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Epidemiologia e Serviços de Saúde

Print version ISSN 1679-4974On-line version ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde vol.31 no.esp1 Brasília  2022  Epub July 27, 2022

http://dx.doi.org/10.1590/ss2237-9622202200011.especial 

Artigo original

Indicadores da linha de cuidado de pessoas com diabetes no Brasil: Pesquisa Nacional de Saúde 2013 e 2019

Indicadores de la línea de atención a personas con diabetes en Brasil: Encuesta Nacional de Salud 2013 y 2019

Deborah Carvalho Malta (orcid: 0000-0002-8214-5734)1  , Edmar Geraldo Ribeiro (orcid: 0000-0002-7201-9566)1  , Crizian Saar Gomes (orcid: 0000-0001-6586-4561)2  , Francielle Thalita Almeida Alves (orcid: 0000-0001-8886-8514)1  , Sheila Rizzato Stopa (orcid: 0000-0001-8847-665X)3  , Luciana Monteiro Vasconcelos Sardinha (orcid: 0000-0002-3679-3618)3  , Cimar Azeredo Pereira (orcid: 0000-0001-6183-1607)4  , Bruce Bartholow Duncan (orcid: 0000-0002-1365-2222)5  , Maria Inês Schimidt (orcid: 0000-0002-9479-3659)5 

1 Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Enfermagem, Belo Horizonte, MG, Brasil

2 Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Medicina, Belo Horizonte, MG, Brasil

3 Ministério da Saúde, Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis, Brasília, DF, Brasil

4 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Diretoria de Pesquisas, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

5 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-graduação em Epidemiologia, Porto Alegre, RS, Brasil

Resumo

Objetivo:

Comparar indicadores de cuidado assistencial em adultos com diagnóstico médico de diabetes mellitus (DM) no Brasil em 2013 e 2019, e analisar esses indicadores, em 2019, segundo características sociodemográficas.

Métodos:

Estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 e 2019. Foram avaliados os indicadores de cuidado em pessoas com diagnóstico médico de DM.

Resultados:

A prevalência de DM aumentou de 6,2% (2013) para 7,7% (2019). Entre 2013 e 2019, ocorreu aumento no uso de medicamentos (de 80,2% para 88,8%) e de assistência médica (de 73,2% para 79,1%), houve redução no uso de medicamentos da Farmácia Popular (de 57,4% para 51,5%) e no acompanhamento com mesmo médico (de 65,2% para 59,4%). Em 2019, pessoas do sexo masculino, mais jovens, de raça/cor da pele preta e parda, menores escolaridade e renda apresentaram pior desempenho nos indicadores.

Conclusão:

A maioria dos indicadores permaneceu semelhante durante os últimos cinco anos, com diferenças segundo características sociodemográficas em 2019.

Palavras-chave: Adulto; Doenças não Transmissíveis; Diabetes Mellitus; Epidemiologia; Inquéritos Epidemiológicos

Resumen

Objetivo:

Comparar indicadores de atención de salud para adultos con diagnóstico médico de diabetes mellitus (DM) en Brasil, en 2013 y 2019, y analizar estos indicadores, en 2019, según características sociodemográficas.

Métodos:

Estudio transversal con datos de la Encuesta Nacional de Salud de 2013 y 2019. Se evaluaron indicadores de atención en personas con diagnóstico médico de DM.

Resultados:

La prevalencia de DM aumentó del 6,2% (2013) al 7,7% (2019). Entre 2013 y 2019 hubo aumento en uso de medicamentos (80,2% a 88,8%) y de atención médica (73,2% a 79,1%), reducción en uso de medicamentos de Farmacia Popular (57, 4% a 51,5%) y seguimiento con mismo médico (65,2% a 59,4%). En 2019, personas de sexo masculino, más jóvenes, de la raza/color de piel negra y mestiza, menor nivel educativo e ingresos mostraron un peor desempeño en los indicadores.

Conclusión:

La mayoría de los indicadores se mantuvieron similares durante los últimos cinco años, con diferencias según las características sociodemográficas en 2019.

Palabras clave: Adulto; Enfermedades no Transmisibles; Diabetes Mellitus; Epidemiología; Investigaciones Epidemiológicas

Contribuições do estudo

Principais resultados

A prevalência de diabetes mellitus (DM) aumentou de 2013 para 2019. Comparando-se 2013 com 2019, houve aumento no uso de medicamentos e na assistência médica, bem como redução do uso de medicamentos da Farmácia Popular e acompanhamento com mesmo médico.

Implicações para os serviços

Comparar e analisar os indicadores de cuidado assistencial de DM segundo características sociodemográficas pode subsidiar o planejamento para ações de controle, prevenção, tratamentos e processos avaliativos nos cuidados assistenciais.

Perspectivas

Ainda se faz necessário apoio a políticas públicas para o monitoramento dos indicadores de manejo e cuidado assistencial, que apontam a imensa contribuição do Sistema Único de Saúde (SUS)na busca da equidade, integralidade e redução das desigualdades em saúde.

