2 Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 295 mil bebês morrem nas primeiras quatro semanas de vida por conta de anomalias congênitas, a cada ano.1
A coleta sistemática e contínua de informações sobre casos de anomalias congênitas em uma população bem definida configura um registro.3 No mundo, diferentes registros de anomalias congênitas foram criados a partir da segunda metade do século XX, após o episódio conhecido como “tragédia da talidomida”, quando mais de 10 mil crianças, em 46 países, nasceram com graves anomalias congênitas em decorrência do uso desse fármaco durante a gravidez.4 Os registros de anomalias congênitas são úteis para monitorar tendências temporais ou geográficas dessas alterações, auxiliar na identificação de fatores de risco, delinear grupos populacionais vulneráveis, planejar e avaliar ofertas de cuidado à saúde, entre outras finalidades.3,5
Conhecer o perfil epidemiológico das anomalias congênitas, por meio do sistema de registro de notificação com cobertura nacional e do monitoramento com cobertura nacional, proporciona aos países a possibilidade de entender seu impacto na população e em seus sistemas de saúde. Esse conhecimento também produz informações úteis no sentido de advogar por medidas de prevenção e cuidado adequadas ao cenário específico de cada local.6-8
Os registros de anomalias congênitas podem cobrir países inteiros ou uma parcela representativa da população nacional (registros nacionais), ou ainda, lugares específicos dentro de um país (registros locais ou subnacionais). Além disso, eles podem abranger todos os nascimentos de determinada área geográfica (base populacional) ou cobrir apenas nascimentos em um único hospital ou hospitais selecionados (base hospitalar).9,10 Todavia, inexistem dados na literatura científica sobre o panorama global e atualizado dos registros nacionais de anomalias congênitas e suas particularidades.
Este trabalho teve como objetivo identificar registros de anomalias congênitas com cobertura nacional existentes no mundo, destacando suas principais características históricas e operacionais.
Métodos
Trata-se de uma nota de pesquisa de caráter documental, cuja estratégia metodológica foi detalhada em um trabalho de revisão narrativa, sobre redes internacionais para a vigilância de anomalias congênitas, anteriormente publicado.6 Em resumo, para mapear e documentar os registros de anomalias congênitas com cobertura nacional existentes ao redor do mundo, buscou-se por referências bibliográficas indexadas na base Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (Medline)/PubMed (disponibilizada pela National Library of Medicine, dos Estados Unidos) em 10 de janeiro de 2020, a partir da chave de busca especificada na Figura 1. Além dessa busca, informações relevantes, relacionadas ao tema deste trabalho, foram obtidas de relatórios, documentos oficiais e sítios eletrônicos disponibilizados pelas redes, registros e instituições que trabalham com a vigilância de anomalias congênitas.
As principais etapas metodológicas, assim como as informações extraídas de cada um dos trabalhos ou documentos encontrados, apresentam-se detalhadas na Figura 1. As informações extraídas foram analisadas por dois revisores (Cardoso-dos-Santos AC e Alves SRM), de maneira independente. Informações sobre a renda nacional bruta per capita de cada um dos países relacionados foram obtidas do relatório World Economic Situation and Prospects, elaborado pela Organização das Nações Unidas.7
Resultados
Ao todo, foram identificados 40 registros de anomalias congênitas com cobertura nacional em 39 países, cujas principais características se encontram no Quadro 1. À exceção da África, todos os continentes apresentaram pelo menos um registro nacional de anomalias congênitas. A maior parte desses países se concentrava no continente europeu, todos nas categorias socioeconômicas de renda alta (28) e média superior (12), como mostrado na Figura 2. Vinte e seis registros foram de base populacional e 12 de base hospitalar; tal informação não foi encontrada para Chile e Panamá.
O registro nacional húngaro (Hungarian Congenital Abnormality Registry) foi o mais longevo - suas atividades oficiais iniciaram-se em 1962 - enquanto o mais recente foi o escocês, criado em 2018. A maioria dos registros nacionais (29/40) fazia parte de pelo menos uma rede internacional para vigilância de anomalias congênitas. O registro brasileiro foi o que apresentou maior número de nascimentos anuais - em torno de 3 milhões - e cobria 98% dos nascimentos do país. No total, 19 registros apresentaram mais de 98% de cobertura, quase todos de base populacional; dois deles, Cuba e República Dominicana, na América Central, eram de base hospitalar.
