SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.31 número3La incidencia de los errores de inmunización en Minas Gerais, Brasil: estudio transversal, 2015-2019Tendencia temporal y perfil epidemiológico de los accidentes por animales venenosos en Brasil, 2007-2019 índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

  • No hay articulos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Epidemiologia e Serviços de Saúde

versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde vol.31 no.3 Brasília  2022  Epub 12-Oct-2022

http://dx.doi.org/10.1590/s2237-96222022000300006 

Artigo original

Tendência das desigualdades sociodemográficas no pré-natal na Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro, 2000-2020: um estudo ecológico

Tendencia de las desigualdades sociodemográficas en la atención prenatal en la Baixada Litorânea, región del estado de Rio de Janeiro, Brasil, 2000-2020: un estudio ecológico

Sandra Costa Fonseca (orcid: 0000-0001-5493-494X), concepção, coleta e análise dos dados, redação das versões preliminares e final do artigo, aprovação da versão final1  ; Zenair Simião Barbosa de Carvalho (orcid: 0000-0001-7963-9226), concepção, coleta e análise dos dados, redação das versões preliminares e final do artigo, aprovação da versão final1  ; Pauline Lorena Kale (orcid: 0000-0001-5439-9158), análise dos dados, redação das versões preliminares e final do artigo, aprovação da versão final2  ; Cynthia Boschi-Pinto (orcid: 0000-0002-0069-7974), análise dos dados, redação das versões preliminares e final do artigo, aprovação da versão final1  ; Júlia Cardoso Correia Guimarães (orcid: 0000-0002-6252-338X), análise dos dados, redação das versões preliminares e final do artigo, aprovação da versão final3 

1Universidade Federal Fluminense, Instituto de Saúde Coletiva, Niterói, RJ, Brasil

2Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

3Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Medicina, Niterói, RJ, Brasil

Resumo

Objetivo:

Analisar a tendência das desigualdades sociodemográficas no acesso e utilização do pré-natal na Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, Brasil, em 2000-2020.

Métodos:

Estudo ecológico - série temporal - do número de consultas e da adequação do acesso ao pré-natal. Desigualdades absolutas (diferenças) e relativas (razões) foram calculadas entre categorias extremas das variáveis; tendências foram estimadas por regressão joinpoint.

Resultados:

Foram estudadas 185.242 gestantes. A proporção de ≥ 7 consultas aumentou anualmente 2,4% (IC95% 1,1;3,7) entre 2013 (54,4%) e 2020 (63,4%), estável para escolaridade menor que oito anos. A adequação de acesso aumentou 2,6% (IC95% 1,2;4,0) entre 2014 e 2020, estável para mulheres ≥ 35 anos e escolaridade ≥ 12 anos. Diminuíram desigualdades absolutas (entre 3,5% e 6,4%) para idade e raça/cor da pele, e relativas (entre 7,7% e 20,0%) para todas as variáveis.

Conclusão:

Acesso e número de consultas aumentaram, mas permaneceram menores para mulheres adolescentes, de baixa escolaridade e raça/cor da pele preta e parda.

Palavras-chave: Cuidado Pré-Natal; Disparidades em Assistência à Saúde; Qualidade da Assistência à Saúde; Estudos de Séries Temporais

Resumen

Objetivo:

Analizar la tendencia de las desigualdades sociodemográficas en el acceso y uso de la atención prenatal (APN) en la “Baixada Litorânea” en Rio de Janeiro, 2000-2020.

Métodos:

Estudio ecológico - serie temporal - del número de consultas y adecuación del acceso a la APN. Se calcularon desigualdades absolutas (diferencias) e relativas (razones) entre categorías extremas de variables. Tendencias fueron estimadas por regresión joinpoint.

Resultados:

Se estudiaron 185.242 gestantes. La proporción de ≥ 7 consultas aumentó en un 2,9% (IC95% 0,7;5,1), anualmente, entre 2013 (54,4%) e 2020 (64,7%), estable para menos de ocho años de escolaridad. La adecuación del acceso aumentó 2,6% (IC95% 1,2;4,0), estable en mujeres ≥ 35 años, e con ≥ 12 años de escolaridad. Disminuyeron las desigualdades absolutas (entre 3,5% y 6,4%) para edad y color/raza, y relativas (entre 7,7% y 20,0%) para todas las variables.

Conclusión:

Acceso e consultas aumentaron, pero persistieron menores entre adolescentes, baja escolaridad y raza/color de piel negro y marrón.

Palabras clave: Atención Prenatal; Disparidades en Atención de Salud; Calidad de la Atención de Salud; Estudios de Series Temporales

Contribuições do estudo

Principais resultados

Desigualdades sociodemográficas na realização de sete ou mais consultas de pré-natal se reduziram na Baixada Litorânea, mas seguem menores o número de consultas e a adequação do acesso para mulheres adolescentes, de baixa escolaridade e raça/cor da pele preta e parda.

Implicações para os serviços

Como a gestão da Rede Cegonha é responsabilidade da região de saúde, a divulgação destes resultados deve subsidiar os esforços para ampliar a cobertura do pré-natal qualificado na Baixada Litorânea, enfatizando as mulheres mais vulneráveis.

Perspectivas

Gestores e profissionais de saúde devem direcionar esforços para reduzir desigualdades no pré-natal. O monitoramento dos indicadores segundo variáveis sociodemográficas deve prosseguir, e o estudo pode contribuir como base para futuras avaliações.

Introdução

A realização do pré-natal desempenha papel fundamental na promoção da saúde da gestante, do feto e do recém-nascido.1-3 O pré-natal adequado identifica possíveis situações de risco para o binômio mãe-filho e aumenta as chances de intervenções oportunas para promover nutrição adequada, prevenir doenças de transmissão vertical e controlar morbidades maternas, como hipertensão arterial, diabetes mellitus e infecção urinária.2,3

A cobertura do pré-natal no Brasil é quase universal. Entretanto, a adequação da assistência à gestante ainda não foi atingida de forma plena,4,5 havendo muito a evoluir em relação ao número de consultas e aos exames e procedimentos, segundo o preconizado pela estratégia Rede Cegonha.5 Esta iniciativa, criada em 2011, ampliou a atenção humanizada na gestação e parto, fortalecendo programas nacionais voltados à saúde da mulher e da criança.5 No componente pré-natal, a estratégia prevê o acolhimento, a classificação de risco e vulnerabilidade, a ampliação do acesso e a melhoria da qualidade do pré-natal.

