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Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Humanas

versión impresa ISSN 1981-8122

Bol. Mus. Para. Emilio Goeldi Cienc. Hum. v.4 n.1 Belém abr. 2009

 

"Ordenar o Caos": Emílio Goeldi e a arqueologia amazônica

 

"Ordering the Chaos": Emil Goeldi and the amazonian archaeology

 

 

Lúcio Menezes Ferreira

Universidade Federal de Pelotas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil (luciomenezes@uol.com.br)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O artigo analisa as pesquisas arqueológicas de Emílio Goeldi (1859-1917) realizadas no Museu Paraense, em Belém. Demonstra como Goeldi elaborou um plano sistemático de expedições e escavações, organizou coleções e definiu um problema regional de pesquisa. Enfatiza, ainda, como as pesquisas arqueológicas e etnológicas de Goeldi se articularam a uma política colonial.

Palavras-chave: Emílio Augusto Goeldi. Museu Paraense Emílio Goeldi. Arqueologia amazônica. Política colonial.


ABSTRACT

The paper analyzes the archaeological studies of Emil Goeldi (1895-1917) at Museum of Pará, in the city of Belém, Brazil. It shows how Goeldi developed a systematic plan of surveys and archaeological excavations, organized collections and defined a regional problem to research. It emphasizes the way Goeldi's archaeological and ethnological studies were articulated to a colonial policy.

Keywords: Emil August Goeldi. Emilio Goeldi Museum of Pará. Amazonian archaeology. Colonial policy.


 

 

Entre o Primeiro Reinado e a consolidação da República, a Amazônia, se comparada às outras regiões do Brasil, foi terreno privilegiado para pesquisas arqueológicas (Ferreira, 2007; Noelli e Ferreira, 2007). Entre os vários cientistas que contribuíram para a arqueologia amazônica, encontra-se Emílio Augusto Goeldi (1859- 1917)1. Como diretor do Museu Paraense de História Natural e Etnografia, em Belém (PA), seus passos no terreno arqueológico amazônico calçaram-se num plano sistemático de escavações e na organização de coleções arqueológicas e etnográficas. Goeldi definiu um problema regional de pesquisa, modulando-o conforme os debates arqueológicos e antropológicos internacionais. Suas pesquisas nesse campo, ademais, se coadunaram a uma política colonial. Meu objetivo nesse artigo é, assim, analisar as pesquisas arqueológicas de Goeldi e suas relações com uma política colonial.

Ao explorar as relações entre as pesquisas arqueológicas de Goeldi e uma política colonial, não quero transformá-lo num colonialista inveterado, alguém, por exemplo, como Cecil Rhodes (1853-1902), que se dizia disposto a colonizar até mesmo as estrelas. Obviamente, ao termo colonialismo cola-se toda uma semântica negativa: significante de opressão, exploração, humilhação, escravização e etnocídio. Contudo, ao lado do 'livro negro do colonialismo', há mecanismos de dominação mais sutis, que podem ser interpretados como políticas coloniais. Assim, colonialismo não significa apenas a conquista militar e econômica de territórios e povos nativos por uma metrópole imperialista (Bohemer, 1995, p. 8). Como mostram muitos historiadores (MacLeod, 2000; Bethell, 1996), o conceito também se aplica à apropriação simbólica de territórios por meio da ciência.

A arqueologia, nessa acepção do colonialismo, foi instrumento fundamental. O conhecimento arqueológico andava a par e passo com o conhecimento geográfico, ensejando a formação de coleções e planificando a demarcação de regiões e fronteiras (Cohn, 1996, p. 76-105; Lyons e Papadopoulos, 2002, p. 2). Assim, não se deslinda a institucionalização da arqueologia, nos séculos XIX e XX, das políticas coloniais de esquadrinhamento e apropriação de territórios (Given, 2004; Wobst, 2005; Gosden, 2006). Essa acepção mais sutil do colonialismo – ato de apropriação simbólica de territórios – engloba uma outra característica: aquele que arranja as coleções arqueológicas e narra o passado fortalece um discurso cultural que confina o indígena num estatuto 'racial' secundário, vendo seus territórios como espaços clamando pela missão civilizadora e pelo governo colonial. O colonialismo, pois, não se firmou só com tiros de canhão; ele susteve-se também na aliança entre a representação científica e a retórica filantrópica da missão civilizadora.

Poder-se-ia dizer que essas observações são pertinentes e cabíveis somente alhures, para explicar a dinâmica das atividades dos cientistas albergados pelas instituições das metrópoles imperiais. Contudo, nos últimos anos, arqueólogos latino-americanos apontaram, em seus respectivos países, as articulações entre a institucionalização da arqueologia e as políticas coloniais (Ângelo, 2005; Gnecco, 2004; Ferreira, 2005a, 2007). Margarita Díaz-Andreu, arqueóloga da Universidade de Durham, recentemente corroborou o argumento de seus colegas: na América Latina, notadamente entre o século XIX e o início do século XX, a arqueologia consubstanciou políticas coloniais (Díaz-Andreu, 2007, p. 86-94).

Na América Latina, a arqueologia, portanto, também lidimou a anexação simbólica de territórios e a representação cultural dos indígenas como populações a serem governadas. É, exatamente, nesse viés que as pesquisas arqueológicas de Goeldi se atrelaram a políticas coloniais. Dizê-lo não implica detratar a qualidade do trabalho arqueológico do cientista e, tampouco, reduzi-lo a uma categoria política cuja semântica é carregada de horrores e opróbrio – o colonialismo. Pelo contrário, implica entendê-lo no contexto mais geral, político e científico, de onde ele emana.

 

CIÊNCIA DE GOVERNO

Para entendermos as pesquisas arqueológicas de Goeldi, e a política colonial que delas deriva, devemos, inicialmente, volver aos processos de institucionalização da arqueologia e da etnologia no Museu Paraense. Mesmo antes da fundação do museu, cientistas locais coletavam peças arqueológicas e etnográficas amazônicas. Francisco da Silva Castro (1815-1899) foi um dos primeiros a reuni-las. Desde os anos 1860, coletou cerâmicas na ilha de Marajó e no rio Maracá, localizado na então Guiana Brasileira (atual estado do Amapá). Manteve, entre 1864 e 1865, correspondência com a Academia de Ciências de Estocolmo, na Suécia, e com o Museu da Universidade de Oslo, na Noruega, enviando para essas instituições as cerâmicas amazônicas (Cunha, 1989; Bertho, 1994).