Introdução

O diabetes mellitus (DM) é uma doença crônica não transmissível (DCNT) relacionada com o aumento dos níveis de glicose no sangue, podendo resultar em repercussões em órgãos-alvo, como o coração, os vasos sanguíneos, os olhos, os rins e os nervos.1

Aproximadamente 422 milhões de pessoas no mundo têm DM, e 1,6 milhão de mortes anuais são diretamente atribuídas ao DM.2 Segundo dados do Global Burden of Disease (GBD), em 2019, o DM foi responsável por 2,74% (2,58%; 2,87%) do total de mortes no mundo e por 2,8% (2,5%; 3,1%) de anos de vida perdidos por morte ou incapacidade.3

Análise de dados laboratoriais da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2013 identificou que a prevalência de DM pode variar entre 6,6% e 9,4%, segundo diferentes critérios. Ademais, demonstrou que a prevalência de DM foi superior para pessoas do sexo feminino, idade acima de 30 anos, baixa escolaridade, sobrepeso e obesidade.4

Os custos do DM são elevados e estão associados à morbidade, à mortalidade e às complicações, podendo acometer 15% do orçamento anual de saúde de um país,5 considerando-se os gastos diretos (medicamentos, exames, procedimentos e suprimentos, visitas profissionais e gastos hospitalares nos serviços de emergência, além de gastos não médicos) e indiretos (absenteísmo no trabalho, improdutividade, aposentadoria precoce).6

Para os portadores de DM, o acesso ao tratamento é fundamental para a sobrevivência. Visando avançar na assistência à saúde das pessoas com DCNTs, entre elas o DM, o Ministério da Saúde (MS) publicou, em 2014, uma portaria que determina diretrizes para a organização das linhas de cuidado para pessoas com DCNTs.7 O cuidado ao indivíduo com DM, orientado por diretrizes clínicas, visa garantir a atenção à saúde, por meio de monitoramento e manejo, evitando hospitalizações e mortes por complicações.8

As melhores evidências para o gerenciamento do DM enfatizam a importância de mudanças estruturadas no estilo de vida, como redução de peso e dos níveis de açúcar no sangue, controle da pressão arterial, do colesterol e de múltiplos fatores de risco, bem como cuidados integrados baseados em equipe e orientados por dados.9

O monitoramento dos indicadores de manejo e cuidado assistencial são importantes para avaliar o cuidado em DM, permitindo desnudar desigualdades e, assim, apoiar políticas públicas. No Brasil, estes indicadores podem ser monitorados por meio da PNS, que incluiu perguntas sobre o DM autorreferido e sobre os cuidados prestados junto a esta população. Assim, este estudo comparou indicadores de cuidado assistencial em adultos com diagnóstico médico de DM no Brasil, entre 2013 e 2019, e analisou esses indicadores, em 2019, segundo características sociodemográficas.

Métodos

Estudo transversal que analisou os dados de duas edições da PNS (2013 e 2019). A PNS é um inquérito domiciliar realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) juntamente com o MS, objetivando produzir dados sobre estilos de vida e situação de saúde da população brasileira.

A PNS utiliza amostragem por conglomerados em três estágios de seleção, sendo as unidades primárias os setores censitários, ou conjunto destes; as unidades secundárias, os domicílios; e as unidades terciárias, os moradores adultos.10

Em 2013, foram coletadas informações em 64.348 domicílios, de aproximadamente 80 mil domicílios selecionados. Em 2019, foram coletados dados em 94.144 domicílios entre os 108.525 selecionados.10 Detalhamentos sobre a metodologia podem ser verificados em publicações específicas.10

Foram comparados os seguintes indicadores em 2013 e 2019:

  • Prevalência de adultos que nunca mediram sua glicemia; e

  • Prevalência de adultos que referiram diagnóstico médico de DM.

Os indivíduos acima de 18 anos, que referiram diagnóstico médico de DM, foram analisados nos seguintes indicadores da linha do cuidado:

  • Uso de medicamento para DM ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa;

  • Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses;

  • Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores;

  • Realização de todas as consultas com médico especialista após ser encaminhado;

  • Realização de exame de vista nos últimos 12 meses;

  • Realização de exame dos pés, para verificar sensibilidade ou presença de feridas ou irritações, nos últimos 12 meses;

  • Internação por causa da DM ou de alguma complicação;

  • Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido ao DM ou a alguma complicação;

  • Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde (UBS); e

  • Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular”. Mais detalhes sobre a construção dos indicadores estão apresentados no Material Suplementar 1.

Em 2019, os indicadores de cuidado foram analisados segundo variáveis sociodemográficas: sexo (masculino; feminino); faixa etária (18 a 29 anos; 30 a 59 anos; ≥ 60); raça/cor da pele autorreferida (branca; preta; parda - as demais categorias foram somadas no total, não sendo individualizadas, em função de pequeno número de observações); rendimentos [até 1 salário mínimo (SM); de 1 a 3 SMs; 3 ou mais SMs]; escolaridade (sem instrução e ensino fundamental incompleto; fundamental completo e médio incompleto; médio completo e superior incompleto; superior completo); e grandes regiões (Centro-Oeste; Norte; Nordeste; Sudeste; Sul).

A base de dados e os questionários da PNS 2013 e 2019 encontram-se disponíveis, para acesso e uso público, no repositório da PNS (https://www.pns.icict.fiocruz.br/).

Realizou-se o cálculo das prevalências/proporções e intervalos de confiança de 95% (IC95%) dos indicadores em 2013 e 2019. As diferenças foram avaliadas pelo teste qui-quadrado, considerando-se p-valor < 0,05.

Para o cálculo das razões de prevalência e IC95%, foram utilizados modelos de regressão de Poisson com variância robusta, onde as variáveis dependentes foram os indicadores e as variáveis independentes foram as características sociodemográficas. O nível de significância adotado foi de 5%.

Para análise dos dados, utilizou-se o Software for Statistics and Data Science (StataCorp LP, College Station, Texas, United States), versão 14.0, por meio do módulo survey, que considera efeitos do plano amostral.

Para análise dos dados da PNS, faz-se necessária a definição de fatores de expansão ou pesos amostrais, com probabilidades distintas de seleção, tanto para domicílios quanto para os moradores selecionados, devido à complexidade amostral. O resultado aplicado é um produto do inverso das expressões de probabilidade de seleção de cada estágio do plano amostral, e que inclui também correção de não respostas e ajustes dos totais populacionais.10 Com a finalidade de garantir comparabilidade entre as duas edições da pesquisa, o IBGE realizou uma nova calibração dos fatores de expansão da PNS 2013, considerando a revisão da Projeção da População das Unidades da Federação por sexo e idade.