A adequação do pré-natal tem sido bem estudada, a partir de diferentes abordagens e definições de pré-natal adequado.4 Contudo, não há um consenso em relação ao conceito de adequação, e podem ser usados critérios simples, quantitativos, como número de consultas, ou critérios mais complexos, incluindo exames e procedimentos, infraestrutura, e vinculação da gestante a uma maternidade.4,6-8

Estudos que avaliam o número de consultas como indicador de qualidade, na dimensão de utilização dos serviços de pré-natal,9-12 podem se valer de dados secundários, como os do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), disponíveis de forma pública e atualizada. O Ministério da Saúde propôs um indicador de adequação do acesso, que leva em conta o número de consultas e o início do atendimento pré-natal, também disponível no Sinasc.13

Em duas avaliações nacionais do pré-natal, com base em número de consultas e início do acompanhamento por esse serviço,12,13 a região Sudeste apresentou bom desempenho. O estado do Rio de Janeiro referiu a menor média de consultas realizadas e o menor percentual de mulheres com início do pré-natal no primeiro trimestre da gravidez,12 além de proporções mais baixas do índice de adequação do acesso ao atendimento,13 quando comparado aos demais estados da região. Não foram identificados estudos recentes, após a implementação da Rede Cegonha, que houvessem analisado o número de consultas e/ou o início do pré-natal nas diferentes localidades do estado, além da capital. No entanto, os relatórios da Secretaria de Estado de Saúde mostram menor proporção de mulheres com sete ou mais consultas de pré-natal nas regiões fora do eixo metropolitano, caso da Baixada Litorânea.14

É imprescindível, além da adequação, estudar desigualdades no pré-natal. Estudos mostram que tanto o número de consultas como outras medidas de adequação do pré-natal podem ser socialmente determinadas.15-18 Nesse contexto, a identificação de populações com menor acesso e/ou adequação no atendimento pode subsidiar estratégias nas políticas de saúde voltadas à redução de desigualdades, tanto nos programas de saúde específicos como naqueles intersetoriais.5,17,19 Intervenções adequadas durante o pré-natal e alta cobertura de populações negligenciadas, efetivamente, reduzem a morbimortalidade materna e infantil.2,17,19

Adolescência, baixa escolaridade e raça/cor da pele parda e preta são características maternas frequentemente relacionadas a disparidades na assistência à saúde materno-infantil, como menor acesso, menor número de consultas e desfechos perinatais desfavoráveis.15-18,20-22 A disponibilização, pelo Sinasc, de dados sobre idade, escolaridade e raça/cor da pele possibilita estudos dessa natureza.

O objetivo deste estudo foi analisar a tendência das desigualdades sociodemográficas no acesso e utilização do serviço pré-natal na região de saúde da Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, Brasil, no período de 2000 a 2020.

Métodos

Foi realizado um estudo ecológico de série temporal, sobre o período 2000-2020, na Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro. Considerou-se como unidade de análise a fração de tempo “ano”.23 Cada indicador foi avaliado anualmente, e sua variabilidade temporal estimada.

A Baixada Litorânea fluminense, com 823.899 habitantes, agrega nove municípios: Araruama, Armação dos Búzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Casimiro de Abreu, Iguaba Grande, Rio das Ostras, São Pedro da Aldeia e Saquarema.14 O índice de desenvolvimento humano (IDH) dos municípios varia entre 0,709 (Saquarema) e 0,773 (Rio das Ostras). A cobertura populacional exercida pela Atenção Básica do Sistema Único de Saúde (SUS) na região foi de 67,5% em 2017; Araruama, Rio das Ostras e Saquarema apresentaram os menores percentuais. A Baixada Litorânea apresenta o menor percentual de realização de sete ou mais consultas de pré-natal, no estado do Rio de Janeiro.14

A população do estudo foi composta por mulheres residentes na região, que tiveram nascidos vivos de gestação única, igual ou superior a 22 semanas, e com 500 g ou mais de peso.

A fonte dos dados foi o Sinasc, disponível nas páginas eletrônicas da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES/RJ) e do Departamento de Informática do SUS (Datasus), do Ministério da Saúde, acessadas em abril de 2022.24,25 A Declaração de Nascido Vivo (DN), instrumento cujos dados servem de base para o Sinasc, sofreu modificações em 2011, incluindo a ampliação das informações sociodemográficas, reprodutivas e assistenciais (início do pré-natal, número detalhado de consultas, relação entre trabalho de parto e cesariana).26 Anteriormente, os campos da DN referentes a idade e escolaridade maternas eram fechados, preenchidos apenas por categorias; a partir de 2011, foram incluídos campos abertos, com essas informações mais detalhadas. Os sítios eletrônicos da SES/RJ e do Datasus disponibilizam a informação das variáveis sociodemográficas, tanto na forma detalhada como em categorias, permitindo a comparação entre períodos anteriores e posteriores a 2011.

As variáveis analisadas foram:

  1. Sociodemográficas maternas, de forma categórica, obedecendo à disponibilidade da versão tabnet do Sinasc:

    - Idade (em anos: até 19; 20 a 34; ≥ 35).

    - Escolaridade (em anos de estudo: 0 a 3; 4 a 7; 8 a 11; e ≥ 12).

    - Raça/cor da pele (branca; preta; parda; amarela; indígena).