Entretanto, Domingos Soares Ferreira Penna (1818-1888), em texto póstumo, inserido por José Veríssimo (1857-1916) no número inaugural do Boletim do Museu Paraense (Penna, 1894, p. 29), indica-nos a possibilidade de que Silva Castro tenha ofertado coleções arqueológicas e etnográficas também para a Associação Filomática do Pará, da qual era sócio. Criada em 1866, a Associação Filomática, núcleo inicial do Museu Paraense, além das coleções obtidas por Castro, recebeu, conforme Ferreira Penna, peças arqueológicas e etnográficas de diversas partes do interior do Pará, de Manaus e da Venezuela (Penna, 1894, p. 28-29). Havia, também, as coleções amealhadas pelo próprio Ferreira Penna, o primeiro diretor do Museu Paraense. Contudo, a partir de 1872, Ferreira Penna trabalhou como naturalista viajante do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e foi para essa instituição que remeteu a maioria das coleções amazônicas que reuniu ao longo de suas pesquisas (Sanjad, 2005; Ferreira, 2005b).

Goeldi, ao assumir a direção do Museu Paraense, em 1894, não fez uma avaliação apologética dessas coleções iniciais. Estipulou um novo regulamento para o Museu, aprovado no mesmo ano. Nele, clarifica-se o programa da instituição, que se propunha: "ao estudo, ao desenvolvimento e à vulgarização da História Natural e Etnologia do Estado do Pará e da Amazônia em particular e do Brasil, da América do Sul e do continente americano em geral" (Goeldi, 1894a, p. I-II). Dividiu-se o Museu em quatro seções: a primeira incluía a Zoologia, Anatomia e Embriologia comparadas; a segunda, a Botânica; depois, a Geologia, Paleontologia e Mineralogia; por fim, a quarta seção, de Etnologia, Arqueologia e Antropologia. Criaram-se, também, dois anexos: um Horto Botânico e um Jardim Zoológico (Sanjad, 2005; Ferreira, 2007). Conferiu-se, pois, primazia às ciências naturais, calcando-a em três seções e dois anexos. Prioridade que se reflete no número superior de publicações e de pesquisas das três primeiras seções.

Poder-se-ia concluir que a mudança resultou da formação acadêmica de Goeldi: nada mais previsível do que um zoólogo encastelar a arqueologia e a etnologia numa seção única, brindando o Museu com três seções de ciências naturais. Goeldi, porém, não soterrou a quarta seção sob os estratos das três primeiras. Pelo contrário. Institucionalizou-a sob o diapasão característico de sua quadra histórica. Como nos mostra Schnapp (1991), a arqueologia, em seu processo de institucionalização, sempre oscilou entre os modelos naturalistas e filológicos.

Em seus primeiros relatórios administrativos, Goeldi alertou para o estado caótico das coleções da quarta seção: "o que positivamente me surpreendeu, quando assumi a direção deste museu, foi o caos existente nesta seção" (Goeldi, 1894b, p. 15). Assinalou que elas eram um aglomerado fragmentário. Não possuíam indicações de proveniência. Estavam, pois, destituídas de qualquer valor (Goeldi, 1894b, p. 15). Goeldi queria que a quarta seção procedesse a uma ruptura com o modus operandi da arqueologia e etnografia brasileiras. Para ele, essas ciências, no Brasil, estavam em fase embrionária; ciências infantis, que reuniam coleções ao acaso e com autenticidade duvidosa (Goeldi, 1894c, p. 222).

Para elevá-las à altura de uma ciência, Goeldi arrolou três medidas. Primeiro, a quarta seção não poderia ficar acéfala. Um chefe de seção seria necessário, e Goeldi envidou esforços para contratar um etnógrafo estrangeiro (Goeldi, 1897a, p. 4; 1897b, p. 269); porém, quando obteve um candidato à vaga, este desistiu em razão dos "parcos vencimentos" (Goeldi, 1900a, p. 35). Em segundo lugar, o Museu Paraense precisaria sistematizar uma "campanha metódica de escavações" (Goeldi, 1894c, p. 222). Por fim, o chefe da seção etnográfica deveria demorar-se entre os índios, aparelhar viagens científicas para obter coleções completas, fazer levantamentos lingüísticos, medir corpos e fotografar cenas cotidianas (Goeldi, 1894c, p. 223).

Contudo, qual seria o modelo institucional proposto por Goeldi para a quarta seção? Para ele, se não se inaugurasse "uma campanha metódica e sistemática no estudo de nossos índios, à maneira do que se fez na América do Norte por parte de uma comissão permanente e composta de membros especialmente habilitados para este fim, comissão que trabalha debaixo da guia e direção da Smithsonian Institution, não é tão cedo que se fará por aqui coisa capaz e que se preste aos olhos da ciência internacional" (Goeldi, 1894c, p. 223). Temos, aqui, o primeiro ponto de atrelagem da pesquisa arqueológica e etnológica de Goeldi a uma política colonial. O zoólogo não escolheu um modelo qualquer. Referiu-se, especificamente, ao Bureau of Ethnological Research, da Smithsonian Institution, cujo suporte institucional era o Museu Nacional dos Estados Unidos.

Essa instituição obedecia a projetos manifestamente colonialistas. Suas coleções eram metáforas da ambição imperial dos Estados Unidos. Corporificavam a imagem de um mostruário do mundo. É o que conotam os relatórios dos departamentos de Etnologia e Antropologia pré-histórica da Smithsonian Institution. As exibições públicas sacramentavam a materialização simbólica da supremacia histórica e imperial dos Estados Unidos, com coleções que abrangiam todo o continente americano e grandes parcelas do mundo: Tibet, Ceilão, Japão, Coréia, Finlândia etc. (Departament of Ethnology and Anthropology, 1894, p. 78-82). Não só artefatos se colonizavam. A Smithsonian Institution, desde que foi criada em 1846 pelo governo dos Estados Unidos (Willey e Sabloff, 1980, p. 41), legitimou a tomada das terras indígenas. Articulava-se claramente à política do Destino Manifesto (Manifest Destiny): a de que uma raça eleita, o povo anglo-saxão, alastraria a civilização do Atlântico ao Pacífico (Horsman, 1981). Mais tarde, em 1879, o Bureau of Ethnological Research foi organizado, na Smithsonian, para desenvolver estudos cuja qualidade científica não escapou a Lévi-Strauss (1983). Mas qualidade, em ciência, é força. O Bureau, conforme Curtis Hinsley (1981, p. 81-190), hierarquicamente centralizado na burocracia da Smithsonian, era uma ciência de governo. As pesquisas arqueológicas e antropológicas, ligadas ao aparelho de Estado, asseguravam a legislação das reservas indígenas, o esfacelamento das terras para sua posterior apropriação e colonização (MacGuire, 1992; Trigger, 1980).

Goeldi não copiou, ipsis verbis, o modelo fornecido pelo Bureau. A cópia é a mais difícil das artes. O Bureau lhe foi uma centelha de inspiração. Açulou sua imaginação para pensar um artifício político enraizado em uma experiência local. Para organizar o "caos" das coleções do Museu Paraense, a pesquisa arqueológica e etnológica, como no Bureau, não se dissociaria de uma política colonial. Não ao modo do Destino Manifesto, mas dos Diretórios de Índios. Goeldi, contudo, adverte que o Diretório de Índios do Estado do Pará não poderia ser a mimese dos Diretórios da monarquia brasileira, onde reinavam a corrupção e a desonestidade. Para ele, o cargo de Diretor de Índios deveria pertencer a um etnógrafo versado nos problemas arqueológicos e etnológicos da Amazônia, a alguém da probidade e estatura de Ferreira Penna (Goeldi, 1894c, p. 224).

