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Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Naturais

versão impressa ISSN 1981-8114

Bol. Mus. Para. Emilio Goeldi Cienc. Nat. v.5 n.1 Belém abr. 2010

 

CARTA DO EDITOR

 

 

Dr. Alexandre Aleixo

Editor Associado de Zoologia Notas sobre os vertebrados do norte do Pará, Brasil: uma parte esquecida da Região das Guianas

 

 

Como podemos preencher, em apenas 12 meses, as lacunas de conhecimento da biodiversidade Amazônica? Essa é uma pergunta cuja resposta tem uma importância extraordinária, já que toda a política de conservação para essa região, notável quanto à sua vasta gama de serviços ambientais ofertada para todo o planeta, se baseia no conhecimento sobre quais, quantas e como estão distribuídas as espécies de organismos que nela ocorrem.

A demarcação de cinco unidades de conservação estaduais em áreas remotas do norte Pará em 2006, numa região batizada nos anos 70 de "Calha Norte", foi o ponto de partida para o preenchimento de uma importante lacuna sobre o conhecimento da biodiversidade Amazônica. As cinco unidades decretadas cobrem juntas mais de 13 milhões de hectares na porção mais preservada de toda a Amazônia, que se manteve neste estado até hoje por uma razão logística simples: os rios, que em outras partes da bacia funcionam como vias principais de transporte, na Calha Norte são encachoeirados em vários trechos, inviabilizando a navegação de embarcações de médio e grande porte. Por esse motivo, os poucos a navegarem os rios da Calha Norte foram os indígenas e quilombolas em suas caçadas e expedições para a coleta de borracha a castanha. A mesma barreira logística que vem impedindo o acesso da indústria do desmatamento à Calha Norte também impediu que a sua biodiversidade fosse estudada por naturalistas e biólogos, gerando uma grande lacuna de conhecimento.

Em 2007, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará (SEMA) formou um consórcio de instituições para produzir planos de manejo para as cinco novas unidades de conservação da Calha Norte recém-criadas, ficando os inventários biológicos sob responsabilidade técnica do Museu Paraense Emílio Goeldi. A meta traçada pelo consórcio foi bastante ambiciosa: finalizar todos os planos de manejo até 2010. Para isso, os inventários biológicos deveriam começar o quanto antes e depois prosseguir num regime de "expedição permanente" até a sua finalização, período esse estimado em 12 meses. Para resolver o grande entrave logístico que historicamente havia tornado a Calha Norte inacessível a biólogos, um acordo entre a SEMA e uma empresa de mineração assegurou o imprescindível apoio do transporte aéreo, sempre que necessário, na execução dos inventários biológicos. Recursos da organização Conservação Internacional (Cl-Brasil) financiariam gastos com alimentação, materiais de consumo e equipamentos, pessoal e despesas de transporte complementares.

Após os devidos arranjos institucionais e financeiros, entre janeiro de 2008 e janeiro de 2009, sete inventários biológicos com a duração aproximada de duas semanas cada, foram realizados nas cinco unidades de conservação alvo do consórcio. Em conjunto, as sete expedições cobriram os principais setores da Calha Norte no estado do Pará, um feito inédito e que gerou um grande acúmulo de conhecimento para todos os grupos biológicos trabalhados durante os inventários.

Logo após o final das expedições, ficou claro que toda a informação acumulada para essa região da Amazônia antes nunca amostrada sistematicamente, deveria ser analisada e publicada o quanto antes, com o objetivo maior de não apenas subsidiar os planos de manejo das unidades de conservação, mas também preencher lacunas sobre o conhecimento científico básico da biodiversidade amazônica. Neste espírito, o Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Naturais ofereceu espaço para a publicação de um conjunto de artigos científicos sobre os resultados obtidos para os diferentes grupos biológicos amostrados durante as sete expedições à Calha Norte. Esses artigos terão como título geral Notas sobre os vertebrados do norte do Pará, Brasil: uma parte esquecida da Região das Guianas. Têm como objetivo principal sistematizar e sintetizar o conhecimento da fauna de vertebrados do norte do Pará a partir dos novos resultados obtidos, contextualizando-os em relação a outros setores mais bem conhecidos da mesma unidade biogeográfica: a região das Guianas ou centro de endemismo Guiana.

O primeiro artigo a vir a lume é o referente à herpetofauna. Juntos, os três autores deste artigo talvez possuam o maior número de horas de campo na região amazônica do que qualquer outro herpetólogo, além de um histórico de trabalhos na região das Guianas. A contribuição deles é chave para o conhecimento da herpetofauna do centro de endemismo das Guianas, até então incompleto pela lacuna de conhecimento que o norte do Pará representava, situação que deve ser replicada para futuros artigos.

