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Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Naturais

versão impressa ISSN 1981-8114

Bol. Mus. Para. Emilio Goeldi Cienc. Nat. v.6 n.3 Belém dez. 2011

 

Nota sobre predação de Passer domesticus (Aves, Passeridae) por Philodryas olfersii (Squamata, Dipsadidae) em uma área urbana na Zona da Mata de Pernambuco, Brasil

 

Notes on a predation event of Passer domesticus (Birds, Passeridae) by Philodryas olfersii (Squamata, Dipsadidae) in an urban area of the Zona da Mata of Pernambuco, Brazil

 

 

Gleymerson Vieira Lima de Almeida; Ednilza Maranhão dos Santos

Universidade Federal Rural de Pernambuco. Serra Talhada, Pernambuco, Brasil

Autor para correspondência

 

 


RESUMO

A presente comunicação relata um evento de predação no qual a serpente Philodryas olfersii preda a ave Passer domesticus.Esse registro foi verificado em uma área urbana da Zona da Mata do estado de Pernambuco, Brasil, no município de Nazaré da Mata, em 21 de junho de 2009.

Palavras-chave: Presa. Comportamento alimentar. Ave. Serpente. Dieta.


ABSTRACT

This communication reports a predation event, where the snake Philodryas olfersii captures and eats a House Sparrow Passer domesticus. This observation occurred in an urban area of the Zona da Mata, Pernambuco State, Brazil, in the municipality of Nazaré da Mata on June 21, 2009.

Keywords: Prey. Feeding behavior. Bird. Snake. Diet.


 

 

INTRODUÇÃO

O pardal, Passer domesticus (Linnaeus 1758), é uma ave exótica oriunda da Europa, pertencente à ordem dos Passeriformes e família Passeridae. Foi introduzida no Brasil em 1906 para controle biológico de insetos. Possui cerca de 150 mm de comprimento, é encontrada comumente em zonas urbanas em todo território brasileiro, beneficiando-se da ação antrópica. Alimenta-se de restos de comida, insetos e sementes, ocupando, principalmente, áreas edificadas, que são utilizadas como abrigo e também para nidificação (Major et al., 2004).

Philodryas olfersii (Lichtenstein 1823) é uma serpente pertencente à família Dipsadidae, com ampla distribuição no Brasil (Leite et al., 2009); pode chegar a 1,4 m de comprimento total, com pupilas redondas e colorido predominantemente verde-escuro no dorso e verde-claro no ventre (Freitas, 2003). É uma serpente diurna, ovípara, de hábito terrestre, podendo também ser encontrada empoleirada em arbustos e árvores, que se alimenta de pequenos vertebrados (Vanzolini et al., 1980). Quanto à dentição, esse ofídio é opistóglifo, secretando substâncias tóxicas por meio da glândula de Duvernoy. Essas toxinas auxiliam na higiene bucal, na imobilização e captura de presas, além de atuar também na lubrificação e antiputrefação do alimento (Kardong, 1982). Registros referentes ao hábito alimentar dessa serpente incluem itens como aves, anfíbios anuros e, principalmente, mamíferos (Vitt, 1980; Vitt & Vangilder, 1983; Leite et al., 2009). Hartmann & Marques (2005), em estudos realizados no sul do Brasil, destacam os anfíbios anuros com maior frequência na sua dieta.

A presente nota relata um evento de predação de P. domesticus por P. olfersii em área urbana na Zona da Mata de Pernambuco.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Durante visita ocasional à Zona da Mata pernambucana, na cidade de Nazaré da Mata, na rua Conselheiro João Brasil, residência no. 102, Centro (89 m de altitude e 7o 44' 22,21" S / 35o 13' 07,71" W), a 63 km da cidade de Recife, Pernambuco, pôde-se registrar, no dia 21 de junho de 2009, entre as 12h10 e 13h, um evento de predação de P. domesticus por P. olfersii. O fato ocorreu em ramos de uma Annona squamosa L. (pinheira), próximo a um indivíduo de Averrhoa carambola L. (caramboleira) e Malpighia emarginata DC. (aceroleira), no jardim da residência acima citada.

O acontecido foi registrado em câmera fotográfica digital Sansung Digimax S860, 8.1 Megapixels e as imagens foram depositadas na Coleção Herpetológica da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), em arquivo digital. As medidas morfológicas (Comprimento Rostro Cloacal - CRC e Comprimento da Cauda - CC) e massa do animal foram obtidas com auxílio de uma fita métrica e balança. A altura onde houve o evento foi mensurada utilizando-se uma trena.

A serpente (CRC= 105 cm, CC= 12 cm e massa= 170 g) foi observada a cerca de 1,90 m de altura, com a ave na boca, dependurada pela região dorsal da cabeça (Figura 1). Ela manteve a ave presa, na mordida, por um minuto e 30 segundos, em seguida deslocou-se entre os ramos do arbusto (Annona squamosa L.), utilizando uma bifurcação da planta como apoio para melhor deglutição. Após cinco minutos, novamente ergueu a ave (Figura 2), deslocou-se para um ponto mais alto do arbusto, onde apoiou a presa em um ramo e, com movimentos do corpo, iniciou o processo de deglutição. A serpente, após ter ingerido a sua presa por completo, abriu a boca por várias vezes, ajustando sua mandíbula; em seguida, projetou o seu corpo para frente, como possível movimento para auxiliar o deslocamento da presa para o interior do tubo digestivo. Logo após, a serpente ficou empoleirada no arbusto, em posição de repouso (Figura 3).