O etnógrafo, além de administrar o Diretório de Índios, acumularia o posto de chefe da quarta seção. Exatamente aquele que angariaria as coleções completas para o Museu. E, assim como o Bureau era um departamento dirigido e controlado pela Smithsonian, o Diretório submeter-se-ia ao controle do Museu Paraense, particularmente da quarta seção. De acordo com a proposta de Goeldi, a quarta seção, a exemplo do Bureau, desenvolveria uma ciência de governo. Valer-se-ia da demografia e da estatística dos grupos indígenas (Goeldi, 1894c, p. 225), ciências que, no mundo colonial, foram largamente utilizadas para a contabilização e o controle das populações (Kalpagam, 2000; Asad, 1994).

Goeldi teve uma outra inspiração. Acesa, agora, não pelo Bureau, mas sim pela experiência colonial francesa. Segundo ele, "se a ocupação com os índios não fosse um desiderato diretamente originado agora pela nova organização do Museu Estadual e a seção de etnografia nela contemplada, eu chamá-lo-ia um postulado de civilização, da filantropia e do progresso, que ostentamos na bandeira da nova Era" (Goeldi, 1894c, p. 225). Postulado de civilização, imperativo filantrópico. Eufemismos que permearam a noção colonialista francesa de mission civilisatrice (young, 2001, p. 30-35).

O ideal de Goeldi era o de subdividir o Museu Paraense, transformá-lo em diferentes institutos de pesquisa: um Instituto Botânico, outro Mineralógico-Geológico e, por fim, um Etnográfico (Lopes, 1997, p. 263). Essa repartição de especialidades, porém, pelo menos no que se refere à etnografia e à arqueologia, invoca uma estrutura referencial ligada a experiências coloniais. Ao imaginar um Instituto Etnográfico, Goeldi vinculou-o aos propósitos de uma missão civilizadora. Recorreu, pois, a uma das estratégias da experiência colonial: a associação das pesquisas etnográficas e arqueológicas a objetivos filantrópicos (Beer, 1997; Bravo, 1997).

A proposta de recriação dos Diretórios de Índios é um projeto de reestruturação de poderes colonialistas, de reforma de uma instituição de aprisionamento dos indígenas. "Fazer melhor do que o Império" é acrescentar aos Diretórios de Índios o que, segundo Goeldi, lhes faltava: o profissional em Etnografia, o especialista, estrangeiro ou não, responsável pelas pesquisas de campo, pela formação de coleções e escrita de monografias. Daí o modelo para os Diretórios de Índios - o Bureau of Ethnological Research, uma espécie de entreposto etnográfico avançado que, ao lado das pesquisas científicas, garantiria o avanço através das fronteiras, a desterritorialização das terras nativas e sua reterritorialização pelo Estado nacional.

 

O PLANO METÓDICO

Entre os textos arqueológicos e etnográficos de Goeldi, há duas conferências apresentadas no Congresso dos Americanistas de 1904 (Goeldi, 1906a, 1906b); uma conferência sobre os índios da foz do Amazonas, que proferiu no Museu Paraense em 1896 (Goeldi, 1898); uma "Memória" sobre as escavações arqueológicas realizadas em 1895 na então Guiana Brasileira, publicada em 1900 (Goeldi, 1900b); e um texto de divulgação baseado nessa memória, publicado na revista "Die Schweiz" (Sanjad, 2005, p. 316). Goeldi planejou publicar mais duas memórias arqueológicas e etnológicas. Para estas, ele preparou pessoalmente estampas fotográficas de coleções, que comentarei adiante. Mas essas memórias não foram publicadas. Nas palavras de Goeldi: "(...) já se acham prontas as estampas para a Memória IV e em adiantada fase acha-se igualmente a impressão das estampas para a Memória V. Ambas são de teor arqueológico e etnográfico" (Goeldi, 1907, p. 9; ver, também, Goeldi, 1900b, p. II; 1904, p. 489; 1906).

Embora poucos em relação aos escritos biológicos, os trabalhos de Goeldi nasceram de uma campanha metódica de escavações e da definição de um problema regional de pesquisa. Vejamo-las mais de perto. Em 1894, Goeldi declarara que, especialmente em relação à Amazônia, a arqueologia e a etnografia precisavam "de dedicados e pacientes cultivadores, de enérgicos braços e esclarecidos espíritos para emergir finalmente do rodamoinho de teorias mais ou menos absurdas que vogam até hoje neste terreno e da fase embrionária em que – digam embora o contrário –, se acham ainda os nossos conhecimentos" (Goeldi, 1894d, p. 85).

Contudo, para onde iriam os pesquisadores? Goeldi planeou algumas rotas antropológicas para pesquisadores estrangeiros (Goeldi, 1906c, p. 763). Os locais foram escolhidos, segundo Goeldi, em função das lacunas etnográficas da Amazônia e da rarefação de pesquisas em determinadas regiões. Em 1900, por exemplo, Goeldi traçou um plano de viagem para o rio Purus, a ser percorrido em 1901 pelo naturalista Joseph Beal Steere (1842-1940), contratado pela Smithsonian Institution para obter coleções de história natural e de antropologia para a Exposição Panamericana de Buffalo. Steere queria visitar os Munducurus, mas Goeldi dissuadiu-o, alegando que esses indígenas "já não se prestavam ao estudo etnológico em virtude do contato com missionários e a civilização, tendo perdido muito de suas antigas artes, costumes e língua" (Steere, 1949[1903], p. 64).

Outras rotas que, para Goeldi, tinham especial interesse etnográfico eram o rio Uaupés e os tributários do rio Negro. Para esses rios, ele sugeriu que Theodor Koch-Grünberg (1872-1924), do Museu Real de Etnografia de Berlim, se encaminhasse em 1900, depois de haver concluído suas atividades na expedição de Hermann Meyer ao Xingu entre 1898 e 1900 (Schaden, 1953). Goeldi publicou duas cartas de Koch-Grünberg no Boletim do Museu Paraense, relativas à expedição para o rio Negro (Goeldi, 1904c).

Contudo, para Goeldi, havia uma rota ainda mais fundamental para as pesquisas da quarta seção. Esta, ele reservou para os trabalhos que dirigiu. Em sua conferência de 1896, Goeldi afirmou que o núcleo arqueológico e etnológico fundamental da Amazônia seria as imediações do rio Xingu. Goeldi retoma, nesse ponto, a obra de Karl F. P. von Martius (1794-1868), para quem as adjacências do Xingu (mas, também, o Tocantins e o Araguaia) depositariam elementos para a resolução do "problema etnológico do Brasil" (Noelli e Ferreira, 2007).