  2. Pré-natal, de acordo com dois indicadores:

    - Utilização do pré-natal - considerou-se apenas a variável “número de consultas”, informação categorizada e disponível para todo o período analisado; adotou-se, como ponto de corte, sete ou mais consultas realizadas, número compatível com a categorização do Sinasc e mais próximo da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS).1

    - Adequação do acesso ao pré-natal, definida conforme recomendação do Ministério da Saúde, com base nas informações sobre o número de consultas e o período de início do pré-natal, quais sejam, (i) “Não fez” (nenhuma consulta), (ii) “Inadequado” (início/após o 3º mês e/ou menos de três consultas), (iii) “Intermediário” (início no 3º mês ou antes e três a cinco consultas), (iv) “Adequado” (início no 3º mês ou antes e seis consultas) e (v) “Mais que adequado” (início no 3º mês ou antes e sete ou mais consultas);13 registros com informação sobre o número de consultas e início do pré-natal ausente ou ignorada compuseram a categoria “Não classificados”.13

Desde 2014, a variável “adequação do acesso ao pré-natal”, disponível na base nacional do Sinasc (no Datasus), é categorizada em cinco faixas, conforme descrito no parágrafo anterior. Analisou-se a adequação do acesso segundo idade, escolaridade e raça/cor da pele maternas. Considerando-se a ordenação crescente de qualidade da variável, foram comparadas as proporções das situações extremas: “não fez/inadequado” ou “adequado/mais que adequado”, sem considerar, portanto, a categoria intermediária.

Foram descritas as distribuições absolutas e a proporção anual da adequação do acesso para o total de nascidos vivos e aqueles com idade gestacional igual ou superior a 37 semanas (a termo). Outros indicadores de adequação ajustam o número de consultas para a idade gestacional (IG), pois sabe-se que, quanto menor a IG, menor o tempo para obtenção do número ideal de consultas. Como esse indicador - adequação do acesso - não inclui essa variável em sua formulação, analisou-se o total de nascidos vivos com ≥ 37 semanas de gestação, tempo suficiente para alcançar sete consultas. O indicador “adequação do acesso” foi analisado apenas para o período disponível na base nacional do Sinasc, de 2014 a 2020.

Na análise estatística da série temporal, utilizou-se o programa Joinpoint Regression, que ajusta, em uma escala logarítmica, tendências lineares e mudanças dessas tendências (pontos de junção). Para o teste de significância, é usado o Monte Carlo Permutation Method, que ajusta a melhor linha para cada segmento. Uma vez que esses segmentos são estabelecidos, a direção e a magnitude das tendências estimadas são representadas pelos respectivos percentuais anuais de mudança (APC). O APC é calculado da seguinte forma:

APC=100 X (It+1-It)/I

onde I é o indicador no ano (It) e no ano seguinte (It +1). Considerando-se a regressão em escala logarítmica, log (It) = (b0 + b1t), APC=100 x (eb-1) o intervalo de confiança de 95% é calculado pelo método paramétrico.

Os modelos foram avaliados com e sem termo de autocorrelação (AC), sendo mantido o termo quando a APC sofreu mudança superior a 0,2%.

Foram estimadas as tendências temporais, de acordo com as variáveis sociodemográficas, para os dois indicadores: a proporção de mulheres que realizaram sete ou mais consultas, 2000 a 2020; e a proporção de mulheres nas categorias “não fez/inadequado” e “adequado/mais que adequado” acesso, 2014 a 2020. Ressalta-se que, como o comportamento temporal pode diferir entre as variáveis, e entre as categorias de uma mesma variável, os períodos resultantes nem sempre são iguais.

Para avaliar desigualdades, foram calculadas medidas de associação (diferenças absolutas e relativas) para os dois indicadores (proporção de realização de sete ou mais consultas; proporção de adequação de acesso), segundo as variáveis “idade”, “escolaridade” e “raça/cor da pele”, em 2014 e 2020. As diferenças foram calculadas usando-se as categorias de melhor resultado - maior proporção do indicador - como referência. Para estimar a diferença absoluta (DA), foi realizada a subtração dos valores das proporções entre as categorias extremas (de maior e menor valor do indicador); e para a diferença relativa (DR), a razão entre as proporções das mesmas categorias (maior e menor valor). Quando as diferenças, absoluta e relativa, das proporções das categorias extremas das variáveis se aproximam, respectivamente de zero e 1, elas indicam ausência de desigualdade.27

Este estudo é um recorte da pesquisa Estudo sobre indicadores de saúde da mulher e da criança nas regiões de saúde do estado do Rio de Janeiro, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal Fluminense [Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) nº 29721320.0.0000.5243] mediante Parecer nº 4.091.556, emitido em 16 de junho de 2020.

Resultados

No período de 2000 a 2020, na Baixada Litorânea, ocorreram 207.325 nascidos vivos, de feto único, sendo 8.563 em 2000 e 10.808 em 2020. Naquele período, a informação sobre número de consultas teve percentual de ignorados menor que 2%.

A proporção de mulheres que conseguiram realizar sete ou mais consultas aumentou de 51,7%, em 2000, para 63,4% em 2020. Houve estabilidade entre 2000 e 2013, e tendência crescente significante entre 2013 e 2020 (2,4% ao ano). Quando analisada segundo as variáveis sociodemográficos, a tendência foi diferenciada em magnitude (APC) e direção (Tabela 1).

Tabela 1 Proporção de mulheres com sete ou mais consultas de pré-natal e tendência temporal, segundo variáveis sociodemográficas, Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, 2000-2020 

Variável 2000 n = 8.563 2020 n = 10.808 Mudança percentual anual (IC95%a) Tendência
Total 51,7 63,4 2000-2003: 3,5 (-1,2;8,5) Estabilidade
2003-2013: -0,2 (-1,1;0,6) Estabilidade
2013-2020: 2,4 (1,1;3,7) Aumento
Idade materna (em anos)
≤ 19 45,1 51,4 2000-2004: 3,3 (-0,9;7,8) Estabilidade
2004-2007: -7,4 (-19,0;5,7) Estabilidade
2007-2020: 1,8 (1,1;2,5) Aumento
20-34 53,4 64,2 2000- 2004: 3,1 (0,4; 5,9) Aumento
2004-2009: -1,2 (-3,9;1,5) Estabilidade
2009-2020: 1,3 (0,7;1,9) Aumento
≥ 35 56,5 71,1 2000-2020: 1,0 (0,6;1,3) Aumento
Escolaridade (em anos de estudo)
Nenhuma 35,0 25,0 2000-2020: -0,9 (-3,4;1,7) Estabilidade
1-3 34,9 37,2 2000-2020: -0,2 (-1,2;0,7) Estabilidade
4-7 46,5 47,8 2000-2013: -1,4 (-2,4;-0,5) Redução
2013-2020: 2,7 (0,2;5,3) Aumento
8-11 57,5 62,6 2000-2003: 2,9 (0,1;6,0) Aumento
2003-2009: -2,0 (-3,2;-0,7) Redução
2009-2020: 1,3 (1,0;1,9) Aumento
≥ 12 80,8 81,9 2000-2004: -1,5 (-3,5;0,6) Estabilidade
2004-2020: 0,5 (0,2;0,8) Aumento
Raça/cor da pele
Branca 57,5 70,0 2000-2020: 0,8 (1,2;6,1) Aumento
Parda 39,7 60,3 2000-2002: 12,2 (1,0;24,7) Aumento
2002-2007: -2,5 (-5,7;0,9) Estabilidade
2007-2020: 2,7 (2,1;3,3) Aumento
Preta 44,5 61,1 2000-2020: 1,6 (1,0;2,2) Aumento