Quatorze registros nacionais eram de caráter compulsório, e desses, 12 de base populacional; e entre os 11 de caráter voluntário, apenas cinco eram de base populacional. A idade cronológica limite para notificar um indivíduo com anomalia congênita também se revelou bem diferente entre os registros, variando desde a alta hospitalar (6) até um mês (5), ou maior ou igual a 1 ano de idade (23).
Um total de 16 registros nacionais notificavam unicamente anomalias congênitas maiores, e 14 notificavam anomalias maiores e menores. A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID, 9ª e 10ª revisões) foi o principal sistema de codificação empregado (32); porém, dez registros nacionais acrescentaram modificações à CID (sobretudo a British Pediatric Association Classification of Diseases).
Com relação aos desfechos gestacionais, 33 sistemas notificavam registros de nascidos vivos e natimortos, e desses, 20 incluíam interrupções de gestação em seu escopo. Os registros da Tailândia e do Brasil foram os únicos a incluir apenas nascidos vivos. Entre os registros pesquisados, pelo menos 19 também realizavam o processo de vigilância de anomalias congênitas em sua área de cobertura.

Legenda: AC: anomalias congênitas; CID: Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde; PubMed/Medline: Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (Medline)/PubMed, serviço disponibilizado pela National Library of Medicine dos Estados Unidos.
Figura 1 - Fluxograma das principais etapas metodológicas para a identificação e seleção de registros de anomalias congênitas com cobertura nacional existentes no mundo
Quadro 1 - Principais características dos registros de anomalias congênitas com cobertura nacional ao redor do mundo, 10 de janeiro de 2020
País | Renda | Nome do registro | Ano de início | Tipo de registro | Redes | Milhares de nascimentos anuais (% de cobertura) | Compulsório | Período limite | Tipo de anomalia congênita | Codificação | Desfechos gestacionais | Vigilância | Fonte das informações |
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Arábia Saudita | Alta | Medical Service Department- Birth Defect Registry (MSD-BDR) | 2010 | Base hospitalar | ICBDSR | - | Sim | 2 anos | Maiores | CID-BPA | - | - | https://bit.ly/2XHWSNm |
Argentina | Média superior | National Registry of Congenital Anomalies of Argentina (RENAC) | 2009 | Base hospitalar | ICBDSR, ReLAMC | 300 (40%) | Não | Alta hospitalar | Maiores | CID-BPA | NV e NM | Sim | https://bit.ly/3bCBph4 http://dx.doi.org/10.5546/aap.2013.484 |
Austrália | Alta | Australian Congenital Anomalies Monitoring System (ACAMS) | 1981 | Base populacional | - | - | Híbrido | Varia entre as diferentes coleções | Maiores | CID-BPA e AM | NV e NM | Sim | https://bit.ly/2LqbnTQ https://bit.ly/2Ke5JmZ |
Brasil | Média superior | Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) | 1999 | Base populacional | ReLAMC | 3.000 (100%) | Sim | Alta hospitalar | Maiores | CID | NV | Não | https://bit.ly/3nId7VA |
Canadá | Alta | Canadian Congenital Anomalies Surveillance System (CCASS) | 1966 | Base populacional | ICBDSR | 330 (98%) | - | 1 mês | Maiores | CID-CA | NV e NM | Sim | https://bit.ly/3bEVm6U https://bit.ly/2LMLUDV |
Chile | Alta | Registro Nacional de Anomalías Congénitas de Chile (RENACH) | 2016 | - | ReLAMC | 220 | - | - | - | - | - | - | https://bit.ly/38Gs1Hq https://bit.ly/3qyZ7iq |
China | Média superior | Birth Defects Surveillance System for the Collaborative Project-China (BDSS-China) | 1992 | Base populacional | - | 260 | - | 42 dias | Maiores | CID | NV e NM | Sim | https://doi.org/10.1002/ajmg.c.31690 https://doi.org/10.1007/s12519-011-0326-0 |