Embora Goeldi reconhecesse as proposições de von Martius como precursoras, criticou-as por incorrerem no erro fundamental da pesquisa arqueológica e etnológica do Brasil: a "tupi-mania" (Goeldi, 1898, p. 403). Segundo Goeldi, à maneira dos outros pesquisadores que se debruçaram sobre a questão, von Martius condensou elementos etnográficos heterogêneos numa célula homogênea: atribuiu extensão geográfica e lingüística exagerada à ocupação Tupi do território brasileiro. Para ele, a tupi-mania enredara ainda mais o nó górdio das classificações etnolingüísticas dos variados grupos indígenas do Brasil.

Entretanto, a etnologia brasileira começara a sair do embrião, entrara numa nova fase, segundo Goeldi, graças às viagens científicas ao rio Xingu feitas por Karl von den Steinen (1855-1929), Lucien Adam (1833-1918) e Paul Ehrenreich (1855-1914). Para Goeldi, a obra desses pesquisadores revisara a classificação etnolingüística de von Martius e propusera uma síntese etnológica atinente ao Pará e à Amazônia: "(...) pelo menos quanto à parte setentrionaloriental da Sul América, a discriminação etnográfica está se tornando mais clara e mais simples. Sabemos que, em relação ao atual Estado do Pará, temos principalmente de ocupar-nos com os quatro troncos do Tupi, dos Jês, dos Caraíbas e dos Nu-Aruake" (Goeldi, 1898, p. 406).

Goeldi formulou, também, um "plano metódico de trabalho" para outra região. Partindo do fato empírico de que nas vizinhanças de Belém havia muitos "necrotérios" indígenas, ele estendeu as investigações arqueológicas para outros pontos do estado. Resolveu principiar com a exploração da foz do Amazonas e do litoral da Guiana. Estudar essas regiões significava, para Goeldi, combater a infantilidade da pesquisa arqueológica e etnológica do Brasil: "Não se tratava de juntar, sem crítica, meramente objetos para preencher armários e salas; pelo contrário, nossa divisa era coligir fatos, documentos e argumentos positivos e seguros, que possam servir de pedra de toque para as diversas doutrinas etnológicas em voga" (Goeldi, 1898, p. 409). Para ele, as pesquisas arqueológicas na ilha de Marajó estariam "estereotipadas"; devia-se abandoná-las provisoriamente e escavar as localidades situadas no rio Xingu, na foz do Amazonas e no litoral da Guiana. Essas regiões teriam um hiato arqueológico, uma sombra a ser clareada pelas doutrinas etnológicas contemporâneas (Goeldi, 1898, p. 409).

Nos contornos dessa problemática regional, Goeldi calcou itinerários para duas expedições à Guiana brasileira. Entre outubro e novembro de 1895, Goeldi, o botânico Jacques Huber (1867-1914), o preparador Max Tänner (que faleceu de malária na viagem de regresso), serventes e o Tenente-Coronel Aureliano Pinto de Lima Guedes (1848-1912) percorreram todo o litoral da Guiana, os rios Cunani, Amapá Grande e seus afluentes. Entre julho e setembro de 1896, realizou-se uma nova expedição; compuseram-na Aureliano Pinto de Lima Guedes e seu filho, Manoel Pinto de Lima Guedes, preparador de botânica do Museu. Às ciências naturais reservou-se parte substancial das pesquisas na região. Na primeira expedição, Goeldi e sua comitiva percorreram os reinos da zoologia, botânica e geologia. Contudo, o estado do Pará designou Lima Guedes para conduzir, principalmente, pesquisas arqueológicas. Em seu relatório de pesquisa, afirma textualmente que seu objetivo era cumprir o plano de exploração arqueológica esboçado por Goeldi (Guedes, 1897, p. 42-43).

Lima Guedes esquadrinhou toda a circunferência dos tributários, ilhas e lagos dos rios Maracá e Anauerá-Pucu (Figura 1). Realizou escavações e localizou sítios arqueológicos. No rio Maracá, identificou urnas tubulares. Contudo, o clímax dessas explorações foi o encontro de dois "necrotérios indígenas", situados à margem esquerda do rio Cunani, ao cimo de uma colina chamada Monte Curu. A referência para a descoberta foi um marco de granito, um disco que, uma vez removido, deixara entrever cavernas. Lima Guedes classificou-as como artificiais. Mais especificamente, como "mausoléus". Numa delas, colheu dezoito igaçabas (Guedes, 1897, p. 49-59).

 

 

Lima Guedes realizou, em 1901, uma outra exploração arqueológica, desta vez à ilha Mexiana, cujo propósito foi estudar depósitos de cerâmica. Todas as coleções reunidas por Lima Guedes foram remetidas ao Museu Paraense: as de Mexiana, as dezoito igaçabas do rio Cunani e as quarenta e seis urnas tubulares, antropomorfas e zoomorfas, do rio Maracá (Goeldi, 1904b, p. 18). Sobre essas coleções, Goeldi disse, em 1896, que eram reais ornamentos do Museu, capazes de despertar a inveja de estabelecimentos congêneres, dentro e fora do Brasil (Goeldi, 1898, p. 280). Para Goeldi, o "caos" fora ordenado. Além das coleções obtidas pelas explorações arqueológicas, outras foram adquiridas por compra e permuta. Em 1898, já havia, no Museu Paraense, uma sala de exposição dedicada à arqueologia e etnografia da região amazônica (Goeldi, 1897a, p. 4). Em 1900, as coleções perfaziam mais de 1.310 artefatos (Goeldi, 1900c, p. 263-264).

 

AMAZÔNIA ASIÁTICA

Passemos, agora, às interpretações arqueológicas de Goeldi. De saída, coloquemo-nos a seguinte questão: por que Goeldi afirmou que as pesquisas sobre a ilha de Marajó estavam estereotipadas? Por que a arqueologia e a etnologia amazônicas gravitavam em meio a um roda-moinho de teorias absurdas? O absurdo, aqui, não é uma alegoria. Para Goeldi, se teorias arqueológicas e etnológicas engolfavam-se num roda-moinho, era porque feriam as regras da lógica. Contudo, os leitores de Kafka sabem que a dominação se assenta no absurdo. Há lógica no disparate.