a) IC95%: Intervalo de confiança de 95%.

Todas as faixas etárias mostraram tendência crescente em algum momento. Para mulheres adolescentes, essa tendência foi significante apenas no período de 2007 a 2020. Já aquelas com ≥ 35 anos apresentaram tendência de crescimento em todo o período. Quanto maior a idade materna, maior a proporção de realização de sete ou mais consultas. Mulheres com menos de oito anos de estudo mostraram padrão predominante de estabilidade. Aquelas com oito ou mais anos de estudo, ao contrário, tiveram tendência crescente. Quanto maior a escolaridade, maior a proporção de sete ou mais consultas. Observou-se tendência crescente para todas as categorias de raça/cor da pele, mais intensa para as mulheres pardas entre 2007 e 2020, e constante para brancas e pretas. As mulheres brancas mantiveram o maior percentual em todo o período (Tabela 1).

A categoria de adequação do acesso “mais que adequado” foi a predominante no período, variando de 45,4% (2014) para 52,8% (2020); somada a esta a categoria “adequado”, foram contempladas 60,9% das mulheres em 2020. O percentual médio de registros não classificados foi de 12,2% no período. Quando analisados apenas os nascidos vivos a termo, os números foram semelhantes (Tabela 2).

Tabela 2 Proporção de mulheres segundo adequação de acesso ao pré-natal, para o total de nascidos vivos (NV) e NV a termo, da Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, 2014-2020 

Classificação 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Todos os nascidos vivosa n = 11.028 n = 11.465 n = 10.879 n = 11.186 n = 11.508 n = 11.276 n = 10.808
Não fez 0,3 0,3 0,4 0,4 0,5 0,4 0,4
Inadequado 22,7 21,8 21,8 19,7 17,6 18,2 17,6
Intermediário 8,8 8,5 8,2 9,1 8,0 8,3 9,8
Adequado 8,7 9,0 8,4 8,8 7,8 7,5 8,1
Mais que adequado 45,4 46,3 48,3 50,7 54,1 56,0 52,8
Não classificados 14,1 14,1 12,9 11,3 12,0 9,6 11,3
Nascidos vivos a termob n = 9.819 n = 10.304 n = 9.654 n = 10.016 n = 10.329 n = 10.039 n = 9.647
Não fez 0,3 0,3 0,3 0,4 0,4 0,4 0,3
Inadequado 22,1 21,4 21,3 19,5 17,5 18,1 17,3
Intermediário 7,9 7,5 7,2 8,3 6,9 7,3 8,8
Adequado 8,4 8,6 8,0 8,4 7,4 7,1 7,9
Mais que adequado 47,0 47,4 50,0 52,1 55,7 57,5 54,3
Não classificados 14,3 14,8 13,2 11,4 12,1 9,6 11,4

a) NV: Feto único, peso ≥ 500 g e idade gestacional ≥ 22 semanas; b) NV a termo: Feto único, peso ≥ 500 g e idade gestacional ≥ 37 semanas.

Na série temporal de 2014 a 2020 (Tabela 3), registrou-se predomínio de tendência crescente das categorias “adequado” e “mais que adequado”, e queda da inadequação. Mesmo com as mudanças favoráveis, cerca de 25% das adolescentes mantiveram-se na categoria “não fez/inadequado” e pouco mais de 50% alcançaram adequação. Mulheres com 35 anos ou mais, apesar da estabilidade, tiveram sempre mais que 60% de adequação. A faixa de 20 a 34 anos teve resultado intermediário, ou seja, conforme a idade da mãe, gradativamente aumentava a adequação do acesso. De forma semelhante, quanto maior o número de anos de estudo, maior era a proporção de mulheres com pré-natal adequado/mais que adequado. Mulheres de todas as raças/cores da pele tiveram tendência crescente de adequação, porém as brancas se destacaram com maior percentual de adequado/mais que adequado (sempre maior que 60%) (Tabela 3).

Tabela 3 Proporção de mulheres por categoria de adequação de acesso ao pré-natal (não fez/inadequado versus adequado/mais que adequado,a e tendência temporal, total e segundo variáveis sociodemográficas, Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, 2014-2020 

