Servicios Personalizados
Revista
Articulo
Indicadores
- Citado por SciELO
Links relacionados
- Similares en SciELO
Compartir
Epidemiologia e Serviços de Saúde
versión impresa ISSN 1679-4974versión On-line ISSN 2237-9622
Epidemiol. Serv. Saúde vol.33 Brasília 2024 Epub 06-Mayo-2024
http://dx.doi.org/10.1590/s2237-96222024v33e2024008.en
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Utilidade da autópsia minimamente invasiva no diagnóstico das arboviroses para ampliação da sensibilidade do Sistema de Vigilância Epidemiológica no Brasil: experiência do Ceará
1Centro Universitário Christus, Faculdade de Medicina, Fortaleza, CE, Brasil
2Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós-Graduação em Patologia, Fortaleza, CE, Brasil
3Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, Serviço de Verificação de Óbito Dr. Rocha Furtado, Fortaleza, CE, Brasil
4Universidade Federal do Ceará, Ambulatório de Pesquisa Clínica Replick, Fortaleza, CE, Brasil
5Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil
6Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Fortaleza, CE, Brasil
7Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil
8Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
9Fundação Oswaldo Cruz, Centro Gonçalo Moniz, Salvador, BA, Brasil
Objetivo:
Estabelecer protocolo para realização de autópsias minimamente invasivas (AMIs) na detecção de óbitos por arboviroses e relatar dados preliminares desse protocolo no Ceará, Brasil.
Resultados:
Estabeleceu-se protocolo para AMI, definindo-se critérios para amostras a serem coletadas, suas formas de armazenamento e diagnóstico, segundo o tipo de amostra biológica; em três meses, foram realizadas 43 AMIs, das quais 21 (48,8%) chegaram ao Serviço de Verificação de Óbito (SVO) com hipótese diagnóstica de alguma arbovirose e sete (16,3%) foram confirmados (seis de chikungunya; uma de dengue); também foram confirmados casos de covid-19 (n = 9), tuberculose (n = 5), meningite (n = 4), criptococose (n = 1), doença de Creutzfeldt-Jakob (n = 1), neoplasia de mama (n = 1) e raiva humana (n = 1).
Conclusão:
O protocolo implantado permitiu a captação de um maior número de óbitos suspeitos de arboviroses, além da confirmação de outras patologias de interesse da vigilância.
Palavras-chave: Infecções por Arbovirus; Autópsia; Serviços de Vigilância Epidemiológica; Técnicas de Pesquisa
Principais resultados
Desenvolveu-se um protocolo para realização de autópsias minimamente invasivas (AMIs) no Serviço de Verificação de Óbito (SVO), capaz de ampliar a capacidade do sistema para captar um maior número de óbitos suspeitos de arboviroses.
Implicações para os serviços
A experiência sugere que profissionais treinados em serviço conseguem realizar AMI, e que o uso dessa técnica no SVO se mostrou capaz de aumentar a sensibilidade do sistema em detectar óbitos de interesse para a saúde pública.
Perspectivas
Profissionais treinados serão capazes de realizar coleta de material biológico em hospitais, por meio de AMI, nos casos de interesse da vigilância e quando os familiares não permitirem a realização da autópsia convencional completa.