Goeldi aludiu a uma tradição de pesquisa que conceituo como arqueologia nobiliárquica (Ferreira, 2003a, 2003b, 2005a, 2005c). O conceito atém-se ao período formativo da disciplina no Brasil, durante o Primeiro e o Segundo Reinados. Sem querer simplificá-la em suas diferenças conceituais e políticas internas, pode-se dizer que a arqueologia nobiliárquica articulava-se ao projeto político centralizador da Monarquia. Fê-lo ao modo nacionalista e colonialista. Procurava validar uma hipótese mediterrânica de povoamento do Brasil. Buscava, nos vestígios arqueológicos, na arte rupestre e, sobretudo, nas línguas e mitos indígenas, uma origem que remontasse aos povos nautas da Antigüidade: gregos, fenícios, egípcios. Essa civilização primordial poderia, também, advir de navegadores europeus modernos, particularmente os nórdicos. A busca de uma origem 'civilizada' para os índios correspondia à constituição de uma identidade nacional. Tratava-se de prescrever uma determinada ordem, um lugar social a ser ocupado pelos indígenas na hierarquia e na representação histórico-coletiva da Nação.

Numa sociedade que distribuía títulos de nobreza, os indígenas que a rodeavam deveriam ser também 'nobres'. Ainda que sua nobreza estivesse entre artefatos despedaçados, restos petrificados e mudos. Com os instrumentos da moderna filologia, procurava-se remodelar aqueles pedaços, dar-lhes voz. Fazê-los falar um relato histórico de origem, um Epos onde as elites do país pudessem se reconhecer. Alicerçada numa sociedade em que a imagem do indígena figurava nos brasões imperiais, em que os nomes indígenas batizavam a proveniência de uma família, a arqueologia confundiu-se com a heráldica. Lia os artefatos como suportes de signos de civilização.

Movendo-se num transporte numismático, ela trazia consigo uma moeda de reversos antitéticos. De um lado, devia-se poli-la para que seu metal lampejasse um brilho civilizado. Mas esse brilho vinha do passado. De um lugar onde os conflitos podem ser conjurados pelos poderes de uma narrativa epopéica, por uma Odisséia ambientada nos trópicos. O outro lado da moeda era o índio vivo. O índio do presente. E o presente é um lugar onde os conflitos se resolvem pelo combate e pelas táticas políticas. Os solos de manobra dessas táticas repousavam, para a arqueologia nobiliárquica, na proposição de que o indígena era um ser degenerado. O debate sobre a degeneração, que se espraiou, com respostas diversas, por toda a América (Rueda, 2003), conheceu, no Brasil, um relativo consenso.

Reconhecia-se no indígena alguém que teve um passado civilizado, mas que, contudo, degenerou pela ação impiedosa dos trópicos, pelos desejos frenéticos da miscigenação e da antropofagia. Se os artefatos do passado podem guardar inscrições civilizadas, os do presente, embora sejam objetos etnográficos, são ameaçadores. O arco e a flecha impediam a interiorização da civilização, o avanço geopolítico do Estado Nacional, a demarcação das fronteiras. Assim, as respostas à integração dos indígenas na sociedade monárquica bambearam entre a solução do extermínio e a receita eugênica da miscigenação entre índios e imigrantes europeus. Qualquer possibilidade de pacto social implicava na diluição do indígena no corpo da Nação. Numa palavra, o conceito de degeneração era um apanágio para incorporar as terras ocupadas pelos indígenas.

No tocante à Amazônia, as hipóteses da arqueologia nobiliárquica foram laboradas, nesta quadra histórica, por Ladislau Netto e por João Barbosa Rodrigues. Para Ladislau Netto, os artefatos indígenas de jadeíte tinham origem asiática. Sua hipótese era a de que as civilizações andinas e da América Central nasceram de uma colonização de povos da Ásia, particularmente dos chineses e dos japoneses. Dos Andes, os Incas partiram para a Amazônia, chegando, posteriormente, à ilha de Marajó. Haveria, pois, uma ascendência asiática e incaica na Amazônia, grafada nos artefatos de jadeíte (Netto, 1877, 1885, 1888). João Barbosa Rodrigues partilhava dessa hipótese. Apoiando-se em Heinrich Fischer, enfatizou que os 'muirakitãs' (amuletos em forma de rã), feitos de jadeíte e de nefrita, eram adornos originalmente confeccionados pelos fenícios. Os 'muirakitãs', pois, resultaram de contatos transatlânticos entre a Ásia e a Amazônia (Rodrigues, 1892, 1899).

Rotularam-se essas hipóteses, desde o final do século XIX, e principalmente a partir dos anos 1930 e 1940, como fantasias míticas, devaneios arqueológicos (Costa, 1935; Ramos, 1943). Mas elas não são uma pré-história da arqueologia brasileira, mitos projetados em direção à racionalidade crescente da disciplina. As pesquisas de Ladislau Netto e de Barbosa Rodrigues (como, de resto, de toda a arqueologia nobiliárquica) não são desprovidas de carga empírica e rigor metodológico. Ambos realizaram escavações arqueológicas e dispuseram de amplas e bem arranjadas coleções. O primeiro reuniu-as como diretor do Museu Nacional; o segundo, como diretor do Museu Botânico do Amazonas, tendo-as coletado desde os anos 1870, em suas explorações geográficas feitas sob encomenda do Governo Imperial. Se há devaneio em seus trabalhos, é como em Hamlet: há método nesta loucura.

Detenhamo-nos brevemente em um desses métodos. Conceituo-o como geometria dos artefatos. Ele deriva do que se tem designado convencionalmente como ciência humboldtiana (Dettelbach, 1997). A física da Terra, de Alexander von Humboldt (1769-1859), os espaços geográficos milimetrados e cartografados pelos instrumentos modernos e pelos procedimentos científicos, atingiram também os objetos de menor proporção. Assim, descreviam-se e mediam-se os artefatos em todos os seus detalhes geométricos. Tentava-se determinar suas formas, modelos e funções. Deduzia-se, a partir da geometria, o cálculo racional dos artefatos, sua precisão tecnológica, esmero estético e funcionalidade. Quanto mais geométrico um artefato, mais civilizado seria um grupo etnográfico.

A geometria dos artefatos resultava numa abordagem comparativa. Assim, Barbosa Rodrigues, ao escavar a necrópole de Mirakanguera, descobriu uma cerâmica refinada. Um dos artefatos, em forma de panela, foi cotejado com as figuras apresentadas na obra de Gustaf Montelius (1843-1921), "Antigüidades Suecas" (1873). Concluiu, assim, que a panela amazônica era semelhante àquela em que os nórdicos guardavam cinzas mortuárias (Rodrigues, 1892, p. 25) (Figura 2). Do mesmo modo, um vaso quadrangular foi classificado como espécie única na Amazônia (Figura 3). Somente a China, desde sua remota antigüidade, confeccionavam-nos. Portanto, houve, possivelmente, uma dupla imigração pré-histórica na Amazônia: escandinava e chinesa (Rodrigues, 1892, p. 31-35). Deve-se frisar, porém, que tanto Barbosa Rodrigues, quanto Ladislau Netto, usam sempre a condicional; falam a título de hipótese; argumentam a favor de uma tese futura, a ser comprovada por ulteriores escavações e pesquisas etnográficas e lingüísticas.