Classificação/variáveis 2014 2020 Mudança percentual anual (IC95%a) Tendência
Total de gestantes
Não fez/inadequado 22,4 17,1 2000-2020: -4,3 (-5,9;-2,7) Redução
Adequado/mais que adequado 55,4 62,2 2000-2020: 2,6 (1,2;4,0) Aumento
Idade (em anos)
10-19
Não fez/inadequado 30,6 25,1 2000-2020: -3,1 (-4,8;-0,1) Redução
Adequado/mais que adequado 44,0 52,6 2000-2020: 3,7 (2,0;5,3) Aumento
20-34
Não fez/inadequado 21,2 16,8 2000-2020: -4,1 (-5,9;-2,2) Redução
Adequado/mais que adequado 57,4 63,4 2000-2020: 2,2 (1,0;3,5) Aumento
≥ 35
Não fez/inadequado 15,8 14,3 2000-2020: -3,1 (-6,0;0,0) Estabilidade
Adequado/mais que adequado 62,3 65,6 2000-2020: 1,9 (-0,3;4,2) Estabilidade
Escolaridade (em anos de estudo)
≤ 7
Não fez/inadequado 32,3 30,4 2000-2020: -0,3 (-3,5;3,1) Estabilidade
Adequado/mais que adequado 41,1 47,2 2000-2020: 2,8 (0,4;5,3) Aumento
8-11
Não fez/inadequado 21,0 16,4 2000-2020: -4,1 (-5,9;-2,2) Redução
Adequado/mais que adequado 56,4 62,8 2000-2020: 2,2 (0,8;3,7) Aumento
≥ 12
Não fez/inadequado 11,6 8,8 2014-2018: -9,5 (-17,0;-1,4) Redução
2018-2020: 5,2 (-21,1;40,2) Estabilidade
Adequado/mais que adequado 72,7 75,0 2000-2020: 0,6 (-0,1;1,3) Estabilidade
Raça/cor da pele
Branca
Não fez pré-natal/inadequado 18,9 12,3 2000-2020: -6,1 (-9,8;-3,1) Redução
Adequado/mais que adequado 61,3 67,6 2000-2020: 1,9 (0,3;3,5) Aumento
Preta
Não fez pré-natal/inadequado 28,2 19,2 2000-2020: -5,6 (-8,7;-2,5) Diminuição
Adequado/mais que adequado 47,6 61,1 2000-2020: 4,1 (3,1;5,2) Aumento
Parda
Não fez pré-natal/inadequado 25,2 19,8 2000-2020: -4,1 (-5,4;-2,8) Redução
Adequado/mais que adequado 49,6 60,3 2000-2020: 3,8 (2,0;5,5) Aumento

a) Não incluída a categoria intermediária.

Entre 2014 e 2020, diminuíram as diferenças absolutas na realização de sete ou mais consultas, entre mulheres ≥ 35 anos e demais faixas etárias. Ressalta-se que ainda foi elevada a desigualdade absoluta para adolescentes, porém a diferença relativa caiu. Cotejadas à faixa etária ≥ 12 anos de estudo, mulheres dos demais níveis de escolaridade diminuíram a diferença absoluta; exceto a faixa de 0 a 3 anos, que manteve ambas as desigualdades. As diferenças absolutas e relativas entre brancas, pardas e pretas diminuíram (Tabela 4).

Tabela 4 Diferenças absolutas e relativas da realização de sete ou mais consultas e da adequação de acesso ao pré-natal, segundo variáveis sociodemográficas, Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, 2014-2020 

Variável Proporção de 7 consultas ou mais de pré-natal Proporção da adequação de acesso do pré-natal (RN a termo)
2014 (n = 11.028) 2020 (n = 10.808) 2014 (n = 10.913) 2020 (n = 9.647)
Diferenças Diferenças Diferenças Diferenças
% Absoluta Relativa % Absoluta Relativa % Absoluta Relativa % Absoluta Relativa
Idade (em anos)
≤ 19 43,3 24,1 1,6 51,4 19,7 1,4 42,1 19,4 1,5 52,6 13,0 1, 2
20-34 60,1 7,2 1,1 64,2 6,9 1,1 56,2 5,3 1,1 63,4 2,2 1,1
≥ 35a 67,4 - - 71,1 - - 61,5 - - 65,6 - -
Escolaridade (em anos de estudo)
0-3 34,9 45,9 2,3 35,8 46,1 2,3 33,3 39,5 2,2 40,4 34,6 1,9
4-7 41,7 39,1 1,9 47,8 34,1 1,7 42,2 30,5 1,7 47,7 27,3 1,6
8-11 61,2 19,6 1,3 62,6 19,3 1,3 56,4 16,4 1,3 62,8 12,2 1,2
≥ 12b 80,8 - - 81,9 - - 72,7 - - 75,0 - -
Raça/cor da pele
Parda 52,8 13,2 1,3 60,3 9,7 1,2 49,6 11,7 1,2 60,3 7,3 1,1
Preta 52,1 12,5 1,2 61,1 8,9 1,1 47,6 13,7 1,3 61,1 6,5 1,1
Brancac 65,3 - - 70,0 - - 61,3 - - 67,6 - -

a) Categoria de referência da idade materna para o cálculo das diferenças; b) Categoria de referência da escolaridade materna para o cálculo das diferenças; c) Categoria de referência da raça/cor da pele materna para o cálculo das diferenças.

As desigualdades absolutas e relativas da adequação do acesso ao pré-natal reduziram-se para todas as faixas etárias, de escolaridade e raça/cor da pele (Tabela 4); entretanto mantiveram-se elevadas entre mulheres com baixa escolaridade e adolescentes.

As diferenças absolutas e relativas dos indicadores - proporção de ≥ 7 consultas (2014 e 2020) e proporção de pré-natal adequado (2014 e 2020) -, por categorias extremas de idade, escolaridade e raça/cor da pele materna, estão expressas na Figura 1. Apesar da tendência crescente dos indicadores em todas as categorias, observou-se magnitude superior em mães na idade de 35 anos ou mais, com 12 ou mais anos de estudo e de raça/cor branca, em relação às menos favorecidas. As maiores diferenças absolutas foram observadas para a escolaridade, seja pelo número de consultas, seja na adequação do acesso.

Figura 1 Proporções de sete consultas ou mais (gráficos superiores) e de adequação do acesso “adequado/mais que adequado” do pré-natal (gráficos inferiores) e suas diferenças absolutas (DAs) e relativas (DRs), segundo categorias extremas das variáveis sociodemográficas, Baixada Litorânea, estado do Rio de Janeiro, 2014-2020 

Discussão

O estudo identificou aumento tanto do número de consultas como da adequação do acesso ao pré-natal na Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro. Entretanto, esse aumento mostrou-se insuficiente diante da meta estabelecida, de 70% para o primeiro indicador,14 e da persistência de desigualdades em ambos os indicadores. Adolescentes, mulheres com menos de oito anos de escolaridade e aquelas de raça/cor da pele parda ou preta apresentaram os resultados mais desfavoráveis, cujas diferenças foram atenuadas, mas não revertidas, durante o período do estudo.