Palavras-chave: Infecções por Arbovirus; Autópsia; Serviços de Vigilância Epidemiológica; Técnicas de Pesquisa
INTRODUÇÃO
Preocupado com o cenário das arboviroses no Brasil,1)-(3 o Ministério da Saúde do país recomenda que os óbitos suspeitos dessa condição sejam investigados.4 Determinar a causa dessas mortes permanece como um desafio.5 A autópsia, certamente, contribui para melhorar a compreensão de como os microrganismos causam doenças, especialmente as emergentes e reemergentes.6
As autópsias realizadas pelo Serviço de Verificação de Óbito (SVO) da Secretaria da Saúde do Estado do Ceará contribuíram para uma maior detecção de óbitos por dengue, sendo um dos maiores notificadores de óbitos suspeitos por dengue em 2011-2012 e chikungunya em 2016-2017 em seu território.7)-(10
Todavia, é grande a recusa à realização de autópsias, em virtude de falta de informação, preconceito ou pressão dos serviços de sepultamento.11),(12 Logo, aumenta a necessidade do uso de técnicas mais seguras e menos invasivas na obtenção de amostras dos órgãos para análises post-mortem, potencialmente mais aceitáveis por familiares ou responsáveis daqueles idos a óbito.13 Outro aspecto a mencionar sobre a questão foi a emergência da pandemia de covid-19, que levou a maior parte dos serviços a suspender a realização de autópsias por questões de segurança.14)-(16
O objetivo das autópsias é obter mais informações sobre os processos patológicos e determinar os fatores contributivos para a morte.17 Se, por um lado, essa prática tem sido cada vez mais difícil nos casos em que a família não permite sua realização,11 por outro lado, a autópsia minimamente invasiva (AMI; minimally invasive autopsy, MIA, na sigla em inglês) vem-se tornando um método cada vez mais utilizado para coletar amostras de órgãos-chave post-mortem.12),(17)-(19 Trata-se de uma técnica relativamente simples, para coleta de amostras de tecidos de vários órgãos e fluidos corporais; um procedimento rápido, não desfigurante, de fácil aplicabilidade e capaz de fornecer dados robustos para a vigilância em saúde.20)-(23
O objetivo deste estudo foi estabelecer um protocolo para realização de AMIs na detecção de óbitos por arboviroses, e relatar dados preliminares de sua implantação no estado do Ceará, Brasil.
MÉTODOS
Relata-se aqui uma experiência desenvolvida em parceria, entre os Programas de Pós-Graduação em Patologia e em Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Ceará, a Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, o Serviço de Verificação de Óbito Dr. Rocha Furtado, a Faculdade de Medicina do Centro Universitário Christus e o Laboratório Central de Saúde Pública do Ceará (Lacen/CE), além do Departamento de Anatomia Patológica e de Microbiologia do Hospital Clínic de Barcelona e do Instituto de Salud Global de Barcelona (ISGlobal), Espanha, para implantação da técnica de AMI no Ceará.
Posteriormente, o projeto foi financiado pelo Ministério da Saúde do Brasil, que custeou, entre outros itens, a vinda da equipe de patologistas da Espanha para ministrar treinamento em serviço, nas dependência do SVO Dr. Rocha Furtado. Contudo, o início da pandemia de covid-19 levou ao fechamento do aeroporto internacional de Fortaleza; em seguida, as autópsias foram suspensas por orientação do Ministério da Saúde.17 Naquele momento de crise pandêmica, aumentou a necessidade do serviço em implantar a AMI, dado o crescente número de corpos que chegavam ao SVO sem causa básica estabelecida, vários deles ocorridos no domicílio.
Diante da urgência em iniciar o uso da AMI, o Ministério da Saúde viabilizou a intermediação do grupo do Ceará com a equipe da Universidade de São Paulo (USP), para treinar alguns patologistas. No âmbito dessa parceria, foram enviados três profissionais para serem treinados em São Paulo (Figuras 1A e 1B). A primeira AMI experimental no Ceará foi realizada em janeiro de 2021.24 Portanto, o SVO do Ceará foi o segundo no Brasil a pôr em prática essa técnica (Figuras 1C, 1D, 1E e 1F).
Com o arrefecimento da pandemia, foi possível realizar um treinamento no SVO, entre os dias 7 e 11 de novembro de 2022, com a participação de profissionais de São Paulo, Barcelona/Espanha, e do Ministério da Saúde, para troca de experiências. Nove patologistas do Ceará foram treinados em serviço, para a realização de AMI. Com a equipe local treinada, foi possível estabelecer fluxos dentro do SVO e iniciar as AMIs.
Por se tratar, ainda, de um período considerado de treinamento dos profissionais, naqueles casos em que a família concedeu autorização, foi realizada a AMI e posteriormente, a autópsia, com o objetivo de comparar os achados de imagem com os das amostras biológicas enviadas ao laboratório de referência. Nestes casos, em que foi colhido material biológico pelas duas técnicas, os procedimentos foram realizados por patologistas distintos. O resultado da concordância deu-se de forma direta, quando os achados da macroscopia e da microscopia coincidiam com o órgão-alvo.
O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Christus (CEP/UNICHRISTUS) em 20 de fevereiro de 2020, por meio do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) no 27162619.1.0000.5049 e Parecer no 3.851.684.