Ambas as pesquisas foram aprovadas pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa para Seres Humanos do MS, pareceres nº 328.159 para a edição de 2013 e nº 3.529.376 para a edição de 2019.

Resultados

Foram avaliados 60.202 indivíduos, em 2013, e 88.531 em 2019. Desses, 6,2%, em 2013, e 7,7%, em 2019, reportaram diagnóstico médico de DM e responderam às perguntas sobre os cuidados assistenciais (Material suplementar 2A). Ademais, observou-se que, em 2013, 11,6% (IC95% 11,1;12,1) da população adulta nunca havia medido a glicemia, e, em 2019, essa prevalência se reduziu para 6,2% (IC95% 5,9;6,5) (Material suplementar 2B).

Sobre o cuidado em saúde e o acesso e uso de serviços entre os portadores de DM, verificou-se aumento: no uso de medicamento (80,2%, em 2013, e 88,8%, em 2019; p-valor < 0,001) e da proporção de adultos com DM que receberam assistência médica no último ano (de 73,2%, em 2013, para 79,1%, em 2019; p-valor = 0,001). Por outro lado, houve redução na aquisição de medicamentos pelo programa “Aqui Tem Farmácia Popular” (57,4%, em 2013; 51,5%, em 2019; p-valor = 0,002), da proporção de pessoas com DM que referiram ter sido atendidas pelo mesmo médico das consultas anteriores (de 65,2%, em 2013, para 59,4%, em 2019; p-valor = 0,004). Nos demais indicadores, não foram encontradas diferenças significativas (Figura 1).

Figura 1 Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus, Pesquisa Nacional de Saúde 2013 e 2019 

Analisando-se os indicadores segundo sexo, em 2019, observou-se que pessoas do sexo feminino usaram mais o programa “Aqui Tem Farmácia Popular” para aquisição de medicamentos (53,4%), tiveram maior proporção de assistência médica no último ano (81,0%), realização da última consulta para acompanhamento de DM em uma UBS (51,1%) e se internaram menos devido a DM ou complicações (13,1%). Os demais indicadores não apresentaram diferenças significativas (Tabela 1).

Tabela 1 Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo sexo, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Sexo RPa (IC95%)b
Masculino (A) Feminino (B) B/A
% (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 88,8 (86,7;90,6) 88,9 (87,1;90,5) 1,00 (0,97;1,03)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 76,6 (73,7;79,2) 81,0 (78,7;83,0) 1,06 (1,01;1,10)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 60,4 (57,1;63,6) 58,6 (55,7;61,5) 0,97 (0,90;1,04)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 82,7 (77,0;87,2) 81,9 (77,6;85,5) 0,99 (0,91;1,07)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 36,8 (33,8;39,8) 36,6 (34,1;39,3) 1,00 (0,90;1,11)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 30,5 (27,8;33,4) 32,5 (30,1;35,1) 1,07 (0,95;1,20)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 16,5 (14,3;19,1) 13,1 (11,5;15,0) 0,80 (0,65;0,97)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 6,1 (4,7;7,9) 5,6 (4,2;7,6) 0,93 (0,62;1,38)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 46,4 (43,2;49,6) 51,1 (48,1;54,0) 1,10 (1,01;1,21)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 49,0 (45,9;52,2) 53,4 (50,6;56,1) 1,09 (1,01;1,18)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus.

Em relação às diferenças regionais, tendo a região Norte com referência, verificou-se que no Sudeste, Sul e Centro-Oeste houve maior proporção de aquisição de medicamento para DM pelo programa “Aqui Tem Farmácia Popular” (56,4%, 59,1% e 56,4%, respectivamente). As regiões Nordeste e Sudeste tiveram menor proporção de realização da última consulta em UBS (49,6% e 46,2%, respectivamente). As regiões Sudeste e Sul apresentaram maior percentual de acesso ao mesmo médico na última consulta (61,8% e 64,7%, respectivamente). O Sudeste apresentou maior realização de exame de vista nos últimos 12 meses (40,8%) e menor de internação devido a DM ou complicações (12,1%). Os demais indicadores não apresentaram diferenças significativas (Tabela 2).