 

 

 

 

Essas hipóteses foram discutidas internacionalmente, como mostra o Congresso dos Americanistas. Após Ladislau Netto (1888) apresentar seu trabalho sobre as cerâmicas e os adornos de jadeíte amazônicos, o renomado Rudolf Virchow (1821-1902) criticou-o duramente. Mostrou-lhe que tais artefatos eram comuns no Neolítico europeu e asiático. As análises químicas do mineral evidenciavam diferentes composições, sendo impossível, portanto, determinar precisamente qual população o levou para a América (Virchow, 1888). Thomas Wilson, curador de Pré-História da Smithsonian Institution, evidenciou, anos depois, que havia fontes de jadeíte na América, Europa e Ásia. Os artefatos feitos com este mineral, portanto, seriam provas frágeis para validar qualquer imigração transcontinental (Wilson, 1902).

Não obstante essas críticas, as pesquisas arqueológicas na Amazônia modularam as questões propostas ao comitê dos americanistas. Em 1890, perguntava-se se as cerâmicas descobertas na Amazônia provinham de uma 'raça' civilizada. Pedia-se aos congressistas, e chegou-se a satisfazer tal pedido (Allen, 1883), para assinalar as correspondências entre as civilizações asiáticas e americanas (Congrés International des Américanistes, 1892, p. 4-5). Outro tema benquisto ao Congresso foi a colonização escandinava da América. Vários artigos abordaram-no, com base em documentação material e escrita (Loffler, 1883; Bamps, 1883; Clarke, 1892; Shipley, 1892; Fabricius, 1894; Shipley, 1902). Ressonâncias daquelas hipóteses chegaram aos ouvidos de Lévi-Strauss (1996, p. 238-244), que sublinhou, em "Tristes Trópicos", as similitudes estruturais entre os povos das fronteiras meridionais da China, dos escandinavos e dos índios pré-colombianos.

 

ARQUIVOS DE BARRO

O problema regional de pesquisa formulado por Goeldi inseria-se, assim, numa discussão internacional. Como vimos, para ele, a arqueologia nobiliárquica era ilógica, absurda. Mas, incorria também em comicidade. Numa de suas resenhas, comentou sarcasticamente que anunciar filiações entre civilizações orientais e populações indígenas amazônicas era risível. Lê-las exigia um "forte diafragma" (Goeldi, 1906c, p. 764-765).

Como Goeldi se contrapôs à arqueologia nobiliárquica? Há uma hermenêutica arqueológica nos textos de Goeldi, um conjunto de técnicas analíticas que podem ser delimitadas. Em primeiro lugar, há uma análise espacial e uma geometria dos sítios arqueológicos. Os discos de granito das cavernas do Monte Curu, na Guiana brasileira, foram contextualizados espacialmente. Para Goeldi, tais artefatos não estavam ali aleatoriamente. Possuíam uma situação topográfica. Eram sinais a serem lidos. Sua significação os revelou como marcos simbólicos do mausoléu. Inscrições da artificialidade da paisagem, mas com uma funcionalidade precisa: eram tampas protetoras que recobriam as cavernas. O sítio arqueológico seria, também, objeto de representação gráfica. Dever-se-ia mostrá-los em cortes longitudinais e ideais, representá-los na disposição em que se encontravam e segundo a distribuição espacial dos vestígios em seu interior (Goeldi, 1900b, p. 5-6) (Figuras 4 e 5).

 

 

 

 

Essa análise geométrica e sua representação gráfica servem à caracterização do grau de civilização dos grupos que construíram o sítio arqueológico. Para Goeldi, as cavernas eram, de fato, artificiais: poços cilíndricos, alargados na parte inferior, como um cone. O objetivo do alargamento, para ele, era evitar o desmoronamento da caverna e, conseqüentemente, a ruína das urnas. Goeldi, assim, concluiu que "estes recursos técnicos tão habilmente aproveitados aqui na confecção destes poços, constituem significativo critério para julgarmos da altura intelectual dos arquitetos" (Goeldi, 1900b, p. 22-23).

Em segundo lugar, não se escava e analisa geometricamente qualquer sítio arqueológico. Para Goeldi, há um princípio estético que preside a escavação. Goeldi imbuiu-se de uma concepção de arqueologia comum em sua quadra histórica: a arqueologia como tributária da história da arte (Funari, 1998, p. 8; Bandinelli, 1994; Malina e Vasicek, 1997, p. 33-34). Assim, reconheceu que o povoado de Amapá assentava-se sobre um sítio arqueológico. Era um aterro arqueológico, como os da ilha de Marajó. As primeiras escavações no povoado ensinaram-lhe, contudo, que as urnas eram de feitio tosco. Aparentavam simples moringas. Sem 'arte', sem decorações. Não valiam o suor da escavação: "um tanto mal acostumados já, por assim dizer, pela estranha beleza da cerâmica encontrada mais ao norte no Cunani, as urnas lisas e mal jeitosas do Amapá não nos pareciam mais apresentar equivalente justo para o suor, que nos ia custar a continuação de rude fadiga" (Goeldi, 1900b, p. 7-8). Essa visão da arqueologia como coletora de objetos artísticos, subsumida à interpretação estética, reflete-se na escolha das estampas que ilustraram a "Memória". Goeldi selecionou as mais belas, cujos motivos decorativos eram mais elaborados (Figuras 6, 7 e 8). O valor das estampas, segundo ele, deveria sobrepujar e tornar secundário o texto descritivo (Goeldi, 1900b, p. III).

 

 

 

 

 

 

Em terceiro lugar, Goeldi realizou, a exemplo de Ladislau Netto e de Barbosa Rodrigues, uma geometria dos artefatos. Há toda uma seção da "Memória" dedicada à medição e descrição geométrica das cerâmicas da Guiana brasileira (Goeldi, 1900b, p. 9-22). As mensurações trouxeram-lhe um dado insólito: uma bandeja quadrangular semelhante àquela da necrópole de Mirakanguera, descoberta por Barbosa Rodrigues. Goeldi, assim, polemizou mais uma vez com a arqueologia nobiliárquica. Cerâmicas em forma quadrangular não mais seriam raras na Amazônia. Não haveria base empírica para filiá-las à China ou à Escandinávia. E ironizou: "confesso não possuir a mais leve competência em assuntos da China" (Goeldi, 1900b, p. 28).

À geometria dos artefatos, Goeldi justapunha sua experiência como naturalista. Trabalhos recentes Gualtieri, 2000, p. 228-231; Sanjad, 2005, p. 270) elucidam-nos sobre a origem do método que Goeldi empregava em seus estudos zoológicos: a abordagem filogenética de Ernst Haeckel (1834-1919). Afeito a essa abordagem, às lides classificatórias e à sistemática, Goeldi sabia que se vai do gênero às suas espécies por diferenças específicas. Sabia, portanto, que as coleções do Museu Paraense permitiriam, se descritas em suas características essenciais, se isoladas em suas particularidades morfológicas, uma taxionomia arqueológica e etnográfica. Em sua conferência, Goeldi resumiu sua técnica analítica como um jogo comparativo de procedimentos indutivos e dedutivos, próprio das ciências naturais: "O método analítico de investigação aplicado ao princípio comparativo do material, da técnica fabril, das formas, dos ornamentos quer pintados simplesmente, quer gravados em relevo, e finalmente o arranjo e a disposição dos necrotérios e da cerâmica neles contido, este método dedutivo aponta nitidamente para o resultado indutivo (...). Consegue-se, assim, o que em linguagem das ciências naturais se chamaria uma determinação genérica" (Goeldi, 1898, p. 411).