China | Média superior | Chinese Birth Defects Monitoring Network (CBDMN) | 1988 | Base hospitalar | - | 1.380 (8,51%) | Não | 7 dias | Maiores | CID | NV, NM e IG | Sim | https://doi.org/10.1007/s12519-011-0326-0 https://doi.org/10.1046/j.1365-3016.2003.00478.x |
Colômbia | Média superior | Vigilancia de los Defectos Congénitos | 2010 | Base populacional | ReLAMC | 661 (100%) | - | 1 ano | Maiores | CID | - | - | https://doi.org/10.26633 /RPSP.2019.44 |
Costa Rica | Média superior | Costa Rican Birth Defects Register Centre (CREC) | 1985 | Base populacional | ICBDSR, ReLAMC | 70 (100%) | Sim | 1 ano | Maiores e menores | CID-BPA | NV e NM | Sim | https://bit.ly/3bPXdWL https://doi.org/10.26633 /RPSP.2019.44 https://doi.org/10.1007/s10995-014-1542-8 |
Cuba | Média superior | Cuban Register of Congenital Malformation (RECUMAC) | 1985 | Base hospitalar | ICBDSR, ReLAMC | 120 (100%) | Não | Alta hospitalar | Maiores e menores | CID-BPA | NV, NM e IG | - | https://doi.org/10.26633 /RPSP.2019.44 http://doi.org/10.26633/RPSP.2017.174 |
Dinamarca | Alta | Danish Medical Birth Registry | 1973 | Base populacional | - | - | - | 1 ano | - | CID | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/3quYJ4D https://doi.org/10.1080/ 14034940210134194 https://doi.org/10.3402/ijch.v68i5.17376 |
Emirados Árabes Unidos | Alta | National Congenital Anomalies Register | 1999 | Base populacional | - | 63 (100%) | - | 1 ano | Maiores | CID com modificações | NV e NM | Sim | https://bit.ly/39LKphk |
Escócia | Altab | The Scottish Linked Routine Data Congenital Anomaly Register | 2018 | Base populacional | EUROCAT | 50-55 (100%) | Híbrido | 1 ano | Maiores | CID | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/3oUI0Y1 https://bit.ly/39FYiO5 |
Eslováquia | Alta | Teratologic Information Centre, Slovak Medical University | 1964 | Base populacional | ICBDSR | 55 (100%) | Sim | Alta hospitalar | - | - | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/2XHWSNm http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2018-028139 |
Espanha | Alta | Spanish Collaborative Study of Congenital Malformations (ECEMC) | 1976 | Base hospitalar | ICBDSR, EUROCAT | 90 (20%) | Não | 3 dias | Maiores e menores | CID | NV e NM (IG em alguns hospitais) | Sim | https://bit.ly/3imtzto, https://doi.org/10.2165/00002018-200831060-00008 https://doi.org/10.1016/j.jpedsurg.2008.07.002 |
Estados Unidosa | Alta | National Birth Defects Prevention Network (NBDPN) | 1997 | Base populacional | - | - | Não | - | Maiores | CID e CDC/BPA | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/3sxskMG https://doi.org/ 10.1002/bdr2.1607 https://doi.org/ 10.1155/2014/212874 |
Finlândia | Alta | Register of Congenital Malformations | 1963 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 60 (100%) | Sim | 1 ano | Maiores | CID | NV, NM, IG | Sim | https://bit.ly/3nUTRUH https://bit.ly/2XHWSNm https://doi.org/10.3402/ijch.v68i5.17376 https://doi.org/10.1093/ije/11.3.239 |
Guatemala | Média superior | Protocolo de Vigilancia de Anomalías Congénitas | 2017 | Base hospitalar | - | 155 (40%) | - | 1 mês | Maiores | CID | - | Sim | https://doi.org/10.26633 /RPSP.2019.44 |
Hungria | Alta | Hungarian Congenital Abnormality Registry (HCAR) | 1962 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 100 (100%) | Sim | 1 ano | Maiores e menores | CID com modificações | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/2XHWSNm https://doi.org/10.1111/cga.12025 |