RESULTADOS
Durante os três primeiros meses após o treinamento em serviço, foram realizadas 43 AMIs, das quais 21 (48,8%) chegaram ao SVO com hipótese diagnóstica de alguma arbovirose, e as demais 22 (52,2%), com suspeição de outros agravos. Entre os 21 óbitos suspeitos de arboviroses, sete (16,3%) foram confirmados laboratorialmente: seis de chikungunya e um de dengue. Predominou o sexo feminino (79,2%) e a idade média de 54 anos (< 1 a 100), com destaque para idosos (39% com 70 anos ou mais).
Entre os outros agravos investigados, foram confirmados nove casos de covid-19, cinco de tuberculose, quatro de meningite, um de criptococose, um de doença de Creutzfeldt-Jakob, uma neoplasia de mama e um caso de raiva humana.
Em 30/43 (60,7%) casos, foram realizadas as duas técnicas: AMI e autópsia convencional. As amostras enviadas ao Lacen/CE permitiram a identificação de positividade para IgM e RT-qPCR, tanto em amostras de sangue como de líquor e vísceras (cérebro e baço). O percentual de concordância entre os achados pelas duas técnicas foi maior para encéfalo, coração, pulmão e fígado, e mais complexo para o baço. Foi possível identificar, claramente, achados como destrabeculação hepatocitária no fígado, necrose tubular aguda no rim, além de edema e hemorragia alveolar no pulmão (Figuras 2 e 3).
Legenda: 1) Destrabeculação hepatocitária em amostras de fígado; 2) Necrose tubular aguda em amostras de rim; 3) Edema e hemorragia alveolar em amostras de pulmão.
Notas: Macroscopia = quando o patologista conseguiu coletar fragmentos que, macroscopicamente, pareciam ser o órgão-alvo da punção; Microscopia = quando foi confirmado, microscopicamente, que o fragmento coletado por meio da punção correspondia ao tecido do órgão-alvo da punção.
Com base nessa experiência inicial, foi criado um fluxo e estabelecidas as rotinas necessárias para realização da AMI no SVO, além de se definirem os seguintes critérios de seleção:
a) óbito encaminhado ao SVO com hipótese diagnóstica de alguma arbovirose; ou
b) óbito que dá entrada no SVO e cuja suspeita de arbovirose é aventada após a entrevista com os familiares; ou
c) óbito cujo(s) familiar(es) ou responsável legal não autoriza a autópsia convencional; ou
d) óbito que se enquadra nas patologias em que há elevado risco biológico, contraindicando a autópsia.
Havendo indicação para realização de AMI por qualquer um desses critérios, foi solicitada a autorização dos familiares para a realização da AMI, mediante apresentação de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido sobre os procedimentos implicados. Recebida essa autorização, o estudo post mortem foi iniciado pela AMI, separando-se e identificando-se todo o material a ser utilizado. Para a realização da AMI, foram usadas agulhas coaxiais semiautomáticas, de tipo TRU-CUT, 16G x 20 cm de comprimento para adultos e 14G x 9 cm de comprimento para crianças. Foram utilizadas agulhas individuais para cada órgão biopsiado: cérebro, coração, pulmão direito, pulmão esquerdo, fígado, baço, rins direito e esquerdo, nesta ordem.
Os fragmentos coletados pela AMI foram distribuídos para análises biomolecular, imuno-histoquímica e histopatológica, conforme o seguinte protocolo:
- oito agulhas, com seus respectivos oito fios-guia, para a punção dos oito órgãos-chave (cérebro, coração, pulmão direito, pulmão esquerdo, fígado, baço, rim direito e rim esquerdo);
- dez criotubos sem formol, para acondicionamento in natura das amostras de sangue, de liquor e dos oito órgãos-chave, a serem enviados para a análise sorológica e de biologia molecular no Lacen/CE;
- oito criotubos contendo formol tamponado a 10%, para acondicionamento dos fragmentos de cada um dos oito órgãos-chave, a serem enviados para a análise imuno-histoquímica no laboratório de referência conveniado ao Lacen/CE;
- oito criotubos contendo formol tamponado a 10%, para acondicionamento dos fragmentos de cada um dos oito órgãos-chave, a serem processados para a análise histopatológica no próprio SVO.