Goeldi enunciou, ainda na conferência, que o serviço arqueológico do Museu Paraense, metodicamente organizado, formou um "arquivo escrito em barro, tanto mais precioso quanto constituirá o único meio seguro (...) para reconstruirmos a verdade histórica sobre as gerações que aqui viviam em tempos passados" (Goeldi, 1898, p. 410). Goeldi levanta um problema clássico do ponto de vista hermenêutico. A reconstituição da verdade histórica implicava determinar a autoria dos arquivos de barro. Tratava-se, para ele, de fazer a hermenêutica dos sinais grafados nos artefatos, uma leitura das marcas e dos emblemas timbrados nas cerâmicas. Por meio de procedimentos comparativos, Goeldi busca regularidades culturais, motivos semelhantes e correspondências temáticas na coleção de cerâmicas do Museu.

Goeldi, na conferência, valeu-se de três coleções: a da Guiana brasileira, as da ilha de Marajó e as urnas tubulares, antropomorfas e zoomorfas, do rio Maracá, descobertas por Lima Guedes. Estas últimas, possivelmente, seriam objetos das duas já aludidas "Memórias" arqueológicas e etnológicas que Goeldi nunca publicou, mas para as quais já tinha estampas prontas (publicadas na seção Memória, nesse número do Boletim). Goeldi, ao proceder à hermenêutica destas coleções, ressaltou suas afinidades estruturais. Inclusive, as cerâmicas de Mirakanguera, achadas por Barbosa Rodrigues, comungariam elementos comuns com as de Maracá, Marajó e Cunani: "Não quero passar em silêncio que cada um dos três tipos mostra certos pontos de contato e parentesco com as igaçabas de Mirakanguera, no Amazonas, poder-se-ia dizer que estas têm a forma das de Marajó, às vezes fisionomias em relevo das de Cunani e tampas das de Maracá" (Goeldi, 1898, p. 416).

Essas afinidades estruturais levaram-no a postular a etnogênese dos artefatos. A determinação genérica, como método indutivo, revelaria, para ele, a autoria das cerâmicas. A premissa da indução é a seguinte: se as coleções têm motivos semelhantes, se compartem traços simbólicos e geométricos, é porque possuem uma única filiação etnológica. Chega-se a essa generalização ativando-se uma quarta técnica analítica. Podemos designá-la como princípio da analogia direta. Nessa técnica, trata-se de deduzir configurações arqueológicas a partir do presente etnográfico e da história indígena da região. Goeldi compulsou documentos históricos e lingüísticos, bem como as obras de Paul Ehrenreich, Karl von den Steinen e Lucien Adam, justamente os autores que forneceram a "nova síntese etnológica da Amazônia", para rastrear os povos que viveram na região. Concluiu que os Nu-Aruakes eram os autores da cerâmica (Goeldi, 1898, p. 408-409, 411-413; 1900b, p. 32-43). Isto porque, dentre as populações que viviam na Amazônia, os Nu-Aruakes seriam os mais civilizados. Para ele, um povo por demais primitivo não fabricaria cerâmicas tão primorosas (Goeldi, 1900b, p. 39).

Goeldi comparou as cerâmicas amazônicas, por seu requinte e beleza, com artefatos incaicos. Para ele, as realizações culturais dos Nu-Aruakes representariam a suprema produção artística da América cisandina (Goeldi, 1898, p. 411; 1900b, p. 43). Contudo, não as classificou como pré-históricas. Para ele, a cerâmica Cunani era póscolombiana, coetânea da conquista ibérica. Dois foram os argumentos para esta datação das cerâmicas: as urnas das cavernas artificiais estavam conservadas; se elas fossem antigas, suas cores e seus desenhos apresentar-se-iam esmaecidos; numa urna de Maracá, encontrou-se um esqueleto em cujo pulso havia uma pulseira de contas de vidro veneziano, trazidas pelos ibéricos durante a conquista (Goeldi, 1898, p. 416-417; 1900b, p. 32).

Goeldi, pois, refutou frontalmente as hipóteses da arqueologia nobiliárquica. Primeiro, enfatizando que as cerâmicas dos Nu-Aruakes possuíam motivos simbólicos, linhas geométricas e técnicas fabris comuns na Amazônia. Espargiram-se numa grande área, desde a foz do Amazonas ao Oiapoque. Não eram raridades resultantes de uma influência chinesa ou nórdica. Tampouco esta civilização cisandina era pré-histórica. De outro lado, a interpretação corrente sobre as contas de vidro era a de Karl von Koseritz (1830-1890). Achando-as em igaçabas de sambaquis do Rio Grande do Sul, atribuiu-lhes ascendência fenícia (Koseritz, 1884). Goeldi evidenciara que, ao contrário, as contas, tendo origem veneziana, estabeleciam uma cronologia recente para a arqueologia amazônica.

Contudo, Goeldi rompeu apenas parcialmente com a arqueologia nobiliárquica. Ele não poliu o lado 'nobre' da moeda. Mostrou que os artefatos indígenas, por mais que se o quisesse, não emitiriam brilhos pré-históricos de uma civilização mediterrânica. O reverso da moeda, sua efígie colonialista, devotada à anexação de territórios, foi lustrado por ele. Na conferência, ele reafirmou seu ideal de pesquisa arqueológica e etnológica: ela deveria se fazer em concomitância com o estabelecimento dos Diretórios de Índios (Goeldi, 1898, p. 401). Contudo, há um segundo ponto, uma segunda coordenada, da atrelagem da pesquisa arqueológica a uma política colonial. Ele se posiciona, exatamente, na definição da problemática regional de pesquisa. Não se tratava somente de refutar as hipóteses risíveis da arqueologia nobiliárquica. A escolha da Guiana brasileira não era apenas um ditame científico. Tinha, também, uma ordenação geoestratégica.