Inglaterra | Altab | National Congenital Anomaly and Rare Disease Registration Service (NCARDRS) | 2015 | Base populacional | BINOCAR, ICBDSR | 610 (100%) | Não | - | Maiores e menores | CID | NV, NM, IG | - | https://bit.ly/38UlJEb http://dx.doi.org/ 10.1136/archdischild -2017-312833 |
Islândia | Alta | Icelandic Register of Births | - | Base populacional | - | - | - | - | - | CID | NV e NM | - | https://doi.org/10.3402/ijch.v68i5.17376 |
Itália | Alta | Italian Multicenter Register for Congenital Malformations (IPIMC) | 1977 | Base hospitalar | - | 116 (20%) | Não | 5 dias | Maiores | - | NV e NM | Sim | http://doi.wiley.com/10.1002/ajmg.1320460425 https://doi.org/10.1007/BF00162315 |
Japão | Alta | Japan Association of Obstetricians and Gynaecologists (JAOG) | 1972 | Base hospitalar | ICBDSR | 100 (9%) | - | 7 dias | - | - | NV e NM | - | https://bit.ly/2XTwSyV https://bit.ly/2XHWSNm |
Letônia | Alta | Register of Patients Suffering from Certain Diseases | 1987 | Base populacional | EUROCAT | 19,2 (100%) | Sim | 18 anos | - | - | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/3oUI0Y1 https://doi.org/10.1186/s13023-014-0147-z |
Malta | Alta | Malta Congenital Anomalies Register (MCAR) | 1985 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 4 (100%) | Não | 1 ano | Maiores e menores | CID | NV e NM | - | https://bit.ly/2XHWSNm https://bit.ly/3oUI0Y1 |
México | Média superior | Registro y Vigilancia Epidemiológica de Malformaciones Congénitas (RYVEMCE) | 1978 | Base hospitalar | ICBDSR | 62 (3,5%) | Não | Alta hospitalar | Maiores e menores | - | NV e NM | Sim | https://doi.org/10.26633/ RPSP.2019.44 https://bit.ly/2XHWSNm https://doi.org/10.1016/j.bmhimx.2017.02.003 https://bit.ly/3qqzz76 |
Noruega | Alta | Medical Birth Registry of Norway (MBRN) | 1967 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 60 (100%) | Sim | 1 ano | - | CID-BPA | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/35OTZyM http://doi.wiley.com/ 10.1034/j.1600-0412. 2000.079006435.x https://doi.org/10.1111/ dmcn.13552 |
Nova Zelândia | Alta | New Zealand Birth Defects Registry (NZBDR) | 1975 | Base populacional | ICBDSR | 58 (100%)c | Sim | Sem limite | Maiores e menores | - | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/2XRvhK4 https://bit.ly/2XHWSNm |
País de Gales | Altab | Congenital Anomaly Register & Information Service for Wales (CARIS) | 1998 | Base populacional | BINOCAR, ICBDSR, EUROCAT | 35 (100%) | Não | 1 ano | Maiores e menores | CID | NV, NM e IG | - | https://bit.ly/3nUENXh https://bit.ly/2XHWSNm http://doi.wiley.com/ 10.1002/bdra.23336 |
Panamá | Alta | Programa Nacional de Malformaciones Congénitas de Panamá (PNMC) | - | - | ReLAMC | - | - | - | - | - | - | - | https://bit.ly/3qyZ7iq |
Paraguai | Média superior | Programa Nacional de Prevención de Defectos Congénitos del Ministerio de Salud Pública del Paraguay (PNPDC) | 2016 | Base hospitalar | ReLAMC | Sim | 1 ano | Maiores e menores | CID | - | - | https://bit.ly/3qwW9LG https://bit.ly/3qyZ7iq | |
Polônia | Alta | Polish Registry of Congenital Malformations (PRCM) | 1997 | Base populacional | EUROCAT | 300 (85%) | Sim | 2 anos | Maiores e menores | CID | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/3oVZp2G https://bit.ly/3oUI0Y1 https://bit.ly/3oWRSAL |
Portugal | Alta | Portuguese national registry of congenital anomalies (RENAC) | 1995 | Base populacional | EUROCAT | - | Não | Fim do período neonatal | Maiores | CID | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/2NgJ7DC http://doi.wiley.com/ 10.1002/bdra.23530 |
República Checa | Alta | National Registry of Congenital Anomalies (NRCA) of the Czech Republic | 1964 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 110 (100%) | Sim | 15 anos | - | CID | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/35QVI6U https://bit.ly/2XHWSNm https://doi.org/10.21101/cejph.a4201 |