 

 

 

 

 

 

Todo o evento durou aproximadamente 50 minutos. A serpente foi capturada para identificação e biometria, sendo solta em seguida.

 

RESULTADO E DISCUSSÃO

Com esse evento, pode-se observar que P. olfersii possui estratégia de forrageio tanto terrestre quanto arborícola, utilizando, possivelmente, comportamento de espreita para captura de suas presas. Segundo Sazima e Haddad (1992), essa serpente utiliza o envenenamento e a constrição como modo de subjugar sua presa. Estes autores também afirmam que a dieta de P. olfersii está relacionada à disponibilidade de recurso alimentar no ambiente. Desse modo, como P. domesticus é uma ave sinantrópica, abundante na área urbana, infere-se que também seja um item alimentar importante para esta serpente.

O presente trabalho corrobora as informações de Vitt (1980), Vitt e Vangilder (1983) e Leite et al. (2009) sobre aves fazendo parte da dieta de P. olfersii. Todavia, informações sobre a descrição de eventos de predação para essa serpente são escassos. Vale salientar que, apesar do conhecimento sobre aves como item alimentar na dieta dessa serpente, relatos com imagem de predação envolvendo o P. domesticus raramente têm sido documentados (Sazima, 2006; Sazima & Marques, 2007), destacando a importância desse evento. O modo como um adulto de P. olfersii subjugou a presa, bem como sua tática de captura, confirma observação já documentada por Sazima & Marques (2007) para o sudeste do Brasil. Esses autores observaram uma fidelidade em relação ao local de forrageio para indivíduo de P. olfersii. Essa fidelidade é evidenciada pela frequência em que a serpente é observada forrageando num mesmo local. Segundo esses autores, os registros de predação ocorreram no período entre primavera e verão, época em que há maior disponibilidade de flores e frutos para as aves. No presente trabalho, o evento foi registrado no período chuvoso (mês de junho), sugerindo-se que a frequência de aves em um determinado local, além da disponibilidade de alimento, pode também estar relacionada à escolha de um espaço para refúgio e descanso.

 

REFERÊNCIAS

FREITAS, M. A., 2003. Serpentes Brasileiras: 1-160. Lauro de Freitas, Bahia.

HARTMANN, P. A. & O. A. V. MARQUES, 2005. Diet and habitat use of two sympatric species of Philodryas (Colubridae), in south Brazil. Amphibia-Reptilia 26: 25-31.

KARDONG, K. V., 1982. The evolution of the venom apparatus in snakes from colubrids to viperids to elapids. Memórias do Instituto Butantan 46: 105-118.

LEITE, P. T., I. L. KAEFER & S. Z. CECHIN, 2009. Diet of Philodryas olfersii (Serpentes, Colubridae) during hydroelectric dam flooding in southern Brazil. North-Western Journal of Zoology 5(1): 53-60.

MAJOR, I., L. G. SALES JR. & R. CASTRO, 2004. Aves da Caatinga: 1-256. Edições Demócrito Rocha, Fortaleza.

SAZIMA, I., 2006. Passer domesticus (Linnaeus, 1758). Wiki Aves - A Enciclopédia das Aves do Brasil. Disponível em: <http://www.wikiaves.com/208650>. Acesso em: 22 dezembro 2011.

SAZIMA, I. & C. F. B. HADDAD, 1992. Répteis da Serra do Japi: notas sobre história natural. In: L. P. C. MORELLATO (Org.): História natural da Serra do Japi: Ecologia e preservação de uma área florestal no sudeste do Brasil: 212-236. UNICAMP/FAPESP, Campinas.

SAZIMA, I. & O. A. V. MARQUES, 2007. A reliable customer: hunting site fidelity by an actively foraging neotropical colubrid snake. Herpetological Bulletin 99: 36-38.

VANZOLINI, P. E., A. M. M. RAMOS-COSTA & L. J. VITT, 1980. Répteis da Caatinga: 1-161. Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro.

VITT, L. J., 1980. Ecological observation on sympatric Phillodryas (colubridae) in northeastern Brazil. Papéis Avulsos de Zoologia 34(5): 87-98.

VITT, L. J. & L. D. VANGILDER, 1983. Ecology of a snake community in northeastern Brazil. Amphibian-Reptilia 4(2-4): 273-296.

 

 

Autor para correspondência:
Gleymerson Vieira Lima de Almeida.
Universidade Federal Rural de Pernambuco.
Unidade Acadêmica de Serra Talhada.
Curso de Agronomia.
Fazenda Saco, s/n. Serra Talhada, PE, Brasil.
CEP 56900-000
(gleymersonalmeida@hotmail.com)

Recebido em 27/04/2011
Aprovado em 26/12/2011

Responsabilidade editorial: Hilton Tulio Costi