Nos anos de 1898 e 1899, Goeldi foi à Europa para ajudar o Barão do Rio Branco a solucionar a demarcação geopolítica entre a Guiana Francesa e a Brasileira. Em abril de 1900, Goeldi voltaria à Europa para continuar a tratar, ao lado do Barão do Rio Branco, desta questão diplomática. O sucesso das negociações rendeu a Goeldi uma homenagem. O Governo do Pará, num decreto de 1900, mudou o nome do Museu Paraense de História Natural e Etnografia para Museu Goeldi (Decreto n. 933, 1904, p. 1). Goeldi reconheceu explicitamente que as pesquisas na Guiana brasileira auxiliaram na regularização do secular litígio com a Guiana Francesa. Segundo ele: "Pela publicação dos resultados das expedições científicas do estabelecimento realizadas no litoral da Guiana, o Museu Paraense tornou-se um dos principais elementos de defesa do Brasil. É fato histórico" (Goeldi, 1900c, p. 274).

Nelson Sanjad (2005, p. 303 e seguintes) enfatiza como as pesquisas feitas na Guiana brasileira auxiliaram diretamente na demarcação das fronteiras do Amapá, ressaltando, acertadamente, que o maior número de publicações resultantes da expedição foi em ciências naturais. Foram poucos, sem dúvida, os textos arqueológicos produzidos pelo Museu Paraense. Lembremo-nos, porém, que a arqueologia foi institucionalizada, no Museu Paraense, em meio às ciências naturais. No contexto da expedição à Guiana, a arqueologia, assim como as ciências naturais, se fez essencialmente como pesquisa de campo, na dinâmica das viagens científicas. É esse nomadismo que instituiu a lógica de incorporação de territórios indígenas para o Estado nacional. As viagens científicas para a Guiana brasileira imbuíram-se de uma estratégia largamente usada pelos Estados colonialistas.

Desde o século XVI, mas intensificando-se no final do século XVIII, as viagens científicas, desbravando territórios desconhecidos pelos Estados colonialistas, inventaram geografias, descortinaram, por meio da ciência, paisagens, monumentos e populações exóticas (Beer, 1997). Como diz Edward Said, o olhar colonial recobria a imaginação geográfica (Said, 1979, p. 49-73; 1995a). Ele circunscrevia fronteiras geopolíticas, marcando-as artificialmente. O escopo geográfico é a própria metodologia do colonialismo. É o esteio de muitas formas de saber: as ciências naturais, mas também a etnologia e a arqueologia. Um exemplo disso nos é dado pelo oponente mesmo da disputa geopolítica pela Guiana brasileira. Afinal, a França, desde a invasão napoleônica ao Egito, tornou as ciências naturais e a arqueologia um móvel do colonialismo (Petitjean, 1997). A "Descrição do Egito" (1823) ("Description de l'Egypte"), com seus nove volumes de texto e quatorze de pranchas, apresenta não propriamente descrições, mas atribuições de identidade (Said, 1995b, p. 154-178; Gran-Aymerich, 1998, p. 94-107). As pranchas ilustrativas, suas pinturas de monumentos decrépitos e empoeirados, como representações, são uma conquista simbólica da geografia.

O estado colonial francês, de outro lado, não partiu só para a conquista simbólica da África, criando, em 1878, em Paris, um Musée d'Ethnographie para receber as coleções que chegavam, é claro, do Egito, mas também do Saara e da chamada África Ocidental (Barros, 1990, p. 157). O mesmo se passou na América, por meio da colonização dos artefatos das civilizações Inca, Maia e Asteca. O Louvre, em 1850, já dispunha de uma galeria com coleções arqueológicas da América Central. Em 1857, o governo francês financiou a expedição do explorador e fotógrafo Desiré Charnay (1828- 1915), da qual resultou a obra "Cités e Ruines Américaines" (1863). Dez anos depois, a França já participava da Exposição Internacional com uma seção toda dedicada à arqueologia da América Central e do México (Bernal, 1980).

A expedição à Guiana brasileira usou as mesmas armas da França. Partiu para a colonização científica de uma porção da América do Sul. As ciências naturais e a arqueologia revelaram, para o estado do Pará, e mais amplamente, para o Brasil, uma geografia pouco conhecida, senão completamente desconhecida. As coleções arqueológicas puderam ser removidas de seu contexto local e transportadas para o Museu Paraense, onde foram usadas em exposições públicas e transformadas em textos científicos. Uma vez decifradas, as coleções integraram o patrimônio do estado do Pará, representando, assim, uma colonização simbólica do território.

As estampas cromolitográficas das cerâmicas Cunani são representativas do domínio científico da região. Se elas sobrepujam, como queria Goeldi, o texto descritivo, é porque atribuem, com seu enlevo estético, uma identidade representativa de uma ampla porção do estado do Pará. Elas têm elementos estruturais, motivos decorativos e perícia técnica que se estendem pela ilha de Marajó, Mirakanguera e foz do Amazonas. São provas científicas de uma civilização cisandina, assentada numa ampla porção do território paraense. Preparadas como objetos artísticos, as imagens das coleções arqueológicas mostravam à França, à apreciação do olhar europeu, e também do das elites brasileiras, coleções dignas de figurar na galeria americana do Louvre. Agora, porém, pertenciam ao estado do Pará. Podiam ser utilizadas para benefícios geopolíticos, para desenhar contornos cartográficos.

Políticas coloniais operam geograficamente, fixando fronteiras (Prakash, 1995). Domesticar fronteiras foi o que fizeram as pesquisas arqueológicas de Goeldi na Guiana. Pode-se, assim, rasurá-las criticamente como política colonial. O colonialismo ocorre não somente quando uma força política externa, estrangeira, acomete a um povo e seu território (Spivak, 1988; Chatterjee, 1993). Ele é, também, uma versão política que pode ser acionada a partir do interior de uma fronteira nacional; contanto que uma elite, detendo os aparelhos de Estado, se valha dos braços da ciência (e não apenas do exército) para classificar populações e imaginar geografias (Loomba, 2000). No caso das pesquisas arqueológicas de Goeldi, arquivos de barro inventaram, por meio do passado, uma geografia do presente. Uma geografia que continua a demarcar geopoliticamente o Brasil e sua noção física de soberania nacional.

 

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Fátima Teles, chefe da Biblioteca Domingos Soares Ferreira Penna, do Museu Goeldi, pela gentilíssima e amiga ajuda que me prestou nos arquivos da instituição. Raul Campos e Nelson Sanjad fizeram jus a Fátima Teles: receberam-me, também, com amizade e gentileza, esclarecendo-me sobre as nuances dos arquivos do Museu Goeldi. Agradeço, ainda, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que financiou minhas pesquisas entre 2000 e 2008.

 

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Endereço para correspondência:
Museu Paraense Emílio Goeldi
Editor do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas
Av. Magalhães Barata, 376
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E-mail:boletim@museu-goeldi.br

Recebido: 16/12/2008
Aprovado: 25/04/2009

 

 

1Zoólogo de origem suíça, Emil August Goeldi foi contratado em 1884 pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde trabalhou como subdiretor da Seção Zoológica. Foi demitido em 1890. Em março de 1894, assumiu a direção do Museu Paraense, em Belém, a convite do governador do Pará, Lauro Sodré, permanecendo nessa instituição até 1907, quando retornou à Suíça.