Mais do que efetivamente colocar o conhecimento sobre a fauna de vertebrados do centro de endemismo das Guianas num outro patamar, os artigos do conjunto Notas sobre os vertebrados do norte do Pará, Brasil: uma parte esquecida da Região das Guianas mostram como é possível, num prazo relativamente curto de 12 meses, preencher uma importante lacuna sobre o conhecimento da biodiversidade Amazônica, servindo assim como um modelo para outras iniciativas com os mesmos objetivos. Quando há vontade nas esferas governamentais e da sociedade civil, além de uma equipe de biólogos de campo dedicados e dispostos a encarar condições adversas em prol de um projeto de interesse público, o resultado, ilustrado nas páginas desta revista, não pode ser outro além do sucesso.

 

 

EDITOR'S NOTE

 

 

Dr. Alexandre Aleixo

Associate Editor of Zoology Notes on the Vertebrates of northern Para, Brazil: a forgotten part of the Guianan Region

 

 

How can the knowledge gaps on Amazonian biodiversity be filled in just 12 months? The importance of answering this question is extraordinary, given that conservation policies for this region offering a wide array of environmental services to the world are established ultimately based on the knowledge of its species composition, richness, and distribution.

The creation of five state-owned conservation units in 2006 in the pristine north of the Para, Brazil, an area known as "Calha Norte", was the starting point for filling in one of the major knowledge gaps on Amazonian diversity. Together, those five conservation units cover ca. 13 million hectares in the best preserved sector of Amazonia, which has remained as such for a simple reason: unlike other parts of the region where rivers are the main venues for transportation, ubiquitous rapids prevent vessels from reaching most of Calha Norte. Only indigenous populations and "quilombolas" (Afro-descendents originally fleeing slavery) have coped with Calha Norte waterfalls during hunting expeditions and searches for rubber and Brazil nuts. The same logistical hurdle preventing the so called "deforestation industry" from reaching deep into Calha Norte has also adversely affected naturalists and biologists, leading ultimately to one of the major gaps concerning biological information in Amazonia.

In 2007, the Secretariat of Environment of the State of Para (SEMA) created a consortium of several institutions to consolidate management plans for the five recently established conservation units, bestowing upon the Goeldi Museum the technical responsibility for conducting the necessary Rapid Assessment Surveys of biodiversity (RAPs). The goal established was bold: finish all five management plans by 2010. To this end, RAPs had to start as soon as possible and continue with a nearly full-time dedicated field team until their completion in an estimated time frame of 12 months. To solve the long standing transportation hurdle that rendered Calha Norte historically inaccessible to biologists, an agreement was reached between SEMA and a mining company to provide critical aerial support for RAPs whenever needed. Conservation International was to cover costs related to food, personnel, research supplies, and supplementary transportation.

With all institutional and financial details settled, between January 2008 and January 2009, seven RAPs lasting roughly two weeks each were conducted in all five conservation units worked by the consortium. Together, those seven expeditions covered all main Calha Norte sectors in northern Para, an unprecedented feat resulting in the accumulation of a large amount of novel information for all biological groups sampled.

Shortly after the end of the RAPs, it became clear that all biological information amassed for this part of Amazonia that had never been systematically sampled before, was going to be useful not only for the management plans themselves, but also to fill in knowledge gaps concerning Amazonian biodiversity at a much broader scale. With this idea in mind, the Editorial Board of the Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi. Ciencias Naturais offered space to publish a set of scientific papers focusing on the results obtained for the different biological groups sampled during all seven RAPs in northern Para. This special set of papers, entitled Notes on the Vertebrates of northern Para, Brazil: a forgotten part of the Guianan Region, aims to provide a synthesis and systematize the knowledge on the vertebrates of northern Para in a broader context that also includes other better known parts of the same biogeographical unit: the Guianan Region or Guiana center of endemism in northeastern South America.

The first paper to inaugurate this series, presented herein, pertains to the herpetofauna. Summed up among themselves, Avila-Pires, Hoogmoed, and Rocha have probably accumulated the greatest number of field hours in Amazonia than any other single herpetologist, in addition to having a long-term experience with the herpetofauna of the Guianan Region. Their contribution is essential to the understanding of the entire herpetofauna associated with the Guiana center of endemism, which until now was incomplete due to the knowledge gap in northern Para, a pattern that should repeat itself in future papers published in the same series.

More than merely raising the knowledge on the vertebrates from the Guiana center of endemism to a new level, papers published in Notes on the Vertebrates of northern Para, Brazil: a forgotten part of the Guianan Region also show how it is possible to fill in a major knowledge gap concerning Amazonian biodiversity in the relatively short period of time of 12 months, thus serving as template for similar enterprises. When both government and the organized society as a whole share the same "can do" attitude, added to a team of dedicated field biologists willing to overcome several hardships towards a major goal of general public interest, the outcome can be no other than sheer success, as illustrated in the pages of this special set of papers.