Após a realização de todas as punções da AMI, o corpo foi transferido da maca para a mesa de necrópsia e submetido a autópsia, com a abertura das cavidades craniana e toracoabdominal. Também foram coletados fragmentos de todos os órgãos-chave e examinados integralmente cada um deles, escolhendo-se intencionalmente a melhor amostra de cada órgão para a análise.
Concluída a AMI e a autópsia, todas as amostras foram enviadas aos laboratórios e seus resultados confrontados posteriormente, para validação da técnica em casos de arboviroses.
DISCUSSÃO
A criação e implantação do protocolo pelo SVO do Ceará permitiu que óbitos de interesse da vigilância epidemiológica que não tivessem autorização da família para realização de autópsia fossem captados para o uso da técnica de AMI, possibilitando a coleta de material biológico para investigação da causa mortis. O uso da AMI permitiu aumentar tanto o número de óbitos suspeitos a serem investigados como a sensibilidade do sistema de investigação.
Uma limitação do estudo a se destacar é que, mesmo sendo uma técnica segura, rápida, acessível e com maior aceitabilidade, independentemente de impedimentos de ordem religiosa e ética,25),(26 a utilização da AMI encontrou resistência por parte de alguns patologistas. Também cumpre citar a dificuldade na identificação e punção de pequenas lesões focais, que acometem apenas uma pequena porção de determinado órgão. Lesões focais, como nódulos ou abscessos, por exemplo, podem não ser puncionadas caso sejam realizadas punções aleatórias. Esta limitação é parcialmente resolvida com a utilização da ultrassonografia, que permite identificar uma grande quantidade de lesões focais e direcionar as punções a elas. Restaria, ainda, a limitação para identificar lesões focais que não deixam alterações ultrassonográficas, como nas áreas de isquemia do miocárdio. Para esse tipo de lesão, todavia, não existem técnicas de AMI que substituam, de forma satisfatória, a análise macroscópica que a autópsia proporciona. Não obstante essas limitações, convém ressaltar que, por meio da AMI, tem-se condição de identificar o agente etiológico na maioria dos óbitos por causas infecciosas.21
Considerando-se o objetivo primário do protocolo, de demonstrar a utilidade da AMI no diagnóstico das arboviroses, e sabendo-se que as infecções por arbovírus são sistêmicas e acometem os órgãos de forma difusa, as limitações observadas tendem a não prejudicar substancialmente o que foi proposto. Ainda que não seja possível identificar lesões focais no coração, por exemplo, desde que a miocardite por arbovírus é difusa, há uma grande chance de tal miocardite ser detectada mediante punções de porções aleatórias do miocárdio.
É importante deixar claro que o uso da AMI não deve ser incentivado em detrimento da realização de uma autópsia. A autópsia permanece sendo o padrão ouro mas, nos casos em que não há SVO ou quando a família não autoriza sua realização, a AMI é uma alternativa.
As primeiras AMIs no Brasil aconteceram em São Paulo, em março de 2020,27 e algum tempo depois, no Ceará24 e em seguida na Bahia.28
A confirmação de um caso de raiva humana no Ceará, após vários anos sem registro da doença no estado, foi uma evidência da ampliação da sensibilidade do sistema com o uso da AMI: a família recusou a autópsia e o caso não seria investigado se não fosse realizada a AMI no próprio hospital onde ocorreu o óbito. A propósito, eis um aspecto a ser discutido nesse cenário de ampliação do uso dessa técnica para os hospitais: se a AMI deveria ou não ser exclusiva do médico patologista. A experiência da USP aponta para a possibilidade de o procedimento ser feito por profissionais treinados, mesmo que não sejam médicos. No Ceará, optou-se por treinar apenas médicos patologistas, até porque são os mesmos profissionais que devem fazer o diagnóstico histológico, conforme recomenda a legislação brasileira. Nos casos em que não houver SVO na região, a realização da AMI por outros profissionais de saúde deverá ser discutida e avaliada. Até o momento da conclusão deste relato, não há consenso sobre o assunto, mas certamente ele merece uma reflexão, haja vista o pequeno número de médicos patologistas disponíveis na rede.
Mesmo que o objetivo inicial do SVO do Ceará seja utilizar a AMI nas arboviroses, de forma complementar, estenderam-se as indicações de AMI para outras doenças infectocontagiosas de importância para a saúde pública, de modo a aumentar o número de procedimentos realizados por cada patologista, acelerando a curva de aprendizagem da técnica e ampliando a sensibilidade da vigilância de óbitos no Ceará.29
A experiência do SVO sugere que, no momento de realizar a AMI, o corpo seja posicionado sobre uma maca. As mesas de necropsia convencionais possuem bordas elevadas, que podem dificultar a punção das estruturas mais dorsais, como os rins. Com o corpo em decúbito ventral, é feita a punção suboccipital para a coleta de líquor a partir da cisterna magna. Como não há uma ordem obrigatória, é recomendável que cada serviço ou profissional determine uma sistematização de condutas, evitando-se esquecer de puncionar algum dos órgãos. No SVO do Ceará, estabeleceu-se a seguinte ordem de punção: cérebro, coração, pulmão direito, pulmão esquerdo, fígado, baço, rim direito e rim esquerdo.
Sobre os casos de covid-19, cumpre mencionar, estudos relatam que corpos submetidos a AMI obtiveram achados histológicos coletados quase idênticos, quando comparados àqueles submetidos a autópsia.30
No primeiro momento, utilizou-se uma agulha para cada órgão, em virtude do objetivo secundário de identificar o órgão que referisse positividade laboratorial. Pretendeu-se identificar, ademais, se havia algum órgão com maior positividade que outros, visando a sua priorização quando não fosse possível realizar coletas em todos. Isto aumenta o custo do procedimento, mas, em condições normais, o consumo de agulhas será bem menor.
Não há como mensurar o número de AMIs necessárias para o profissional alcançar um percentual de acerto do órgão-alvo de 100%. A experiência do Ceará sugere que, com poucas autópsias realizadas, o profissional tem segurança suficiente e, se o serviço conta com um equipamento de ultrassom e dispõe de um médico radiologista, a técnica de AMI torna-se mais efetiva, facilitando a conclusão do processo.
Historicamente, o Ceará registra maior rejeição por parte dos familiares para realização da autópsia, o que acaba por motivar a busca de alternativas menos invasivas; principalmente após a epidemia de chikungunya, responsável por muitos óbitos em idosos cujos familiares não permitiram a realização de autópsia.
A adoção da AMI não deve condicionar a necessidade de novos SVOs. Seu uso pode ampliar o leque de doenças observadas por punções pós-morte, a detecção de doenças emergentes e até mesmo o diagnóstico de doenças crônicas.
O próximo desafio do estado do Ceará será treinar infectologistas e neurologistas dos hospitais de referência locais - Hospital São José de Doenças Infecciosas e Hospital Geral de Fortaleza, ambos na capital cearense - para o uso da técnica no próprio hospital, nos casos de interesse da vigilância e especialmente naqueles em que os familiares não permitam o encaminhamento do corpo para o SVO. A maior utilização da AMI certamente contribuirá para a redução do número de óbitos com causa mal definida no Ceará.
REFERÊNCIAS
1. Carvalho FHC, Cavalcanti LPG. The triple epidemic of arboviroses in Brazil. What does this mean? Are we ready? Rev Med UFC. 2016;56(1):6-7. doi: 10.20513/2447-6595.2016v56n1p6-7. [ Links ]
2. Freitas ARR, Cavalcanti LPG, von Zuben PB, Donalísio MR. Excess mortality related to chikungunya epidemics in the context of cocirculation of other arboviruses in Brazil. PloS Curr. 2017;9(1):1-13. doi: 10.1371/currents.outbreaks.14608e586cd321d8d5088652d7a0d884. [ Links ]
3. Brito CAA. Alert: Severe cases and deaths associated with chikungunya in Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2017;50:585-9. doi: 10.1590/0037-8682-0479-2016. [ Links ]
4. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico: Monitoramento dos casos de dengue, febre de chikungunya e febre pelo vírus Zika até a Semana Epidemiológica 32 [Internet]. 2016 [citado 2023 Março 15];47(33). Disponível no link: Disponível no link: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2016/setembro/16/2016-028---Dengue-SE32.pdf . [ Links ]
5. Cavalcanti LPG, Barreto FKA, Oliveira RMAB, Canuto IFP, Lima AAB, Lima JWO, et al. Thirty years of dengue in Ceará: history, contributions to science and challenges in the current scenario with triple arbovirus circulation. J Health Biol Sci. 2018;6(1):65-82. doi: 10.12662/2317-3076jhbs.v6i1.1415.p65-82.2018. [ Links ]
6. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Guia de vigilância epidemiológica. 7. ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. 816 p. [ Links ]
7. Cavalcanti LPG, Braga DNM, Silva LMA, Aguiar M, Castiglioni M, Silva-Junior JU, et al. Postmortem diagnosis of dengue as an epidemiological surveillance tool. Am J Trop Med Hyg. 2016;94(1):187-92. doi: 10.4269/ajtmh.15-0392. [ Links ]
8. Cavalcanti LPG, Escóssia KNF, Simião AR, Linhares PMC, Lima AAB, Lopes KW, et al. Experience of the Arbovirus Death Investigation Committee in Ceará, Brazil, in 2017: advances and challenges. Epidemiol Serv Saude. 2019;28(3):1-7. doi: 10.5123/S1679-49742019000300011. [ Links ]
9. Cavalcanti LPG, Braga DNM, Pompeu MML, Lima AAB, Silva LMA, Aguiar MG, et al. Evaluation of the WHO classification of dengue severity from autopsied, during an epidemic in 2011 and 2012, in Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2015;48(6):658-64. doi: 10.1590/0037-8682-0287-2015. [ Links ]
10. Monteiro DCS, Souza NV, Amaral JC, Lima KB, Araújo FMC, Ramalho ILC, et al. Dengue: 30 years of cases in an endemic area. Clinics. 2019;74:e675. doi: 10.6061/clinics/2019/e675. [ Links ]
11. Simião AR, Barreto FKA, Oliveira RMAB, Cavalcante JW, Lima Neto SS, Barbosa RB, et al. A major chikungunya epidemic with high mortality in northeastern Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2019;52:e20190266. doi: 10.1590/0037-8682-0266-2019. [ Links ]
12. Maixenchs M, Anselmo R, Sanz A, Castillo P, Macete E, Carrilho C, et al. Healthcare providers’ views and perceptions on post-mortem procedures for cause of death determination in Southern Mozambique. PLoS One. 2018;13(7):e0200058, 2018. doi: 10.1371/journal.pone.0200058. [ Links ]
13. Hurtado JC, Quintó L, Castillo P, Carrilho C, Fernandes F, Jordao D, et al. Postmortem interval and diagnostic performance of the autopsy methods. Sci Rep. 2018;8(1):16112. doi: 10.1038/s41598-018-34436-1. [ Links ]
14. Hanley B, Lucas SB, Youd E, Swift B, Osborn M. Autopsy in suspected COVID-19 cases. J Clin Pathol. 2020;73(5):239- 42. doi: 10.1136/jclinpath-2020-206522. [ Links ]
15. Rakislova N, Ismail MR, Martinez A, Carrilho C, Martínez MJ, Bassat Q, et al. Minimally Invasive Autopsy: a more feasible and safer alternative to conventional autopsy in the COVID-19 pandemic era? Med Clin Sci. 2020;2(3):1-5. [ Links ]
16. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças não Transmissíveis. Manejo de corpos no contexto do novo coronavírus COVID-19 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2023 Março 15]. 32 p. Disponível em: Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/bvsms/resource/pt/biblio-1087614 . [ Links ]
17. Costache M, Lazaroiu AM, Contolenco A, Costache D, George S, Sajin M, et al. Clinical or postmortem? The importance of the autopsy; a retrospective study. Maedica. 2014;9(3):261. [ Links ]
18. Chapman AR. Assessing the universal health coverage target in the Sustainable Development Goals from a human rights perspective. BMC Int Health Hum Rights. 2016;16(1):33. doi: 10.1186/s12914-016-0106-y. [ Links ]
19. Centers for Disease Control and Prevention. National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES): anthropometry procedures manual. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention; 2007. p. 15-6. [ Links ]
20. Castillo P, Ussene E, Ismail MR Jordao D, Lovane L, Carrilho C, et al. Pathological methods applied to the investigation of causes of death in developing countries: minimally invasive autopsy approach. PLoS One. 2015;10(6):e0132057. doi: 10.1371/journal.pone.0132057. [ Links ]
21. Martínez MJ, Massora S, Mandomando I, Ussene E, Jordao D, Lovane L, et al. Infectious cause of death determination using minimally invasive autopsies in developing countries. Diagn Microbiol Infect Dis. 2016;84(1):80-6. doi: 10.1016/j.diagmicrobio.2015.10.002. [ Links ]
22. Maixenchs M, Anselmo R, Pérez GM, Oruko K, Agnandji ST, Minsoko PCA, et al. Socio-anthropological methods to study the feasibility and acceptability of the minimally invasive autopsy from the perspective of local communities: lessons learnt from a large multi-centre study. Glob Health Action. 2019;12(1):155949. doi: 10.1080/16549716.2018.1559496. [ Links ]
23. Maixenchs M, Anselmo R, Zielinski-Gutiérrez E, Odhiambo FO, Akello C, Ondire M, et al. Willingness to know the cause of death and hypothetical acceptability of the minimally invasive autopsy in six diverse African and Asian settings: a mixed methods socio-behavioural study. PLoS Med. 2016;13(11):e1002172. doi: 10.1371/journal.pmed.1002172. [ Links ]
24. Secretaria Estadual de Saúde (CE). Serviço de Verificação de Óbitos realiza autópsia minimamente invasiva, técnica inédita no Ceará [Internet]. Fortaleza: Secretaria Estadual de Saúde; 2021 [atualizado 2021 Jan 28, citado 2023 Maio 09]. Disponível em: Disponível em: https://www.saude.ce.gov.br/2021/01/28/servico-de-verificacao-de-obitos-realiza-autopsia-minimamente-invasiva-procedimento-inedito-no-ceara/ . [ Links ]
25. Ben‐Sasi K, Chitty LS, Franck LS, Thayyil S, Judge-Kronis L, Taylor AM, et al. Acceptability of a minimally invasive perinatal/paediatric autopsy: healthcare professionals' views and implications for practice. Prenat Diagn. 2013;33(4):307-12. doi: 10.1002/pd.4077. [ Links ]
26. Wagensveld IM, Weustink AC, Kors JA, Blokker BM, Hunink MGM, Oosterhuis JW. Effect of minimally invasive autopsy and ethnic background on acceptance of clinical postmortem investigation in adults. PloS One. 2020;15(5):e0232944. doi: 10.1371/journal.pone.0232944. [ Links ]
27. Monteiro RAA, Duarte-Neto AN, Silva LFF, Oliveira EP, Theodoro Filho J, Santos GAB, et al. Ultrasound-guided minimally invasive autopsies: a protocol for the study of pulmonary and systemic involvement of COVID-19. Clinics. 2020;75:e1972. doi: 10.6061/clinics/2020/e1972. [ Links ]
28. Instituto Gonçalo Moniz - Fiocruz Bahia. Primeira necropsia minimamente invasiva da Bahia é realizada em projeto de Covid-19 [Internet]. Salvador: Instituto Gonçalo Moniz - Fiocruz Bahia; 2021 [atualizado 2021 Mar 1; citado 2023 Março 15]. Disponível em: Disponível em: https://www.bahia.fiocruz.br/primeira-necropsia-minimamente-invasiva-da-bahia-e-realizada-em-projeto-de-covid-19/ . [ Links ]
29. Cavalcanti LPG, Escóssia KNF, Simiao AR, Linhares PMC, Lima AAB, Lopes KW et al. Experiência do Comitê de Investigação de Óbitos por Arboviroses no Ceará em 2017: avanços e desafios. Epidemiol Serv Saude. 2019;28(3):e2018397. doi: 10.5123/S1679-49742019000300011. [ Links ]
30. Rakislova N, Marimon L, Ismail MR, Carrilho C, Fernandes F, Ferrando M, et al. Minimally invasive autopsy practice in COVID-19 cases: biosafety and findings. Pathogens. 2021;10(4):412. doi: 10.3390/pathogens10040412. [ Links ]
FINANCIAMENTO A pesquisa foi financiada pelo Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde (Processo no 421724/2017-0) e pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (Processo no 707272/19-002). Luciano Pamplona de Góes Cavalcanti é bolsista de produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (CNPq/MCTI): Processo no 310579/2022-8.
Recebido: 17 de Janeiro de 2024; Aceito: 04 de Março de 2024