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Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Naturais

versão impressa ISSN 1981-8114

Bol. Mus. Para. Emilio Goeldi Cienc. Nat. v.2 n.1 Belém abr. 2007

 

INTRODUÇÃO

 

Anatomia sistemática: uma nova linha de pesquisa em ornitologia no Brasil

 

 

Maria Luiza Videira Marceliano; Reginaldo José Donatelli; Elizabeth Höfling

 

 

Define-se Anatomia Sistemática como uma linha de pesquisa que procura estabelecer as relações de parentesco entre táxons por meio de estudos anatômicos, através da metodologia da Sistemática Filogenética. Ela difere da Anatomia Tradicional justamente por seu caráter comparativo, tentando entender o táxon em questão no contexto de outros níveis de organização, e não em isolamento. Assim, enquanto a Anatomia Tradicional focaliza, por exemplo, as características morfológicas de uma espécie, a Anatomia Sistemática ocupa-se em situar essas características dentro de um quadro comparativo mais amplo.

Conforme o momento histórico, algumas linhas de pesquisa em Ornitologia têm prevalecido em detrimento de outras. No final do século XIX e início do século XX, exemplares da fauna neotropical eram trazidos aos laboratórios do Hemisfério Norte e estudados com ênfase na Anatomia Tradicional e na Taxonomia. Após a Segunda Guerra Mundial, houve maior mobilidade dos pesquisadores e a oportunidade de se realizarem pesquisas em campo possibilitou a observação in loco, o que levou a uma expansão dos estudos de biologia alimentar, biologia reprodutiva, comportamento e ecologia geral e de comunidades. Nesse período, a Anatomia Tradicional e a Taxonomia foram conseqüentemente relegados a segundo plano.

Em meados do século XX, o entomólogo alemão Willi Hennig elaborou um sistema de estudo do inter¬relacionamento entre organismos, que motivou o resgate da Anatomia como fundamento para a Taxonomia. Os princípios e fundamentos desse sistema, denominado originalmente Sistemática Filogenética (mais tarde amplamente conhecido como Análise Cladística), abalaram as bases das classificações tradicionais. Os caracteres dos organismos foram reexaminados, de maneira a permitir que os táxons fossem classificados segundo formassem grupos naturais, compartilhando da mesma linhagem evolutiva. Adaptando-se a esses conceitos, a Ornitologia passou a exigir um estudo mais amplo e profundo da Anatomia para possibilitar essa análise. A Anatomia Sistemática, assim surgida, aplicava um direcionamento evolutivo aos estudos anatômicos, permitindo uma compreensão maior da distribuição da avifauna no tempo e no espaço.

Difundida no Brasil no final dos anos 1970 pelos entomólogos Nelson Bernardi e Nelson Papavero, a Sistemática Filogenética encontrou sua primeira aplicação na Ornitologia através dos trabalhos de Elizabeth Höfling, ao se iniciar a nova década. Introduzindo uma linha de pesquisa denominada Anatomia Funcional, Höfling refinou o estudo tradicional da Anatomia de aves a partir de descrições anatômicas detalhadas, particularmente da osteologia craniana e da miologia das maxilas, de modo a fornecer elementos para classificação. Com maior propriedade, essa diretriz de trabalho passou a ser conhecida como Anatomia Sistemática.

O surgimento da Anatomia Sistemática abriu um leque de opções e oportunidades de pesquisa em Ornitologia ainda não exploradas no Brasil. Nas duas décadas seguintes, o programa de pós-graduação do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo formou vários mestres e doutores nessa área, sob a orientação de Höfling. Logo surgiram outros pólos de pesquisa orientados por profissionais formados nesse programa: Reginaldo José Donatelli, da Faculdade de Ciências da UNESP campus de Bauru; Maria Luiza Videira Marceliano, do Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém; Herculano Alvarenga, do Museu de História Natural de Taubaté; e Marcos André Raposo Ferreira, do Museu Nacional do Rio de Janeiro. Esses pesquisadores formaram um grupo que consolidou a Anatomia Sistemática de aves como linha de pesquisa e vêm desenvolvendo projetos em colaboração mútua. O resultado dessa associação pode ser refletido na qualidade dos trabalhos produzidos nos últimos anos.

Esta edição reúne sete artigos com descrições e comparações minuciosas da osteologia e miologia cranianas de algumas aves brasileiras, acompanhadas de ilustrações detalhadas de estruturas anatômicas do crânio dessas espécies. O material utilizado provêm, em grande parte, do acervo da Coleção Anatômica do Museu Paraense Emílio Goeldi e do Museu de História Natural de Taubaté, havendo também a contribuição de coleções de outras instituições. Os resultados podem ser prontamente aplicados à hipóteses cladísticas.

O esforço dos estudos desenvolvidos por pesquisadores do grupo em Anatomia Sistemática de aves contribuiu sobremaneira para enriquecer o conhecimento sobre a anatomia da avifauna brasileira, preenchendo uma lacuna na literatura científica. Os trabalhos aqui apresentados demonstram claramente que o conhecimento sobre a Anatomia Sistemática no Brasil avança, de maneira firme, nas instituições parceiras.