Houve tendência crescente da categoria de sete ou mais consultas de pré-natal, até alcançar, em 2020, o percentual de 63,4%. Para o Brasil, em 2013, esse indicador foi de 63,2% para gestações únicas, embora na região Sudeste ele houvesse atingido 73%, quase dez pontos percentuais acima do encontrado na Baixada Litorânea;13 dados do Brasil, de 2015, mostram aumento para 66,9%.13 Quando se compara a Baixada Litorânea a outras localidades, apenas Fortaleza/CE tinha percentuais mais baixos, 56,8%, enquanto Campinas e São Paulo/SP, e Porto Alegre/RS, apresentaram entre 74% e 79% em 2015-2016.11 A análise da tendência temporal na Baixada Litorânea só identificou aumento no período de 2013 a 2020, provavelmente resultante de medidas da estratégia Rede Cegonha, implantada no ano de 2011 em nível nacional.5 Contudo, é necessário manter ou aumentar esse ritmo de crescimento para alcançar pelo menos o patamar da região Sudeste, nos próximos anos.

O indicador de sete ou mais consultas no pré-natal teve gradiente crescente com o aumento da idade materna; porém, as adolescentes constituíram um grupo desfavorecido, com menor percentual, enquanto as mais velhas tiveram os maiores valores, comportamento semelhante ao demonstrado por estudo nacional de 2013.13 Destaca-se que, na Baixada Litorânea fluminense, os valores para adolescentes foram menores que no nível nacional.13 Mulheres com menos de oito anos de estudo tiveram as proporções mais baixas, sempre inferiores a 50%, enquanto aquelas com ≥ 12 anos de estudo atingiram o maior valor, 81,9% em 2020, semelhantemente aos achados de estudos nacionais.9,10 Na Baixada Litorânea, todavia, houve estagnação do indicador, contrariamente ao ocorrido no Brasil, entre 2000 e 2015, quando se observou aumento mais intenso para as faixas de baixa escolaridade, cerca de 3,2% ao ano.10

O percentual de realização de sete ou mais consultas entre mulheres brancas foi sempre superior ao das pardas e pretas, como em nível nacional.9,10 Entretanto, as mulheres brancas da Baixada Litorânea só atingiram 70%, proporção inferior aos valores nacionais.9,10 O fato de a Baixada Litorânea não ter acompanhado as melhorias na utilização do pré-natal sugere falhas na captação e acompanhamento das gestantes, principalmente daquelas mais vulneráveis. Por sua vez, características regionais na configuração das vulnerabilidades poderiam explicar, ainda que em parte, esse cenário, que deverá subsidiar gestores na definição de ações de saúde materno-infantil. Por exemplo, adolescentes que engravidam já se caracterizam como um grupo mais vulnerável, acumulando outros fatores como baixa escolaridade e baixa renda, os quais também potencializam menor acesso e utilização dos cuidados pré e perinatais.23

Ainda são poucos os estudos com o indicador da adequação de acesso ao pré-natal.11,13 Os valores relatados para o somatório das categorias “adequado” e “mais que adequado”, em nível nacional, referentes ao ano de 2015, foram mais elevados nas regiões Sul e Sudeste (> 76%), e mais baixos no Nordeste (63,8%) e Norte (53,1%). A região Centro-Oeste (71,7%) teve o valor mais próximo do Brasil (70,2%).13 O estado do Rio de Janeiro, onde se situa a região estudada, teve o menor valor do Sudeste, 70%, embora a Baixada Litorânea oscilasse entre 55% e 62%, comportamento semelhante ao das regiões Norte e Nordeste do país. Deve ser ressaltado que a Baixada Litorânea teve melhor desempenho no item “início do pré-natal”, dado que cerca de 80% das mulheres da região conseguiram iniciar o atendimento no primeiro trimestre (dado não mostrado na tabela), faltando melhorar a longitudinalidade desse atendimento.

Comparado aos dados das categorias “adequado” e “mais que adequado” do Brasil nos anos de 2014 e 2015,13 o comportamento na Baixada Litorânea foi mais desfavorável para as mulheres adolescentes, pretas e pardas, e de baixa escolaridade, todas com valores inferiores aos nacionais,13 mostrando maior vulnerabilidade para essa região do estado do Rio de Janeiro. Características regionais, na organização dos serviços, na implementação da Rede Cegonha e na distribuição das vulnerabilidades na população podem explicar por que essa região se mantém com indicadores inferiores aos do restante do estado.14

Como alternativa para avaliar a desigualdade no pré-natal, um estudo em nível nacional explorou as diferenças relativas e absolutas, no período de 2000 a 2015.10 Identificou-se queda de ambos os tipos de diferença para a realização de sete ou mais consultas, em relação à escolaridade e raça/cor da pele, não sendo analisada a idade materna. Segundo o presente estudo, na Baixada Litorânea, adotando-se a mesma abordagem, embora para um período mais curto, de 2014 a 2020, as desigualdades se atenuaram, mas persistiram: na escolaridade, observou-se o comportamento de bottom inequality,27 ou exclusão marginal, pois as mulheres com 12 ou mais anos de estudo têm cobertura adequada, e são grandes as diferenças relativas, tanto maiores quanto menor a faixa de escolaridade. As diferenças foram de menor magnitude para a comparação da raça/cor da pele, e diminuíram para pardas e pretas.

Por último, a desigualdade, tanto relativa como absoluta, diminuiu para adolescentes, mas, ainda assim, manteve-se elevada, corroborando a vulnerabilidade dessa faixa etária. Cabe destacar que se tem identificado esse padrão de desigualdades em outros estudos sobre saúde da mulher, mostrando que há um acúmulo prejudicial no período reprodutivo.15,21,22

Como limitações do estudo, estão aquelas relacionadas à qualidade dos dados dos sistemas de informações. Uma análise do Sinasc, em nível nacional (2019), mostrou discreta superestimação do percentual de sete ou mais consultas de pré-natal e da escolaridade alta (12 e mais anos de estudo), com concordância boa: índice de Kappa de 0,639 e 0,680, respectivamente.28 Outra limitação deste trabalho é inerente ao indicador apenas quantitativo, uma vez que não é possível explorar com profundidade a qualidade do atendimento pautando-se apenas pelo número de consultas. No entanto, os resultados de estudos nacionais recentes, com indicadores mais refinados de adequação do pré-natal, identificaram as mesmas desigualdades: associação de pré-natal inadequado com idade menor que 20 anos, escolaridade menor que oito anos de estudo e raça/cor da pele preta.6,15-18 Por último, ao se incluir o ano de 2020, pode ter havido distorção na análise de tendências, pois todos os serviços de saúde sofreram o impacto da pandemia de COVID-19, inclusive o atendimento pré-natal.29 Afinal, analisou-se a série sem e com o ano de 2020, e as diferenças foram pequenas, embora seja importante destacar a queda havida no número de consultas em 2020.