Tabela 2 Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo região, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Região RPa (IC95%)b
Norte (A) Nordeste (B) Sudeste (C) Sul (D) Centro-Oeste (E) B/A C/A D/A E/A
% (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 86,8 (83,5;89,5) 90,2 (88,2;91,8) 88,8 (86,2;90,9) 87,0 (83,3;90,0) 90,1 (86,9;92,6) 1,04 (1,00;1,08) 1,02 (0,98;1,07) 1,00 (0,95;1,05) 1,04 (0,99;1,09)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 82,3 (78,5;85,6) 78,4 (75,5;80,9) 80,7 (77,4;83,6) 74,6 (69,6;79,0) 78,5 (74,0;82,5) 0,95 (0,90;1,01) 0,98 (0,93;1,04) 0,91 (0,84;0,98) 0,95 (0,89;1,02)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 51,7 (46,3;57,0) 55,5 (52,4;58,7 61,8 (57,8;65,6) 64,7 (60,4;68,8) 51,6 (45,5;57,5) 1,08 (0,96;1,21) 1,20 (1,10;1,35) 1,25 (1,11;1,42) 1,00 (0,85;1,17)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 82,7 (75,4;88,2) 75,6 (69,6;80,7) 83,1 (77,3;87,6) 89,3 (83,8;93,1) 80,8 (71,2;87,7) 0,91 (0,82;1,02) 1,00 (0,91;1,11) 1,08 (0,98;1,19) 0,98 (0,86;1,11)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 34,2 (29,7;38,9) 32,2 (29,5;35,0) 40,8 (37,3;44,3) 32,1 (28,2;36,3) 36,3 (31,8;41,1) 0,94 (0,80;1,11) 1,20 (1,02;1,40) 0,94 (0,78;1,13) 1,06 (0,88;1,28)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 29,9 (25,6;34,7) 29,4 (26,7;32,2) 34,0 (30,6;37,4) 30,5 (26,6;34,8) 28,4 (23,9;33,7) 0,98 (0,82;1,17) 1,13 (0,95;1,36) 1,02 (0,83;1,25) 0,95 (0,76;1,19)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 17,4 (13,5;22,2) 17,2 (14,8;20,0) 12,1 (10,1;14,5) 15,9 (12,5;20,1) 16,6 (13,0;20,9) 0,99 (0,74;1,32) 0,70 (0,51;0,95) 0,92 (0,65;1,29) 0,95 (0,67;1,34)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 5,6 (3,8;8,1) 5,9 (4,8;7,1) 6,0 (4,1;8,7) 5,5 (3,7;8,0) 5,7 (4,0;7,1) 1,05 (0,69;1,60) 1,07 (0,63;1,82) 0,98 (0,57;1,67) 1,02 (0,61;1,69)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 56,6 (51,2;61,8) 49,6 (46,4;52,8) 46,2 (42,3;50,0) 55,7 (50,7;60,5) 49,5 (43,7;55,3) 0,88 (0,78;0,98) 0,82 (0,72;0,93) 0,98 (0,87;1,12) 0,88 (0,75;1,02)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 35,6 (30,7;40,9) 39,5 (36,4;42,7) 56,4 (52,8;60,0) 59,1 (54,5;63,6) 56,4 (51,6;61,1) 1,10 (0,94;1,31) 1,59 (1,35;1,86) 1,66 (1,41;1,96) 1,58 (1,34;1,87)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus.

Quanto às diferenças por idade, adultos de 30 a 59 anos e idosos com idade ≥ 60 anos apresentaram a maior proporção de uso de medicamentos ou insulina (87,0% e 91,1%, respectivamente), de assistência médica para DM no último ano (79,9% e 79,2%, respectivamente), de limitação em grau intenso/muito intenso das atividades devido a DM ou complicações (7,0% e 5,2%, respectivamente) e menor proporção de internação (14,4% e 13,9%, respectivamente). Os demais indicadores não apresentaram diferenças significativas (Tabela 3).

Tabela 3 Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo grupos de idade, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Grupos de idade (anos) RPa (IC95%)b
18 a 29 (A) 30 a 59 (B) ≥ 60 (C) B/A C/A
% (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 60,1 (41,8;76,0) 87,0 (84,6;89,0) 91,1 (89,5;92,5) 1,45 (1,07;1,95) 1,52 (1,13;2,03)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 57,9 (39,8;74,1) 79,9 (77,1;82,6) 79,2 (77,0;81,2) 1,38 (1,02;1,87) 1,37 (1,01;1,86)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 58,3 (39,8;74,7) 57,9 (54,4;61,3) 60,5 (57,8;63,2) 0,99 (0,72;1,37) 1,04 (0,76;1,43)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 58,5 (22,6;87,1) 82,3 (77,5;86,2) 83,1 (78,6;86,8) 1,41 (0,73;2,71) 1,42 (0,74;2,74)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 30,5 (16,5;49,3) 34,9 (31,7;38,3) 38,2 (35,7;40,7) 1,15 (0,65;2,03) 1,25 (0,72;2,19)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 17,8 (9,5;30,9) 26,3 (23,3;29,6) 36,1 (33,7;38,6) 1,48 (0,81;2,70) 2,03 (1,11;3,68)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 43,3 (25,6;62,8) 14,4 (12,3;16,7) 13,9 (12,2;15,7) 0,33 (0,21;0,53) 0,32 (0,20;0,51)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 0,4 (0,0;1,7) 7,0 (4,9;9,8) 5,2 (4,3;6,3) 17,20 (3,97;74,42) 12,84 (3,05;53,95)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 54,7 (36,4;71,9) 51,6 (48,1;55,1) 47,2 (44,5;49,9) 0,94 (0,67;1,33) 0,86 (0,61;1,22)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 36,5 (21,6;54,7) 53,2 (49,7;56,8) 50,7 (48,1;53,2) 1,46 (0,91;2,34) 1,39 (0,86;2,22)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus.

Comparados a população de menor escolaridade, os indivíduos com ensino superior completo apresentaram melhor desemprenho em diversos indicadores, como: maior proporção de pés examinados no último ano (41,2%; IC95% 35,1;47,4); realização de exame de vista no último ano (50,6%; IC95% 44,5;56,6); consulta com médico especialista (95,2%; IC95% 91,5;97,3); atendimento pelo mesmo médico das consultas anteriores (69,5%; IC95% 63,9;74,9); e menor limitação intensa/muito intensa devido a DM ou complicações (2,0%; IC95% 0,9;4,2). Quanto à aquisição de medicamento pelo programa federal, a população com ensino superior completo apresentou índices menores (40,7%; IC95% 35,1;46,4), bem como menor realização da última consulta médica em uma UBS (17,5%; IC95% 12,2;23,5). Os outros indicadores não tiveram diferença significativa quando analisados sob a perspectiva da escolaridade (Tabela 4).

Tabela 4 Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo escolaridade, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Escolaridade RPa (IC95%)b
Sem instrução e fundamental incompleto (A) Fundamental completo e médio incompleto (B) Médio completo e superior incompleto (C) Superior completo (D) B/A C/A D/A
% (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 89,6 (87,9;91,0) 85,2 (79,2;90,2) 87,9 (84,5;90,7) 91,0 (87,1;93,8) 0,95 (0,88;1,02) 0,98 (0,95;1,02) 1,02 (0,98;1,06)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 79,5 (77,2;81,6) 76,2 (69,6;81,7) 79,5 (75,5;82,9) 79,8 (75,1;83,8) 0,96 (0,89;1,04) 1,00 (0,95;1,05) 1,00 (0,94;1,07)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 57,0 (54,1;59,8) 61,7 (55,9;67,3) 60,1 (55,5;64,6) 69,5 (63,6;74,9) 1,08 (0,98;1,2) 1,06 (0,96;1,15) 1,22 (1,11;1,34)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 80,0 (75,0;84,0) 80,4 (71,7;86,9) 82,3 (75,2;88,3) 95,2 (91,5;97,3) 1,00 (0,9;1,12) 1,03 (0,93;1,14) 1,19 (1,11;1,27)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 32,2 (29,7;34,9) 39,1 (33,0;45,6) 41,5 (37,2;45,9) 50,6 (44,5;56,6) 1,21 (1,01;1,46) 1,29 (1,13;1,47) 1,57 (1,36;1,81)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 29,0 (26,5;31,5) 33,5 (28,4;39,0) 34,0 (29,7;38,5) 41,2 (35,2;47,4) 1,16 (0,96;1,39) 1,17 (1,0;1,37) 1,42 (1,2;1,69)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 15,9 (14,1;17,9) 12,5 (9,1;16,9) 13,3 (10,6;16,6) 11,3 (7,2;17,3) 0,78 (0,56;1,09) 0,84 (0,65;1,08) 0,71 (0,45;1,11)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 7,3 (5,7;9,3) 4,0 (2,5;6,4) 4,5 (2,8;7,1) 2,0 (0,9;4,2) 0,55 (0,32;0,93) 0,61 (0,36;1,05) 0,27 (0,12;0,61)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 58,3 (55,5;61,0) 48,7 (42,8;54,7) 38,0 (33,4;42,8) 17,5 (12,9;23,5) 0,84 (0,73;0,95) 0,65 (0,57;0,74) 0,30 (0,22;0,41)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 52,3 (49,5;55,0) 59,8 (54,2;65,2) 50,1 (45,5;54,7) 40,7 (35,3;46,4) 1,15 (1,03;1,27) 0,96 (0,86;1,07) 0,78 (0,67;0,9)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus.

Na análise segundo raça/cor da pele, encontrou-se maior realização da última consulta médica para acompanhamento de DM em UBS pelas populações preta e parda (55,7% e 54,8%, respectivamente). Por outro lado, estes apresentaram menor proporção de atendimento pelo mesmo médico da última consulta (55,1% e 56,9%, respectivamente), bem como menor avaliação dos pés durante o último ano (24,7% e 29,5%, respectivamente). Indivíduos de raça/cor da pele parda apresentaram menor realização de exame de vista durante a consulta (33,8%). Os demais indicadores não apresentaram diferenças significativas (Material suplementar 3).

Quanto à renda, as pessoas com rendimento de 1 a 3 SMs e maior que 3 SMs apresentaram os melhores indicadores: o médico que as atendeu na última consulta era o mesmo das anteriores (60,9% e 72,2%, respectivamente); conseguiram consulta com médico especialista (87,6% e 91,6%, respectivamente); realizaram exame de vista no último ano (39,1% e 51,9%, respectivamente); tiveram os pés examinados nos últimos 12 meses (33,3% e 43,9%, respectivamente); menor proporção de internação (11,8% e 7,5%, respectivamente) e de incapacidade (4,3% e 2,6%, respectivamente). Ademais, tiveram menor realização de consulta em UBS (45,0% e 13,3%, respectivamente). Os indivíduos com renda de 3 SMs ou mais apresentaram menor aquisição de medicamentos no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” (38,4%). Os demais indicadores não apresentaram diferença quando analisados pela ótica da renda (Material suplementar 4).

Discussão

O estudo comparou indicadores da PNS 2013 e 2019 referentes à linha de cuidado para pessoas com DM. Houve aumento no uso de medicamentos ou insulina e da assistência médica, no último ano, e redução do uso da Farmácia Popular e do acompanhamento com o mesmo médico. Em 2019, na análise segundo características sociodemográficas, verificaram-se piores indicadores para pessoas do sexo masculino, mais jovens, de raça/cor da pele preta e parda, com menores escolaridade e renda.

O exame de glicemia é fundamental para diagnosticar DM, e o seu monitoramento na Atenção Primária já tem sido preconizado.11 A evolução temporal apontou progressos no Brasil, entre 2013 e 2019, com a redução da proporção de pessoas que nunca realizaram exame de sangue. Entretanto, aumentou a prevalência da doença, o que pode ser resultado da melhoria do diagnóstico, mas, essencialmente, pode se dever ao envelhecimento populacional e aumento da obesidade decorrentes de sedentarismo e alimentação não saudável.1,12

O aumento de DM autorreferido ocorreu para ambos os sexos, embora a prevalência seja mais elevada entre o sexo feminino. Análise realizada com dados laboratoriais da PNS 2013 e associando-os ao relato de uso de medicamentos concluiu-se que a prevalência foi mais elevada no sexo feminino (9,7%; IC95% 8,6;10,7), quando comparado ao masculino (6,9%; IC95% 5,9;7,9).4 Estudos destacam que aspectos como diabetes gestacional e alterações hormonais na menopausa podem elevar a adiposidade abdominal e justificariam o aumento do DM entre mulheres.13 Porém, em países como Austrália14 e Inglaterra,15 utilizando-se critérios laboratoriais, os dados foram diferentes do Brasil, apontando prevalências de DM mais elevadas entre homens.

Como piora dos indicadores de cuidado, destaca-se a redução do acompanhamento com o mesmo médico, o que pode interferir no cuidado longitudinal, no acompanhamento e seguimento do usuário. A continuidade do cuidado programado no plano terapêutico, traçado para cada usuário, é essencial na boa evolução dos casos.9,16

Em relação aos indicadores da linha de cuidado em 2019, as diretrizes do MS para a Atenção Primária a Saúde (APS) preconizam uma consulta médica anual para a pessoa com DM,11 o que foi alcançado, de acordo com o presente estudo, em aproximadamente 80% das pessoas com DM, sem variação segundo escolaridade, rendimentos e raça. A variação ocorreu para a população jovem, que apresentou menos de 60% de consultas anuais, o que pode ser atribuído ao menor tempo de diagnóstico e menor adesão ao tratamento.17 Ainda entre esta população, pessoas do sexo feminino tiveram maior assistência.

Estes indicadores reforçam a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), o maior provedor de cuidados ao portador de DM. Entretanto, em relação ao acesso a médicos especialistas e exames, embora também sejam elevados, apresentaram diferenças segundo escolaridade e renda. Ademais, o estudo aponta diferenças regionais, com piores indicadores nas regiões Norte e Nordeste para o acesso aos medicamentos no programa “Aqui Tem Farmácia Popular do Brasil” e ao mesmo médico da última consulta. Essas são as regiões com piores indicadores econômicos e maiores vazios assistenciais, em função da falta de estrutura física e de profissionais de saúde.18,19

A PNS também revelou elevada proporção de pessoas com DM que usaram medicamentos nas duas semanas anteriores à entrevista, independentemente de sexo, região, raça/cor da pele, escolaridade e renda, o que demonstra a importância do SUS no provimento e dispensação de medicamentos gratuitos na APS, ampliando o acesso e reduzindo as desigualdades.20 Destaca-se que as UBS ofertam insumos, como fitas para glicemia e glicosúria, além de medicamentos hipoglicemiantes e insulinas. Acessar medicamentos a partir do programa “Aqui Tem Farmácia Popular do Brasil” foi referido por metade da população, embora tenha ocorrido redução do acesso, desde 2013, o que pode ser explicado por sucessivos cortes no financiamento no programa após 2017.21

O menor uso de medicamentos entre adultos mais jovens (18 a 29 anos) pode ser explicado pela menor gravidade da doença, podendo favorecer o manejo através de medidas não farmacológicas, como dieta e atividade física.11,22 Já o uso maior entre idosos (≥ 60 anos) pode ser decorrente da maior gravidade e associação com outros riscos cardiovasculares.23

Após 10 anos de DM, é comum a perda de acuidade visual em função da retinopatia; portanto, é fundamental iniciar o acompanhamento no momento do diagnóstico do DM tipo 2 (DM2) e, dentro de cinco anos, para o DM tipo 1 (DM1), com repetição anual.11,24 Entre as complicações mais frequentes, destaca-se o pé diabético e suas consequências, desde de as feridas crônicas e infecções, até amputações de membros inferiores.16 O rastreamento do pé diabético deve ser realizado em todas as pessoas com DM2 no momento do diagnóstico. Estes foram os piores desempenhos entre os indicadores avaliados; apenas 1/3 da população referiu realizar esses exames, com maior proporção entre os mais escolarizados e com maior renda. Estes resultados ficaram muito abaixo dos de outros países, por exemplo, os dos Estados Unidos, onde um inquérito mostrou, em 2010, que cerca de 70% dos indivíduos com DM realizaram exame anual dos pés e dos olhos.17

A maior frequência de internações entre os jovens de 18 a 29 anos, no presente estudo, pode ser explicada pela maior prevalência em jovens adultos do DM1, em função dos sintomas agudos da doença e ainda de não adaptação aos novos cuidados24 e menor adesão às práticas de cuidado.17 O autocuidado e o empoderamento dos usuários no seu cuidado devem ser cada vez mais buscados pelas equipes de saúde, visando a melhor qualidade de vida e à prevenção de desfechos mais graves.11,25

As internações foram semelhantes segundo raça/cor da pele e escolaridade, e foram menos frequentes na população de maior renda, o que sugere o papel dos determinantes sociais de saúde e sua preponderância na incidência, prevalência e evolução do DM.26,27

Entre as limitações do estudo, encontra-se a prevalência autorreferida, sujeita a vieses de relato. No entanto, esta medida tem fornecido estimativas de prevalência de DM válidas,4,28 funcionando como proxy da prevalência populacional. Registrem-se ainda, como limitações, a não distinção entre o tipo de DM (DM1 ou DM2) e a ausência de avaliações quanto à diferença no cuidado dispensado entre os dois grupos. Destaca-se que a realização de pequenas alterações nas perguntas, entre 2013 e 2019, que geraram os indicadores, podem ter comprometido a comparação entre as duas edições.

O estudo apontou aumento do diagnóstico médico autorreferido de DM nos últimos cinco anos. Em relação ao cuidado recebido, a maioria dos indicadores assistenciais permaneceram semelhantes no período e foram piores nas populações com menor escolaridade, menor renda, de raça/cor da pele preta e parda, do sexo masculino, e entre os mais jovens. Alguns indicadores foram piores nas regiões Norte e Nordeste, destacando-se as diferenças regionais e os vazios assistenciais, que devem ser enfrentados. Entretanto, a maioria dos indicadores apresentaram resultados positivos e apontam a imensa contribuição do SUS na busca da equidade em saúde, e seu papel na geração da integralidade e na redução das desigualdades em saúde. Coloca-se a preocupação com os constantes ataques ao SUS, bem como com a redução de orçamentos, principalmente após a aprovação da Emenda Constitucional nº 95, em 2016, que, entre outras medidas, reduziu recursos da saúde por 20 anos, implicando profundas mudanças nos cuidados assistenciais.21,29

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Financiamento Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde (SVS/MS), TED 147/2018.

Material suplementar 1

Construção e método de cálculo dos indicadores relacionados aos cuidados assistenciais e de acesso em pessoas com diabetes mellitus, Pesquisa Nacional de Saúde, 2013 e 2019 

Indicador Perguntas utilizadas na construção do indicador Método de cálculo
Uso de medicamento para diabetes mellitus (DM) ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa PNS 2013 (número de pessoas que tomaram medicamento para diabetes ou usaram insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes) x 100
Nas duas últimas semanas, por causa do diabetes, o(a) Sr.(a):
Tomou medicamentos orais para baixar o açúcar? (sim; não)
Usou insulina? (sim; não)
PNS 2019
Nas duas últimas semanas, por causa do diabetes, o(a) Sr.(a):
Tomou os medicamentos orais para baixar o açúcar? (sim, todos; sim, alguns; não)
Algum médico já lhe receitou insulina para controlar o diabetes? (sim; não)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que receberam assistência médica para diabetes há menos de 1 ano/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes) x 100
Quando foi a última vez que o(a) Sr.(a) recebeu atendimento médico por causa do diabetes? (há menos de 6 meses; de 6 meses a menos de 1 ano; de 1 ano a menos de 2 anos; de 2 anos a menos de 3 anos; há 3 anos ou mais; nunca fez)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que referem que o médico que atendeu na última consulta era o mesmo das consultas anteriores/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes e que receberam atendimento médico há menos de 3 anos) x 100
Na última consulta, o médico que o(a) atendeu era o mesmo das consultas anteriores? (sim; não)
Realização de todas as consultas com médico especialista após ser encaminhado PNS 2013 (número de pessoas que referiu conseguir todas as consultas com médico especialista/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes e que foram encaminhados para alguma consulta com médico especialista) x 100
Em algum dos atendimentos para diabetes, houve encaminhamento para alguma consulta com médico especialista, tal como cardiologista, endocrinologista, nefrologista ou oftalmologista? (sim; não; não houve encaminhamento, pois todas as consultas para diabetes foram com médico especialista)
O(a) Sr.(a) foi a todas as consultas com médico especialista? (sim; não)
PNS 2019
Em algum dos atendimentos para diabetes, houve encaminhamento para alguma consulta com médico especialista, tal como cardiologista, endocrinologista, nefrologista ou oftalmologista? (sim; não; não houve encaminhamento, pois todas as consultas para diabetes foram com médico especialista)
O(a) Sr.(a) foi às consultas com médico especialista? (sim, todas; sim, algumas; não)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que referem realizar exame de vista há menos de 1 ano/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes) x 100
Quando foi a última vez que realizaram um exame de vista ou fundo de olho em que dilataram sua pupila? (há menos de 6 meses; de 6 meses a menos de 1 ano; de 1 ano a menos de 2 anos; de 2 anos a menos de 3 anos; há 3 anos ou mais; nunca fez)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que referem ter seus pés examinados há menos de 1 ano/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes) x 100
Quando foi a última vez que um médico ou profissional de saúde examinou seus pés para verificar sensibilidade ou presença de feridas ou irritações? (há menos de 6 meses; de 6 meses a menos de 1 ano; de 1 ano a menos de 2 anos; de 2 anos a menos de 3 anos; há 3 anos ou mais; nunca fez)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que foram internados por causa da diabetes ou de alguma complicação/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes e que receberam atendimento médico há menos de 3 anos) x 100
Alguma vez o(a) Sr.(a) se internou por causa do diabetes ou de alguma complicação? (sim; não)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação PNS 2013 e 2019 (número de indivíduos que referem grau muito intenso/intenso de limitações nas atividades habituais devido ao diabetes ou a alguma complicação/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes) x 100
Em geral, em que grau o diabetes ou alguma complicação do diabetes limita as suas atividades habituais (tais como trabalhar, realizar afazeres domésticos etc.)? (não limita; um pouco; moderadamente; intensamente; muito intensamente)
Realização da última consulta para diabetes em unidade básica de saúde (UBS) PNS 2013 (número de indivíduos que realizaram a última consulta em unidade básica de saúde/número de indivíduos que referem diagnóstico médico de diabetes e que receberam atendimento médico há menos de 3 anos) x 100
Na última vez que recebeu assistência médica para diabetes, onde o(a) Sr.(a) foi atendido?
PNS 2019
Na última vez que recebeu atendimento médico para diabetes, onde o(a) Sr.(a) foi atendido?
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” PNS 2013 (número de pessoas que obtiveram pelo menos um medicamento ou insulina no programa “Aqui Tem Farmácia Popular”/número de indivíduos que tomaram medicamento para controlar a diabetes) x 100
Algum dos medicamentos para diabetes ou insulina foi obtido no Programa Farmácia Popular (PFP)? (sim, todos; sim, alguns; não, nenhum)
PNS 2019
Algum dos medicamentos orais para diabetes foi obtido no “Aqui Tem Farmácia Popular”? (sim, todos; sim, alguns; não, nenhum)
A insulina foi obtida no “Aqui Tem Farmácia Popular”? (sim; não)

Material suplementar 2

Prevalência de adultos que referiram diagnóstico médico de diabetes mellitus (A) e que nunca fizeram exame de sangue para medir a glicemia (B), segundo sexo, Pesquisa Nacional de Saúde, 2013 e 2019 

Material suplementar 3

Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo raça/cor da pele autorreferida, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Raça/cor da pele RPa (IC95%)b
Branca (A) Preta (B) Parda (C) B/A C/A
% (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 88,3 (85,8;90,4) 88,8 (84,8;91,8) 89,1 (87,2;90,0) 1,00 (0,96;1,00) 1,00 (0,97;1,00)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 77,8 (74,6;80,7) 77,9 (73,1;82,51) 80,5 (78,0;82,7) 1,00 (0,93;1,00) 1,00 (0,98;1,10)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 63,2 (59,6;66,6) 55,1 (49,0;61,3) 56,9 (53,7;60,0) 0,87 (0,77;0,98) 0,90 (0,83;0,97)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 85,1 (80,4;88,9) 83,2 (73,4;89,9) 78,3 (72,4;83,2) 0,97 (0,87;1,10) 0,92 (0,84;1,00)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 40,3 (37,3;43,45) 34,1 (29,1;39,4) 33,8 (30,9;36,9) 0,84 (0,71;1,00) 0,84 (0,74;0,94)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 34,9 (32,0;38,0) 24,7 (20,7;29,2) 29,5 (26,7;32,5) 0,70 (0,58;0,85) 0,84 (0,74;0,96)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 13,3 (11,2;15,6) 14,7 (11,5;18,7) 15,8 (13,8;18,1) 1,10 (0,82;1,49) 1,20 (0,96;1,40)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 4,6 (3,5;6,0) 5,4 (3,9;7,4) 6,9 (4,9;9,5) 1,10 (0,77;1,80) 1,50 (0,96;2,30)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 41,5 (38,2;44,8) 55,7 (49,7;61,6) 54,8 (51,6;57,9) 1,30 (1,10;1,50) 1,30 (1,20;1,40)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 53,6 (50,5;56,6) 53,8 (48,0;59,5) 49,3 (46,1;52,5) 1,00 (0,89;1,10) 0,92 (0,84;1,00)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus.

Material suplementar 4

Indicadores do cuidado assistencial referido pelos brasileiros com diabetes mellitus (n = 7.088), segundo renda, com intervalo de confiança de 95%, Pesquisa Nacional de Saúde 2019 

Indicadores Rendimento domiciliar per capita RPa (IC95%)b
Até 1 SMd (A) 1 até 3 SMsd (B) 3 ou mais SMsd (C) B/A C/A
% (IC95%)b % (IC95%)b % (IC95%)b
Uso de medicamento para DMc ou insulina nas duas últimas semanas anteriores à data da pesquisa 88,6 (86,6;90,4) 89,0 (86,8;90,9) 89,2 (84,7;92,5) 1,00 (0,97;1,04) 1,01 (0,96;1,05)
Assistência médica para diabetes nos últimos 12 meses 79,2 (76,7;81,5) 79,2 (76,4;81,8) 78,6 (74,0;82,6) 1,00 (0,96;1,04) 0,99 (0,94;1,05)
Realização da última consulta para DM com o mesmo médico das consultas anteriores 55,1 (52,1;58,0) 60,9 (57,2;64,4) 72,2 (67,0;76,9) 1,11 (1,02;1,19) 1,31 (1,20;1,43)
Realização de todas as consultas com o médico especialista após ser encaminhado 75,7 (70,0;80,6) 87,6 (83,8;90,6) 91,6 (86,8;94,8) 1,16 (1,07;1,25) 1,21 (1,12;1,31)
Realização de exame de vista nos últimos 12 meses 30,9 (28,3;33,6) 39,1 (35,8;42,5) 51,9 (46,6;57,1) 1,27 (1,12;1,43) 1,68 (1,47;1,92)
Realização de exame dos pés nos últimos 12 meses 27,3 (24,9;29,8) 33,3 (30,0;36,7) 43,9 (38,5;49,5) 1,22 (1,07;1,40) 1,61 (1,38;1,88)
Internação por causa da DM ou de alguma complicação 18,5 (16,3;20,9) 11,8 (9,9;13,9) 7,5 (5,4;10,5) 0,64 (0,51;0,79) 0,41 (0,29;0,58)
Limitação de grau intenso ou muito intenso nas atividades habituais devido a DM ou alguma complicação 7,9 (6,4;9,7) 4,3 (2,6;7,1) 2,6 (1,4;4,8) 0,55 (0,32;0,94) 0,33 (0,17;0,63)
Realização da última consulta para DM em unidade básica de saúde 61,3 (58,4;64,1) 45,0 (41,3;48,6) 13,3 (10,2;17,3) 0,73 (0,67;0,80) 0,22 (0,17;0,29)
Aquisição de pelo menos um medicamento no programa “Aqui Tem Farmácia Popular” 53,6 (50,6;56,5) 53,1 (49,6;56,7) 38,4 (33,5;43,6) 0,99 (0,91;1,08) 0,72 (0,62;0,83)

a) RP: Razão de prevalência; b) IC95%: Intervalo de confiança de 95%; c) DM: Diabetes mellitus; d) SM: Salário mínimo.

Recebido: 20 de Abril de 2021; Aceito: 16 de Novembro de 2021

Correspondência Deborah Carvalho Malta. dcmalta@gmail.com

Editora associada

Maryane Oliveira Campos

Contribuição dos autores

Malta DC redigiu a primeira versão do manuscrito, participou do delineamento, análise e interpretação dos dados. Gomes CS realizou análise e interpretação dos dados. Ribeiro EG, Gomes CS, Alves FTA, Stopa SR, Sardinha LMV, Pereira CA, Ducan BB, Schimidt MI contribuíram na análise e interpretação dos dados, redação ou revisão crítica do manuscrito. Todos os autores aprovaram a versão final e são responsáveis por todos os aspectos do trabalho, incluindo a garantia de sua precisão e integridade.

Conflitos de interesse

Os autores declararam não haver conflitos de interesse.

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