República Dominicana | Média superior | Sistema Nacional de Vigilancia Epidemiológica | 2016 | Base hospitalar | - | 193 (100%) | - | Alta hospitalar | Maiores e menores | CID | - | - | https://doi.org/10.26633/RPSP.2019.44 |
Singapura | Alta | National Birth Defects Registry | 1992 | Base populacional | - | - | - | 18 anos | Maiores e menores | CID | NV, NM e IG | - | http://doi.org/10.3389/fped.2014.00060 https://bit.ly/38S57Nk |
Suécia | Alta | Swedish Medical Birth Registry (MBR) | 1964 | Base populacional | ICBDSR, EUROCAT | 100-120 (100%) | Sim | 1 ano | - | CID | NV, NM e IG | Sim | http://doi.wiley.com/10.1080/ 00016340902934696 http://doi.wiley.com/ 10.1111/j.1651-2227.1989.tb11122.x |
Tailândia | Média superior | Thailand Birth Defects Registry | 2014 | Base hospitalar | SEAR-NBBD | 67 (8,3%) | - | 1 ano | Cinco tipos prioritáriosd | CID | NV | - | https://bit.ly/2NgKfqQ https://doi.org/10.1002/ ajmg.c.31690 |
Uruguai | Alta | Registro Nacional de Defectos Congénitos y Enfermedades Raras de Uruguay (RNDCER) | 2011 | Base populacional | ReLAMC | 28 (58%) | Sim | 6 anos | Maiores e menores | CID | NV, NM e IG | Sim | https://bit.ly/2KumQRM https://doi.org/10.26633/RPSP.2019.44 https://bit.ly/3qyZ7iq |
a) NBDPN é, propriamente, uma rede de base voluntária dos sistemas estaduais ao redor dos Estados Unidos;
b) A informação é relacionada ao Reino Unido; c) Cobre todos os nascidos vivos entregues ou tratados em um hospital público da Nova Zelândia; d) Síndrome de Down, defeitos de tubo neural, fissuras labiopalatinas, anomalias de membros e distrofia muscular de Duchenne.
Legenda: BINOCAR: British and Irish Network of Congenital Anomaly Researchers; BPA: British Pediatric Association Classification of Diseases; CDC: Centers for Disease Control and Prevention dos Estados Unidos; CID: Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde; EUROCAT: European surveillance of congenital anomalies; ICBDSR: International Clearinghouse for Birth Defects, Surveillance and Research; IG: interrupção de gestação; NM: natimorto; NV: nascido vivo; ReLAMC: Red Latinoamericana de Malformaciones Congénitas; SEAR-NBBD: South-East Asia Region New-born and Birth Defects

Nota: Os registros da Inglaterra, Escócia e País de Gales foram representados, em conjunto, pelo Reino Unido, e a cobertura anual foi representada pela soma dos nascimentos nos três registros de anomalias congênitas. Polígonos com preenchimento representam os países que possuem pelo menos um registro nacional de anomalias congênitas de base populacional, hospitalar ou ambas. O tamanho do círculo é proporcional ao número (em milhares) de nascimentos cobertos anualmente, em cada registro.
Figura 2 - Distribuição mundial e cobertura anual dos registros incluídos no presente trabalho (A), com destaque para o continente europeu (B), 10 de janeiro de 2020
Discussão
Em todo o mundo, apenas 40 registros de anomalias congênitas com cobertura nacional foram encontrados em 39 diferentes países. Os registros identificados se localizavam exclusivamente em países de rendas alta e média superior, grande parte deles concentrada na Europa. Desse modo, as estimativas globais das anomalias tendem a super-representar esses lugares, em detrimento dos demais. Entretanto, trata-se de uma importante contribuição dos registros presentes nesses países a produção de uma série de materiais técnico-científicos de orientação das diferentes etapas da vigilância de anomalias congênitas.
A ausência de representatividade em países de renda média inferior e baixa é importante porque, nesses contextos, o impacto das anomalias em saúde pode ser maior, devido à baixa oferta de serviços assistenciais adequados para o cuidado de crianças afetadas.8 Além disso, nesses países, as demais causas de mortalidade infantil, como desnutrição, baixas condições de saneamento e suscetibilidade a infecções, dificuldade de acesso aos serviços de saúde, entre outras, ainda são comuns, o que pode ajudar a “mascarar” a real magnitude das anomalias congênitas, em termos epidemiológicos 8,11
Grandes eventos, envolvendo consequências teratogênicas, como a tragédia da talidomida,4,12 o desastre de Chernobyl13 e a epidemia de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus Zika,14 vêm mobilizando as nações e seus territórios para o monitoramento das anomalias congênitas. A despeito do registro húngaro ser o mais antigo encontrado neste trabalho (1962), o programa da República Tcheca iniciou suas atividades em 1961, mas o monitoramento regular teve início em 1964.15
Os registros com cobertura nacional apresentaram diferentes características entre si. A maior parte deles foi de base populacional, o que torna as prevalências obtidas de tais sistemas menos suscetíveis a vieses, comparadas àquelas obtidas a partir de registros hospitalares.5,16 Registros de base hospitalar podem ser uma escolha interessante, sobretudo em países com registros incipientes e/ou recursos financeiros limitados; além disso, existe a possibilidade, no futuro, destes registros de anomalias se expandirem para programas de base populacional.5,17 Também é importante mencionar que alguns registros complementam suas informações por meio da busca ativa de dados, a exemplo da revisão de relatórios de alta hospitalar (caso de alguns estados dos Estados Unidos),18 auditoria perinatal (Austrália e Nova Zelândia)19 e rotinas de vinculação (linkage) entre bases de dados (Escócia).20
O que, até quando e como notificar as anomalias congênitas também foram questões revisadas. A maior parte dos registros mostrou notificação de caráter compulsório, sobretudo de anomalias maiores de acordo com a CID, em nascidos vivos, natimortos e crianças com idade máxima notificada igual ou abaixo de 1 ano.
Embora o trabalho tenha investigado apenas registros com cobertura nacional, a proporção de nascimentos cobertos anualmente variou bastante. O registro brasileiro - Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) - foi aquele que apresentou o maior número absoluto de nascimentos cobertos anualmente. O documento básico do Sinasc é a Declaração de Nascido Vivo, na qual, desde 1999, constam dados sobre a presença e o tipo de anomalia congênita.21,22
Apesar de a vigilância hospitalar ser realizada em alguns poucos hospitais do Brasil, por meio do Estudo Colaborativo Latino-Americano de Malformações Congênitas (ECLAMC), a vigilância de anomalias congênitas ainda não acontece sistematicamente, em todo o território nacional. Entretanto, um modelo de vigilância nacional vem sendo estruturado na Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde brasileiro, em articulação com demais secretarias do órgão, membros da comunidade acadêmica e sociedades médicas.23-25
Este trabalho apresentou algumas limitações, como a possibilidade de haver registros com cobertura nacional não capturados pela abordagem metodológica utilizada, devido, por exemplo, à inexistência de material publicado online. Ademais, os registros são dinâmicos e características como a cobertura podem mudar ao longo do tempo.
Em conclusão, este trabalho revisou os principais registros de anomalias congênitas com cobertura nacional ao redor do mundo. Os 40 registros analisados apresentaram diferentes características, constituindo-se em material de consulta para profissionais interessados pela temática e, sobretudo, fornecendo subsídios à reflexão sobre atividades de vigilância e quais características são desejáveis ou possíveis de serem implementadas, considerando-se a realidade de cada nação.