Como virtude do estudo, ele foi o primeiro a analisar a utilização e a adequação do acesso ao pré-natal na Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro. A análise regional alinha-se à forma como a gestão da Rede Cegonha se organiza e pode subsidiar as mudanças necessárias. Confirmou-se a potência do Sinasc como fonte de dados para estudos da área materno-infantil, bem como para o monitoramento de indicadores de saúde e de desigualdades. O uso de diferenças absolutas e relativas fortaleceu a análise de desigualdades e pode ser incorporado a estudos ulteriores.

Conclui-se que persistem desigualdades sociodemográficas na atenção pré-natal. Na avaliação de tendência, observou-se equidade inversa, ou seja, novas intervenções atingem primeiramente os grupos mais favorecidos e, mais tardiamente, os menos favorecidos, com persistência das desigualdades.30 A Baixada Litorânea do estado do Rio de Janeiro está mais desfavorecida que outros locais onde tem havido redução das desigualdades,17,20 apontando para a necessidade de priorizar os cuidados às gestantes com menor escolaridade, de raça/cor de pele preta ou parda e adolescentes.

Referências

1. World Health Organization. WHO Recommendations on antenatal care for a positive pregnancy experience [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2016 [update 2016 Nov 26; cited 2020 Agu 21]. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241549912Links ]

2. Hodgins S, Tielsch J, Rankin K, Robinson A, Kearns A, Caglia J. A new look at care in pregnancy: simple, effective interventions for neglected populations. PLoS One. 2016;11(8):e0160562. doi: 10.1371/journal.pone.0160562 [ Links ]

3. Kikuchi K, Okawa S, Zamawe COF, Shibanuma A, Nanishi K, Iwamoto A, et al. Effectiveness of continuum of care-linking pre-pregnancy care and pregnancy care to improve neonatal and perinatal mortality: a systematic review and meta-analysis. PLoS One. 2016;11(10):e0164965. doi: 10.1371/journal.pone.0164965 [ Links ]

4. Nunes JT, Gomes KRO, Rodrigues MTP, Mascarenhas MDM. Qualidade da assistência pré-natal no Brasil: revisão de artigos publicados de 2005 a 2015. Cad Saude Colet. 2016;24(2):252-61. doi: 10.1590/1414-462X201600020171 [ Links ]

5. Leal MC, Szwarcwald CL, Almeida PVB, Aquino EML, Barreto ML, Barros F, et al. Saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil nos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Cien Saude Colet. 2018;23(6):1915-28. doi: 10.1590/1413-81232018236.03942018 [ Links ]

6. Domingues RMSM, Viellas EF, Dias MAB, Torres JA, Theme-Filha MM, Gama SGN, et al. Adequação da assistência pré-natal segundo as características maternas no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2015;37:140-7. [ Links ]

7. Neves RG, Flores-Quispe MDP, Facchini LA, Fassa AG, Tomasi E. Pré-natal no Brasil: estudo transversal do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica, 2014. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(1):e2019019. doi: 10.5123/S1679-49742020000100008 [ Links ]

8. Mendes RB, Santos JMJ, Prado DS, Gurgel RQ, Bezerra FD, Gurgel RQ. Avaliação da qualidade do pré-natal a partir das recomendações do Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento. Cien Saude Colet. 2020;25(3):793-804. doi: 10.1590/1413-81232020253.13182018 [ Links ]

9. Anjos JC, Boing AF. Diferenças regionais e fatores associados ao número de consultas de pré-natal no Brasil: análise do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos em 2013. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(4):835-50. doi: 10.1590/1980-5497201600040013 [ Links ]

10. Mallmann MB, Boing AF, Tomasi YT, Anjos JC, Boing AC. Evolução das desigualdades socioeconômicas na realização de consultas de pré-natal entre parturientes brasileiras: análise do período 2000-2015. Epidemiol Serv Saude. 2018;27(4):e2018022. doi: 10.5123/S1679-49742018000400014 [ Links ]

11. Fernandes JA, Venâncio SI, Pasche DF, Silva FLGD, Aratani N, Tanaka OY, et al. Avaliação da atenção à gestação de alto risco em quatro metrópoles brasileiras. Cad Saude Publica. 2020;36(5):e00120519. doi: 10.1590/0102-311x00120519 [ Links ]

12. Souza DRS, Morais TNB, Costa KTDS, Andrade FB. Maternal health indicators in Brazil: a time series study. Medicine (Baltimore). 2021;100(44):e27118. doi: 10.1097/MD.0000000000027118 [ Links ]

13. Ministério da Saúde (BR). Como nascem os brasileiros: uma análise da adequação da assistência pré-natal e das indicações de cesárea por critérios de risco epidemiológico a partir do Sinasc. In: Ministério da Saúde (BR). Saúde Brasil 2017: uma análise da situação de saúde e os desafios para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Brasília: Ministério da Saúde; 2018. p. 22-41. [ Links ]

14. Governo do Estado (RJ). Secretaria de Saúde. Planejamento Regional Integrado: diagnósticos regionais atualizados[Internet]. Rio de Janeiro: Governo do Estado; 2020 [citado 2020 Set 15]. Disponível em: https://www.saude.rj.gov.br/planejamento-em-saude/regioes-de-saude/planejamento-regional-integradoLinks ]

15. Leal MC, Gama SGN, Pereira APE, Pacheco VE, Carmo CN, Santos RV. The color of pain: racial iniquities in prenatal care and childbirth in Brazil. Cad Saude Pública. 2017;33(Suppl 1):e00078816. doi: 10.1590/0102-311X00078816 [ Links ]

16. Tomasi E, Fernandes PAA, Fischer T, Siqueira FCV, Silveira DS, Thumé E, et al. Qualidade da atenção pré-natal na rede básica de saúde do Brasil: indicadores e desigualdades sociais. Cad Saude Publica. 2017;33(3):e00195815. doi: 10.1590/0102-311X00195815 [ Links ]

17. Cesar JA, Black RE, Buffarini R. Antenatal care in Southern Brazil: Coverage, trends, and inequalities. Prev Med. 2021;145:106432. doi: 10.1016/j.ypmed.2021.106432 [ Links ]

18. Morón-Duarte LS, Varela AR, Bertoldi AD, Domingues MR, Wehrmeister FC, Silveira MF. Quality of antenatal care and its sociodemographic determinants: results of the 2015 Pelotas birth cohort, Brazil. BMC Health Serv Res. 2021;21(1):1070. doi: 10.1186/s12913-021-07053-4 [ Links ]

19. Kovacs R, Barreto JOM, Silva EN, Borghi J, Kristensen SR, Costa DRT, et al. Socioeconomic inequalities in the quality of primary care under Brazil's national pay-for-performance programme: a longitudinal study of family health teams. Lancet Glob Health. 2021;9(3): e331-e339. doi: 10.1016/S2214-109X(20)30480-0 [ Links ]

20. Barros AJD, Victora CG. Measuring coverage in MNCH: determining and interpreting inequalities in coverage of maternal, newborn, and child health interventions. PLoS Med. 2013;10(5): e1001390. doi: 10.1371/journal.pmed.1001390 [ Links ]

21. Pacheco VC, Silva JC, Mariussi AP, Lima MR, Silva TR. As influências da raça/cor nos desfechos obstétricos e neonatais desfavoráveis. Saúde debate. 2018;42(116):125-37. doi: 10.1590/0103-1104201811610 [ Links ]

22. Bruno SKB, Rocha HAL, Rocha SGMO, Araújo DABS, Campos JS, Silva AC, et al. Prevalence, socioeconomic factors, and obstetric outcomes associated with adolescent motherhood in Ceará, Brazil: a population-based study. BMC Pregnancy Childbirth. 2021;21(1):616. doi: 10.1186/s12884-021-04088-7 [ Links ]

23. Aquino R, Gouveia N, Teixeira MG, Costa MC, Barreto M. Estudos ecológicos (desenho de dados agregados). In: Almeida-Filho N, Barreto M, organizadores. Epidemiologia & Saúde: fundamentos, métodos, aplicações. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. p. 175-84. [ Links ]

24. Governo do Estado (RJ). Secretaria de Saúde. Informações de Saúde. Estatísticas vitais: nascidos vivos no estado do Rio de Janeiro [Internet]. Rio de Janeiro: Governo do Estado; 2022 [citado 2022 Abr 15]. Disponível em: http://sistemas.saude.rj.gov.br/tabnet/tabcgi.exe?sinasc/nascido.defLinks ]

25. Ministério da Saúde (BR). Informações de Saúde. Nascidos vivos, Rio de Janeiro [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2022 [citado 2022 Abr 15] Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sinasc/cnv/nvrj.def Links ]

26. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Coordenação Geral de Informações e Análises Epidemiológicas. Consolidação do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - 2011 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2013 [citado 2022 Abr 15]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sinasc/Consolida_Sinasc_2011.pdf Links ]

27. Silva ICMD, Restrepo-Mendez MC, Costa JC, Ewerling F, Hellwig F, Ferreira LZ, et al. Mensuração de desigualdades sociais em saúde: conceitos e abordagens metodológicas no contexto brasileiro. Epidemiol Serv Saude. 2018;27(1):e000100017. doi: 10.5123/S1679-49742018000100017 [ Links ]

28. Szwarcwald CL, Leal MC, Esteves-Pereira AP, Almeida WS, Frias PG, Damacena GN, et al. Avaliação das informações do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), Brasil. Cad Saude Publica. 2019;35(10): e00214918. doi: 10.1590/0102-311X00214918 [ Links ]

29. Chisini LA, Castilhos ED, Costa FS, D'Avila OP. Impact of the COVID-19 pandemic on prenatal, diabetes and medical appointments in the Brazilian National Health System. Rev Bras Epidemiol. 2021;24:e210013. doi: 10.1590/1980-549720210013 [ Links ]

30. Victora CG, Vaughan JP, Barros FC, Silva AC, Tomasi E. Explaining trends in inequities: evidence from Brazilian child health studies. Lancet. 2000;356(9235):1093-8. doi: 10.1016/S0140-6736(00)02741-0 [ Links ]

Trabalho acadêmico associadoArtigo derivado de dissertação de mestrado acadêmico intitulada Indicadores de pré-natal na Baixada litorânea do estado do Rio de Janeiro: Estudo temporal de 2000 a 2017, defendida por Zenair Simião Barbosa de Carvalho no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal Fluminense (ISC/UFF), em 2020.

FinanciamentoJúlia Cardoso Correia Guimarães é bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/Ministério da Ciência Tecnologia e Inovações (CNPq/MCTI) - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Federal Fluminense (Pibic/UFF): Processo nº 121012/2021-2.

Recebido: 26 de Fevereiro de 2022; Aceito: 27 de Julho de 2022

Correspondência Alberto Madeiro madeiro@uol.com.br

Editora associada

Doroteia Aparecida Höfelmann

Contribuição das autoras

Fonseca SC e Carvalho ZSB foram responsáveis pela concepção, coleta, análise dos dados e redação do artigo. Kale PL, Boschi-Pinto C e Guimarães JCC participaram da análise dos dados e redação final. Todas as autoras contribuíram na redação das versões preliminares, aprovaram a versão final do artigo e declaram-se responsáveis por todos os aspectos do trabalho, garantindo sua precisão e integridade.

Conflitos de interesse

As autoras declararam não haver conflitos de interesse.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons